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quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Mariana Aydar se apresenta...





Chico Buarque - Entrevista RS

por Paulo Terron
"Eu teria de mudar a minha vida inteira.” Chico Buarque está com o olhar perdido em direção ao chão da sala de sua cobertura, no Alto Leblon, no Rio de Janeiro. Ele não se refere a música ou política, mas a um terceiro elemento sempre associado à sua imagem pública: o futebol. Aos 67 anos, ele sente dores nas costas; em uma consulta, recebeu a notícia de que não poderia mais jogar nas partidas de seu time, o Polytheama. “Mas consultei outro médico e ele me disse que exatamente porque faço esse exercício eu não precisaria parar”, diz.
As declarações deixam óbvia a importância do futebol na vida do artista, mas também puxam o ambiente para um universo além-arte. Nesta tarde de agosto, ele está disposto a falar sobre qualquer tema, sem limitação de tempo – uma oportunidade rara com um astro notoriamente avesso a ações promocionais. Atualmente, as chances
de se cruzar com Chico em eventos sociais estão entre a de ser atingido por um raio e a de não encontrar um ex-BBB em uma festa  open bar.
O apartamento é espaçoso, decorado discretamente. Em uma sala, um piano e um violão se encontram ao lado de um computador Macintosh. São instrumentos da alternância que ele mantém desde os anos 90, revezando o trabalho entre a literatura e a música. Agora, ele é o Chico Buarque compositor, que lançou Chico (o primeiro disco de estúdio desde 2006) e está imerso no processo da nova turnê (que deve começar em Belo Horizonte em novembro e passará pelas principais capitais).
Entre sorrisos e gargalhadas – ao perceber um assunto familiar, um meio sorriso surge; ao se empolgar com uma resposta, gargalha até perder o fôlego –, o músico revela à Rolling Stone Brasil um retrato preciso de como se encontra em 2011: calmo (mas não conformado), incisivo (e às vezes inseguro), mas jamais lacônico ou desinteressante. Após cinco décadas de atividade artística, Chico Buarque de Hollanda está pronto para mostrar seu lado humano sem hesitação ao caminhar pelo espaço reservado somente às lendas.
Você é conhecido por ser metódico no trabalho. E na vida cotidiana, também? Você se permite decisões espontâneas ou mantém o controle?
Eu não sabia que tinha fama de metódico. Na verdade, minha vida e meu trabalho se confundem, nem eu mesmo sei direito quando estou trabalhando ou não. Às vezes digo que estou muito atarefado, porque as pessoas pensam que um artista está sempre disponível para ir à festa. Como o artista em geral não tem horário, não dá expediente, costumam pensar que é vagabundo. Mas, assim como a criança se concentra num brinquedo, tem dias em que preciso me concentrar no trabalho, nem que seja compor um palíndromo ou inventar times de futebol.
Quando se propõe a fazer um disco, o processo de compor só começa quando você determina?
Não é nem um pouco regrado. O que acontece é que, hoje, compor se tornou um ato tão rarefeito que a cada vez que faço uma música me lembro exatamente – eu sei a história de cada composição, porque é um momento especial. É normal para qualquer compositor, qualquer criador, perder aquele entusiasmo juvenil com o [passar do] tempo, aquela exuberância criadora toda. Vai se tornando um criador mais seletivo.
A imagem romântica do artista tem mais a ver com inspiração: você está na padaria, baixa a inspiração e escreve a letra. As pessoas não pensam que fazer música é um esforço consciente.
É e não é. Tem algo de mágico, algo que corresponde a essa ideia romântica. Porque você não faz a música quando quer, você não escreve e tem uma boa ideia quando quer. Agora, você tem que estar disponível para as ideias surgirem. A centelha que desencadeia a música continua tendo um certo mistério. A partir daí, o trabalho é trabalho. Você tem uma técnica, tem uma experiência. Dificilmente você vai escrever na padaria, mas pode, por exemplo, fazer isso caminhando. Muitas das minhas caminhadas são de trabalho. Vou caminhando e pensando em como desenvolver melhor uma música. Mas criar... eu preciso de um instrumento para criar, eu preciso do violão. Agora, a letra: posso andar com uma maquininha dessas, um fone de ouvido, ouvindo aquela música e desenvolvendo numa caminhada ou até mesmo na padaria. Estou o tempo todo a serviço dessa música. Se estiver num restaurante conversando, posso ter uma ideia que vai me tirar daquela conversa e me levar de volta para a minha música. É um pouco as duas coisas.
Em seu período de dedicação à literatura, a música – não como ofício – continua presente? Por exemplo, ouvindo música dos outros?
Não, não. Eu não ouço música. Na verdade, ouço pouca música. Escrevendo ou não escrevendo, ouço pouca música. Recebo um disco de um autor ou de uma cantora que me interessam, coisas que me recomendam. E é assim: ponho o CD no carro, que é o lugar onde mais ouço, e escuto aquilo. Quando você está escrevendo, criando, parece que é um choque! As coisas que entram, batem e saem. Quando estou escrevendo um livro, não tenho o menor interesse por música, fico inteiramente fora. Períodos como este agora: aí, sim, estou aberto a tudo e ouço coisas que aparecem.
A partir dos anos 00, sempre que vai explicar um novo disco, você diz: “Eu andava meio parado com a música”. Você já se considerou inseguro em relação a isso? Parece que existe um esforço consciente seu.
