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sábado, 3 de agosto de 2013

George Harrison watching This Boy



O pacto com o diabo

Literatura e cinema: O Pacto dos Estados Unidos da América com o diabo


Texto do Professor Jorge Moreira (Especial para o Setaro's Blog)

O pacto com o diabo (Lúcifer, Mefistófeles, Mefisto) tem uma longa história na cultura ocidental, estando relacionado originalmente com a história bíblica da tentação de Jesus Cristo no deserto. Conforme o “Evangelho segundo São Mateus” (1), um dos mais confiáveis, as principais tentações tomam a forma de três incitações diabólicas que são: a incitação para transformar pedras em pão; a incitação para saltar do templo e a incitação para reinar sobre o mundo. Biblicamente, Jesus resiste às tentações, negando-se a fazer o pacto com o diabo. Das três tentações, a terceira é a que parece ter tido mais influência na história da literatura e do cinema ocidental.

Nas obras literárias, por exemplo, o tema da tentação e do pacto com o diabo, têm sido representadas através da elaboração da lenda (que circulava na Idade Média) sobre a relação de troca entre Fausto e Lúcifer. E a lenda se transformou numa das formas predominantes (uma espécie de padrão artístico), para a produção artística subsequente. Na literatura, o diabo oferece ao herói pactário algo que ele deseja desesperadamente - riqueza, poder ou conhecimento -, exigindo em troca a possessão da alma do herói depois da sua morte.

Uma das primeiras manifestações deste padrão artístico (teatral ou narrativo) foi apresentada na peça de teatro A Trágica História do Doutor Fausto escrita por Christopher Marlowe (2) no século XVI. Outra das célebres representações da temática do pacto com o diabo se encontra em Faust, o poema trágico (na forma de peça de teatro com diálogos rimados) escrito por Johann Wolfgang von Goethe no século XIX (3). Já no século XX, o escritor alemão, Thomas Mann (filho da brasileira Julia da Silva Bruhns), prêmio Nobel de literatura, realizou uma extraordinária variação do tema (o pacto com o demônio) na sua obra Doktor Faustus (Dr. Fausto) de 1947 (4). No Brasil, o escritor João Guimarães Rosa também realizou uma brilhante variação (as veredas) da lenda de Fausto, na versão do “suposto” pacto do Riobaldo Tatarana com o diabo, no seu consagrado romance Grande Sertão: veredas (5). A historia do pacto é contada pelo próprio Riobaldo que, alem de protagonista, é o narrador do romance.

Como sabemos, estes reconhecidos textos literários sobre o pacto diabólico (incluindo a obra teatral de Christopher Marlowe) foram adaptados para o cinema por escritores e diretores de fama internacional e do Brasil.

No Brasil, existem duas adaptações visuais de destaque do romance de Guimarães Rosa: Grande Sertão, o filme de 1965, dirigido pelos irmãos Geraldo e Renato Santos Pereira, com Maurício do Valle como Riobaldo Tatarana; e Grande Sertão: Veredas (uma minissérie) da Rede Globo, escrita e dirigida por Walter Avancini contando com Tony Ramos no papel de Riobaldo.
Na historia do cinema, o filme Faust, dirigido por F. W. Murnau, é uma das primeiras adaptações cinematográficas (1926) bem sucedidas da lenda de Doctor Faustus para sétima arte. Em língua inglesa, existe uma adaptação cinematográfica de 1967 que teve grande circulação na época devido às atuações de Richard Burton e a mulher Elizabeth Taylor, dois ídolos do cinema mundial. O filme, intitulado Faust, foi dirigido por Burton que também acumulava o papel protagonista.
Por seu lado, o romance de Thomas Mann ganhou uma excelente versão cinematográfica intitulada Doktor Faustus que foi realizada em 1982 pelo diretor alemão Franz Seitz (6). Um ano antes, o romance Mephisto de Klaus Mann, escritor e filho alemão de Thomas Mann, ganhou uma magistral versão cinematográfica com o mesmo título, que foi dirigida pelo húngaro István Szabó em 1981 (7 )
A mais recente e destacada realização cinematográfica que conheço sobre o pacto demônico foi realizado em 2011 pelo diretor russo Alexander Sokurov (8) . Seu filme Faust está baseado numa livre interpretação da lenda de Fausto e de sua adaptação literária por Goethe e por Thomas Mann.

