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segunda-feira, 5 de agosto de 2013
Só a preguiça melhora o mundo
POR XICOSA
Depois da gula e da luxúria, o sagrado direito à preguiça, meu caro boa-praça Francisco.
Não a preguiça amorosa e sexual do homem-Ossanha, aquele que diz vai e não vai, pula fora, vacila e deixa a dama a chupar o frio chicabom da solidão.
Não a preguiça de outro tipo bem moderno, o MacunaEmo, o cara que tem a leseira do Macunaíma e a choradeira de um jovem roqueiro Emo.
Trato da preguiça bíblica e proveitosa.
A preguiça de uma sesta a dois, la vieja siesta espanhola, na rede ou na cama, com uns gatos ronronando na área.
A preguiça de um dengo debaixo das cobertas.
Uns cafunés também caem bem na avarandada tardinha.
Um preguiçoso e inconclusivo slow sexo de ladinho antes do desmaio no sono.
Palavra alguma, apenas sussurros, gemidos, onomatopeias da pura manha, periquitosos barulhinhos da existência.
Tim Maia como guia espiritual permanente: eu quero é sossego.
Dorival Caymmi como mestre de cerimônia.
O pantagruélico Ascenso Ferreira como Deus pai todo poderoso dos pecadores nos fornece o seu poema “Filosofia” como mandamento único:
“Hora de comer — comer!
Hora de dormir — dormir!
Hora de vadiar — vadiar!
Hora de trabalhar?
— Pernas pro ar que ninguém é de ferro!”
A preguiça, jovens da rueira rebeldia da hora, ainda é a melhor forma de combater o capital.
A preguiça, amigos da causa verde, ainda é a melhor forma de não poluir o planeta.
Sem se falar no ócio criativo, que só poderia ter sido inventado por alguém com o descansado nome de Domenico De Masi.
Ai que preguiça macunaímica. É o tipo de pecado que não dá trabalho, meu caro papa Francisco.
A preguiça melhora o trânsito e o ar que eu respiro.
A preguiça nos livra dos novos pecados capitais, santo bispo de Roma.
Só a preguiça melhora o homem, porque só um homem preguiçoso é um homem que não faz merda.
Todo preguiçoso é, por essência, um grande sujeito.
O canalha, por exemplo, é um propositivo nato, um homem atento, produtivo, inquieto, ligadaço, sempre a serviço de alguma corporação ou de interesses escusos.
Só a preguiça, meu caro Francisco, é capaz de melhorar o mundo.
http://xicosa.blogfolha.uol.com.br/
Cantar bem sem olhar a quem
POR XICOSA
Educação sentimental do homem.
Episódio de hoje: a cantada.
Sim, amigos, a cantada é como a revolução de Mao Tse-Tung, tem que ser permanente.
Existem mulheres que a gente canta no jardim da infância para dar o primeiro beijo lá pelos treze, quatorze.
Mas é necessário que a cante sempre, não aquela cantada localizada, neoliberal e objetiva, falo do flerte, do mimo, do regador que faz florescer, como numa canção brega, todos os adjetivos desse mundo.
A cantada de resultado, aquela imediata, é uma chatice, insuportável, se eu fosse mulher reagiria com um tapa de novela mexicana, daqueles que fazem plaft!
A boa cantada é a cantada permanente.
E mais importante ainda depois que rolam as coisas, depois que acontece, aí a cantada vira devoção, oração dos pobres moços a todas elas.
Porque cantar só para uma noitada de sexo é uma pobreza dos diabos, qualquer um animal o faz.
Porque cantar, à vera, é cantar todas e não cantar nenhuma ao mesmo tempo.
Explico: é espalhar pacientemente a devoção a todas as mulheres como quem espalha sementes nos campos de lírios.
Mesmo que elas digam, com aquele riso litografado na covinha do sorriso, que você diz isso para todas.
E claro que para cada uma dizemos uma loa, fazemos uma graça, não repetimos o texto, o lirismo, o floreado.
Porque amamos mesmo as mulheres.
Cantemos indiscriminadamente, e que me perdoe o velho e bom Vinícius de Moraes, mas cantemos sobretudo as ditas feias, esse conceito cruel e abstrato de beleza. Elas merecem, até porque as feias não existem, nunca conheci nenhuma até hoje.
Não por sermos generosos, piedade, ou algo do gênero… É que a dita feia, quando bem cantada, vira a superfêmea, para lembrar a bela pornochanchada com a Vera Fischer.
A cantada permanente e indiscriminada é irresistível, quando você menos espera, acontece o que você tanto sonhava.
Sim, tem que ter o cuidado para não ser simplesmente um chato que baba diante do melhor dos espetáculos, a existência das mulheres.
Ter que cantar sempre a mesma mulher e parecer que está apenas de passagem, que o estribilho é sempre novo, nada de larararás que mais parecem refrões do Sullivan e do Massadas, lembram dessa dupla de músicas chicletosas?
Ah, digamos que você cantou a Sônia Braga ainda naqueles tempos em que Gabriela subiu com aquele vestidinho no telhado –a cena mais quente da teledramaturgia brasileira até hoje- e e continuou cantando, sempre, sutil e sempre, e agora ela, passados tantos calendários, se comove e resolve recompensá-lo!
Vai ser lindo do mesmo jeito, não acha? Na tela do nosso cocoruto vai passar o videotape de todos os desejos antigos e despejados no ralo pela morena cravo & canela.
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