Sim, porque sair da inércia é complicado, tanto para a música quanto para a literatura. Quando eu me disponho a entrar na fase musical, requer um esforço. Não é do nada que aparece, não é assim. Tem que buscar. Minha primeira sensação, quando pego o violão depois de um longo tempo, é a de que não sei mais como se faz uma música. Eu não tenho ideia de como se compõe. É como se fosse um instrumento alheio, como se não me dissesse respeito. É um momento de quase flerte com a música, de procurar me reaproximar. Então pego o violão e começo a tocar: “Que diabo é isso? Pra onde vou?” Ou então os acordes já vêm na sequência que vinham antes, começam a se repetir e tocar quase que mecanicamente. Até voltar a dominar aquilo leva um bom tempo. Quando vou escrever um livro, é a mesma coisa. É um exercício, que se tem que fazer até se sentir dentro da coisa.
A expectativa a respeito de suas músicas é sempre alta. Essa pressão chega até você?
Eu não posso me deixar levar por isso. E não adianta você querer matar um leão por dia, porque as pessoas sempre vão dizer que o leão antigo era melhor e mais forte do que o de hoje [risos]. Mas não é isso que vai me estimular. Existe uma pressão interna, sim, uma necessidade e um prazer grande em fazer uma música. Essa possibilidade de alternância é saudável, porque ninguém está esperando um disco novo meu daqui a um ano: nem eu, nem ninguém. Tem esse tempo todo agora, lento e de maturação. Escrever um livro provavelmente – e isso não precisa ser tão mecânico – vai tomar um longo tempo. Então, não acho que a gente deva se levar por esse tipo de pressão. Não tenho contrato com gravadora, não tenho obrigação nenhuma e já é suficiente a pressão que a gente exerce sobre si próprio.
Hoje se vendem menos discos. Faz diferença?
Não, para mim não faz. Tanto é que eu fiquei sabendo mais ou menos dessas novidades durante as conversas de lançamento do disco. Então me foi apresentado um projeto de lançar o disco pela internet e eu não conhecia nada disso. E aí eu fui conhecer a realidade do mercado. Eu andava longe disso havia cinco ou seis anos e não sabia que tinha mudado tanto assim. A previsão do lançamento de um disco é, em termos numéricos, muito inferior agora. Então, tentei compensar a gravadora, de certa forma, pelo investimento que ela fez, colaborando no projeto de lançamento deles. Internet e aquela coisa do site e tal. Mas isso não é assunto meu. Eu, na verdade, cheguei a uma altura da vida que não preciso mais do disco para sobreviver. Eu já tenho basicamente aquilo que eu preciso, não tenho grandes ambições. Já tenho certa estabilidade financeira e não preciso ficar muito preocupado com isso. Meus discos vendem direitinho, tenho direitos autorais aqui e lá fora. Os livros vendem mais do que os discos, inclusive [risos]. E os livros são vendidos lá fora. Não tenho essa preocupação.
Como estão os planos para a turnê?
Quem está vendo isso é o pessoal da produção, porque fazer um show hoje em dia... Para me sentir confortável no palco, vou querer chamar meus músicos, meus amigos com quem eu já me dou bem. As músicas são novas, os amigos não precisam ser novos, são os velhos mesmo. Para montar isso tudo é uma estrutura grande. Precisa de patrocínio. Vou precisar de um mês, talvez mais, para ensaiar. Para pagar isso, tem de fazer praticamente uma temporada de pelo menos um ano para viabilizar. O pessoal que mexe com isso está procurando uma maneira de viabilizar economicamente esse show. Isso passa por patrocínio e, evidentemente, um patrocínio de um show meu não pode contar com isenção fiscal, com Lei Rouanet, com nada disso. Senão, seria mais fácil [risos]. Mas mesmo no meu último show eu não tinha isso.
Por opção? Porque você prefere?
Hoje eu nem poderia porque acontece, por acaso, que a minha irmã é a ministra da Cultura. Mas o último show já era, se não me engano, o governo Lula. Gil era o ministro da Cultura e achei melhor não entrar com patrocínio via Lei Rouanet. Mas isso dificulta. Você sabe disso, né? Não é qualquer empresa que vai querer simplesmente associar o nome a um artista sem poder abater no seu imposto de renda e tal.
A Lei Rouanet é uma questão peculiar para artistas do seu tamanho. As pessoas parecem não entender direito como ela funciona.
Parece que não há muita boa vontade em deixar claro, para o grande público, o que é a Lei Rouanet. Sempre se passa essa ideia de que o governo está bancando um artista, de que o Ministério da Cultura está financiando um filme, uma peça, um show de artista famoso. O Ministério, pelo contrário, patrocina justamente quem não tem acesso à Lei Rouanet. Ela permite que o artista busque patrocínio na iniciativa privada, mediante isenção fiscal. Não cabe ao Ministério julgar se o artista precisa ou não de alguma ajuda pessoal, cabe a ele julgar o mérito do projeto apresentado. Há quem seja contra porque acredita que o Estado não deve dar incentivo algum às artes e à cultura. É um ponto de vista. Eu nem queria entrar muito nesse assunto. Estou entrando assim, de raspão, porque desde que minha irmã foi nomeada ministra eu me sinto impedido de opinar. Até fico fora do assunto de direito autoral para não parecer que eu tenho alguma coisa a ver com isso. Para mim é um incômodo ter uma irmã no Ministério da Cultura.
A Ana de Hollanda foi criticada por ter uma postura em relação aos direitos autorais que foi considerada um retrocesso em relação aos ministros anteriores. Você tem opinião sobre isso?
