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sexta-feira, 10 de agosto de 2012

"Em verdade sou um obá" Jorge Amado e outras palavras...


Jorge Amado e o seu Brasil mestiço, alegre, festeiro e sensual

“A amizade é o sal da vida, se você tem amigos, tem tudo."



100 ANOS JORGE AMADO 1912-2012.


“Não possuímos direito maior e mais inalienável do que o direito ao sonho. O único que nenhum ditador pode reduzir ou exterminar.”
"Fiz da minha vida e da minha obra uma coisa única,
unidade do homem e do escritor."

Jorge Amado, Zélia Gattai e os filhos.
“A vida me deu mais do que pedi e mereci. Não me falta nada. Tenho Zélia e isso me basta."
- Jorge Amado, aos 84 anos, em entrevista ao jornal "O Estado de São Paulo", 18/08/1996.



Jorge Amado
Nem a rosa, nem o cravo...
As frases perdem seu sentido, as palavras perdem sua significação costumeira, como dizer das árvores e das flores, dos teus olhos e do mar, das canoas e do cais, das borboletas nas árvores, quando as crianças são assassinadas friamente pelos nazistas? Como falar da gratuita beleza dos campos e das cidades, quando as bestas soltas no mundo ainda destroem os campos e as cidades?

Jorge Amado
Já viste um loiro trigal balançando ao vento? É das coisas mais belas do mundo, mas os hitleristas e seus cães danados destruíram os trigais e os povos morrem de fome. Como falar, então, da beleza, dessa beleza simples e pura da farinha e do pão, da água da fonte, do céu azul, do teu rosto na tarde? Não posso falar dessas coisas de todos os dias, dessas alegrias de todos os instantes. Porque elas estão perigando, todas elas, os trigais e o pão, a farinha e a água, o céu, o mar e teu rosto. Contra tudo que é a beleza cotidiana do homem, o nazifascismo se levantou, monstro medieval de torpe visão, de ávido apetite assassino. Outros que falem, se quiserem, das árvores nas tardes agrestes, das rosas em coloridos variados, das flores simples e dos versos mais belos e mais tristes. Outros que falem as grandes palavras de amor para a bem-amada, outros que digam dos crepúsculos e das noites de estrelas. Não tenho palavras, não tenho frases, vejo as árvores, os pássaros e a tarde, vejo teus olhos, vejo o crepúsculo bordando a cidade. Mas sobre todos esses quadros bóiam cadáveres de crianças que os nazis mataram, ao canto dos pássaros se mesclam os gritos dos velhos torturados nos campos de concentração, nos crepúsculos se fundem madrugadas de reféns fuzilados. E, quando a paisagem lembra o campo, o que eu vejo são os trigais destruídos ao passo das bestas hitleristas, os trigais que alimentavam antes as populações livres. Sobre toda a beleza paira a sombra da escravidão. É como u'a nuvem inesperada num céu azul e límpido. Como então encontrar palavras inocentes, doces palavras cariciosas, versos suaves e tristes? Perdi o sentido destas palavras, destas frases, elas me soam como uma traição neste momento.

Mas sei todas as palavras de ódio, do ódio mais profundo e mais mortal. Eles matam crianças e essa é a sua maneira de brincar o mais inocente dos brinquedos. Eles desonram a beleza das mulheres nos leitos imundos e essa é a sua maneira mais romântica de amar. Eles torturam os homens nos campos de concentração e essa é a sua maneira mais simples de construir o mundo. Eles invadiram as pátrias, escravizaram os povos, e esse é o ideal que levam no coração de lama. Como então ficar de olhos fechados para tudo isto e falar, com as palavras de sempre, com as frases de ontem, sobre a paisagem e os pássaros, a tarde e os teus olhos? É impossível porque os monstros estão sobre o mundo soltos e vorazes, a boca escorrendo sangue, os olhos amarelos, na ambição de escravizar. Os monstros pardos, os monstros negros e os monstros verdes.

