Pesquisar este blog

quarta-feira, 14 de março de 2012

A Poesia de Caetano Veloso

A Poesia de Martha Medeiros



Strip-Tease
Chegou no apartamento dele por volta das seis da tarde
e sentia um nervosismo fora do comum.
Antes de entrar, pensou mais uma vez no que estava por fazer.
Seria sua primeira vez.
Já havia roído as unhas de ambas as mãos.
Não podia mais voltar atrás.
Tocou a campainha e ele, ansioso do outro lado da porta,
não levou mais do que dois segundos para atender.
Ele perguntou se ela queria beber alguma coisa, ela não quis.
Ele perguntou se ela queria sentar, ela recusou.
Ele perguntou o que poderia fazer por ela.
A resposta: sem preliminares.
Quero que você me escute, simplesmente.
Então ela começou a se despir como nunca havia feito antes.
Primeiro tirou a máscara:
'Eu tenho feito de conta que você não me interessa muito,
mas não é verdade.
Você é a pessoa mais especial que já conheci.
Não por ser bonito ou por pensar como eu sobre tantas coisas,
mas por algo maior e mais profundo do que aparência e afinidade.
Ser correspondida é o que menos me importa no momento:
preciso dizer o que sinto'.
Então ela desfez-se da arrogância:
'Nem sei com que pernas cheguei até sua casa,
achei que não teria coragem.
Mas agora que estou aqui,
preciso que você saiba que cada música que toca é com você que ouço,
cada palavra que leio é com você que reparto,
cada deslumbramento que tenho é com você que sinto.
Você está entranhado no que sou, virou parte da minha história.'
Era o pudor sendo desabotoado: 'Eu beijo espelhos, abraço almofadas,
faço carinho em mim mesma tendo você no pensamento,
e mesmo quando as coisas que faço são menos importantes,
como ler uma revista ou lavar uma meia,
é em sua companhia que estou'.
Retirava o medo: 'Eu não sou melhor ou pior do que
ninguém, sou apenas alguém que está aprendendo a lidar com o amor,
sinto que ele existe, sinto que é forte
e sinto que é aquilo que todos procuram. Encontrei'.
Por fim, a última peça caía, deixando-a nua
'Eu gostaria de viver com você, mas não foi por isso que vim.
A intenção é unicamente deixá-lo saber que é amado
e deixá-lo pensar a respeito,
que amor não é coisa que se retribua de imediato,
apenas para ser gentil.
Se um dia eu for amada do mesmo modo por você,
me avise que eu volto, e a gente recomeça de onde parou, paramos aqui'.


E saiu do apartamento sentindo-se mais mulher do que nunca.

A Poesia de GIL

Eu sei que vou te amar - Toquinho e Orquestra Arte Viva - Vinicius / Jobim

A Poesia de Vinicius de Morais

Ternura

 

Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentado
Pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer que o grande afeto que te deixo
Não traz o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras dos véus da alma...
É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade o olhar extático da aurora.

Rio de Janeiro
http://www.viniciusdemoraes.com.br/site/article.php3?id_article=99

Amistad - O navio negreiro - Caetano Veloso

Para Celebrar o Dia Nacional da Poesia e 165 anos de nascimento do poeta Castro Alves







Castro Alves é inquestionavelmente um dos maiores poetas da língua portuguesa.


Nesse sentido, sugere-se a leitura da obra “O Amor do Soldado”.

Nela o leitor poderá encontrar o envolvente relato da vida, dos amores e
da incansável luta pela liberdade, protagonizada pela sedutora figura daquele que
ficou conhecido como o Poeta dos Escravos; contada como só um outro baiano,
também imortal e saudoso, saberia contar – Jorge Amado.

Antônio de Castro Alves nasceu na Bahia, no ano de 1847, na fazenda de
Cabaceiras, então comarca de Cachoeira.
Pela família e pelos amigos era conhecido apenas pelo simples Cecéu. Entretanto,
para as autoridades de seu tempo, era o rebelde e subversivo estudante; e para a história
da literatura brasileira, ficaria conhecido para sempre como o Poeta dos Escravos.
Embora a inquestionável excelência de seus versos, o poeta teve um único livro
editado ainda em vida - “Espumas Flutuantes”. Nele, Castro Alves retoma o tema do
amor em sua sensualidade e em sua realização.
Transformando o sentimento amoroso em pleno sentido de prazer e sofrimento,
em “Espumas Flutuantes” descreve cenas oportunas da paixão humana. Em poemas tais
como "O adeus de Teresa", por exemplo, percebemos a plenitude do lirismo de seu
lirismo:


A vez primeira que eu fitei Teresa,

Como as plantas que arrasta a correnteza,

A valsa nos levou nos giros seus’...