Não tenho e me mantive alheio a esse assunto. Exatamente porque desde o início tentou-se passar a impressão de que eu teria alguma ingerência na nomeação da minha irmã como ministra. Para mim, o mais confortável era que o Juca Ferreira continuasse sendo ministro. Até mesmo para que as pessoas xingassem o Juca Ferreira e não a minha irmã nos jornais [risos]. Quando entra esse assunto de direitos autorais, volta e meia sou procurado, recebo e-mails e tal. Digo: “Prefiro não me interessar por isso”. São tantos assuntos pelos quais a gente tem de se interessar, tantos jornais que a gente tem de ler, tantas notícias que a gente tem que ficar por dentro, que eu prefiro deixar esse de lado. E há colegas meus que estão brigando, discutindo isso com muito mais conhecimento de causa do que eu. Prefiro não opinar. Nem sei direito o que é o Creative Commons, o que isso deixa de ser. Eu sei que o selo foi tirado do [site do] Ministério. O que isso representa, eu não sei.
Quem participar de um jantar no qual estivessem você e a Ana ouvirá que tipo de conversa?
Ouvirá muita conversa jogada fora. Somos muitos irmãos, todos nos damos bem, mas quando nos encontramos ninguém se mete na vida do outro. Só pelas costas.
Você acha que esperam que você tenha opinião sobre política porque no passado você foi tão ligado a esse tema?
Acho que nem se espera mais tanto. Isso acontece durante as campanhas eleitorais quando fica impossível, para mim, não tomar partido. Porque eu acompanho a política do país desde garoto, desde os tempos do Juscelino [Kubitschek]. A primeira vez que votei foi pela volta do presidencialismo, João Goulart, e desde então me interesso por política e me manifesto. Agora, a vida política, o dia a dia, não me atrai nem um pouco e nem faço questão de ficar me manifestando. Durante uma campanha eleitoral, o artista é praticamente compelido a se manifestar. Porque senão vão dizer: “Cadê os artistas que estavam falando e agora não falam mais nada, estão em cima do muro?” Eu sei perfeitamente o que faço quando tomo partido durante uma campanha. Na última, apoiei a Dilma e sabia que isso ia atrair o ódio de quem votou no Serra. Se eu apoiasse o Serra, provavelmente ia atrair o ódio de quem votou na Dilma. Nesse momento, tudo fica exacerbado. Mas não vou ficar me pautando por isso, pelo medo de ser odiado por essa ou por aquela parcela da opinião pública. Isso passa com o tempo. Quer dizer, passa em termos. Porque há sempre uma cobrança. “Você apoiou, o que você acha disso e daquilo?” Eu apoiei e não me arrependo. É mais cômodo ser oposição, sem dúvida. Eu votei no Jango, na volta do Jango à presidência da República depois da tentativa de golpe de 1961, que não durou muito, pois em 1964 veio o golpe militar. O que eu apoiava no Jango é o que o governo Lula mais ou menos implantou no país. O que me envergonhava nos anos 60 era o que me envergonhava até há pouco. O Brasil era um país tão rico, eu vivia num país tão rico e tão desigual. Essa desigualdade, de certa forma, foi reduzida. Ou se tentou reduzir, investiu-se nisso, na redução da miséria por meio de programas sociais. E também me envergonhava viver num país internacionalmente insignificante, subserviente. Acredito que durante o governo Lula se criou uma política externa mais condizente com a importância do país. O país cresceu aos olhos do mundo devido a essa política externa.
Na última eleição, você declarou que votaria na Dilma, mas que não via muita diferença entre ela e o Serra. E mencionou agora que é mais cômodo ser oposição. Em algum momento se sentiu decepcionado pelo PT depois que o partido assumiu o poder?
Em primeiro lugar, é preciso deixar claro que eu não sou filiado ao PT. Nunca fui e não voto automaticamente com o PT. Um ano antes das eleições, antes das campanhas eleitorais, numa entrevista que fizeram na França, perguntaram sobre as eleições e o quadro ainda não estava muito claro. E eu disse: “Não vejo muita diferença, acho que um eventual governo do Serra não vai ser muito diferente do que o governo Lula tem feito em termos econômicos. Não vejo grande possibilidade de se mudar, até mesmo porque a política econômica do governo Lula seguiu mais ou menos as diretrizes do governo anterior, do Fernando Henrique. Não vejo grandes possibilidades de alteração, não vejo grandes diferenças entre os candidatos. Até porque o passado de Serra é o de um homem de esquerda – até à esquerda de Fernando Henrique”. Pois bem, começou a campanha e o Serra inicialmente até demonstrou certo endosso à figura e à política do Lula. Só que isso foi se desvirtuando e ele foi abraçando os valores mais reacionários que tem no país. O Serra se deixou levar por um tipo de discurso que não tem absolutamente nada a ver com o Serra que eu conheci. Nesse Serra eu não votaria nunca. Ali, claramente, optei mais uma vez por um candidato do PT, a Dilma. Eu estou querendo dizer que um ano antes eu não tinha conhecimento suficiente de quem era a Dilma. Se não me engano ela era candidata já – ou nomeada, indicada, sugerida, insinuada pelo Lula. Não havia uma clareza muito grande sobre o que iria acontecer. Quando a campanha chegou, eu me senti obrigado a tomar uma posição, e essa posição não poderia ser outra. Isso não tem nada a ver com alinhamento automático com o PT. Eu tenho um milhão de críticas ao PT. Pessoas que conheci quando era um pequeno partido hoje são pessoas com quem eu não quero me encontrar. As pessoas que rodeiam o Lula eu não quero encontrar. Essas pessoas eu não quero ver pela frente. Não vou a Brasília, não vou ao Palácio, não tenho atração alguma pelo poder. Ao mesmo tempo, é muito cômodo eu, que não tenho de governar, dizer isso tudo: “Ah, com esse fulano eu não falo”. Eu não preciso falar. O Lula tem que falar, ele tem que lidar com essa gente. A Dilma tem que lidar com uma porção de gente que eu não convidaria para entrar na minha casa [risos]. Eu não sou um político e não tenho a menor vocação para isso. Nunca seria. Tenho as minhas posições claras, mas também reconheço que é confortável estar em casa e [ficar falando] “Porra, olha o Lula tirando foto com não sei quem, a Dilma dando abraço em não sei quem”. Ninguém vai governar sem certos acordos, sem certas alianças. É impossível, pelo menos no sistema político que se tem aqui no Brasil. Ninguém faz. Nem a Marina Silva, que eu adoro.