Jorge Amado
Mas eu sei todas as palavras de ódio e essas, sim, têm um significado neste momento. Houve um dia em que eu falei do amor e encontrei para ele os mais doces vocábulos, as frases mais trabalhadas. Hoje só ódio pode fazer com que o amor perdure sobre o mundo. Só ódio ao fascismo, mas um ódio mortal, um ódio sem perdão, um ódio que venha do coração e que nos tome todo, que se faça dono de todas as nossas palavras, que nos impeça de ver qualquer espetáculo - desde o crepúsculo aos olhos da amada - sem que junto a ele vejamos o perigo que os cerca.

Jamais as tardes seriam doces e jamais as madrugadas seriam de esperança. Jamais os livros diriam coisas belas, nunca mais seria escrito um verso de amor. Sobre toda a beleza do mundo, sobre a farinha e o pão, sobre a pura água da fonte e sobre o mar, sobre teus olhos também, se debruçaria a desonra que é o nazifascismo, se eles tivessem conseguido dominar o mundo. Não restaria nenhuma parcela de beleza, a mais mínima. Amanhã saberei de novo palavras doces e frases cariciosas. Hoje só sei palavras de ódio, palavras de morte. Não encontrarás um cravo ou uma rosa, uma flor na minha literatura. Mas encontrarás um punhal ou um fuzil, encontrarás uma arma contra os inimigos da beleza, contra aqueles que amam as trevas e a desgraça, a lama e os esgotos, contra esses restos de podridão que sonharam esmagar a poesia, o amor e a liberdade!
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- Texto originalmente publicado no jornal "Folha da Manhã", edição de 22/04/1945, e consta do livro "Figuras do Brasil: 80 autores em 80 anos de Folha", PubliFolha - São Paulo, 2001, pág. 79, organização de Arthur Nestrovski.

“E, se não fôssemos nós, pontais ao crepúsculo, vagarosos caminhantes dos prados do luar, como iria a noite – suas estrelas acendidas, suas esgarçadas nuvens, seu manto de negrume – como iria ela, perdida e solitária, acertar os caminhos tortuosos dessa cidade de becos e ladeiras? Em cada ladeira um ebó, em cada esquina um mistério, em cada coração noturno grito de súplica, uma pena de amor, gosto de fome nas bocas de silêncio, e Exu solto na perigosa hora das encruzilhadas.”
- Jorge Amado, em "Pastores da Noite".


Jorge Amado, por Wal Alves.
"Devemos a Jorge Amado a abertura da consciência literária no Brasil. Ele foi um pioneiro cheio de esplendor e obstinação. é um homem indissociavelmente ligado não somente à história da literatura, mas também à cultura brasileira. Foi escolhido pelas fadas, ou por quem quer que seja. Jorge Amado atravessou toda a literatura brasileira, praticamente desde a Semana de Arte Moderna, e atravessou-a com uma obsessão que, pode-se dizer, chega a ser sublime, o sentimento de uma missão . De forma incrível. Ele ajudou a conduzir o Brasil dentro da modernidade."
- João Ubaldo Ribeiro, In: RAILLARD. Alice. Conversando com Jorge Amado. Rio de Janeiro: Record, 1990.

João Amado de Faria (Fazendeiro de cacau) e D. Eulália Leal e seus filhos.[família de Jorge Amado]
"(...) Em verdade sou um obá - em língua ioruba da Bahia obá significa ministro, velho, sábio: sábio da sabedoria do povo."

"Não se vive inutilmente uma infância entre os Capitães da Areia."

Sonia Braga e Jorge Amado.
“É um paradoxo, mas ele conseguiu transformar o regional em universal.”
- Bruno Barreto, cineasta.

"Jorge Amado [(1912-2001), escritor baiano que celebrizou, no país e no mundo, personagens típicas da Bahia], quem não gosta de Jorge Amado? A verve do Jorge Amado, a criatividade, vai ficar. Nós já temos um acervo de literatura que nos retrata e que é o espelho em que o Brasil se olha. Nós aprendemos a nos olhar assim. As mulheres brasileiras aprenderam a fazer amor com o preto, foi lendo Jorge Amado, aprenderam que era factível."
- Darcy Ribeiro, no Roda Viva, TV Cultura, em 17 abr. 1995.


