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terça-feira, 7 de maio de 2013

O Silêncio

em Três Poemas (por Drummond)

Folheando o “Discurso de Primavera e Algumas Sombras“, um livro indevidamente pouco recordado no conjunto geral da extraordinária poesia do meu querido Drummond, me deparei “casualmente” com o que chamei pessoalmente de uma Trilogia do Silêncio. Um conjunto de três belos poemas sobre a dialética entre silêncio e palavra com os títulos de: “A Palavra Mágica”; “O Constante Diálogo” e “SOM”. Drummond não era psicanalista e na sua arte não encontraremos o rigor da teoria, mas sua poesia fabulosamente se debruça sobre o mesmo fenômeno do incompleto da existência e das armadilhas da palavra. Cuidadoso que era, sabia que poesia é palavra lapidada sendo antes de mais nada ritmo e forma. Poesia não nasce pronta num instante de comunicação cósmica. A palavra deve ser lapidada, catada, escolhida, escrutinada. O silêncio somente deve ceder de sua condição de possibilidade ante o minuto de ouro da poesia que dorme na sombra e somente encontra o motivo de despertar diante de algo que vibra na vida do poeta.
“A PALAVRA MÁGICA
——————————————– 

Certa palavra dorme na sombra
de um livro raro.
Como desencantá-la?
É a senha da vida
a senha do mundo.
Vou procurá-la.
Vou procurá-la a vida inteira
no mundo todo.
Se tarda o encontro, se não a encontro,
procuro sempre.
Procuro sempre, e minha procura
ficará sendo
minha palavra
O CONSTANTE DIÁLOGO
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Há tantos diálogos
Diálogo com o ser amado
o semelhante
o diferente
o indiferente
o oposto
o adversário
o surdo-mudo
o possesso
o irracional
o vegetal
o mineral
o inominado
Diálogo consigo mesmo
com a noite
os astros
os mortos
as idéias
o sonho
o passado
o mais que futuro
Escolhe teu diálogo
e
tua melhor palavra
ou
teu melhor silêncio
Mesmo no silêncio e com o silêncio
dialogamos.
SOM
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Nem soneto nem sonata
vou curtir um som
dissonante dos sonidos
som
ressonante de sibildos
som
sonotinto de sonalhas
nem sonoro nem sonouro
vou curtir um som
mui sonso, mui insolúvel
som não sonoterápico
bem insondável, som
de raspante derrapante
rouco reco ronco rato
som superenrolado
com se sona hoje-em-noite
vou curtir, vou curtir um som
ausente de qualquer música
e rico de curtição.”

Silêncio e Palavra

Thiago de Mello

Thiago de Mello

I
A couraça das palavras
protege o nosso silêncio
e esconde aquilo que somos

Que importa falarmos tanto?
Apenas repetiremos.

Ademais, nem são palavras.
Sons vazios de mensagem,
são como a fria mortalha
do cotidiano morto.
Como pássaros cansados,
que não encontraram pouso
certamente tombarão.

Muitos verões se sucedem:
o tempo madura os frutos,
branqueia nossos cabelos.
Mas o homem noturno espera
a aurora da nossa boca.
II
Se mãos estranhas romperem
a veste que nos esconde,
acharão uma verdade
em forma não revelável.
(E os homens têm olhos sujos,
não podem ver através.)

Mas um dia chegará
em que a oferenda dos deuses,
dada em forma de silêncio,
em palavra transfaremos.

E se porventura a dermos
ao mundo, tal como a flor
que se oferta - humilde e pura - ,
teremos então cumprido
a missão que é dada ao poeta.
E como são onda e mar,
seremos palavra e homem.

Fonte: www.fisica.ufpb.br

Tai o que eu queria dizer...