Você nunca escondeu sua admiração pelo Lula. Caso viesse a disputar a presidência novamente, ele teria o seu apoio?
Com quem? Contra a Dilma? [Gargalhadas]
No lugar da Dilma.
Ele tem meu apoio, sim. Tenho a maior admiração pelo Lula. Nada do que eu falei aqui é contra o Lula. Não sei se não fui claro: não gosto das pessoas... Metade das pessoas que estão em volta do Lula são pessoas que eu não convidaria para tomar um cafezinho. Ao mesmo tempo, entendo que ele tenha de tomar um cafezinho com essas pessoas. Conheci muita gente do PT, da época de partido pequeno, que se perdeu pelo caminho. Todo mundo sabe que o poder corrompe. A corrupção está ali, você não vai eliminar a corrupção – nem aqui nem em nenhum lugar do mundo. Nem o Lula e muito menos a Dilma são a favor da corrupção. Existe uma consciência de que há corruptos – se não no primeiro, pelo menos no segundo, terceiro escalão. Há uma estrutura viciada, corrupta. E isso é o Brasil, isso é a política.
Politicamente, você sempre foi associado à esquerda. Esse conceito ainda se aplica à política brasileira? Ainda existe esquerda?
Eu acredito que sim. Acredito que quando se toma como prioridade – como prioridade, não como acessória – uma política que combata a desigualdade de renda, que procure tirar gente da miséria, como no governo Lula, isso não pode deixar de ser considerado uma política de esquerda.
Nos anos 90, muita música brasileira foi redescoberta lá fora. Os Mutantes, pela identifi cação com a psicodelia; o Tom Zé foi descoberto pelo David Byrne. Só que você não passou por isso.
Não passei. Mas outro dia fui jogar futebol em Lisboa e o Felipão [Luiz Felipe Scolari] era o técnico. Era um jogo dos amigos do Zidane contra os amigos do Figo. Ele me escalou de saída, e o baterista do Radiohead [Phil Selway] ficou lá no banco, emburrado, porque ele não saiu jogando e eu sim. No intervalo, falei pra ele: “Escuta, não fica aí de cara feia porque o nome da sua banda é roubado de uma música minha” [risos]. O David Byrne ouviu a “rádio cabeça” [a música “O Último Blues”, que contém o verso “na Rádio Cabeça” ], quando foi lançado o disco da Ópera do Malandro. Ele esteve aqui e cantou “A Volta do Malandro” no Canecão. Ele deve ter achado que era uma expressão que se usava muito no Brasil e fez a música lá dele [ “Radio Head”, de True Stories, 1986] que deu origem ao [nome do] Radiohead. Então me sinto representado pelo Radiohead, por intermédio do David Byrne. Afora isso, já tentei fazer carreira lá fora quando morei na Itália e não fui bem-sucedido. Não tenho essa ambição. Mal faço shows aqui no Brasil, tenho preguiça de fazer shows lá fora e não passa pela minha cabeça a ambição de ser conhecido lá. Se alguém resolver – além do Radiohead – me fazer uma homenagem, está liberado! Pode fazer à vontade [risos]. Não me chateia não ter sido descoberto até agora.
Você já disse que tirou músicas dos shows porque as acha datadas. O que data uma música sua?
Posso atribuir essa datação às músicas mais agudas do tempo da ditadura. Algumas músicas que foram criadas meio que como uma função extramusical. Ou seja, com a intenção de desafiar o regime, a censura etc. Vamos dizer: músicas sinceras. Essas vivem menos, talvez seja isso. Outras ficam datadas musicalmente, porque são canções, harmonias que não representam mais o que me interessa hoje como uma solução harmônica, construção melódica. Essas têm remédio porque eu posso refazer, rearranjar, re-harmonizar. Agora, a meia dúzia de canções – “Apesar de Você”, “Cálice”, “Deus lhe Pague” – essas, para mim, ficaram datadas. Elas correspondem ao momento político e não fazem grande sentido hoje.
Será que essas músicas não têm um significado mais abrangente para o público?
Pode ser, pode ser. Porque as pessoas têm uma lembrança afetiva da música. Elas gostam de determinadas músicas porque elas remetem a uma época feliz da sua vida. “Essa é a música que ouvi quando conheci a minha namorada.” Isso existe independentemente do que diz a letra. Quando eu digo que não tenho vontade de cantá-las porque elas são datadas, isso é pra mim! Eu não tenho vontade de cantar. Acredito que as pessoas que não tinham posições políticas claras na época possam ouvir “Apesar de Você” hoje e encontrar um valor afetivo muito grande, independentemente do que a letra diz. Isso até contraria um pouquinho o que você falou, porque as pessoas se deixam levar pela música e, às vezes, cantam a letra sem prestar atenção no que estão dizendo. Isso existe, basta lembrar as músicas que você cantava na infância. “Que engraçado, essa música quer dizer isso!” Você não entendia o que era e repetia. Ou as pessoas que cantam em inglês e muitas vezes não sabem o que diz aquilo. Elas gostam do som e aprendem a dizer aquelas palavras, não têm muita noção do que elas dizem. Ouvem músicas que fazem um enorme sucesso no mundo inteiro e que, na verdade, são compreendidas por uma parcela bem menor de pessoas.