"O Escritor, a meu ver, deve estar comprometido com o seu tempo e seu povo."

Pierre Verger, Jorge Amado e Carybé.
“Não nasci para famoso nem para ilustre, não me meço com tais medidas, nunca me senti escritor importante, grande homem: apenas escritor e homem.”
- Jorge Amado, em “Navegação de Cabotagem”.

É Doce Morrer no Mar, de Dorival Caymmi e Jorge Amado.

"Jubiabá me surpreendeu. Eu o li com a mesma delícia com que leio os melhores autores norte-americanos, ingleses, franceses e alemães. Se eu tivesse engenho e arte havia de escrever o a-bê-cê de Jorge Amado, um sujeito magro de olhos de chinês, que nasceu na Bahia, foi rebelde, fugiu de casa, viu a vida e viveu-a com ânsia; um sujeito que ama os humildes e os oprimidos e que, aos 23 anos, é um dos maiores romancistas que o Brasil já tem."
- Érico Verissimo, In. BLOCH, Pedro. Entrevista. Rio de Janeiro: Bloch Editores, 1989.

Rascunho datilografado de um poema de Jorge Amado, ano 1938.
Extraído: Em busca da prosa simples.

“(...) Liberdade de expressão não há mesmo, está cada vez mais rara pelo mundo afora. È cada vez mais difícil. Chega um momento em que você tem que controlar a palavra, isso e aquilo. Realmente as condições pra você escrever estão se tornando muito difíceis e muito duras (...).”
- Jorge Amado, em "Grandes entrevistas do Pasquim". Rio de Janeiro: CODECRI, 1975. 160 p. il. (Coleção Edições do Pasquim, v.2).


“Assim é a Bahia. Esse é o seu clima, ligado ao passado, fitando o futuro.”

Jorge Amado
“Para mim, a descoberta de Amado foi um alumbramento porque eu lia os seus livros e via a minha terra. E quando encontrei Quincas Berro Dágua eu o via na ilha de São Vicente, na minha rua de Passá Sabe.”
- Gabriel Mariano, escritor de Cabo Verde – África.

Jorge Amado
“Para mim, o sexo sempre foi uma festa. Aos 82 anos, a festa é muito diferente do que era aos 20, aos 50, mesmo aos 60: é uma festa que é feita da experiência, do refinamento."
- Jorge Amado, aos 82 anos, Folha de S.Paulo, 1994.
Ilustração de "Suor", por Mário Cravo.
“Ferreiro saído dos infernos, coberto de fogo e aço, comido de goiva e ácido, os bigodes arrogantes, devassos, quase agressivos, os olhos de insônia, a boca em gargalhada, eis o guerreiro Mário Cravo em luta com o ferro bruto, a madeira pesada e ilustre, a pedra morta, para sempre morta mas, de repente, viva em sua mão, em seu talho, em sua forja, em seu destino deslumbrado e louco, em seu criar sem descanso. O ferro já não é mineral bruto, é o orixá mais poderoso, a fonte cristalina, a mão de onde brota a água e se derrama na boca dos sedentos. Da madeira adusta nasce o mistério de Yemanjá, senhora do mar da Bahia, nasce o cangaceiro do bando de Lampião e do latifúndio feudal, nasce Antônio Conselheiro, capitão da guerra dos pobres, boca de praga, braço de acusação. A pedra se transforma em flor, a flor mais suave e delicada, a mais terna flor, à flor da bem-amada. A madeira, a pedra, o ferro, na forja dos infernos, nas mãos do derradeiro Exu da Bahia são a flor, a água, a poesia, a vida mais vivida e mais profunda. Uma força da natureza por um capricho dos deuses desencadeou-se na Bahia: Mário Cravo, o escultor.”
- Jorge Amado.

