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quinta-feira, 19 de abril de 2012

AMOR DE ÍNDIO - MARIA BETHÂNIA


SIM, TODO AMOR É SAGRADO!!!

AMOR DE ÍNDIO

(Beto Guedes/Ronaldo Bastos)


Tudo que move é sagrado
e remove as montanhas
com todo o cuidado, meu amor.
Enquanto a chama arder
todo dia te ver passar
tudo viver a teu lado
com arco da promessa
do azul pintado, pra durar.

Abelha fazendo o mel
vale o tempo que não voou
A estrela caiu do céu
O pedido que se pensou
O destino que se cumpriu
de sentir seu calor
e ser todo
Todo dia é de viver
para ser o que for
e ser tudo

Sim, todo amor é sagrado
e o fruto do trabalho
é mais que sagrado, meu amor.
A massa que faz o pão
vale a luz do teu suor
Lembra que o sono é sagrado
e alimenta de horizontes
o tempo acordado, de viver.

No inverno te proteger, no verão sair pra pescar
no outono te conheçer, primavera poder gostar
no estio me derreter
pra na chuva dançar e andar junto
O destino que se cumpriu
de sentir seu calor e ser tudo.

se deus quiser um dia quero ser indio

Viva o Índio



Índio Yanomami beijado por um beija-flor. “Foi um instante precioso. Tive muita ...sorte em estar com a máquina por perto. Neste dia eu e alguns repórteres da Alemanha conversávamos com os meninos da aldeia enquanto esperávamos o almoço. Perto de nós havia uma árvore cheia de beija-flores. Quando vi aquela cena simplesmente foquei e apertei o botão. Enquanto isso, os alemães saíram correndo para buscar a câmera e quando voltaram já era tarde demais.” Rosa Gauditano.

Rosa Gauditano
Há mais de dez anos fotografando índios, Rosa Gauditano conta que o interesse pelo assunto surgiu quando foi fazer a cobertura jornalística do Encontro de Altamira, no Pará. Desde então não parou mais de documentar o que chamamos genericamente de índios brasileiros, mas que na verdade são mais de duzentas etnias falando cerca de cento e setenta línguas diferentes.
Seu trabalho foge do folclórico ou do turístico, penetrando no dia-a-dia das tribos com uma intimidade facilmente mostrada nos olhares símpáticos e confiantes com que os modelos brindam suas lentes. As fotos de Rosa Gauditano transmitem um respeito e um orgulho que a realidade brasileira insiste em negar aos índios, seja através do paternalismo estatal ou da exploração econômica. O índio aqui retratado não é o ideal romântico dos autores nacionalistas nem o chamariz folclórico do turismo interno e externo. O que vemos são pessoas normais, com hábitos culturais diferentes, mas certamente tão humanos como nós. O rapaz kayapó leva seu macaquinho às costas com a mesma naturalidade que um menino urbano carregaria seu gameboy.
Como diz Rosa Gauditano: "As populações indígenas têm muito a ensinar sobre os segredos da vida e da natureza do Brasil. Para que isso efetivamente ocorra, será preciso apoiá-los em sua luta pela sobrevivência e manter o espírito aberto para aprender com eles." — com Silvy Bertoja Fernandes.
 
Mundo mundo vasto mundo, mais vasto é meu coração.
 
 
 
 

Às entranhas - LUIZ FERNANDO VERISSIMO


 