Quem cumpre o papel de crítica social hoje?
Todo o rap que se faz aqui no Rio e em São Paulo é fortemente de crítica social. Eles fazem isso muito bem, com propriedade, falando dos problemas locais da comunidade. Falam muito de uma maneira que eu não saberia abordar. Nem me cabe, me sinto até excluído desse mundo. É direto, não há metáforas, não há censura. Vão direto ao ponto. Eu me sinto até um pouco intruso nesse meio. Para mim, o que acontece é que muitas vezes as pessoas falam: “Vem cá, porque você não fala [de problemas político-sociais nas letras]?” Eu me lembro quando estourou aquela história do Mensalão e, numa entrevista coletiva, perguntaram por que eu não falava daquilo. “Você quer que eu faça o quê? O ‘Sambão do Mensalão’?” Não vou fazer o “Sambão do Mensalão”, mesmo porque as pessoas se esquecem de que essas músicas todas que eu citei antes eram coisas que eu dizia e que, na época, os jornais não falavam. Não me interessa hoje repetir em música o que está todos os dias nos jornais. Nem me interessa muito dar entrevista falando mal do governo. Eu gostava de falar mal do governo quando os jornais não o faziam.
O amor está presente no novo disco. Mas teve uma frase, de “Querido Diário”, que foi muito comentada: “amar uma mulher sem orifício”. Teve muito debate, a crítica a usou contra você.
No “Querido Diário” está lá: um dia, segundo dia, terceiro dia, quarto dia. Evidentemente que há algo de nonsense no sujeito que resolve, num belo dia, ter uma religião e, andando na rua, imagina que vai sacrificar uma ovelha. Já entrou nesse campo [risos]. Aí ele resolve ter uma adoração por uma estátua, ou seja, amar uma mulher sem orifício. Eu li em algum lugar que “amar uma mulher sem orifício” seria amar uma mulher casta, uma mulher difícil. Aí, se não é burrice, já é vontade de encher um pouquinho o saco do compositor.
Até os anos 80 a pergunta clichê que se fazia aos artistas era: “E a crítica?” Agora, virou: “E os paparazzi?”. Você sente saudade de quando a crítica era o principal problema do artista?
Ah, sim. Eu não estou entendendo o [que você quis dizer com] “o problema com a crítica”. O problema com a crítica eu sempre tive...
É que hoje parece que há mais interesse sobre a vida pessoal do artista. Você percebe isso?
[Longo silêncio] Que a vida pessoal ficou muito mais exposta do que há 20, 30 anos, não tem a menor dúvida. Eu tenho de mudar algumas atitudes porque você está mais exposto do que antes, mas não me afeta tanto assim. Me afeta ao, por exemplo, ir à praia. Sempre, desde criança, gostei de ir à praia. Nasci em frente ao mar, nadava em Copacabana, pegava jacaré no Arpoador, mergulhava. Até três anos atrás eu ia à praia. Até o dia em que saio da praia e um sujeito se agarra em mim, começa a berrar, gritar no meu ouvido e a perguntar algumas coisas. Quando me dou conta: “Ih, tem um cara lá filmando. Isso aqui é um número cômico de um programa de televisão” [risos]. Eu agora faço parte de um programa de televisão e vou ter que lidar com isso. Não vou fazer uma cena, só fico pensando em quando é que vai acabar a história. Resultado: não posso ir à praia. Mas não é o fim do mundo. Deixo de ir à praia, deixo de ir ao restaurante da rua Dias Ferreira e pronto. Isso não me afeta grandemente. Falei sobre isso na internet: você está mais exposto, mas aí é você – pessoa – e sua obra também. Com a internet aumentou muito o número de críticos, se multiplicou um milhão de vezes. Como no caso dessa história do verso que você está apontando. Sei exatamente como ela foi criada: num blog de um cara da revista Veja, que tem uma enorme estima pela minha pessoa e gosta de lançar esse tipo de futrica. Ali vale tudo, já sugeriram até que se desapropriasse meu campo de futebol para a construção de casas populares. É um problema que vem de muitos anos, uma questão doentia de uma revista contra um artista. Parece que o cara que manda nessa revista tem ambições literárias. Então ele não gostou de os meus livros ganharem prêmios, porque ele quer ser escritor. Aí, decidi me vingar. Sabe o que eu fiz? Li o romance do cara, um tal de [Mario] Sabino. Não é parente do Fernando Sabino, acho. Fui até o fim, li tudo, tudo. E fiquei tranquilo, passou a raiva [risos]. Falei: “Bom, o melhor que esse cara tem a fazer é ser editor da revista Veja”.
Questão inevitável: é ou já foi difícil ser o Chico?
É difícil ser o Chico quando as pessoas pensam que você é o Chico. Quando você entra no teatro e acham que você é o Chico e que você tem de falar sobre a sua vida ou sobre a sua obra e tal. Porque você está distraído. Você não anda na rua e pensa: “Ah, sou o Chico Buarque”. Não passa pela cabeça do artista. A não ser que ele seja um louco e saia por aí, “Sou o Picasso, sou o Picasso”. Não faz parte das minhas preocupações isso de “o que vou dizer” e “o que vou fazer”. É difícil, às vezes, dar entrevista e ter de ficar se explicando. Fora isso, não tenho queixas, gosto de fazer o que faço. Não que seja fácil escrever livros e canções, mas é preciso sempre desconfiar das coisas fáceis.
Talvez para o artista não exista isso de ser artista o tempo todo, mas para as pessoas é um choque a diferença entre a expectativa e a realidade. Talvez tenha a decepção de...
[Interrompe] O tempo todo.
Os fãs te pedem conselhos na rua, esperando que você mude a vida deles?