Um Girassol da Cor de Seu Cabelo: Saudades da Esquina e do Clube


NelsonAngelo_e_Joyce-image016
A capa do álbum Nel­son Angelo & Joyce, 1972
Nos anos 70, já havia o Chico Buar­que de “Mulhe­res de Ate­nas”, o Cae­tano Veloso de “Sampa”, o Edu Lobo de “Arras­tão” na indo­má­vel voz de Elis. E isso era bom. Mas nós, na peri­fe­ria da peri­fe­ria do mundo neces­si­tá­va­mos de algo mais. Algo mais cos­mó­po­lis, que nos  sin­te­ti­zasse e sin­to­ni­zasse com o mundo ou ligasse defi­ni­ti­va­mente ao rock sem dei­xar de ser orgu­lho­sa­mente peri­fé­ri­cos – até mesmo den­tro de nosso país. Fal­tava a esses todos uma carga pop, bem sabía­mos. Uma liga­ção com o mundo de uma forma ainda mais espon­tâ­nea e com­plexa que nos eflú­vios dema­si­ado van­guar­dis­tas da Tro­pi­cá­lia ou de Os Mutan­tes. Ou que nas bem lapi­da­das rimas toan­tes de Chico, decal­ca­das de João Cabral de Mello Neto. Nós já éramos, de há muito, o cen­tro de nosso mundo. Mas ainda não sabíamos.
Esse fenô­meno, radi­cal­mente musi­cal, rico na inven­ção harmô­nica, ante­nado ao que ocor­ria lá fora, porém sem per­der a bossa de ser­tões pro­fun­dos, sem pre­dar a ore­lha ser­ta­neja e sem dei­xar de des­cer o Rio São Fran­cisco até desviar-se a Ponta de Areia, no Recôn­cavo Bai­ano, deu-se atra­vés de Mil­ton Nas­ci­mento e seus cola­bo­ra­do­res: Lô Bor­ges, Beto Gue­des, Tavi­nho Moura, Toni­nho Horta, Nel­son Angelo, Joyce, Alaíde Costa, Wag­ner Tiso, Flá­vio Ven­tu­rini, Fer­nando Brant, Ronaldo Bas­tos, O Som Ima­gi­ná­rio, et alli. Era como se o bar­roco das igre­jas de Minas de repente fun­disse com o som dos Bea­tles para pro­du­zir um ter­ceiro que era ainda mais ambi­ci­oso até mesmo que o som do quar­teto de Liver­pool depois do Pep­pers. Chico e Cae­tano eram poe­tas valendo-se de can­ções. Edu Lobo, um com­po­si­tor sofis­ti­cado, embora exces­si­va­mente cau­te­loso. Mil­ton era a can­ção em estado bruto. 
A onda ficou conhe­cido como Clube da Esquina. Um rótulo gené­rico, super­fi­cial, mas sufi­ci­ente. O lema era um pouco o que segue na letra de Fer­nando Brant em “Para Len­non e McCart­ney”, que, aliás presta conta de um misto de fas­ci­na­ção, des­con­solo, emu­la­ção, supe­ra­ção: “Por que vocês não sabem do lixo Ocidental/ Não pre­ci­sam mais temer/ Não pre­ci­sam da solidão/ Todo dia é dia de viver// Por que vocês não verão meu lado Ocidental/ Não pre­cisa medo, não/ Não pre­cisa da timidez/ Todo dia é dia de viver// Eu sou da Amé­rica do Sul/ Eu sei, vocês não vão saber/ Mas agora sou cowboy/ Sou do ouro, eu sou vocês/ Sou o mundo, sou Minas Gerais”. É ao mesmo tempo senso de sentir-se des­pre­zado ou igno­rado, e supe­rar esse estado, esse opró­brio, por inven­ti­vi­dade. Ser radi­cal­mente do mundo care­cia de ter um pé no quin­tal, na pro­vín­cia. Assu­mir ser o lixo, e, nesse movi­mento, por amal­ga­mar aspesc­tos “arcai­cos”, “taca­nhos” e infor­ma­ções moder­nís­si­mas, converter-se no luxo do Oci­dente. Ser o rema­tado luxo da aldeia musi­cal do globo. E esse luxo tam­bém somos, doa em quem doer. (Ante­on­tem, aliás, Paul McCart­ney fez show em Belo Hori­zonte (antigo Cur­ral d’El Rey) e disse em por­tu­guês: “eu vim dizer: uai!”).
Enquanto isso há três álbuns abso­lu­ta­mente vene­ra­dos: o Clube da Esquina; o cha­mado disco do Tênis (de Lô Bor­ges); e o Nel­son Angelo & Joyce. Todos do emble­má­tico ano de 1972. Estra­nha coin­ci­dên­cia. Atra­vés des­ses álbuns – e do ras­ti­lho deles em outros menos memo­rá­veis ou mais epi­só­di­cos, depois mas sobre­tudo antes – nós sabía­mos que não só tínha­mos che­gado ao pata­mar da con­tra­cul­tura inter­na­ci­o­nal, mas a supe­rado com a tran­qui­li­dade e a efi­cá­cia artís­tica e musi­cal daque­les caras. (Lem­bro que em 72, eu tinha ape­nas 9 anos, e ia des­co­brir esse uni­verso, fas­ci­nado, um tanto mais adiante).
