“Se você se acostumar com a sua morte, ela não mete mais medo”
Por Claudio Leal
A fusão entre vida e ideias se manifestava em qualquer conversa do jornalista e ensaísta Luiz Carlos Maciel (1938–2017), o principal pensador da contracultura brasileira, morto no último 9 de dezembro, no Rio de Janeiro. “A rigor, só eu mesmo entendo meu pensamento abstrato; bem observada, a tentativa de comunicá-lo parece sempre fadada ao fracasso. Por outro lado, a minha vida concreta parece mais compreensível. Quando a conto, revelo o que aconteceu comigo”, ele advertiu no livro memorialístico As Quatro Estações (2001).
Maciel absorveu autores como Jean-Paul Sartre, Heidegger, Albert Camus, Norman O. Brown, Carlos Castaneda e Herbert Marcuse, sempre articulados para interpretar os nós da história e as utopias geracionais. Em 1959, enlaçou filósofos existencialistas e teatro do absurdo em seu primeiro livro, Samuel Beckett e a Solidão Humana, logo depois de dirigir Esperando Godot com o Teatro de Equipe, em Porto Alegre. Nos anos 60 e 70, refletiria sobre a presença do existencialismo na gênese da contracultura, mais próximo do estilo de vida do “existencialismo americano”, a partir das leituras de Norman Mailer e da literatura beat.
Um olho no repertório internacional, outro no brasileiro, pois tornou-se grande intérprete dos companheiros de viagem contracultural. Pensou a obra de Caetano Veloso — que este ano destacou seu ensaio sobre Verdade Tropicalno prefácio à segunda edição das memórias –, Gilberto Gil, Rogério Duarte, Zé Celso, Jorge Mautner e José Agrippino de Paula. Dialética da Violênciapermanece como uma das análises mais originais de Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha. Em 2016, empolgou-se com a autobiografia Entre Duas Fileiras, de Gerald Thomas, seu amigo e correspondente.
Alguns desses amigos e autores favoritos pintam neste depoimento sobre sua vida.
Em maio de 2015, o primeiro encontro para falar do recém-lançado O Sol da Liberdade (Ed. Vieira & Lent). Maciel estava cercado de gatos e dezenas de caixas de papelão, à espera da mudança de endereço no Leblon. Abandonava o apartamento onde morara por 30 anos em troca de outro menor, mais adequado às barras do desemprego, exposto dali a semanas num apelo por trabalho no Facebook.
O segundo encontro aconteceu na nova residência. “Acho que vai ser legal, estou a fim de falar”, avisou, perto de encerrar o tratamento de uma pneumonia. Havia cores fortes em suas palavras. Selamos as duas sessões de seu depoimento sobre filosofia, contracultura, tropicalismo, teatro, Pasquim, sexo (e drogas), jazz, morte e história.
*Leia a magnifica e longa entrevista aqui:
https://medium.com/revista-bravo/o-ser-e-o-tempo-de-maciel-4d6f8dd0b76c
https://medium.com/revista-bravo