A questão da liberação ou não do aborto é uma questão antiga como a tragédia grega. Em Antígona, escrita séculos antes de Cristo, Sófocles já tratou do que é, no fundo, o que se discute hoje, os limites da intervenção do estado na vida e nas crenças das pessoas. Antígona quer enterrar seu irmão, morto em guerra contra Tebas, e por isso condenado pelo rei de Tebas a permanecer insepulto. A peça é sobre o confronto de Antígona com o rei Creon, do sentimento com a lei, do indivíduo com o estado, do poder da compaixão e dos rituais familiares com o poder institucionalizado e prepotente. A lei de Tebas proíbe o sepultamento do irmão de Antígona, que se rebela e o enterra assim mesmo, com o sacrifício da própria vida. Em gerações ainda por vir o confronto de Antígona e Creon se repetirá. No caso do aborto, em países como o Brasil, em que a legislação a respeito ainda não foi modernizada, a intervenção do estado chega às entranhas da mulher. É a lei que decide o que a mulher deve fazer ou não fazer com o filho indesejado, ou que ameaça a sua vida. E esta é uma decisão que deveria acontecer o mais longe possível de qualquer consideração legal, no íntimo da mulher, que é dona do seu corpo e do seu destino. Nem é preciso lembrar que a legislação atrasada força mulheres a recorrer ao aborto clandestino, em condições precárias,com riscos que não existiriam no caso da legalização.

Discute-se quando começa a vida, o que equivale a fixar em que ponto o feto, de acordo com a lei, passa a ser protegido do estado. Mas do começo ao fim da gestação o feto faz parte do corpo da mulher. O ideal é o processo se completar sem interrupção, ninguém quer a banalização do aborto, mas até a criança ser “dada à luz” ela pertence à mulher, a quem cabe tomar decisões sobre sua vida tanto quanto sobre sua própria vida. O estado não tem nada a fazer neste arranjo particular, salvo assegurar as melhores condições possíveis para o parto ou para o aborto.



SEM SEPULTURA

A analogia com a peça de Sófocles também serve para o que se pretende com a investigação do que houve durante a repressão aos contestadores do regime militar. No caso a analogia é ainda mais apta, pois um dos objetivos da tal Comissão da Verdade é localizar os corpos dos insurgentes mortos, que permanecem não insepultos mas em covas desconhecidas, enterrados sem cerimônias ou identificação. Antígona quer que o estado devolva o corpo do seu irmão à família, para enterrá-lo. Ele não pertence mais ao estado, nem a quem o armou para atacar o estado. Não pertence mais à História. Agora é apenas um irmão morto sem uma sepultura digna.

 http://sergyovitro.blogspot.com.br/2012/04/as-entranhas-luiz-fernando-verissimo.html

Pequenas grandes efemérides - Ruy Castro

 

RIO DE JANEIRO - E dá-lhe de efemérides. Até agora, raro o dia de 2012 em que não me telefonam para perguntar sobre algo que está fazendo 30, 50 ou 100 anos -como se, a exemplo do falecido jornalista Bricio de Abreu, eu fosse uma testemunha ocular da história. Aliás, conheci Bricio, em 1967, na antiga Fiorentina, no Leme, e fiquei besta: não havia evento do século 20 que ele não tivesse presenciado -do recital do maxixe "Corta-Jaca" no Palácio do Catete, em 1914, aos beijos de Isadora Duncan em João do Rio, em 1915, e à primeira audição de "Dorinha, Meu Amor", em 1929. E olhe que, naquela noite, Bricio tinha pouco mais de 60 anos.

Mas há, sim, muito a comemorar em 2012. Só na literatura, são os 100 anos de Nelson Rodrigues, Jorge Amado, Lucio Cardoso. Na música popular, os de Luiz Gonzaga, Mario Lago, J. Cascata (coautor de "Lábios que Beijei"). Os do Santos e os da criação do futebol no Flamengo (que, até então, só tinha o remo), da tragédia do "Titanic" e da difusão, por Chiquinha Gonzaga, da palavra forrobodó -arrasta-pé, farra, confusão-, que acabou reduzida a forró.

São os 50 anos da Copa do Mundo no Chile. De "Garota de Ipanema", "Moon River", "Et Maintenant" e das marchinhas "Oba!", do Bafo da Onça, e "Segura a Chupeta", do Bola Preta. De filmes como "Os Cafajestes", em que Norma Bengell corria nua na praia, "Lawrence da Arábia" e "O Homem que Matou o Facínora". Da morte de Marilyn Monroe e, queira você ou não, são também os 50 anos dos Rolling Stones.