Octávio Araújo

Jorge Amado
“Acho que o mais terrível foi a degradação do caráter. Em relação a duas coisas. Você teve a tortura. Em segundo lugar, a ditadura institucionalizou a corrupção. Hoje, esse mal faz parte dos costumes.”
- Jorge Amado, em "Jornal da Tarde", 04/01/1992 - Sobre as consequências da ditadura no Brasil.

Aurélio Buarque de Holanda e Jorge Amado.
Viver é quase um milagre, e esse milagre o povo realiza diariamente.”

Adonias Filho, Jorge Amado, Gabriel Garcia Marquez.
"Vivi ardentemente, lutei pela liberdade, contra preconceitos, amei, sofri, me alegrei, me diverti."

Jorge Amado e José Saramago.

"O escritor brasileiro tem que ouvir o Brasil."


Maria Bethânia, Jorge Amado e Zélia Gattai.
"Para criar a vida, é preciso tê-la vivido e ardentemente, com apaixonado coração."
Pablo Neruda, Luiz Carlos Prestes e Jorge Amado.
“Milagre de amor não tem explicação, não necessita.”

Jorge Amado e Dorival Caymmi.
“Eu continuo firmemente pensando em modificar o mundo e acho que a literatura tem uma grande importância.”
- Jorge Amado, em “Jornal da Tarde", 16/01/1988 - (Sobre o engajamento em literatura).

Jean-Paul Sartre, Jorge Amado e Simone de Beauvoir.
"Jorge é um homem muito amigo das pessoas, padece de amor ao gênero humano. Sofreu as conseqüências de uma posição muito clara.”
- Antônio Callado, In: LUCENA, Suênio Campos de. 21 escritores brasileiros: uma viagem entre mitos e motes. São Paulo: Escrituras, 2001.

Scliar e Jorge Amado.
“Um escritor não pode desejar nada de maior e de melhor do que ser lido. Assim ele pode cumprir sua missão..."

Gilberto Freyre, Anísio Teixeira e Jorge Amado.
“O escritor é um aprendiz do seu ofício até que deixe de escrever.”

Glauber Rocha e Jorge Amado.

"A poesia não está nos versos, por vezes ela está no coração. E é tamanha. A ponto de não caber nas palavras."
Casamento de Vinícius de Moraes no Candomblé, em 1972 na Bahia.
(...), Vinicius de Moraes, Zélia Gattai e Jorge Amado.

“A palavra é sempre perseguida por aqueles que desejam impedir que ela seja arma do homem na sua luta por uma vida melhor, de paz, fartura e alegria."
- Jorge Amado, em o "Tempo Magazine", Portugal em 1979.

FUNDAÇÃO CASA DE JORGE AMADO E O ACERVO DO ESCRITOR
Fundação Casa de Jorge Amado - Salvador/BA.
A Fundação Casa de Jorge Amado é uma organização não-governamental e sem fins lucrativos cujo objetivo é preservar, pesquisar e divulgar os acervos bibliográficos e artísticos de Jorge Amado, além de incentivar e apoiar estudos e pesquisas sobre a vida do escritor e sobre a arte e literatura baianas. A Casa de Jorge Amado tem também como missão a criação de um fórum permanente de debates sobre cultura baiana – especialmente sobre a luta pela superação das discriminações raciais e sócio-econômicas.
Para manter viva a memória do escritor – que já teve seus livros publicados em 60 países – desde que foi inaugurada, a Casa de Jorge Amado conta com uma exposição permanente de documentos, fotografias, livros, suas apropriações populares, adaptações e objetos relacionados. Também estão expostos prêmios recebidos por Jorge e fotos tomadas por Zélia Gattai, documentando o dia-a-dia do autor.
Endereço
Largo do Pelourinho | Salvador - Bahia
Tel. (55 71) 3321 0070
Funcionamento: Segunda a Sexta: 10h às 18h e
Sábado: 10h às 16h
Site: http://www.jorgeamado.org.br

Jorge Amado
“Eu estava na Bahia para sua despedida e vi o povo nas ruas, aplaudindo seu escritor com emoção. Muitos entre eles nem leem, mas todos sabem que perderam algo de muito importante, que felizmente viverá sempre na obra que aí está.”
- João Ubaldo Ribeiro, escreve em "Jornal O Globo", em 12 de agosto de 2001.


