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sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Canjica + Canela + Casa de mainha!



Alguém curte?
 
ingredientes
  • 10 espigas de milho
  • 200ml de leite de coco
  • 1 collher (sopa) de manteiga
  • 1 xícara de açúcar
  • 1 pitada de sal
  • 2 copos de 200ml de leite de vaca

modo de preparo

1º Passe o milho debulhado no liquidificador com 2 copos de leite.
2º Passe na peneira e leve ao fogo por 25 minutos, mexendo sempre.
3º Coloque o açúcar, o sal, a manteiga e mexa mais 25 minutos.
4º Coloque o leite de coco por último e deixe ferver por 5 minutos.
5º Despeje em um refratário e polvilhe canela em pó.

 

Folhetos de Cordel como suporte didático

Folhetos de Cordel contribuem para a melhoria do processo de ensino aprendizagem   


Segundo Maria Sidalina Gouveia, supervisora Pedagógica de Língua Portuguesa do Instituto Qualidade no Ensino (IQE), eles demonstram, com clareza, que os limites entre escrita e oralidade entre letrados e iletrados, estão muito além da possibilidade de decifração de um código gráfico.

 
Nos últimos anos, uma ampla quantidade de autores tem voltado seu olhar para a temática da utilização de múltiplas linguagens como suporte didático nos processos de ensino e de aprendizagem. Dito de outra forma, o uso de novos recursos e suportes didáticos, que subsidiam estratégias de ensino inovadoras e diferenciadas. A literatura de cordel é um veículo que permite as pessoas participar da vida do país, como debater a realidade, expressar suas necessidades e aspirações. Retratando tradições, costumes, lendas e acontecimentos; e, trazendo consigo todo um conjunto de manifestações artísticas e culturais.
Especialistas apontam que motivos não faltam para persuadir os professores, das várias disciplinas, a abordar os folhetos de cordel em sala de aula. Em primeiro lugar, por serem escritos em versos compostos segundo um padrão que favorece a realização de leituras em voz alta; segundo, por apresentarem as histórias e as notícias interpretadas de acordo com os valores compartilhados por seu público-alvo. “Também por retratarem a vida de personalidades, os feitos de cangaceiros, as espertezas de heróis e apresentarem adaptações de narrativas eruditas da literatura nacional e estrangeira, como Iracema, de José de Alencar, Romeu e Julieta, de Shakespeare. Não podemos nos esquecer, ainda, de que os folhetos possibilitam a promoção de debates, de dramatizações, de produção e análise de xilogravuras”, acrescentou Maria Sidalina Gouveia, supervisora Pedagógica de Língua Portuguesa do Instituto Qualidade no Ensino (IQE).
Segundo ela, os folhetos de cordel demonstram, com clareza, que os limites entre escrita e oralidade, entre letrados e iletrados, estão muito além da possibilidade de decifração de um código gráfico. “Parte do público tradicional dos folhetos é capaz de reconhecer as palavras escritas em romances eruditos, como os de Machado de Assis, porém essa habilidade não é suficiente para que apreciem o texto, ou seja, para que possam compreendê-lo em sua essência, mas a adaptação da mesma obra para o cordel é perfeitamente compreendida e estimada por esse e pelos demais públicos”, frisou.


Sidalina lembra ainda que é útil investir em uma abordagem comparativa entre os folhetos de diferentes autores e épocas e entre folhetos e outras obras literárias, sobretudo as que foram adaptadas para o cordel. “O intuito desse trabalho não é o de formar poetas, mas leitores, portanto, se a escola contribuir com essa formação, certamente estará cumprindo seu papel. Abrir a sala de aula para a literatura de cordel é uma importante conquista; há que se pensar de que modo efetivá-la tendo em vista a formação de leitores”, analisou a supervisora do IQE. Considerar essa literatura apenas ferramenta que pode contribuir para a assimilação de conteúdos das várias disciplinas escolares não possibilita, de acordo com a especialista, a construção de uma significativa experiência de leitura do gênero textual cordel.

