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sexta-feira, 15 de junho de 2012

Paul Conrad - More (Theme from Mondo Cane)

O Carlos Reichenbach era um daqueles caras ímpares

O Carlos Reichenbach era um daqueles caras ímpares (sem eufemismos). Cineasta, amante do cinema, da música, da literatura, dos papos que incluíam tudo isso, da política, da liberdade, dos detalhes da vida. Um utópico, inconformista, radical na beleza que esta palavra carrega e afirmava isso continuamente.
Seus filmes acima do “bom” e “ruim” expressavam suas idéias (isso não é pouco nesses tempos cujo as idéias são desvalorizadas, ficam a margem) e ocupavam lugar especial na filmografia Nacional. Atravessou mais de cinco décadas fazendo filmes de fato.
Filme Demência, Anjos do Arrabalde, Alma Corsária, Dois Córregos, os filmes da fase “boca do lixo”, como “Ilha dos Prazeres Proibidos, os curtas…Sua produção implicava em filmes e numa longa peregrinação de textos, entrevistas, palestras e papos sobre cinema, sobre a vida e as paixões que compunham a matéria prima dos seus filmes.
Gosto especialmente de Alma Corsária.
Lembro de uma palestra do Carlão nos anos 80 lá na Três Rios, ele relatou apaixonadamente suas andanças pelos cinemas, suas descobertas, sua relação com a cidade. O homem a obra, os diálogos apresentados de maneira simples. Falava de detalhes técnicos e da poesia do cinema, sem separar, integralmente. Um homem que pisava nas ruas. Desde então acompanhei tudo que pude sobre ele.
De vez em quando ele parecia aqui nas redes sociais e postava links de filmes de vários estilos e épocas, todos com a marca do seu gosto personalíssimo, verdadeiras aulas. Chamava estes posts de “socialismo”, não perdia a oportunidade de marcar seus atos, generoso.
A perda do Carlão é a típica perda irreparável, não dá pra construir, para inventar outro Carlão, nem no cinema. Sem mais metáforas esvaziadas (ele detestaria). Falta fará.




Carlos Reichenbach - Biografia -


14 de junho de 1945/2012 



Carlos Oscar Reichenbach Filho nasceu em Porto Alegre, em 14 de junho de 1945. Paulistano desde que aprendeu a andar, Carlão, como é conhecido no meio cinematográfico, foi um dos diretores mais expressivos do Cinema Marginal paulista em meados da década de 60, movimento também conhecido como Boca do Lixo ou "udigrudi", termo cunhado por Gláuber Rocha.

Espécie de dissidência do altamente politizado Cinema Novo, o "Cinema da Boca" sonhava com espaço para experimentação em produções de baixo custo que tivessem apelo popular e espelhassem a realidade do País, refutando as regras de produção e distribuição nos circuitos comerciais.

Com poucos recursos e muitas idéias, nasceram dessa fase criativa e transgressora do cinema nacional os célebres "O Bandido da Luz Vermelha" (1968), de Rogério Sganzerla, "A Margem" (1967), de Ozualdo Candeias, Bang Bang (1970), de Andrea Tonacci, As Libertinas (1969) de Reichenbach, Antonio Lima e João Callegaro, entre outros.

 




 Carlão durante a filmagem de Império do Desejo (1980)

(Foto: Conrado Sanches)

Descendente de uma família de gráficos e editores, Reichenbach integrou o primeiro curso de cinema de nível universitário no Brasil, a Escola Superior de Cinema São Luiz, o primeiro foco do cinema marginal em São Paulo, cidade que eternizou em diversos longas. Teve como mestres Roberto Santos, Anatol Rosenfeld, Paulo Emílio Salles Gomes, Mário Chamie, Décio Pignatari, e sobretudo, Luiz Sérgio Person, responsável pelo seu interesse em dirigir filmes.

A escola reunia o meio cinematográfico emergente de São Paulo, entre alunos, como João Callegaro, Ana Carolina, Paulo Rufino, e uma inquieta população flutuante, como Rogério Sganzerla, Jairo Ferreira, José Mojica Marins, Ozualdo Candeias, Fauzi Mansur, entre outros.

Reichenbach abandonou a São Luís com Callegaro e fundou, juntamente com o crítico mineiro Antonio Lima, a Xanadú Produções Cinematográficas, o berço do "cinema cafajeste", que encontra seu ápice em As Libertinas e O Bandido Da Luz Vermelha. Em 1971, Reichenbach torna-se sócio-gerente da Jota Filmes, produtora de filmes publicitários em São Paulo, onde escreveu, produziu, dirigiu e fotografou mais de 150 comerciais e filmes institucionais durante quatro anos.

Quando estava se preparando para uma agradável carreira de yuppie, Reichenbach jogou tudo para o alto para apostar na atividade de mais alto risco no cenário nacional: o cinema autoral. Produziu, escreveu, dirigiu, fez a fotografia e a trilha sonora de Lilian M., Relatório Confidencial (74), utilizando as sucatas dos cenários de sua empresa. Nessa trilha, Reichenbach escreveu e dirigiu cinco curtas-metragens, quatro episódios em longas e 12 longas metragens, acumulando diversos prêmios no Brasil e exterior.

Divide a atividade cinematográfica com as funções de crítico e ensaísta em diversas publicações, além de participar de cursos e palestras sobre o filme brasileiro no Brasil e exterior. Durante quatro anos, também lecionou como titular da cadeira de direção cinematográfica do curso de cinema e vídeo da Escola de Comunicações e Artes (ECA), da Universidade de São Paulo.