E são os 30 anos da Guerra das Malvinas. Da última seleção brasileira (a de Zico, Sócrates, Falcão). Da morte de Elis Regina. Da criação do Dia Internacional do Beijo. Da gravação, por Neuzinha Brizola, de seu grande hit "Mintchura". Do-

É bom parar. Desde então, as efemérides foram ficando cada vez mais efêmeras.
 
http://sergyovitro.blogspot.com.br/2012/04/ruy-castro-pequenas-grandes-efemerides.html
 

a simplicidade de um casal feliz - Danuza Leão

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Danuza Leão
(Foto: Nana Moraes)
 
Era um fim de tarde entre o Natal e o Ano Novo e caía uma chuva fininha que não dava trégua, como acontece no inverno de Paris. O Boulevard St. Germain estava todo iluminado e as vitrines eram uma verdadeira festa. Um casalzinho jovem parou diante de uma delas para olhar.
Era evidente que eles vinham de uma cidade pequena para passar o fim de ano em Paris. Todo mundo andava rápido para não se molhar, mas eles nem ligavam, tão embevecidos estavam com o que viam. Detalhe: a loja era de roupas e acessórios e na vitrine não havia o preço de nada.
Depois de conversarem muito tempo, baixinho, eles enfim entraram; entraram, veio a vendedora, a moça pediu para ver uma das echarpes e procurou um espelho para observar como ficava.
A vendedora foi junto e houve uma longa sessão em que foram mostradas as diversas formas de usar uma echarpe: fazendo duas voltas em torno do pescoço e deixando as pontas nas costas; dando um nó do lado e jogando uma ponta para a frente e a outra para trás; sobre a cabeça, cruzando na parte da frente do pescoço; enrolada na alça da bolsa; por dentro do casaco; e as mil outras que todas as mulheres já nascem sabendo – como ela. Mas eles deveriam estar de acordo, os dois, para que a compra fosse feita. Estava claro que eram casados fazia pouco tempo e se amavam.
Detalhe: em países ricos, como a França, a compra de uma echarpe é uma coisa banal e rápida – e aquela nem custava muito caro –, mas para o jovem casal, percebia-se, era uma transação importante. E uma mulher que ama não faz uma compra dessas sem saber a opinião do marido. A vendedora foi atender outro tipo de cliente, aquela que em um minuto decide se compra ou não; se sim, tira o cartão de crédito, paga e sai. Mas o casal tinha todo o tempo do mundo e trocava ideias sobre se devia ou não levar a echarpe. Afinal, estavam em Paris e provavelmente aquele seria o presente de viagem dele para ela.
A vendedora percebeu que devia deixá-los em paz e eles olharam a loja inteira – sempre com a echarpe na mão. Ela voltou para a frente do espelho – com ele ao lado –, fez mais algumas experiências de como poderia usá-la, os dois se olharam e tomaram a decisão: iam comprar.
Procuraram a vendedora e ele – ele – disse que haviam resolvido. A echarpe foi embrulhada em papel de seda e colocada numa sacola de papel grosso, e não na costumeira sacola vermelha de tecido com o logotipo da loja, para ser protegida da chuva. A conta foi paga com cartão, e na hora de ir embora a moça perguntou baixinho à vendedora se não poderia botar dentro da sacola de papel a sacola de algodão vermelho para levar de recordação – o que foi feito.
Eles saíram debaixo da chuva, que caía um pouco mais forte, de mãos dadas, mais felizes do que se tivessem comprado o mais valioso diamante da mais luxuosa joalheria da cidade, e quem acompanhou tudo teve um pequeno aperto no coração e uma inexplicável e rápida vontade de chorar. Gente simples, ingênua e feliz às vezes provoca mesmo essas reações bobas.

Danuza Leão é cronista, autora de vários livros, entre os quais Fazendo as Malas (Cia. das Letras) e É Tudo Tão Simples (Agir)