Fonte: 180 graus.
Via: @onordeste
 

OBSESSÃO - CLARA NUNES


Antes tarde do que nunca

 

Por Joselia Aguiar | Para o Valor, de São Paulo

Silvia Costanti/Valor / Silvia Costanti/Valor
Maria Valéria, autora de "O Voo da Guará Vermelha", que teve mais de 20 mil exemplares vendidos aqui e edições em Portugal, Espanha e França: mais quatro romances já "prontos" na cabeça.

Aos 40 e tantos, Evandro Affonso Ferreira via a cada dia aparecer um calouro diferente procurando vaga em sua área numa agência de publicidade. Sofreu por aqueles dias um enfarte e, como promessa do pós-operatório, passou a se dedicar mais à leitura. Não só maduro demais, agora também com ponte de safena, perderia o emprego logo depois. Vender a biblioteca de 3 mil livros para conseguir dinheiro foi a ideia que lhe ocorreu. Alguém então lhe sugeriu aquilo que mudaria mais sua vida que a obstrução coronária: montar um sebo.
O dono gostava tanto de conversar sobre livros que o estabelecimento se tornou ponto de encontro de consagrados escritores. As reuniões, por animadas, se transferiram para um café de Pinheiros, em tardes de sábado que fizeram parte da história recente da literatura brasileira. Laços e desavenças datam desse período, assim como a publicação de novos autores entre São Paulo e Rio. Um desses estreantes acabaria por ser o próprio Ferreira, com "Grogotó", em 2000, aos 55. Debutante nas letras com a sorte de estar cercado de medalhões, teve um tipo de apadrinhamento graúdo que só novatos costumam despertar. Quem assinou a apresentação foi um experimentado crítico, o poeta e ensaísta José Paulo Paes (1926-2008).
"Na literatura, sou contemporâneo dessa meninada toda", diz, a dois anos de completar 70, sete livros publicados, escrevendo o oitavo. Sua maior ambição agora é vencer algum grande prêmio "para comprar a primeira quitinete". Como o talento para o comércio nunca foi igual àquele que o inclinava para literatura, vendeu sebo após sebo conforme ia falindo e nesse meio tempo teve de se mudar de casa por causa do divórcio. O cotidiano é espartano; de abundante, só o tempo dedicado à escrita.
A sequência de lançamentos mostra que não houve mais tempo a perder, a produção se dá num ritmo que nem sempre autores jovens conseguem manter. Os primeiros livros de Ferreira, de títulos onomatopeicos, surpreenderam pela invenção narrativa e vocabular. Surgia de fato uma voz com frescor: "Araã!" (2002), "Erefuê" (2004), "Zaratempô!" (2005) e "Catrâmbias!" (2006). Aquele que seria o sexto ele desistiu de publicar. Uma nova fase o levou a um intervalo um pouco maior de livros. Os dois recentes, menos heterodoxos, são emocionalmente mais densos, as perdas e a finitude em perspectiva, com títulos que, como diz, são "quase um miniconto": "Minha Mãe Se Matou sem Dizer Adeus" (2010) e "O Mendigo Que Sabia de Cor os Adágios de Erasmo de Rotterdam" (2012). Para concluir o próximo, "Nunca Houve Tanto Fim como Agora", escreve "toda hora, em qualquer lugar", quase sempre nos cafés de duas livrarias, para onde caminha pela manhã e à tarde. Os exercícios o fazem manter a agilidade, o prumo e a forma.
Para quem for reparar, os que iniciam sua trajetória na maturidade impressionam pela quantidade de ideias que põem no papel. Maria Valéria Rezende, de 71 e pouco mais de uma década de trajetória, tem hoje quatro romances "prontos" na cabeça, cada um com cerca de 70 páginas escritas. Já teve seu enfarte, durante uma Flip de que participou como convidada, em 2006, em meio a sucessos como "O Voo da Guará Vermelha", com mais de 20 mil exemplares vendidos por aqui, edições em Portugal, Espanha e França. O incidente a fez precavida. Quando surge uma ideia com a "voz narrativa" que lhe parece boa, passa noites sem dormir para colocar o que puder no papel: "Acabo o melhor que posso cada capítulo ou equivalente, para que sirvam para alguma coisa se eu bater as botas de repente". A vivacidade do pensamento nem sempre acompanha o ritmo das mãos com artrose. E a vista que já não funciona como antes a deixa cansada mais rapidamente. Ao fim de dois dias, está esgotada.
O mais surpreendente é que a necessidade de encontrar mais tempo não se deve tanto à idade, mas à rotina atribulada que preserva até hoje. Educadora popular, Maria Valéria não para de atender a chamados para consultoria e palestras país adentro. Como a modesta aposentadoria não é suficiente para fechar as contas, reforça o orçamento com um ritmo de traduções diárias do francês, contratadas por uma de suas editoras. Tentou já se inscrever em bolsas de criação literária, mas há cláusulas que ora dificultam por sua idade, região - paulista, vive em João Pessoa (PB) - ou quantidade de livros já publicados - tem já dez, incluindo para o público infantojuvenil. Como diz, ninguém está pensando no "autor maduro de baixa renda".
Paula Giolito/Folhapress / Paula Giolito/Folhapress
Ferreira, que estreou aos 55: "Na literatura, sou contemporâneo dessa meninada toda", diz, a dois anos de completar 70, sete livros publicados, escrevendo o oitavo