Pode acontecer. Se eu ficar parado num lugar, pode acontecer. Por isso estou sempre andando... [risos] Evito que as pessoas venham pedir conselho ou opinião. Mas geralmente o que pedem mais é autógrafo. Agora, mais que autógrafo, são as fotos. Fora isso, eu não fico parado.
O que faz quando quer flanar, conversar com pessoas anonimamente? Para onde você “foge”?
Ando todo dia nas ruas do Rio e quase nunca sou parado, me cumprimentam de passagem. Mas gosto de conversar com o jornaleiro, com as moças do café, com os caras da farmácia. No estrangeiro, além de andar pelas cidades, converso com gente que não faz ideia do que sou ou faço, e isso é bom. Uma ou duas vezes por ano passo uns dias em Paris, e mesmo ser maltratado de vez em quando – ser barrado em restaurante, empurrado no metrô, ouvir desaforo do chofer de táxi – é uma experiência educativa para famosos em geral.
Há uma impressão de que você é mais fechado – não em um nível João Gilberto –, mas certamente mais discreto do que Gil e Caetano. É consciente ou você se força para manter a discrição?
Olha, eu não me forço para nada. Sou o que sou, e se tem uma coisa que me chateia é gente que faz tipo.
A sua turma nos anos 70 era famosa por freqüentar bares para conversar. E hoje você tem essa necessidade de se reunir pessoalmente e trocar ideias com pessoas “equivalentes” a você, intelectuais, artistas, pensadores?
Gosto muito de conversar com meus amigos, que não são necessariamente intelectuais, artistas ou pensadores. Falamos de futebol, cinema, literatura e de otras cositas más. Política também discutimos, numa boa, ninguém nunca brigou com ninguém por causa de política ou de futebol. Em suma, gosto mesmo é de papo-furado em mesa de botequim. Se o pensador quiser me mostrar seus pensamentos, prefiro que o faça por escrito.
Você disse que escuta música com Francisco, seu neto de 14 anos. Como é a relação? Você se envolve com a educação dos netos ou debate com suas filhas a maneira de criá-los?
Imagina se as minhas filhas permitiriam que eu me envolvesse na educação das crianças. Fora que as meninas menores talvez nem saibam que sou seu avô. Eu sou o “Voíco”, aquele cara que acha graça nelas. Já com o Francisco, aliás Chiquinho Brown, tenho algum diálogo musical. Outro dia vi um número dele no YouTube, um solo de guitarra numa banda cover do Iron Maiden. O Chiquinho é muito mais músico que eu, e estou falando sério. Estudou guitarra e violão, é exímio guitarrista, contrabaixista também, toca piano de ouvido, tem ouvido absoluto. Em breve vai se apresentar com sua nova banda, ainda sem nome, mas nem a mãe dele pode assistir. Parece que o show é num local proibido para maiores de dezoito anos. Da família só quem vai sou eu, como vocalista convidado. Devemos tocar “Jorge Maravilha”, aquela do “você não gosta de mim, mas sua filha gosta”.
Você mora sozinho. Como foi essa transição, após tantos anos casado e com filhos em casa?
Já nasci cercado de muita gente, família grande. Casei moço, tive três filhas, e logo elas foram enchendo a casa com um monte de amigas e namorados. Era uma grande animação. Por isso, quando fui morar sozinho, pensei que fosse estranhar. Mas também é bom, é como um silêncio depois de muita música.
No vídeo sobre a internet postado no site do seu disco, você fala que um cara diz: “Olha o que a bebida faz com a pessoa”. E aí você menciona que nem bebe mais. De onde veio essa decisão?
Parece mentira, né? [risos] Parei de tomar destilados há muito tempo. Mas já falei sobre isso. Falei até que tinha um bruxo que me deu umas ervas e enjoei de uísque. Minha bebida era o uísque – e nem vodca mais eu conseguia tomar. Fiquei tomando vinho, mas isso tem 20 anos.
Há uma associação forte da sua imagem nos anos 70, pré-politicamente correto, de entrevistas para a TV com um uísque na mão.
Com um copo e com um cigarro, um em cada mão.
Por isso você brincou: “Parece mentira”. Talvez venha daí essa desconfiança.
É, não havia essa preocupação. Realmente, eu não vou falar de mim, mas agora tem muito essa história. Por exemplo, a Amy Winehouse. Aparece na Veja: “A cantora drogada Amy Winehouse vai gravar um disco...” Virou uma coisa absurda. A foto do Vinicius [de Moraes] na Livraria da Travessa: adulteraram. Tiraram não lembro se foi o copo ou o cigarro, acho que foi o copo. E ficou aquela mão-boba, sem o copo. Fizeram um Photoshop para não dar mau exemplo. E a gente bebia e fumava em cena, fazia parte da mise-en-scène: Vinicius sentado com aquela garrafa. Era normal, a gente ficava meio altinho. Hoje, puta que pariu... [risos] Se tivesse paparazzi naquela época... Além de paparazzi de foto, agora também tem ouvido paparazzo. Você está sentado num restaurante e tem o cara ali ao lado, o paparazzo orelhudo. No dia seguinte está na rede: “Fulano falou isso e aquilo”. E os jogadores de futebol não podem tomar saquê porque vai a imprensa lá: “O jogador tomou 20 saquês”. Isso acho chato, essa fiscalização moralista da vida dos outros. Bom, vou deixar de ir à praia, mas outras coisas não vou deixar de fazer. O meu vinho vou tomar, o meu cigarro vou fumar. Também fumo – pouco, mas fumo – e não vou deixar de tomar o meu vinho e fumar porque tem um cara que vai dizer que você se embebeda e está destroçando os seus pulmões e tal, que você vai morrer e é benfeito.