Modernamente, tanto no romance Doktor Faustus de Thomas Mann quanto no romance Mephisto do filho Klaus Mann, o mito do pacto do diabo, foi reinterpretado para funcionar como una metáfora do pacto de Alemanha com Adolf Hitler.

Atualmente, tem sido um recurso frequente identificar situações reais (ou da realidade) com as situações imaginárias (metafóricas ou alegóricas) como se elas fossem situações iguais, semelhantes, e/ou equivalentes. Em geral, a identificação é realizada através do lema: “a arte imita a vida” ou vice versa “a vida imita a arte”.

Mas a relação entre a situação real e a imaginária é de diferença e não de identidade. Apesar de compartilharem algumas características comuns, elas não conformam uma relação entre iguais. No entanto, isso não significa que a realidade imaginária ou simbólica da arte não possa se refletir, imitar, ter correspondência ou projetar-se no processo da realidade histórica em que vivemos dado que as situações políticas, sociais, econômicas e culturais mostram correspondências e paralelismos entre o pacto demoníaco do texto artístico e o pacto demoníaco dos indivíduos e grupos com o poder político, econômico e militar real das classes dominantes da nossa sociedade capitalista.

Nos Estados Unidos, este paralelismo entre a realidade e o imaginário pacto com o diabo crescem em ritmo acelerado e pode ser também interpretado como metáfora ou alegoria do pacto dos EUA com o nazifascismo e suas políticas etnocidas, genocidas e imperialistas.

As invasões e ocupação de países como Iraque e Afeganistão e a invasão e ocupação dos territórios palestinos; a permanência dos campos de concentração e dos centros de torturas como Guantánamo; as sistemáticas acusações e perseguições efetuadas pelos funcionários do governo dos Estados Unidos aos “whisleblowers”, seres humanos como Daniel Elsberg, Julian Assange, Bradley Manning e Edward Snowden, são indicações de que a corrupção, a mentira, a desonestidade, a hipocrisia, a ilegalidade e o crime são as moedas correntes (o pão de cada dia) dentro das principais instituições políticas, militares, econômicas e judiciárias do capitalismo norteamericano.

Dentro deste contexto, as revelações dos “segredos” políticos e militares dos EUA, por Daniel Elsberg, Julian Assange, Bradley Manning e Edward Snowden, poderiam ser caracterizadas simbolicamente como atos heróicos que tratam de romper ou destruir o pacto dos EUA com o diabo.

Num país verdadeiramente democrático, a sociedade civil e a administração governamental deveriam estar celebrando a dignidade ética e politica de indivíduos valentes e íntegros como Daniel Elsberg, Julian Assange, Bradley Manning e Edward Snowden; a sociedade deveriam estar orgulhosos desses raros indivíduos que, como eles, sacrificam a vida pessoal e profissional para revelar documentos secretos das operações clandestinas e criminais de um governo que aparenta ser democrático, elevando o nível de consciência do público estadunidense (e mundial) sobre o estado de degeneração moral, social e humana a que estamos submetidos sob o capitalismo.

Depois das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki, das guerras dos Estados Unidos da América contra o povo do Vietnã, da Coréia do Norte, do Iraque, do Afeganistão, do Paquistão e da Palestina, ficou quase impossível esconder as características nazifascistas do estado autoritário e ditatorial sob o qual estamos sobrevivendo nos EUA.

Em poucas palavras, as revelações de Edward Snowden e o último escândalo em torno da invasão da privacidade de milhões de norteamericanos através dos grampos nos telefones realizados pelas NSA e CIA em alianças com ATT, Verizon, Google, Facebook e outras parecem demonstrar que estamos sendo aprisionados por um dos mais hediondos pactos demoníacos já realizados entre autoridades políticas, militares, judiciais dos EUA e ideologia e a práticas hitleristas do império do mal.