As palavras de Gal que serviram à juventude dos tempos da militância, "é preciso estar atento e forte", calham nessa hora. "Quem estreia depois dos 50 anos tem de mostrar serviço duplo. Digamos que tem que aparecer como bom autor 'apesar' de não ser tão jovem", avalia um dos mais experientes analistas do mercado editorial, Felipe Lindoso. A hora decerto não ajuda: a busca por autor jovem cresceu recentemente. O episódio mais lembrado nesse movimento é a publicação da primeira antologia só de brasileiros da prestigiosa revista britânica "Granta", escolhidos apenas entre os que têm menos de 40 anos. Não há quem discorde de que há hoje certa sobrevalorização do autor jovem. "Acho importantíssimo que o campo literário se renove. Mas sinto que, às vezes, a imprensa e a crítica descuidam do exame da carreira de alguns autores mais experientes", observa Lindoso.
Idades à parte, a grande dificuldade a afetar autores é publicar o primeiro livro, observa Maria José Silveira, que dirigiu, com Lindoso e Marcio de Souza, a editora Marco Zero, aberta em 1980. "Depois, é talento, trabalho e, talvez o principal, muita sorte." A experiência não é só do lado de quem edita. Maria José foi uma das que estrearam na ficção na maturidade. Tinha mais de 50. Até então, pensava que a editora seria um atalho para o caminho que desejava seguir, manter um pequeno negócio exigiria, porém, dedicação exclusiva. "Só comecei a escrever, realmente, quando a editora caiu em outras mãos. E quem se dedica a escrever com gosto, como é meu caso, necessariamente produz." Em uma década de trajetória, publicou seis romances - o sexto, que acaba de sair, é "Pauliceia de Mil Nomes" -, cerca de 17 livros infantojuvenis, duas peças de teatro encenadas, e crônicas escritas quinzenalmente para "O Popular", jornal de Goiânia.
A atual e relativa efervescência do mercado de ficção nacional contrasta com um período anterior de quase inércia. Como lembra Luciana Villas-Boas, que dirigiu o departamento editorial do grupo Record por 17 anos e hoje atua como agente literária baseada no Rio e em Nova York, nas décadas de inflação galopante a literatura nacional foi de certo modo esquecida pelos editores brasileiros: "Toda uma geração de autores nascida entre o pós-guerra e os anos 70 praticamente não encontrou canais editoriais para se expressar". O mesmo relata Lucia Riff, dona da maior agência literária em atuação no país há mais de duas décadas. Os que têm entre 50 e 70 hoje foram os que encontraram mais dificuldades para publicar, comenta: "Justamente a turma que tem hoje essa idade pegou uma fase do mercado em que tudo estava complicadíssimo. É claro que muita gente bacana conseguiu furar as dificuldades e fez sucesso, mas as dificuldades foram infinitamente maiores".
Desse tempo em que publicar era mais difícil se recorda Ivana Arruda Leite, de 61, autora de, entre outros, "Falo de Mulher". Escreve desde os 14 e não adiou a estreia porque quis. As editoras pouco se abriam; quando se abriam, não ajudavam muito a repercutir autores novos. A virada se dá quando, ali pelos 50, é incluída numa famosa antologia preparada por Nelson de Oliveira, que conheceu nos encontros que surgiram em torno do sebo de Ferreira. Entre uma maioria na casa dos 30, dizia, para brincar, que era "a mais velha da 'geração 90'". Com outro "habitué" dos cafés, o escritor e agitador cultural Marcelino Freire, teve ajuda para que sua obra alcançasse uma editora. Foi por aqueles dias que nasceu o blog Doidivana, que a tornaria popular na internet, território em que predominam jovens.
