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sexta-feira, 22 de agosto de 2014

É FOME DE AMOR

Gourmetizaram o brigadeiro, a farofa, o churrasco e até a coxinha. Estão querendo fazer isso com o amor - encher de firulas, deixá-lo mais inacessível e intimista. Comida bonita enche os olhos, não a barriga. E no meio de tantas metáforas culinárias, só me resta dizer que a fome é de amor, puro e simples.


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Resolvi quebrar o meu jejum para falar sobre a fome que tenho sentido nos últimos dias: Fome de amor. E quando falo de amor, não digo só amor entre homem e mulher, mulher e mulher, homem e homem. Falo de amor entre as pessoas, que está cada vez mais em falta no cardápio. Veja bem: o sexo é servido em prato cheio. É ofertado em lindas fotos e descrições bacanas no Tinder, em conversar despretensiosas no Snapchat, em flertadas no Whatssap ou em fotos de biquíni no Facebook. O sexo é um prato delicioso, mas é um fast-food: ótimo como um Burger King no almoço de uma terça-feira ou prático como um pão com ovo na preguiça de domingo. Você come, lambe os dedos, e só.
Amor é o arroz com feijão. O macarrão com carne moída. Simples, delicioso e sustenta. Mas nesse mundo de comidas elaboradas, ele está ficando fora de moda. Brega. Afinal, arroz com feijão é um nome tão simples no meio de um monte de pratos gourmet, não é mesmo? Pra que carne-moída se posso ter filet mingon ao molho madeira, que é muito mais gostoso? É bom, mas não mata a fome. Não se come todo dia. Caro, e não sustenta por muito tempo: logo já estamos com fome novamente. Mas lá vamos nós atacarmos outros pratos gourmet com nomes difíceis e aparências que enchem os olhos, mas não o coração.
O coração tem fome. Não só o meu, o teu também. Mas não paramos com essa mania de querer complicar as coisas simples. Até o macarrão com carne moída tá virando petuccini à bolonhesa com aspargos do chile frito na manteiga aviação. Me diz, pra quê? Pra que complicar o que a gente sabe que é gostoso, simples, acessível? Parem de querer inventar pratos novos: pegam a receita simples que é o amor, colocam milhares de temperos e no final fica tudo amargo igual jiló. Amor é o brigadeiro comido direto da panela, não o docinho gourmet fresco que a gente só pode provar um por vez. E eu gosto de raspar a panela.
Pego um café todos os dias e abro os jornais: guerra, brigas, mortes e desgraça. Nas redes sociais, exibicionismo e lamúrias. Na rua, gente com o olhar vago e distante, outros passando os dedos rapidamente pelo smartphone escolhendo o próximo cardápio. Ao mesmo tempo que alguns grupos, famintos, insistem em campanhas de ‘mais amor por favor’, ‘abraços grátis’, ‘vida sem wi-fi’ e etc. Fome de amor, aliás, muita gente diz que tem. Milhares de pessoas. Mas o que vocês andam escolhendo para encher o estômago?
Não sei. Me sinto às vezes numa dieta forçada. Só queria oferecer para as pessoas que amo um pouco de arroz e feijão, mas acabo no Mc Donald’s sábado a noite. Não consigo entender qual o problema, nem sou especialista na culinária da vida, mas acho que precisamos simplificar as coisas. Menos pimenta e mais amor. Menos gourmet e mais panela. Menos sushi (por favor) e mais feijão. Não precisa mudar todo seu cardápio, mas experimente as coisas simples às vezes. Os domingos ficarão mais alegres, a barriga mais cheia e o coração, esse pobrezinho, menos vazio. Que fome.


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