Bem acompanhada, Maria Bethânia lança disco ‘solitário’
Álbum soa como resposta, ora doce, ora dura, às críticas recebidas por blog de poesia
RIO - No fim de 2011, Maria Bethânia teve o impulso de entrar em estúdio para preparar um disco. Só sabia, então, que queria fazê-lo sozinha.
— Queria assinar, arcar com toda a responsabilidade. Meu desejo era por algo solitário, me expressar só. Se pudesse, faria à capela — exagera, sorrindo. — Porque nasci só, vou morrer só, não tenho filhos... Sou só.
Paradoxalmente, porém, o núcleo do CD "Oásis de Bethânia" (Biscoito Fino) está em "Carta de amor" — com refrãos de Paulo César Pinheiro e texto da cantora —, que já na abertura anuncia o oposto da solidão: "Não mexe comigo/ Que eu não ando só". Em seguida, Bethânia declama: "Eu tenho Zumbi, Besouro, o chefe dos Tupis/ (...) Eu tenho Jesus, Maria e José". E continua: "Eu posso engolir você/ Só pra cuspir depois". Palavras que podem ser lidas como resposta às críticas dirigidas a ela quando se soube que o Ministério da Cultura autorizou a captação de R$ 1,3 milhão para o projeto que ficou conhecido como "blog da Bethânia" — proposto a ela por Hermano Vianna, ele consistia na publicação de 365 vídeos com a cantora declamando poemas.
— Eram palavras que eu precisava dizer. Uma urgência. Quem quiser vestir a carapuça que vista — diz a cantora sobre "Carta de amor", justificando o longo silêncio desde a polêmica, há um ano. — Estava fazendo coisas, mas nada que precisasse que eu falasse com a imprensa. Até porque o assunto ia ser só um.
Musicalmente, Bethânia também não anda só. Apesar da instrumentação econômica que confirma seu desejo de solidão (muitas vezes há apenas um músico a seu lado), ela se cercou de boa companhia em "Oásis de Bethânia". Depois de ter Jaime Alem como fiel arranjador por 30 anos, a cantora convidou Jorge Helder (que assina com ela a "criação geral" do CD), Djavan, Hamilton de Holanda, Lenine, Mauricio Carrilho, Marcelo Costa e André Mehmari, além do próprio Alem, para assinar os arranjos — ao espalhar a autoria entre muitos, ela acaba reafirmando sua assinatura, solitária, como a mais forte do disco.
Das dez faixas, cinco são inéditas
Para cada faixa escolhida, vinha à sua mente o arranjador ideal. "O velho Francisco", de Chico Buarque — compositor ao qual a cantora planeja dedicar uma série de CDs ("No mínimo 12!", diz, rindo) — ficou a cargo de Lenine ("Seu Lenine é o que há de mais tradicional e mais moderno, traz uma novidade no entendimento rítmico"). Alem faz "Fado" ("A exuberância dele na viola, para mim, seu forte"). Carrilho está em "Calúnia" ("Seu violão filho de Baden").
— A primeira que pensei foi "Lágrima". Ouvia muito com Orlando Silva, já cantei, mas nunca pensei em gravá-la. Quis logo chamar o Hamilton (de Holanda, bandolinista). Gravamos juntos, ao vivo. Quase todo o CD foi assim. Ouvi "Salmo" (de Raphael Rabello e Paulo César Pinheiro) com Amélia Rabello e o próprio Raphael. Quando ouvi o violão dele, pensei: "Não posso gravar com violão". Chamei o (pianista André) Mehmari, que foi lindo. Aliás, depois que me botaram no pelourinho, tive muita sorte com essas pessoas que chamei. Vieram com tanta doçura, parecia uma coisa de Deus, unguentos de Maria de Bethânia mesmo.
Ela faz referência à personagem bíblica que ungiu os pés de Cristo e batizou a cidade israelense Maria de Bethânia, que inspirou o nome do CD:
— Conheci a cidade, que fica num oásis — conta, lembrando que o nome foi retirado do texto de "Carta de amor". — E meu oásis é o sertão, como na foto de Gringo Cardia na capa do disco.
Com dez faixas, "Oásis de Bethânia" — lançado junto com o aplicativo da cantora para iPhone — traz cinco inéditas: "Vive", de Djavan; "Casablanca" e "Fado", de Roque Ferreira (que tem três no CD); "Calmaria", de Jota Velloso; e "Carta de amor":
— Djavan me disse: "Desde 1978 não componho para você, quero fazer isso agora". Falei para escrever sobre o que quisesse e ele veio com uma de suas melhores. Já "Calmaria" tem a ver com meu momento de isolamento. E Roque, fora do samba de roda, mostra sua grande admiração pelo Caymmi romântico.
Num acaso, "Vive" acaba tocando numa ideia central do CD: o saber viver. Ou seja, chorar quando for para chorar ("Lágrima"), louvar a grandeza da existência ("Salmo"), ter a consciência da calmaria e da tempestade ("Calmaria"), assim como da passagem do tempo ("O velho Francisco"). E, acima de tudo (referência ao episódio do blog?), marcar a poesia como uma instância superior da vida. Bethânia sorri com a observação sobre a repetição no CD de palavras como poesia e poeta e destaca uma ocorrência:
— Fiquei muito com o repertório de Dalva (de Oliveira) para fazer o disco. E "Calúnia", sobre essa mulher que foi traída, caluniada, me pareceu uma boa preparação para "Carta de amor". "Deixa a calúnia de lado se de fato és poeta" (cita o verso de "Calúnia"). Boa parte da grandeza da canção está aí.