Mas então, nós saía­mos do Nor­deste sequi­o­sos por Minas. Minas era nosso suple­mento. Saía­mos lou­cos pelas mon­ta­nhas, velhos ritos, as fer­ro­vias, a mís­tica do Grande Ser­tão, as igre­jas, coros e cida­des colo­ni­ais de Minas – que, de outra forma tam­bém as tínha­mos no Nor­deste (em São Luís, Olinda, Recife, Sal­va­dor, Penedo, São Cris­tó­vão) – onde esses eflú­vios musi­cais tinham medrado. Mas faltava-nos Alei­ja­di­nho, e o sen­tido com­pó­sito, com­plexo de pas­sado e futuro jun­gi­dos, da forma como os minei­ros haviam repro­ces­sado no seu som. Ou uma certa dimen­são cívica, pre­sente em can­ções como “Cora­ção Civil” — que pare­ciam defron­tar a dita­dura mas sem per­der um grama de lirismo. E nem por som­bra seguía­mos ape­nas sedu­zi­dos por um sen­ti­mento orto­do­xa­mente cató­lico – e é claro que havia algo de cató­lico tam­bém naquilo – mas mais era: era uni­ver­sal, no mais lato senso — e não no da Igreja Uni­ver­sal do Reino de Deus. Ou seja, era reas­su­mir a radi­ca­li­dade uni­ver­sal do termo. Era, no mínimo, astu­ci­oso que esse apa­rente des­prezo, o da con­di­ção de “peri­fé­ri­cos”, fosse (re-)convertido em pai­xão e fé.
E até hoje, nos rimos do facto: o que dá certo por aqui – ainda quando ori­gi­na­lís­simo – é lou­vado como con­ti­nu­a­ção de Europa (e, quiet often, não neces­sa­ri­a­mente de Por­tu­gal, mas sobre­tudo de Itá­lia, de Ale­ma­nha, de França, até de Ingla­terra). O que dá errado, bem, o que dá errado é nosso mesmo e pecu­liar (e, fre­quen­te­mente, pro­vem tam­bém de Por­tu­gal). Oremos.
Sem remis­são. 
Isso de san­ção vinda de fora, de repente, dei­xou de nos obce­car. Por­que a música nos imu­ni­zou con­tra essas falá­cias e ara­pu­cas. Nos auto­no­mi­zou. Nos abriu para o mundo sem esque­cer o pas­sado. E, claro, esses minei­ros nos apre­sen­ta­ram pon­tu­al­mente a uma pers­pec­tiva musi­cal mais com­plexa e moderna que a dos Bea­tles. Como se fosse uma melhor rea­tu­a­li­za­ção de 22 e das pers­pi­ca­zes lições dos Andrade: Mário e Oswald. Essa (in-)sanção. Insa­ni­dade, se obses­siva. E, logo, ( por que não?) de novo o “tupi or not tupi” na crista da onda. Ou o Macu­naíma. Ou a Antro­po­fa­gia de Oswald. A devo­ra­ção cani­bal e incor­po­ra­ção da subs­tân­cia por eli­mi­na­ção da borra. E, então, quase qual­quer forma de san­ção vinda de fora, com alguma pre­ten­são de hie­rar­quia, já nos pare­cia um pouco tola. Embora com Mil­ton e o Clube da Esquina tenha­mos che­gado a uma modesta sín­tese e rea­tu­a­li­za­ção disso tudo. Ou seja, a uma solu­ção muito pecu­liar de psi­co­de­lia, con­tra­cul­tura e novas infor­ma­ções musi­cais àquela altura da pan­to­mima. E, como não podia dei­xar de ser, fun­dida a impul­sos polir­rít­mi­cos e meló­di­cos tra­di­ci­o­nais, arcai­cos, afri­ca­nos, índi­ge­nas, ibé­ri­cos: atu­a­lís­si­mos. Às simul­ta­nei­da­des e com­po­si­ti­vi­da­des que tanto nos atraem e nos for­mam. Assim, quando Mes­tre Antô­nio Car­los Jobim gra­vou Lô Bor­ges (“O Trem Azul”), em seu último álbum, no meado dos 90, bem sabia o quanto a home­na­gem prestava-se às estra­nhas inven­ções harmô­ni­cas do home­na­ge­ado ou da turma de Minas.
O resul­tado, antes disso, é que, já em plena década de 80, íamos a Ouro Preto, Mari­ana, Tira­den­tes, São João D’El Rey, Con­go­nhas, Sabará, Dia­man­tina como quem vai a Roma ou San­ti­ago de Com­pos­tela, Can­ter­bury ou Lour­des, ainda por conta dessa onda dos 70. Pedir a ben­ção e a conta dessa musi­ca­li­dade faceira e novi­da­dosa, que fun­dia gui­tar­ras elé­tri­cas a berim­baus, tam­bo­res cri­ou­los, coros de ciran­das, rabe­cas, caxi­xis e vio­las cai­pi­ras. Havia inu­si­ta­das orques­tra­ções. Havia senhas que não pre­ci­sá­va­mos glo­sar. Que enten­día­mos de ime­di­ato, tra­zía­mos de cor, como se tatu­a­das no espí­rito. Havia o giras­sol da cor dos cabe­los dela. A voz encan­ta­tó­ria de Mil­ton, (que depois tornar-se-á exces­siva, pre­ci­o­sista, dema­si­ado melí­flua, afe­tada, meio “étnica” ou rococó, após os radi­cais anos 70. E nos des­gos­tará defi­ni­ti­va­mente). Havia o senso de pau e corda (coi­sas acús­ti­cas + uma densa per­cus­são) des­ses três dis­cos fun­da­men­tais. Tudo isso meio que se per­deu na poeira de estre­las. E quase nin­guém se lem­bra mais daquele você que pare­cia comigo e não se acom­pa­nhava de um senhor. Mas antes disso, o cora­ção bateu sem medo,  e  buscou-se um cami­nho, feito  nuvem cigana, “pelas ruas capis­tra­nas de toda cor”:

I. Um Giras­sol da Cor de Seu Cabelo (com Lô Borges):

Este hino­zi­nho gera­ci­o­nal e intrans­fe­rí­vel em tom menor. Nenhuma como esta para der­re­ter o cora­ção das garo­tas àque­les tempos.

II. Cais (Com Mil­ton e Car­mi­nho, numa ver­são pos­te­rior, ten­dendo ligei­ra­mente ao fado)*
*Este ano, no ani­ver­sá­rio da cidade de For­ta­leza, 13 de Abril pas­sado, um dueto impro­vá­vel nos brin­dou com o show de encer­ra­mento da festa. Des­ta­que para “Cais”, can­ção ori­gi­nal­mente regis­trada no mesmo álbum do “Giras­sol…” acima, o opu­lento Clube da Esquina. Na ver­são abaixo, qua­tro déca­das depois, é ado­rá­vel a parte de Car­mi­nho e a dife­rença dos acen­tos. E é claro que Mil­ton, aos 70, não é mais o mesmo nosso Mil­ton dos anos 70, mas guarda vestígio):


III. Tudo Começa de Novo (com Nel­son Angelo e Joyce):

O fecho de um disco vene­rado pelos “ini­ci­a­dos” no Clube.

IV. Pai­xão e Fé (com Mil­ton Nas­ci­mento e os Cana­ri­nhos de Petrópolis)

De repente, Bach e os vio­lei­ros de Minas reu­ni­dos na mesma praça.

V. Cru­zada (com Beto Guedes):

Sinal de espe­rança e fra­ter­ni­dade na tra­ves­sia de deser­tos, des­ma­ze­los polí­ti­cos e ditadura.


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Mesmo que mude - Bidê ou Balde -


 
É sempre amor, mesmo que mude
É sempre amor, mesmo que acabe

QUERO DANÇAR

      
Há quanto tempo não danço? Não lembro. Mas sinto até agora aquele abraço ondulante... fazendo marola!
Aprendi com meu irmão, na sala, no corredor e nas festinhas regadas a cuba libre na casa dos amigos (você que tem menos de 30, 40, pode parar de ler).
Meus pais não gostavam que eu fosse mas eu tinha UM irmão! E as minhas duas amigas vizinhas também tinham IRMÃOS. Então... sempre um par de olhos masculinos era responsável por nós.
Mas o bom mesmo era durante a paquera ou já no namoro mesmo.
Quando ele soltava a mão esquerda pra colocar os dois braços na cintura da gente... era quase um pedido de casamento! E a circunferência dos braços ía diminuindo de acordo com o interesse até os braços se cruzarem nas nossas costas. Sim, porque essa  decisão era dele... nós éramos mulherzinhas e não tomávamos iniciativa alguma... Mas era também o momento de descartar o moço pra sempre - caso vc não estivesse a fim. E essa decisão era nossa... totalmente mocinhas - se é que me entendes.
Era namoro. O corpo todo colado. Rosto. Coxa. Peito. Sentir o coração ressoar com a batida da música. A mão suar. Os olhares, a sincronia de passos, o movimento exato... tudo tão natural e absurdamente sensual.
A gente cresceu um pouquinho e ainda pegou o tempo do "vamos pra outro lugar" dito sussurrado no meio da pista, e também pegou o tempo de dançar junto, e muito, com os amigos.
Quem aqui dançou com Carlinhos Sampaio levanta a mão!
Aliás, tinha uns baianos muito bons nesse negócio de dois pra lá dois prá cá - e olha que não peguei os tempos áureos da Clouse Up...mas dancei bastante. E dançava bem. Era boa de samba quadradinho - onde meu irmão dá show até hoje - o que na maioria das vezes surpreendia os menos avisados.

Bom mesmo seria hoje, no restaurante, antes mesmo da sobremesa, ouvir um "quer dançar?".
E de pé, na hora em que o braço puxasse para o primeiro passo, poder se ajeitar dentro daquele abraço e  me deixar levar.