"Nossas elites são, de fato, extremamente preconceituosas, não merecem grande atenção."

Jorge Amado

"Não acredito que chegue um tempo em que a literatura seja relíquia do passado."

REFERÊNCIA E FONTES DE PESQUISA
Cadernos de Literatura Brasileira publicados pelo Instituto Moreira Salles
Livros do autor, teses e dissertações.

Jorge Amado
“Mais poderoso é o povo que supera e vence as limitações, enfrenta as terríveis condições da vida e marcha em frente, para o futuro.”

JORGE AMADO, o Poeta

JORGE AMADO
JORGE AMADO
(1912-2001)
Jorge Amado é poeta, sim senhor. Por certo, publicou um livro de poesias no início de sua carreia de escritor: A ESTRADA DO MAR, em 1938. Livro raríssimo. Estou à busca dele e não encontro em parte alguma. Deve estar na Casa de Jorge Amado, suponho. Já pedi a uma pessoa para buscar, mas nada...
Mas ele escreveu poemetos e os encaixou na voz de seus personagens.
Mais do que isso: sua prosa é poética. “Poesia em prosa”, já escreveram sobre ele.
Quem chegou mais perto da poesia dele foi a fotógrafa Maureen Bisiliat, na edição de suas fotos em volume extraordinariamente belo — BAHIA AMADA AMADO ou O AMOR À LIBERDADE & A LIBERDADE NO AMOR (Empresa das Artes, patrocínio da Unisys, 1996). Livro de grandes proporções, encadernado em um branco superior, título em relevo. Beleza pura! E as fotos impressionantes.
Maureen escolheu textos das obras de Jorge Amado. Alguns, indiscutivelmente poéticos. Valemo-nos de alguns para esta primeira homenagem ao escritor baiano-universal. Quem tiver os poemas originais de A estrada do mar, que nos socorra!
Grandes canoas imóveis sobre a água parada.
Os saveiros, velas arriadas, dormiam na escuridão.
(em JUBIABÁ)
SEARA VERMELHA

O vento arrastou as nuvens, a chuva cessou e sob o céu novamente limpo crianças começaram a brincar. As aves de criação saíram dos seus refúgios e voltara a ciscar no capim molhado. Um cheiro de terra, poderoso, invadia tudo, entrava pelas casas, subia pelo ar. Pingos de água brilhavam sobre as folhas verdes das árvores e dos mandiocais. E uma silenciosa tranqüilidade se estendeu sobre a fazenda, as árvores, os animais e os homens.
Apenas as vozes álacres das crianças, pelos terreiros, cortavam a calma daquele momento:

Chove, chuva chuverando
Lava a rua do meu bem...

Vestidas de trapos sujos, algumas nuas, barrigudas e magras, as crianças brincavam de roda.
Farrapos de nuvens perdiam-se no céu de um azul claro onde primeiras e leves sombras anunciavam o crepúsculo.
TENDA DOS MILAGRES
Rosa sempre chega assim, inesperada, vem de súbito.
Da mesma forma inconseqüente desaparece...
Fuxicos, arengas, xeretices, pois em verdade
Ninguém sabe nada de concreto sobre Rosa.
Rosa brincava com as algas, todos os ventos em seus cabelos.
Todos os ventos, do norte e sul, o vento terrível do noroeste.
Na canoa ancorada ela deitava, a cabeça de fora, o cabelo no mar.
Parecia cabeça sem corpo, saindo d´água, dava arrepio.
Rosa maluca, Rosa do cais, tanta vezes mentias!
NOITE DOS “CAPITÃES DA AREIA”

A cidade dormiu cedo.
A lua ilumina o céu, vem a voz de um negro do mar em frente.
Canta a amargura da sua vida desde que a amada se foi.
No trapiche as crianças já dormem.