É quase inacreditável que os desejos e ambições de poder (e riqueza) dos funcionários públicos dos estados capitalistas a serviço da classe dominante estejam agigantando o já escandaloso grau de corrupção individual e social que contribuem para destruir todos os resquícios de dignidade humana que ainda restavam nos Estados Unidos e no mundo ocidental.

E no entanto sabemos (e ficou ainda mais evidente durante esta crise estrutural do sistema capitalista) que não existe superação política, econômica, social, cultural, artística ou cinematográfica possível para este estado de degeneração ética, moral e legal (para este quase interminável pacto demoníaco atual) da nossa sociedade, se não formos capazes de produzir a desejada mudança estrutural deste sistema capitalista imperialista e não formos capazes de criar um novo modo de produção de sociedade humana em que se possa viver sem torturas e crimes de guerra.


NOTAS

1) A história do encontro de Jesus com o diabo no deserto foi adaptada por Pier Paolo Pasolini para o seu belíssimo e revolucionário filme Il vangelo secondo Matteo" (O Evangelho Segundo São Mateus) que dirigiu em 1964 para homenagear o papa João XXIII, o criador do Conselho Vaticano II, um dos elementos nas origens da Teologia da Libertação. O filme recebeu vários prêmios importantes, dentre os quais o Prêmio Leão de Prata - Grande Prêmio do Jurado- do Festival Internacional de Veneza em 1964.

2) Christopher Marlowe foi um dramaturgo, poeta e tradutor inglês que viveu no denominado “Período Elizabetano”. É considerado um dos maiores renovadores da forma do teatro do período com a introdução dos versos brancos estrutura que seria empregada por William Shakespeare.

3) O filósofo espanhol Manuel Sacristán tradutor do poema trágico Faustus (a obra prima de Goethe) oferece uma leitura (uma interpretação) brilhante e convincente do poema no seu ensaio intitulado “La veracidad de Goethe”. Veja no livro Panfletos y materiales, IV: Lecturas. Icaria, Barcelona, 1985.

4) O professor Manuel Sacristán oferece, desde a perspectiva da “filosofia da ciência”, uma leitura (uma interpretação) sumamente interessante do romance Doktor Faustus de Thomas Mann no seu importante ensaio intitulado “Tres grandes libros en la estacada”. Veja também no livro Panfletos y materiales, IV: Lecturas. Icaria, Barcelona, 1985.

5) Para uma análise ampliada dos elementos formais da narrativa Roseana, veja o ensaio “O regionalismo de Guimarães Rosa” de Jorge Vital de Brito Moreira (o autor deste texto) na revista Estudos Sociedade e Agricultura, 3, novembro 1994, 92-100.

6) O filme Doktor Faustus de Franz Seitz, conquistou o Prêmio de Prata (Silver Prize) do XIII Festival Internacional de cinema de Moscou em 1983.

7) O filme Mesphisto de István Szabó conquistou o Oscar dos EUA de melhor filme estrangeiro (Hungria) em 1982.

8) O filme Faust de Alexander Sokurov, conquistou o Prêmio Leão de Ouro do 68.ª Festival de Veneza em 2011.




CAPOEIRA



Raízes africanas 
A história da capoeira começa no século XVI, na época em que o Brasil era colônia de Portugal. A mão-de-obra escrava africana foi muito utilizada no Brasil, principalmente nos engenhos (fazendas produtoras de açúcar) do nordeste brasileiro. Muitos destes escravos vinham da região de Angola, também colônia portuguesa. Os angolanos, na África, faziam muitas danças ao som de músicas. 
No Brasil 
Ao chegarem ao Brasil, os africanos perceberam a necessidade de desenvolver formas de proteção contra a violência e repressão dos colonizadores brasileiros. Eram constantemente alvos de práticas violentas e castigos dos senhores de engenho. Quando fugiam das fazendas, eram perseguidos pelos capitães-do-mato, que tinham uma maneira de captura muito violenta.