A idade não limita, antes amplia: tanto a adolescência quanto a madureza servem de temas. Dois exemplos. Em 2003, Ivana publicou "Confidencial - Anotações Secretas de Uma Adolescente". Em 2011, organizou uma antologia com autores que, como ela, estavam prestes a completar 60 anos, a "60 Tão".
A procura pelos jovens não é tanto no mercado brasileiro. Ocorre mais lá fora, concordam as agentes literárias ouvidas pelo Valor. "É claro que em qualquer lugar do mundo o autor jovem é bem-vindo porque significa que, uma vez tendo uma estreia literária bem-sucedida, supostamente dará a sua editora muitos outros títulos capazes de atrair os leitores", explica Luciana Villas-Boas. "Nos últimos anos, essa expectativa tem sido relativizada porque os laços entre autor e editora se enfraqueceram." Dos autores que atende, os mais bem-sucedidos lá fora estão coincidentemente na ponta oposta. Francisco Azevedo, de "O Arroz de Palma", e Edney Silvestre, de "Se Eu Fechar os Olhos Agora", estão ambos na faixa dos 60. "O que indica que, estando o editor diante de uma obra de evidente qualidade literária, a idade não chega a ser um impedimento."
Lucia Riff confirma: "Para venda no exterior, a idade do autor, infelizmente, tem sido levada em conta. Como se contrata pouco, os editores estrangeiros tendem a escolher, entre as boas opções, os autores mais jovens, até inéditos. Parece uma maluquice que se valorize tanto o autor de alto risco, mas é o que acontece". Em sua Agência Riff, tem autores de todas as idades, sem limite - um deles, Maria Valéria Rezende. "Confesso que tenho certa alergia a pensar em autores em termos de idade, de rótulo. Então é bom só porque é jovem? Ou é bom porque é da geração x ou y ou z?" Para equalizar diferenças a fim de abrir oportunidades em igual medida, a revista "Machado de Assis", editada pela Fundação Biblioteca Nacional como parte do esforço iniciado para divulgar a literatura brasileira no exterior, tem se preocupado com a diversidade de idade, de regiões e de gêneros, explica Lindoso, responsável pelo projeto.
Entre autores maduros em grande produção, há os que, tendo iniciado sua trajetória até relativamente jovens, parecem viver seu esplendor depois de certa idade. Zulmira Ribeiro Tavares, aos 83, tem quase ao mesmo tempo dois livros muito elogiados na praça, "Vesúvio", de poesia, "Região", de prosa. Não se deve no entanto pensar que há algum tipo de padrão. "O cuidado aqui é não transferir a exterioridade de uma categoria, a de juventude, para outras categorias, igualmente externas à literatura e à arte, como maturidade ou senilidade", pondera o crítico literário Alcir Pécora, professor da Unicamp, um dos que rejeitam antologias que usam idade como recorte. "Se é irrelevante a ideia de uma literatura de jovens, também o é a ideia de uma literatura de velhos ou de madurões. Acho que o talento ou, ao menos, o grande talento, é uma categoria radicalmente indeterminada: não tem a ver com idade, como não tem a ver com aparência física ou nacionalidade."