E amamos juntos... E depois na sala

“Adeus” eu disse-lhe a tremer co’a fala...

E ela, corando, murmurou-me: “adeus”.

Uma noite... entreabriu-se um reposteiro...

E da alcova saía um cavaleiro

Inda beijando uma mulher sem véus...

Era eu... Era a pálida Teresa !

“Adeus” lhe disse conservando-a presa...

E ela entre beijos murmurou-me: “adeus !”

Passaram tempos...séc’los de delírio...

Prazeres divinais... gozos do Empíreo...

... Mas um dia volvi aos lares meus.

Partindo eu disse – “Voltarei !... descansa!...”

Ela, chorando mais que uma criança,

Ela em soluços murmurou-me: “adeus!”

Quando voltei... era o palácio em festa!...

E a voz d”Ela e de um homem lá na orquestra

Preenchida de amor o azul dos céus.

Entrei!... Ela me olhou branca....surpresa!

Foi a última vez que eu vi Teresa !...

E ela arquejando murmurou-me: “adeus”


O poeta do povo, o defensor dos escravos, como foi e continua sendo chamado
Castro Alves é revelado em sua intensidade de amar, no sentido mais pleno do amor.
Amou a vida. Amou seus amigos. Amou os negros escravos. Amou a volúpia de suas
amantes. Amou os versos. E amou, amou muito, amou perdidamente a mais irresistível
de todas as suas amadas – a Liberdade. Porque não era só com o corpo que o Poeta
amava, era sobretudo com as palavras e com os ideais libertários que ele tremia de
prazer.
Dividido entre os compromissos políticos inerentes a uma época de grandes
revoluções ideológicas e o amor de sua querida Eugênia Câmara, Castro Alves
abandona tudo em nome do amor à causa libertária.

Jorge Amado reverenciou Castro Alves, em “O Amor do
Soldado”:

“Não é fácil prender nos limites de um palco a vida de Castro Alves que se
processou sempre na praça pública à frente da multidão. Ele não agiu como
a maioria dos poetas que se tranca nos gabinetes de trabalho à espera de
inspiração. Não foi apenas liberdade, foi também um militante da liberdade.
Seu lugar era à frente do povo. Sua arte, ele colocou a serviço da Pátria e da
humanidade.”
Sobre liberdade e escravidão Castro Alves não poupou palavras para exprimir
toda sua indignação diante do flagelo por que passou a humanidade até quase o final do
século XIX, em que o homem escravizava o próprio homem, a pretexto de pretensa
superioridade racial que, na verdade, sabia nunca ter existido.

Centrado mais uma vez no tema de exaltação à liberdade, temos, entre outras, “Os
Escravos”, coleção de poesias que foram publicadas doze anos após a morte do poeta,
constituindo-se na forma mais pura da chamada poesia social. Apesar de uma certa
idealização, podemos dizer que os versos lírico-amorosos de Castro Alves conseguiram
ser menos idealizados que os de seus contemporâneos, impregnando da dura realidade
dos negros escravos cada estrofe que escrevia. Falando sempre do negro escravo, cativo
e maltratado pelos senhores, marcou sua incansável luta pela liberdade, como podemos
encontrar na parte IV do “Navio Negreiro”:

Era um sonho dantesco... O tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho,
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros...estalar do açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...

Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras, moças... moças nuas, espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs.

E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...

Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali !

Um de raiva delira, outro enlouquece...
Outro, que de martírios embrutece,
Cantando, geme e ri !

No entanto o capitão manda a manobra
E após, fitando o céu que se desdobra
Tão puro sobre o mar,
Diz do fumo entre os densos nevoeiros:
“Vibrai rijo o chicote, marinheiros !
Fazei-os mais dançar !...”

E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da rocha fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam !...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam !
E ri-se Satanás !...

Jorge Amado afirmou ter sido para ele difícil escrever sobre Castro Alves,
"
é impossível prender nos limites de um texto a vida de um poeta que colocou sua obra a
serviço da liberdade" (AMADO, 1943).

165 anos de uma literatura brasileira que levanta a bandeira do respeito à dignidade humana.