Há um debate quanto ao surgimento de radicais, o que faz parte de se viver em uma democracia. Uma polêmica recente foi sobre o “Dia do Orgulho Hétero”. Como manter o debate saudável? Radicais surgem de todos os lados...Já surgiram. Na verdade, um projeto como esse que foi votado pela Câmara Municipal de São Paulo é a serviço e a reboque dessas manifestações que tem a toda hora: dos skinheads, que justificam bater em gays ou em supostos gays – um pai abraçando um filho toma porrada. Eles têm liberdade de se manifestar e vão se manifestar no Dia do Orgulho Hétero, que a Câmara fez o favor de criar. Não há o que fazer, numa democracia não se pode impedir nada. Nem que o norueguês junte os seus armamentos e saia matando. Não se pode proibir a veiculação de ideias, nem aquelas nas quais ele se baseou.
É um debate amplo. Vão continuar a questionar se a internet não deveria ser controlada.
Eu não acho [que deveria ser controlada], e até acho que quando vejo essas coisas na internet é interessante para se ter uma ideia do país em que você vive. Porque há muita mentira, muita hipocrisia com relação a racismo, em relação à tolerância de diferenças, aos homossexuais e tudo mais. Ninguém quer dizer que é racista. Há pesquisas nesse sentido. Isso foi feito em São Paulo já faz algum tempo e não me lembro dos números. Pessoas que se declaravam racistas: 1%. Pessoas que conheciam racistas: 99%! Tem alguma coisa errada aí [risos]. Então, você tem mais ou menos a temperatura do país em que vive, da sociedade em que vive, deixando, abrindo para esse tipo de manifestação. É crime explicitar o racismo, não pode chamar “o negro não sei quê”. Mas o cara que faz isso anonimamente na internet, de certa forma, está te dando uma ideia de como a questão é vista no Brasil. O problema do racismo é absurdo. E é mais absurdo ainda sendo o Brasil o que é: uma sociedade miscigenada. O racismo é uma espécie de autorracismo.
Em outro vídeo, você falou: “Desde pequeno eu tinha impressão de que um dia eu ficaria velho. E fiquei”. Sempre teve essa expectativa? [Risos] Eu desconfiava de que um dia ficaria velho... Porque tem pessoas que não desconfiam. Acham que nunca serão velhos, como acham que nunca foram pretos.
Mas não é um problema para você? No disco tem uma música sobre isso, “Barafunda”. Eu lido muito bem com isso, inclusive porque eu nem acredito que seja velho [gargalhadas]! Nem acredito que vá ficar velho um dia. Então eu dou risada. Outro dia, descobri que fiquei mais velho que o Vinicius de Moraes. Daí eu estava jogando futebol e tinha um garoto de 20 anos, que me deu um carrinho com campo molhado. Me acertou o tornozelo. Fiquei puto: “Moleque de merda!” E daí a pouco fiquei orgulhosíssimo: ninguém daria um carrinho desses no Vinicius. Ninguém [gargalha]! Nem no Tom [Jobim]. O Tom se foi com a minha idade, 67.
Neste mês completam-se 45 anos do II Festival da Música Popular Brasileira, que teve “A Banda” e “Disparada” como vencedoras. Hoje, sabe-se que a sua música ganhou na votação, mas você exigiu o empate. O que aconteceu? [Risos] Acho que metade foi generosidade e metade foi medo. Ganhar aquilo sozinho ia ser difícil, porque ali estava rachado... E, quando digo generosidade, não estou brincando. Eu realmente achava que “Disparada” era uma música superior a “A Banda”. Eu gostava muito, tanto que, há pouco tempo, fui a São Paulo para um prêmio literário, o Jair Rodrigues cantou essa música e quase chorei. Eu não sou muito de chorar. É muito bonita.
Essa competição dos festivais chegou a virar algo não saudável? No fim dos anos 60, foi muito noticiado o desentendimento que você teria com o Caetano, quando ele gravou “Carolina”. Isso foi basicamente em 1967, quando surgiu o Tropicalismo. Eu fui eleito pelos teóricos do Tropicalismo, pelos jornalistas, como o adversário a ser abatido. Então realmente foi muito pesado, porque eu estava quase sozinho nessa história. E aquilo contaminou um pouquinho, a gente meio que se afastou, mas não tanto por causa disso. Eu já morava no Rio, e o Gil e o Caetano, em São Paulo. Eles estavam andando em outro círculo. A gente se afastou até por questões geográficas e não houve muito tempo para se entender e conversar. Mas não foi nada pessoal, nenhum ataque pessoal do Caetano a mim e nem vice-versa. Do Gil também não.
Eles diziam que a sua música era conservadora. Na época, eu estava aprendendo a fazer música com o Tom Jobim, começando as minhas parcerias com ele. Estava preocupado com outras coisas. E fui eleito como alvo preferencial do Tropicalismo. Isso ficou rendendo muito tempo, esse Fla-Flu. Mas o fato de o Gil, o Caetano e o Milton estarem atuantes até hoje é, para mim, muito bom. Eu diria que, de certa forma, uma competitividade é saudável. Primeiro, eles são muito mais velhos do que eu, vão fazer 70 anos no ano que vem... [risos] Se eles estão compondo, gravando e cantando, não vou me acomodar. “Ah, também quero fazer!” Nesse sentido, é bom. Se o Caetano amanhã desistir de fazer música, vou ficar triste. E, ao mesmo tempo, vou dizer: “Ah, que preguiça, vou parar também”. Nesse sentido, pode existir um estímulo que vem da competição, do espírito competitivo. Se bem que o Caetano é mais competitivo do que eu. Outro dia ele viu uma foto minha, ficou com inveja da minha barriga e está criando uma maior do que a minha [risos].
Para encerrar: se eu perguntar quem é a pessoa musicalmente mais importante para você, qual é o primeiro nome que vem à cabeça? O Tom Jobim. Eu o situaria ao lado do João Gilberto, são os responsáveis pela minha formação. Tom foi um amigo, um parceiro com quem aprendi e de quem fui muito próximo. Vi ele compondo “Águas de Março”, ele tinha esse lado meio exibicionista. E o João foi a revelação, o ponto inicial.
http://rollingstone.com.br/edicao/edicao-61/entrevista-rs-chico-buarque