— Queria assinar, arcar com toda a responsabilidade. Meu desejo era por algo solitário, me expressar só. Se pudesse, faria à capela — exagera, sorrindo. — Porque nasci só, vou morrer só, não tenho filhos... Sou só.
Paradoxalmente, porém, o núcleo do CD "Oásis de Bethânia" (Biscoito Fino) está em "Carta de amor" — com refrãos de Paulo César Pinheiro e texto da cantora —, que já na abertura anuncia o oposto da solidão: "Não mexe comigo/ Que eu não ando só". Em seguida, Bethânia declama: "Eu tenho Zumbi, Besouro, o chefe dos Tupis/ (...) Eu tenho Jesus, Maria e José". E continua: "Eu posso engolir você/ Só pra cuspir depois". Palavras que podem ser lidas como resposta às críticas dirigidas a ela quando se soube que o Ministério da Cultura autorizou a captação de R$ 1,3 milhão para o projeto que ficou conhecido como "blog da Bethânia" — proposto a ela por Hermano Vianna, ele consistia na publicação de 365 vídeos com a cantora declamando poemas.
— Eram palavras que eu precisava dizer. Uma urgência. Quem quiser vestir a carapuça que vista — diz a cantora sobre "Carta de amor", justificando o longo silêncio desde a polêmica, há um ano. — Estava fazendo coisas, mas nada que precisasse que eu falasse com a imprensa. Até porque o assunto ia ser só um.
Musicalmente, Bethânia também não anda só. Apesar da instrumentação econômica que confirma seu desejo de solidão (muitas vezes há apenas um músico a seu lado), ela se cercou de boa companhia em "Oásis de Bethânia". Depois de ter Jaime Alem como fiel arranjador por 30 anos, a cantora convidou Jorge Helder (que assina com ela a "criação geral" do CD), Djavan, Hamilton de Holanda, Lenine, Mauricio Carrilho, Marcelo Costa e André Mehmari, além do próprio Alem, para assinar os arranjos — ao espalhar a autoria entre muitos, ela acaba reafirmando sua assinatura, solitária, como a mais forte do disco.
Das dez faixas, cinco são inéditas
Para cada faixa escolhida, vinha à sua mente o arranjador ideal. "O velho Francisco", de Chico Buarque — compositor ao qual a cantora planeja dedicar uma série de CDs ("No mínimo 12!", diz, rindo) — ficou a cargo de Lenine ("Seu Lenine é o que há de mais tradicional e mais moderno, traz uma novidade no entendimento rítmico"). Alem faz "Fado" ("A exuberância dele na viola, para mim, seu forte"). Carrilho está em "Calúnia" ("Seu violão filho de Baden").
— A primeira que pensei foi "Lágrima". Ouvia muito com Orlando Silva, já cantei, mas nunca pensei em gravá-la. Quis logo chamar o Hamilton (de Holanda, bandolinista). Gravamos juntos, ao vivo. Quase todo o CD foi assim. Ouvi "Salmo" (de Raphael Rabello e Paulo César Pinheiro) com Amélia Rabello e o próprio Raphael. Quando ouvi o violão dele, pensei: "Não posso gravar com violão". Chamei o (pianista André) Mehmari, que foi lindo. Aliás, depois que me botaram no pelourinho, tive muita sorte com essas pessoas que chamei. Vieram com tanta doçura, parecia uma coisa de Deus, unguentos de Maria de Bethânia mesmo.
Ela faz referência à personagem bíblica que ungiu os pés de Cristo e batizou a cidade israelense Maria de Bethânia, que inspirou o nome do CD:
— Conheci a cidade, que fica num oásis — conta, lembrando que o nome foi retirado do texto de "Carta de amor". — E meu oásis é o sertão, como na foto de Gringo Cardia na capa do disco.
Com dez faixas, "Oásis de Bethânia" — lançado junto com o aplicativo da cantora para iPhone — traz cinco inéditas: "Vive", de Djavan; "Casablanca" e "Fado", de Roque Ferreira (que tem três no CD); "Calmaria", de Jota Velloso; e "Carta de amor":
— Djavan me disse: "Desde 1978 não componho para você, quero fazer isso agora". Falei para escrever sobre o que quisesse e ele veio com uma de suas melhores. Já "Calmaria" tem a ver com meu momento de isolamento. E Roque, fora do samba de roda, mostra sua grande admiração pelo Caymmi romântico.
Num acaso, "Vive" acaba tocando numa ideia central do CD: o saber viver. Ou seja, chorar quando for para chorar ("Lágrima"), louvar a grandeza da existência ("Salmo"), ter a consciência da calmaria e da tempestade ("Calmaria"), assim como da passagem do tempo ("O velho Francisco"). E, acima de tudo (referência ao episódio do blog?), marcar a poesia como uma instância superior da vida. Bethânia sorri com a observação sobre a repetição no CD de palavras como poesia e poeta e destaca uma ocorrência:
— Fiquei muito com o repertório de Dalva (de Oliveira) para fazer o disco. E "Calúnia", sobre essa mulher que foi traída, caluniada, me pareceu uma boa preparação para "Carta de amor". "Deixa a calúnia de lado se de fato és poeta" (cita o verso de "Calúnia"). Boa parte da grandeza da canção está aí.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/cultura/bem-acompanhada-maria-bethania-lanca-disco-solitario-4447063#ixzz1qeasuale
Nenhum comentário:
Postar um comentário