A paz da noite envolve os esposos.
O amor é sempre doce e bom, mesmo quando a morte está próxima.
Os corpos não se balançam mais no ritmo do amor.
Mas no coração dos dois meninos não há nenhum medo.
Somente paz, a paz da noite da Bahia.

Então a luz da lua se estendeu sobre todos,
as estrelas brilharam ainda mais no céu,
o mar ficou de todo manso
(talvez que Iemanjá tivesse vindo também a ouvir música)
e a cidade era como que um grande carrossel
onde giravam em invisíveis cavalos os Capitães da Areia.

Vestidos de farrapos, sujos, semi-esfomeados, agressivos,
soltando palavrões e fumando pontas de cigarro,
eram, em verdade, os donos da cidade,
os que a conheciam totalmente,
os que totalmente a amavam,
os seus poetas.

ABC DE CASTRO ALVES
“A praça do povo, amiga, como o céu é do condor”.
A praça é do povo, é o seu campo de batalha, onde ele protesta e luta.
Nãos vistes ainda a multidão se agitar na praça como um mar em tormenta que destrói navios e invade o cais?

No tempo do poeta Castro Alves
Os negros eram escravos comprados em leilões,
Mercadoria que se vendia, trocava e explorava.
E em troca de tudo que eles deram ao branco,
Sua força, seu suor, suas mulheres e filhas,
A maciez da sua fala que adoçou a nossa fala,
Sua liberdade,
O branco lhe quis dar apenas,
Além do chicote, os deuses que possuía.

Mas deuses os negros traziam da África,
Os deuses da floresta e do deserto,
E continuaram fiéis aos seus deuses
Por mais que rezassem ao deuses
Dos seus donos.

Do fundo das senzalas vinha o choro convulso
Dos negros no bater dos atabaques,
Quando chegava do longínquo das praças
A inquietação do homens...
Era toda uma raça que sofria,
Se desesperava e reagia,
Conservando alguma coisa de seu,
Puramente seu.

......

Assim ele via o negro, magnífico, forte e belo,
Rompendo as cadeias, livre na sua força colossal..l.
DONA FLOR E SEUS DOIS MARIDOS

A viração desatava os cabelos lisos e negros de Flor,
punha-lhe o sol azulados reflexos.
No barulho das ondas e no embalo do vento.

Rompeu a aldeia sobre o mar de Itapoã,
a brisa veio pelos ais de amor, e,
num silêncio de peixes e sereias,
a voz estrangulada de Flor em aleluia;
no mar e na terra aleluia, no céu e no inferno aleluia!



Jorge Amado, pintura a óleo de Cândido Portinari, 1934. 46x38 cm.



Orgasmo, "Uma sinfonia do cérebro"



Orgasmo ajuda a prevenir doenças físicas e mentais, diz estudo.

Ausência do prazer sexual pode provocar enfermidades e tornar as pessoas rabugentas.

10 de agosto de 2012
 

"Uma sinfonia do cérebro" ou "um show de fogos artificiais". Estas são alguns dos termos usados pelos cientistas para se referir à resposta do cérebro ao momento do orgasmo. Mas embora o prazer proporcionado por essa sensação seja de conhecimento geral, quais são os benefícios para a saúde?

Magdalena Salamanca, psicanalista especializada em sexo baseada na Espanha, disse à BBC que a ausência do prazer sexual pode provocar doenças e transtornos mentais.

"É importante porque o orgasmo é a satisfação de um dos instintos mais importantes do ser humano, que é o sexual", diz.

Ela destacou ainda que muitos dos problemas de cunho social ou profissional estão vinculados à insatisfação sexual. "Por exemplo, a ansiedade é um dos transtornos mais relacionados com a ausência do orgasmo".

Além disso, a psicóloga Ana Luna disse que "fisiologicamente, a descarga de muitas tensões que o ser humano acumula se produz por meio do orgasmo".