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Duas ou três coisas sobre os anos 80

Caio Fernando Abreu

Foto de Juca Martins

Não sei de onde veio essa mania de dividir o tempo em décadas. Como ele se tornasse mais compreensível e suportável assim organizadinho, disposto em prateleiras. Penso então que a gente quase sempre dá nome às coisas para perder o medo delas. Não sei se conseguimos. Mas sei que se eu falar anos 40 ou 50 ou 60 ou 70, imediatamente você monta uma colagem-painel na cabeça, onde cabem de Humphrey Bogart a Martha Rocha, de Crush a Aída Curi, Patricia Hearst e Sid Vicious, Chevrolet Impala e flower-power. Arbitrária ou não, a divisão funciona. Pelo menos para dar uma certa ilusão de disciplina ao caos.

Mas se eu falar anos-80, você pensa o quê? Tenho pensado duas ou três coisas sobre isso. Com a autoridade talvez apenas de estar dentro deles, em pleno centro vertiginoso e assustador da exata metade deles (junho, 85), perdido entre os 10 milhões de habitantes desta cada vez mais dura Sampa. E se adjetivo “vertiginoso & assustador” já estou dizendo senão três, pelo menos duas coisas sobre este tempo. Sinto muito: conto só com o que sinto e os meus sentidos captam.

Anda tudo muito triste. Engolimos a negação das diretas, aceitamos a meia-sola Tancredo Neves, devoramos a orgia fúnebre via Rede Globo. Órfãos, caímos nos braços de José Sarney. Que não escolhemos, mas tudo bem, cara: trata-se da “Nova República” anunciada pelas centenas de pombos que Fafá de Belém soltou por aí. Uma mágica: Fafá solta a pomba e, plim-plim!, a Nova República cai do céu como um maná, solucionando as secas, enchentes, inflação, fome, desemprego e solidão. Só que não aconteceu nada. Não só em relação a isso, mas a muito mais, tenho me perguntado assim: a face dos anos-80 não estará sendo esse indisfarçável furo na cartola de onde deveria ter saído um coelho?

Não quero falar de Podres Poderes. Há coisas mais graves no ar. São Paulo atualmente é uma cidade tomada pela paranoia do Aids. Pelo menos na faixa de gente-como-a-gente: essa parcela mínima e privilegiada da população que não só come e mora (coisa rara), como ainda por cima ainda lê, vai ao cinema, essas coisas. Conheço pessoas que não se tocam mais. O que é que se faz quando aquilo que era possibilidade de prazer – o toque, o beijo, o mergulho no corpo alheio capaz de nos livrar da sensação de finitude e incomunicabilidade – começa a se tornar possibilidade de horror? Quando o amor vira risco de contaminação. Pouco importa se entre homens e mulheres, entre homens e homens ou mulheres e mulheres. Os médicos acham importante desvincular a ideia da Aids da homossexualidade, sabia? E pouco importa também não saber ao certo de onde veio o vírus maldito. As hipóteses não atenuam o fato: a coisa existe. E mata. Pior ainda: estimula a níveis dementes o preconceito contra a mais castigada das minorias. Há qualquer coisa de nazismo no ar. Qualquer coisa de fogueiras medievais para queimar os feiticeiros. Lenha é que não falta.

Então, para nos distrairmos, há o pós. Pós-punk, pós-new wave, pós-moderno, pós-tudo, pós-pós. E há o new: new catolicismo, new-jovem-guarda, new puritanismo. Ninguém falou ainda no pré. Pré-qualquer-coisa. Anos-80 como pré cara a cara com a nossa perdição de micróbios doentes na costa frágil de um planetinha insignificante? Anda, sim, tudo muito triste. Tudo foi questionado, experimentado, negado, superado: a moda caiu de moda. O vazio e a involução tornam-se dolorosamente nítidos se a gente colocar lado a lado, por exemplo e ao acaso, Beatles e Menudos. Embora eu até possa concordar que a abobrinha seja uma saudável saída para the horror... the horror... Os fins de semana paulistanos têm sido pródigos em abobrinhas para os mais variados gostos, de amantes profissionais a rapazes com problemas por usarem óculos. Mas a gente não é hiena, certo?


Mas a lesão mais feia, mais feia que a ferida na perna do mendigo da esquina aqui de casa, corroendo por trás dos modelinhos Company ou Fiorucci é essa medonha suspeita de que de tanto pestear a natureza, o homem finalmente conseguiu tornar-se, ele mesmo, a própria peste. Daí, eu também ando muito triste. E sem entender quase nada.

Revista Domingo, Jornal do Brasil, 2 de junho de 1985
Atenção: A coluna de Caio F. no Caderno 2 do Estadão começou em 1986. Essa crônica pro JB é de antes disso