A comunicação mediada por computador (CMC), usando instrumentos tais como correio elecrónico (e-mail), open virtual discussion groups (isto é, newsgroups), fóruns (geralmente referidos a grupos específicos ou restritos), real-time text correspondence (isto é, chat rooms), voice exchange (telephony), e face-to-face vídeo communications (videoconferencing), tornou-se uma rotina integrada na vida quotidiana da maior parte da população.
O objectivo do presente trabalho é referir as aplicações filosóficas usadas na Internet, especialmente a World Wide Web (WWW), e tentar clarificá-las, à luz do conceito clássico de que cabe ao filósofo profissional zelar pela cultura ocidental e pela saúde da humanidade (Husserl) num tempo indigente e ameaçado pelo terrorismo e pelas catástrofes naturais.
A Internet contém uma rica variedade de serviços filosóficos, dos quais destacamos:
1. Information Resources. Existem online muitas fontes de informação e bancos de dados sobre conceitos filosóficos e assuntos relacionados à filosofia. Estes recursos disponibilizados amigavelmente podem ser usados por todas as pessoas interessadas em aprender filosofia, nomeadamente pelos estudantes. Contudo, torna-se necessário aconselhar o uso honesto e ético desses recursos. Copiá-los e entregá-los aos professores como se fossem trabalhos de pesquisa original é desonesto e denuncia a falta de carácter e de dignidade daqueles que o fazem frequentemente, incluindo professores. As fontes devem ser devidamente referidas na bibliografia consultada e os seus autores citados.
2. Information about specific philosophical services. Numerosas agências, institutos, departamentos e serviços são promovidos através da website. Também eles fornecem informação e dados, mostram as áreas de pesquisa que estão a desenvolver e, por vezes, dão artigos e outros materiais de pesquisa e de ensino.
3. Revistas e editoras online. Existem muitíssimas revistas online editadas por editoras de prestígio (ELSEVIER, SPRINGER, BLACWELL, SAGE, TAYLOR & FRANCIS GROUP, PNAS, SCIENCE, NATURE) que possibilitam o acesso online a estudos sérios, embora mediante assinatura ou pagamento. Apesar disso, fornecem gratuitamente os abstracts e possibilitam a pesquisa, nomeadamente a elaboração de uma bibliografia. Já existem revistas de CyberPhilosophy e de CyberPsychology, para além das grandes revistas já clássicas de filosofia.
4. Pesquisa Interactiva. A Internet não só possibilita a pesquisa de informação, como também, ela própria, pode ser investigada. É neste nó górdio que a cyberfilosofia deve tomar corpo e forma: como um ramo autónomo da investigação filosófica que usa a Internet para estudar os cyberfenómenos, tais como cyberself, cyberspace, relações online, comunidades virtuais, infedilidades online, netadição ou cybersex, nas suas relações com a chamada vida real dos seus utentes. Esta cyberpesquisa pode adoptar várias abordagens e métodos de estudo, incluindo os métodos clássicos, tais como a fenomenologia, a hermenêutica, a lógica da argumentação, a epistemologia, a ética, a estética, a teoria crítica e tantos outros guias teóricos. Mas o desafio é infinitamente maior: Com a Internet a filosofia pode recuperar aquilo que lhe pertence por direito e que lhe foi burocraticamente sacado pelas pseudo-ciências sociais, que, em mais de cem anos, pariram um rato raquítico que faleceu à nascença.
Além disso, já existem na Internet self-help guides, philosophical testing and assessment, single-session philosophical advice through E-Mail or E-Bulletin Board, ongoing personal counseling, real-time counseling through chat, web telephony, and videoconferencing, synchronous and asynchronous support groups, discussion groups and group counseling. Todos estes últimos serviços devem ser substancialmente melhorados, monitorizados e mais utilizados no apoio do ensino da filosofia. A cyberfilosofia deve, pois, destacar a dimensão do ensino da filosofia, com a utilização de novas metodologias e de novas tecnologias, porquanto, de todas as disciplinas ditas sociais, a filosofia é a única capaz de garantir a continuidade da Civilização Ocidental e de contribuir para a formação auto-reflexiva do self.
Um aspecto interessante é constatar a enorme quantidade de não-ocidentais que, nos sites apropriados ou nos blogs, revelam grande apetência para aprender filosofia e estudar os nossos filósofos. A Internet deve ser também vista como o lar da filosofia, dado que, ao contrário da TV ou da Rádio, conjuga texto e imagem e fomenta o diálogo: os utentes da Internet não são meros receptores, os idiotas culturais de Garfinkel, mas fundamentalmente criadores que podem divulgar os seus pensamentos sérios, sem serem castrados por um sistema de filtragem medíocre.
A crise da palavra de que falava Steiner pode tornar-se coisa do passado, da era da televisão de massas: A Internet usa abundantemente a palavra e o texto e, nesse sentido, não pode ser acusada de embutir o espírito crítico e a reflexão. E, como meio da palavra que é, a Internet também pode tornar-se o veículo da democracia participativa e da cidadania responsável, contra as formas degradadas e corrompidas de democracia vigentes.
A Internet permite fazer oposição e formar uma nova inteligência internacional que diga: «Basta! Estamos cansados de tanta incompetência e de tanta corrupção. Queremos uma democracia real e aberta à participação de todos. Abaixo os luso-burricos!».
Também no domínio político e moral, porquanto não concebemos um sem o outro, tal como Sócrates, Platão e Aristóteles, a cyberfilosofia tem a palavra certa a dizer: a origem da cidade-Estado, da democracia e da filosofia coincidem (Jean-Pierre Vernant). Apesar da mediocridade geral dos professores de filosofia, a continuidade e sobretudo o aprofundamento do ensino da filosofia deve estar garantido, a menos que os luso-burricos queiram condenar os portugueses à condição de animais metabolicamente reduzidos e, assim, explorá-los como frangos de aviário. Se esta foi a política da educação do PSD, não devia ser a do PS. Cabe a José Sócrates decidir o tipo de país que deseja para as suas gentes. Mas nós queremos o melhor...
J FRANCISCO SARAIVA DE SOUSA
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