Nana Caymmi





Rodin, o artista que deu alma ao bronze

Auguste Rodin, o mais famoso escultor do final do século 19, morreu no dia 17 de novembro de 1917. Para o artista francês, a arte deveria materializar as emoções, os sentimentos e não só reproduzir uma realidade. Rodin sempre quis imprimir no bronze os diferentes estados da alma.


O Pensador, um ícone da arte mundial. Escultura retrata o poeta Dante Alighieri imerso na criação da Divina Comédia.
http://blogs.estadao.com.br/arquivo/2011/11/17/morre-rodin-o-artista-que-deu-alma-ao-bronze/

"A Pele Onde Eu Vivo" (La Piel Que Habito) - Crítica




  • A Pele Onde Eu Vivo



  • De: Pedro Almodóvar



  • Com: Antonio Banderas, Elena Anaya, Marisa Paredes, Jan Cornet



  • Género: Drama, Thriller



  • Classificacao: M/16




  • Crítica Ípsilon por:

    Jorge Mourinha

    O “novo Almodóvar” não é o “Almodóvar do costume”; antes um exercício formalista ao qual falta a personalidade que nos habituámos a esperar do cineasta. E isso é bom e mau É “o novo Almodóvar” como se fala hoje do “novo Spielberg” ou do “novo Moretti”, ou se falou em tempos do “novo Chabrol” ou do “novo Truffaut” - e não há muitos cineastas europeus contemporâneos de quem se possa dizer que têm uma marca reconhecida pelo grande público. O problema é que a “marca Almodóvar” já implica expectativas de um determinado tipo de filme, cristalizado por um lado nos delírios garridos da fase “Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos”. “Ata-me” e por outro na improvável sequência de obras-primas “Tudo Sobre a Minha Mãe”/“Fala com Ela”/“Má Educação”. Ora, o “cineasta Almodóvar” está claramente a querer fugir do “colete de forças” em que se deixou encerrar: é isso que explica “A Pele Onde Eu Vivo”, obra malsã e formalista que faz a “ponte” entre o seu cinema mais subversivo dos anos 1980 e o requinte classicista que o tornou num superior autor de melodramas modernos. Este é um filme simultaneamente notável e falhado, exercício de estilo grandiosamente vão que sintetiza toda a carreira de Almodóvar; não se sente o “piloto automático” dos anteriores “Voltar” e “Abraços Desfeitos”, antes um desafio que o cineasta colocou a si próprio - levar aos limites do desconfortável as convenções do cinema de género sem nunca trair o estilo sedutor e elegante que tem vindo a aperfeiçoar. Trata-se, no fundo, de uma história gótica, policial paredes-meias com o filme de terror, sobre a relação mista de ódio e desejo entre uma misteriosa cativa e o cirurgião recluso que a mantém prisioneira, que viremos a descobrir ser o resultado de uma vingança Frankensteiniana. A presença de um inquietante Antonio Banderas no papel principal remete inevitavelmente para os seus primeiros filmes e sobretudo para “Matador”, obra que, no seu jogo de pulsões entre a morte e o desejo, entre o crime e o amor, antecipava “A Pele Onde Eu Vivo” de 25 anos. E, tal como então, Almodóvar não está aqui grandemente preocupado se o público o seguirá ou não - apesar de estar claramente inscrito na sua obra e nas suas temáticas habituais, este não é um filme “de carreira”, antes uma espécie de “linha na areia” para lá da qual nem todos o seguirão. Isso é bom: somado ao requinte quase sem esforço com que o realizador tece uma elegantíssima teia de sedução cinéfila, evocando Hitchcock e Cronenberg a par das belas-artes (de Louise Bourgeois a Gustave Courbet) e brincando habilmente com as referências aos seus próprios filmes, sugere-nos aqui um cineasta livre e suficientemente confiante para experimentar a seu bel prazer. Mas esse formalismo sedutor acaba por também por criar um esquizofrénico efeito de ostentação que, paradoxalmente, anula toda e qualquer emoção. O cinema de Almodóvar ganhou-se sempre no histrionismo hispânico que injectava uma personalidade nas convenções de género; aqui, essa identidade (que está no próprio centro da trama) dilui-se e afoga-se no formalismo fascinado do corpo mutante, como se o dr. Ledgard de Banderas fosse um alter ego de Almodóvar, tornando “A Pele Onde Eu Vivo” num filme admiravelmente gélido, glacial, mordido por um vampiro que lhe tivesse sugado todo o sangue. O que daqui resulta é inevitavelmente espantoso: um filme-súmula onde Almodóvar colocou tudo o que o fascina - à excepção da alma que o tornaria de objecto-”puzzle” em obra-prima para juntar aos seus clássicos. O “novo Almodóvar” não é o “Almodóvar do costume”, e ainda bem, mas se há grande cinema em “A Pele Onde Eu Vivo”, isso por uma vez não chega para fazer um grande filme. http://ipsilon.publico.pt/Cinema/filme.aspx?id=295514

     

    Bartoon


    http://www.publico.pt/

    O nada

    "O Nada é a palavra que mais assusta o comum das gentes. Mas, para exorcizá-lo ninguém precisa ir aos padres, às mães-pretas, aos índios velhos, ao diabo: basta ir a um dicionário e verá que o nada não existe. Sim, é uma coisa tão absurda como a existência do mundo."

    "Na volta da esquina", de Mario Quintana, ed. Globo, 1979, pág. 89-90

    pôr-do-sol em Marte (NASA's Mars Exploration Rover Spirit)

    o nada está em tudo
    em cada tic
    em cada tac
    o nada enche copos
    enche sacos
    enche vidas
    até o obrigado é de nada
    e daqui há bilhões de anos
    quando o sol explodir
    o que vai ser de todo esse NADA?
    (e ainda resta tanto a ser dito sobre o nada...)
    

    Falcão - Entrevista




     

    por James Martins


    Fotos: Alessandra Benini / BN


    JM: - E voltando a falar em política, na sua opinião quem é o político mais corrupto da História do Brasil?

    Falcão: - Vixe! Vamos ver: Antonio Carlos Magalhães, Paulo Maluf, José Sarney e Jader Barbalho. Tem muitos, mas esses quatro são os recordistas.

    JM: - E qual setor da vida brasileira atual se encaixa mais na sua máxima de que “quanto pior melhor”?

    Falcão: - É a política mesmo.

    JM: - Uma das suas primeiras músicas prevê o tempo que, para se estar na moda, o cara vai ter que ser viado. Essa hora já chegou?

    Falcão: - Tá perto. Eu dei um prazo de 10 anos, já tá quase completando. Quem não for viado não vai ter moral em lugar nenhum. Não vai arrumar emprego. Nem a mulher do cara vai gostar dele (risos).

    JM: - E nessa hora rapaz, o que é que você vai fazer, vai começar a queimar o anel também?

    Falcão: - Eu não, porque não gosto de moda.

    JM: - Você já fez exame de próstata?

    Falcão: Ainda não, mas já estou me preparando pro dedo.

    JM: - Quando a minha hora chegar já vai ter uma tecnologia a laser, para eu não tomar a dedada (risos).

    Falcão: - Rapaz, eu acho sinceramente que eles já têm tecnologia pra isso, mas usam o dedo só de sacanagem mesmo (risos).



    Stanley Jordan toca em Praia do Forte


    por James Martins
    Stanley Jordan toca em Praia do Forte
    Stanley Jordan, um dos maiores guitarristas do mundo, não se faz rogado sempre que é convidado a tocar na Bahia. Especialmente em Praia do Forte. O músico se apresenta na inauguração do novo espaço cultural do Projeto Tamar, nesta sexta-feira (18), onde aproveita para também lançar o seu novo álbum 'Friends'. Em turnê mundial, o músico começa a tocar às 19h e os ingressos custam R$40 (inteira) e R$20 (meia). Jordan tocou pela última vez em Praia do Forte em dezembro de 2009, quando dividiu o palco com Armandinho. O norte americano chama a atenção de todos por onde passa pelo seu modo pessoal de fazer soar a guitarra elétrica, combinando técnicas de piano e elaborando releituras ultra-criativas de clássicos como 'Eleanor Rigby' (Beatles) e 'Bolero' (Ravel).


    confira...