Os senhores de engenho proibiam os escravos de praticar qualquer tipo de luta. Logo, os escravos utilizaram o ritmo e os movimentos de suas danças africanas, adaptando a um tipo de luta. Surgia assim a capoeira, uma arte marcial disfarçada de dança. Foi um instrumento importante da resistência cultural e física dos escravos brasileiros.

A prática da capoeira ocorria em terreiros próximos às senzalas (galpões que serviam de dormitório para os escravos) e tinha como funções principais à manutenção da cultura, o alívio do estresse do trabalho e a manutenção da saúde física. Muitas vezes, as lutas ocorriam em campos com pequenos arbustos, chamados na época de capoeira ou capoeirão. Do nome deste lugar surgiu o nome desta luta.

Até o ano de 1930, a prática da capoeira ficou proibida no Brasil, pois era vista como uma prática violenta e subversiva. A polícia recebia orientações para prender os capoeiristas que praticavam esta luta. Em 1930, um importante capoeirista brasileiro, mestre Bimba, apresentou a luta para o então presidente Getúlio Vargas. O presidente gostou tanto desta arte que a transformou em esporte nacional brasileiro.

Três estilos da capoeira 

A capoeira possui três estilos que se diferenciam nos movimentos e no ritmo musical de acompanhamento. O estilo mais antigo, criado na época da escravidão, é a capoeira angola. As principais características deste estilo são: ritmo musical lento, golpes jogados mais baixos (próximos ao solo) e muita malícia. O estilo regional caracteriza-se pela mistura da malícia da capoeira angola com o jogo rápido de movimentos, ao som do berimbau. Os golpes são rápidos e secos, sendo que as acrobacias não são utilizadas. Já o terceiro tipo de capoeira é o contemporâneo, que une um pouco dos dois primeiros estilos. Este último estilo de capoeira é o mais praticado na atualidade.

'Sensacionalíssimo'