Atividade cerebral

Há alguns meses, cientistas da Universidade de Rutgers, no Estado americano de Nova Jersey, determinaram que o orgasmo ativa mais de 80 diferentes regiões do cérebro.

Utilizando imagens de ressonância magnética do cérebro de uma mulher de 54 anos enquanto tinha um orgasmo, os cientistas descobriram que no ato quase todo o cérebro se torna amarelo, o que indica que o órgão está praticamente todo ativo.

Os níveis de oxigênio no cérebro também refletem um espectro que vai desde o vermelho intenso até um amarelo claro, e isto tem um impacto em todo organismo.

Benefícios para a saúde

"Há outros benefícios porque todo esse sangue oxigenado que flui pelo corpo chega aos microssensores da pele e vai para todos os órgãos", diz a psicóloga Ana Luna.

Já Magdalena Salamanca destaca que a saúde física e psíquica estão muito vinculadas à satisfação sexual proporcionada pelo orgasmo, o que o estudo da Universidade Rutgers parece comprovar.

A pesquisa mostrou como a atividade cerebral iniciada pelo orgasmo se propaga por todo o sistema límbico, relacionado às emoções e à personalidade.
Por isso, psicólogos como Ana Luna acreditam que o orgasmo é uma parte essencial de uma personalidade sadia.

"Quando você não tem orgasmo toda essa energia fica represada", diz a estudiosa, acrescentando que muitas vezes a ausência do prazer sexual torna a pessoa irritadiça, triste, rabugenta e até mesmo com dificuldades para sorrir.


http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,orgasmo-ajuda-a-prevenir-doencas-fisicas-e-mentais-diz-estudo,914512,0.htm




O Amado Jorge - Saravá!









Cangote - CéU


BOM DIA

Meu encontro com Jorge Amado





O ano acho que foi 1969, estava cursando o Pedagógico e minha turma ficou encarregada de fazer um estudo dos livros de Jorge Amado, meu grupo escolheu Mar Morto. Lembro que partiu de mim a idéia de fazer uma entrevista com o autor como parte da nossa apresentação. Feitos os arranjos, proposta aceita, partimos para a entrevista na sua casa no Rio Vermelho, em Salvador, onde ele e sua mulher, Zélia Gattai, recebiam desde pessoas ilustres até as pessoas mais simples, do povo. Pelo portão com mo­tivos criados pelo amigo e pintor Carybé, já passaram Pablo Neruda, Dorival Caymmi, João Ubaldo Ribeiro, muita mãe-de-santo, políticos e o moleque da quitanda.
Imaginem vocês a curiosidade e deslumbramento daquela menina-moça, acompanhada de sua professora de Português e mais umas quatro colegas de colégio ao encontrar-se na sala onde habitava o maior escritor da Bahia, do Brasil e um dos grandes do mundo e prestes a conhece-lo e toca-lo.
Jorge Amado foi exatamente o que esperávamos. Passos leves, braços abertos, sorriso e olhar de avô.
Sentamos em um canto da sala e começamos a fazer as perguntas e anotar as respostas em cadernos e num pequeno gravador. Falamos sobre o livro Mar Morto que, da longa lista dos romances de Jorge Amado, é um dos mais populares, não só no Brasil como em muitos outros países. Romance de grande força lírica, considerado um verdadeiro poema em prosa, conta histórias de velhos marinheiros, de mestres saveiros, de pretos tatuados e de malandros que contam e cantam essas histórias da beira do cais da Bahia. Conta a história de Guma e Lívia que é a “história da vida e do amor no mar”, como diz Jorge Amado “O povo de Iemanjá tem muito que contar”.
Sempre atento e paciente saciou nossa curiosidade e com ternura abraçou uma a uma e ainda recordo o afago que fez na minha cabeça. Zélia veio à sala trazer um refresco e também nos deixou o sorriso.
Nosso trabalho foi um sucesso e reconhecido com honras, mas, na minha memória, a imagem paternal do grande escritor ficou gravada para sempre como meu maior prêmio.

Regina Soares