Cineasta, roteirista, professor, fotógrafo, crítico e ensaísta, mas principalmente um autor sintonizado com a realidade caótica de seu tempo, Reichenbach desenvolveu uma obra inconfundível, onde se destacam o já referido Lilian M. (1974), Amor, Palavra Prostituta (1981), O Império do Desejo (1980), Filme Demência (1985) , Anjos do Arrabalde (1987), e Alma Corsária ( 1994). Atualmente, divide a função de sócio-gerente na Dezenove Som e Imagens Produções com a produtora Sara Silveira. Em agosto, lançou no 27º Festival de Gramado seu 12º longa, Dois Córregos, uma reflexão sobre a herança deixada pelos anos de chumbo da política brasileira, com Beth Goulart, Carlos Alberto Ricelli e Ingra Liberato.

Carlos Reichenbach: Filmografia


http://www.terra.com.br/cinema/opiniao/






CARLOS REICHENBACH "Carlão", nos deixa órfãos

CARTAS DO REICHENBOMBER - Opus 44

Aula de Cinema
Se alguém perguntar hoje o que é o cinema, basta comprovar o truísmo de que uma imagem diz mais que muitas palavras ... imaginem, várias imagens! Isto é cinema!


A lição veio do mestre Mario Bava, que vivia dizendo só ter filmado "bosta de touro".

O "estrume" acima, foi copilado da coleção de fotos da belíssima Home Page de Bava:

http://members.tripod.com/mariobava/

Se o imaginário de Bava é merda, então Lang, Welles e Hitchcock que me perdoem; somos "Todos Porcos", diria Shohei Imamura.

Porque até agora nenhum festival nativo ainda não homenageou Bava com uma retrospectiva integral é uma incógnita que só o pedantismo caipira e o critério de resultados fáceis explica.

Fica aqui a ameaça: o Antônio Celso, da PanVision, topou. Florianópolis poderá sediar o Festival Internacional do Cinema Livre. Vem aí: Jack Hill, Jean-Marie Straub, Stephen Dwoskin, Richard Kern, Russ Meyer e, entre outros tantos criadores livres, Mario Bava, lógico.

Retrospectiva Bomber

A partir do dia 14 de Junho, o Museu da Imagem e Som, de São Paulo, estará realizando uma amostragem dos filmes deste escriba.

Infelizmente (ou não), não serão exibidos filmes que gosto muito como CORRIDA EM BUSCA DO AMOR (71), meu primeiro longa-metragem e meu verdadeiro aprendizado de cinema, o longa A ILHA DOS PRAZERES PROIBIDOS (78), o episódio A RAINHA DO FLIPERAMA (82) e o curta metragem SANGUE CORSÁRIO (79), porque, assim como outros filmes menos queridos, não possuem cópias disponíveis.

Do acervo a ser projetado, quase todos foram vistos em retrospectivas recentes em Brasília, São Paulo, Niterói e Porto Alegre. Os longas inclusos e o curta OLHAR E SENSAÇÃO me dão muito prazer em rever. Embora tenha um carinho especial por FILME DEMÊNCIA e IMPÉRIO DO DESEJO, gosto de todos (menos, obviamente, os que não nominei acima).

"Amor, Palavra Prostituta"

A novidade é a exibição exclusiva da versão integral de AMOR, PALAVRA PROSTITUTA (79-81), nunca projetado sem cortes comercialmente no Brasil. Este filme, que ficou dois anos retido na censura, só foi liberado com quatro minutos a menos; justamente os quatro minutos que davam sentido à obra toda.Trata-se de um melodrama social, onde os personagens praticam sexo o tempo todo, com desespero, e sem nenhum prazer. Nos quinze minutos finais, um intelectual desempregado cuida obsessivamente de uma adolescente recém-saída de um aborto clandestino mal realizado. O calvário da jovem plena de energia e o contato com o sangue menstrual que verte de seu interior, fazem o "herói" redescobrir um sentido para continuar vivo.

Filmado com negativo vencido e sistema cooperativado, AMOR, PALAVRA PROSTITUTA foi exibido integralmente em mais de vinte festivais internacionais e ganhou o prêmio CINEDECOUVERTES da Cinemateca Real de Bruxelas, que inclusive possui uma cópia completa em seu acervo. Por ironia, recebeu do júri francófono do evento uma menção especial "por apresentar um ponto de vista singular sobre a sociedade". Quem diria!

Durante a primeira projeção internacional, em Roterdã, Holanda, sai da sala de exibição nos minutos inicias para não ouvir as vaias que aquele filme duro, feio, impuro e seco ia receber na certa. Me escondi no bar do cinema, mas volta e meia ia até o bilheteiro saber quantas pessoas haviam saído. Ele me olhava perplexo e fazia um gesto negativo com a cabeça. No final, voltei à sala novamente, com dor no estômago, e com espanto descobri que as pessoas levavam muito tempo para levantar das suas poltronas, mesmo após as luzes se acenderem. E assim foi, daí para frente, em quase todas as exibições no exterior com exceção de Portugal onde o machismo é retumbante. Na terra mãe, os debates foram quentíssimos e quase acabavam em porrada. De um lado os nostálgicos da PIDE e de outro as feministas lusitanas, que são radicais até a medula.

No Brasil, é a primeira vez que AMOR, PALAVRA PROSTITUTA, será exibido publicamente sem cortes, embora em uma rara versão VHS. A outra única projeção integral por estas plagas, foi coincidentemente no próprio Museu da Imagem e Som de São Paulo, numa sessão fechada para o elenco, equipe e amigos.

Mostra "Cineasta do Mês" : Carlos Reichenbach

http://www.terra.com.br/cinema/opiniao/opus44.htm