CACO PONTES

Poeta lança o livro 'Sensacionalíssimo', inspirado em manchetes de tabloides
18.07.2013 | Texto: Caroline Mendes
Foto: Divulgação
Capa do livro
Grandes doses de humor ácido e críticas à sociedade e ao jornalismo são as bases do novo trabalho deCaco Pontes, o livro Sensacionalíssimo. Aos 31 anos, o poeta aposta em micronarrativas comuns do cotidiano urbano que acabam nos noticiários e na boca do povo – uma morte por atropelamento que atrapalha o trânsito, personagens da cidade como vigaristas, prostitutas e mendigos – para criar versos que fazem refletir sobre a sociedade contemporânea.
Trip bateu um papo com o poeta e, além de respostas, vieram versos.
Trip: Qual a sua história com a poesia?
Caco: Vejo a poesia como um estado de espírito, manifestação que atravessa e orienta todas as correntes artísticas, par'além da literatura, então, nesse sentido, desde garoto me vi iniciando tal busca, bem provável que tenha sido a partir dos oito anos de idade, primeiramente através da expressão cênica, teatral e, desde sempre interessado por cinema, música, quadrinhos, mas conscientemente me percebi construindo versos, fazendo poemas, por volta dos dezoito, numa fase de pouca perspectiva de vida, especialmente para se dedicar a uma carreira artística - que sempre foi o principal objetivo - e eis que me veio essa vertente como forma de expurgar, superar, encarar as adversidades, num processo solitário e intenso, passando mais tarde a se tornar meu trabalho, dando vazão de forma coletiva.
vivendo a poesia/ como se fosse ofício/ fazendo da notícia, verso/ tentando matar o tempo/ e ele, vice-versa
Que mensagem você queria passar quando produzia Sensacionalíssimo?
O processo começou em 2009, eu havia publicado meu livro anterior em 2008 (O incrível acordo entre o silêncio & o alter ego) e, geralmente, a tendência é partir pro próximo livro a fim de libertar tudo que se carregou até a edição anterior. Daí, fui convidado a participar de uma coleção de livretos artesanais xerocados, intitulada Peri go, que propunha a produção de "literatura descartável", projeto idealizado pelos poetas Giovani Baffô, Heyk Pimenta e Bruno Cordeiro. Me ocorreu criar algo que fosse rápido, impactante, popular e que chegasse a qualquer público, independente da classe social e, numa tacada só, brotaram uns onze poemanchetes sensacionalistas, pra dialogar diretamente co povão e até mesmo co'os intelectos, dando continuidade a minha busca em aliar experimentalismo ao entendimento comum. Sou muito grato às críticas construtivas, mas fico satisfeito com o resultado, ver o alcance que está tendo e percebo que posso me arriscar e não ficar preso às tendências do metier, prestar contas e ter de ser sempre o melhor, corresponder à expectativa de promessa da poesia contemporânea... Prezo pela liberdade, como diz o poeta Zizo no filme A Febre do Rato, do Cláudio Assis:
a poesia racha/ a poesia cresce/ a poesia borra/ a poesia suja... o direito de errar!
São versos que, a meu ver, parecem cutucar o leitor, "jogar umas verdades na cara"... 
A poesia, em sua essência, tem por natureza o espírito provocador, anárquico, selvagem, porém trans-lúcido. De certa forma carrega uma maldição, que no decorrer da sua trajetória, o receptor (poeta), precisa entender e alquimizar para manter certo equilíbrio, pois, a tendência é a insanidade, que acaba refletindo esse aspecto do tapa na cara, na própria inclusive, daí pra lançar ao alheio é um passo, apenas. E, felizmente, ainda é um caminho de aceitação da auto-crítica e deboche por parte do espectador, como no humor, que ganha pelo riso, entretenimento, mas no caso da poesia ainda há uma romantização do segmento - apesar da marginalização inerente à mesma - se alimenta um certo mito em torno do mensageiro, que enquanto entidade mundana abre os portais de comunicação com o plano superior, possui a chave, mas não perde a chance de zombar, subverter, rebelar, o poeta incomoda agradando, agrada incomodando, parece existir aí uma relação bem forte com as polaridades, seja bi, tri ou trans.
Além de dar uma cara de cotidiano, a brincadeira com as manchetes de jornal funciona como uma crítica ao jornalismo, também?Certamente. Acho bem curioso o fato de existirem excelentes jornalistas, que marcaram época, atuando num momento em que não existia faculdade de jornalismo e que após o surgimento de tal formação superior, aliado à necessidade de rapidez e pouco aprofundamento nos conteúdos a serem informados, reflete um emburrecimento no setor, além de manipulação e falta de ética no tratamento com as notícias, por parte dos grandes veículos. Optei por fazer referência ao que já nasce assumidamente absurdo e exagerado, como fez o tablóide Notícias Populares, sem falar na genialidade d'O Pasquim, ou mesmo o Jornalismo Gonzo, de Hunter Thompson. Foi um privilégio ter o apoio de figuras como Glauco Mattoso, Hugo Possolo, Kiko Dinucci, Ademir Assunção e Georgette Fadel, além da orelha do Xico Sá e prefácio do Marcelino Freire, todos devidamente antenados com a proposta lançada na roda, desconstruindo a abordagem para a qual foram requisitados.
Você fez as colagens de jornal à mão? Se sim, usou manchetes de verdade, inventou algumas, como foi?
Sim, rolou uma imersão nos recortes, que apesar da tentativa de ser aleatório, ficou difícil escapar às notícias que poderiam ser reconstituídas, criando novos sentidos, ou a total falta deles, gerando o antagonismo e a oposição. Nesse processo foi sendo criada uma interatividade, hipertexto, chegando num misto orgânico entre o clássico e o contemporâneo. O diagramador do livro, Victor Meira, foi bem parceiro na composição, captou perfeitamente minhas sugestões, fez ótimas proposições, montagens, bem como o ilustrador Romulo Alexis, ambos artistas visuais de mão cheia, e, então chegamos num trabalho de equipe bem entrosado, satisfatório, é um dos livros mais bonitos em termos de projeto gráfico na atualidade. Não sou eu quem fala, é o povo que diz [risos].
Você que pensou e fez a arte do livro?
Toda a concepção editorial foi minha, do formato ao papel. Aprendi a ser editor na guerrilha, com a Poesia Maloqueirista, após anos produzindo meus livretos, a Revista Não Funciona, além de meu livro anterior. A coisa vai amadurecendo com o tempo, ganhando mais autonomia... Achei que seria bacana se aproximar do formato de tabloides. Cada sessão tem um espírito, divididas como nos cadernos de jornal, então optei por criar uma grafia pra cada qual, por exemplo na Páginas Policiáveis, adotei letras recortadas de revistas, como aquelas cartas de sequestrador; em (Des)Classificados, bati à maquina de escrever; e em Perifericults & Analogicools, uma tentativa tosca de letras de pixação... Até pensei em chamar algum "pixador profissional", mas acabei fazendo eu mesmo, claro que alguns camaradas que são mais peritos acharam uma merda, mas tá valendo, é bacana poder desagradar até mesmo os que desagradam...
Cada página do livro traz uma mini narrativa, um pequeno mote que poderia se transformar até em crônica... Seus versos têm um pouco cara de crônica. Você tinha essa intenção?
Eu venho da escola da oralidade, comecei no teatro, levei essa característica pro trabalho na poesia, performance, onde pude fazer a fusão, descobrir a intervenção urbana e tals... Já arrisquei escrever em outros formatos, dramaturgia por exemplo, mas ainda sinto mais confiança no verso, então quando arrisco experienciar outros formatos sempre é uma derivação do poema, neste caso, acabei misturando com a micronarrativa, que chega a flertar diretamente com a crônica. E como o formato dos textos são manchetes, ficou inevitável entrar nesse lugar. Há um tempo cheguei a ler o Stanislau Ponte Preta com as Crônicas da Tia Zulmira, que explora algo bem similar... E este trabalho que desenvolvi me remete também um pouco ao poema-piada, que foi bastante difundido pelos poetas marginais, como os da Geração Mimeógrafo; de alguma forma devem ficar resquícios no inconsciente coletivo, universalmente a história da literatura se confunde com mitos recriados, eu não busquei em nenhuma fonte específica a influência, na real até prefiro me distanciar pra não reproduzir meramente, sem ao menos tentar reinventar, mas considerando que a formação do autor se dá por leituras e absorção de conteúdos variados, muita coisa fica no limiar do pensamento criativo.
Sensacionalíssimo tem humor ácido do começo ao fim. Qual você acha que é o papel do humor na arte e na discussão da realidade?
O humor é como o amor, algo universal, tem abordagem em muitos aspectos e pontos de vista, social, cultural, espiritual. Penso que existem muitas possibilidades por esta via, inclusive a banalização, um tanto de superficialidade, dividindo opiniões, criando patrulhas ideológicas e contraposições entre o que seria ético ou reduzido ao politicamente correto. Tenho aprendido que o mais importante é não se levar tão a sério assim. Parece um caminho ligado a uma espécie de sabedoria. E por aí, vou tentando ir. Não sou humorista, mas tenho senso de humor, ora falta dele, sou humano, afinal.
Róliudi
humoristas
geralmente são mal humorados
para ser um bom ator de cinema
basta fazer cara de Colin Farrel
no Miami Vice
e há quem diga que o seu cachê já está milionário
melhor do que se tornar apresentador de TV
estigmatizado
a legitimidade se deve ao ato
para o alto e avante
parei na contramão
como o Roberto Carlos
mas não sou rei, apenas don
e atualmente tento
um aumento de salário.
Vai lá: Sensacionalíssimo
Autor: Caco Pontes
70 páginas
Preço: R$ 25
Editora: Kazuá
www.cacopontes.net
www.editorakazua.com.br