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sexta-feira, 30 de março de 2012

100% honesto

                 
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Suponha que você seja 100% honesto. Eu digo “suponha” porque suponho que você — assim como eu, Pedro e Barrabás — tenha lá seus pecadinhos. E pecado há de todos os calibres, meu irmão.
Em maior ou menor grau, eles estão encastoados no de-ene-á humano a solaparem idoneidade e afrontarem a ética, coisas bobas, aparentemente inofensivas, como: escolher rapidamente o pedaço mais carnudo do frango, antes que alguém da mesa o faça; fingir que um amigo guardava o seu lugar na fila e passar à frente de quem chegou mais cedo (cambada de trouxas!); sair do restaurante sem pagar um produto que você consumiu, mas não foi lançado na sua conta; estacionar o carrão na vaga para deficientes físicos, mesmo gozando de saúde impecável; comprar recibos falsos de um dentista que é primo do vizinho do seu amigo, pra abater no Imposto de Renda e enganar os carcarás da Receita; trapacear na prova, enganando o professor enquanto ele vai ao toalete, cheio de confiança (e a bexiga cheia); comprar uma dissertação na faculdade, ao invés de perder tempo estudando; não assinar a Carteira de Trabalho da empregada doméstica (aquela mocinha semianalfabeta que acabou de chegar do Norte); assediar, azucrinar a vida, mentir o tempo inteiro para uma mulher até conseguir fazer sexo com ela (daí, então, cair fora o mais rápido possível).
Até que alguém descubra os podres em nós, presume-se que sejamos todos honestos. Nestes dias em que denúncias cabeludas permeiam os noticiários, a própria presidente Dilma alertou que Orlando Silva (não o falecido seresteiro Orlando Silva, que cantava sucessos de Ataulfo Alves, como “Errei, erramos” e “Atire a primeira pedra”, mas o Ministro dos Esportes), frente às acusações de corrupção de que foi vítima, teria direito à Presunção de Inocência, como qualquer brasileiro. Putz! Será que até o pecê-dubê...
Quando eu era adolescente havia uma campanha de marketing no país denominada “Amar é...”, através da qual, frases melosas de amor foram utilizadas largamente em cadernos, agendas, cuecas, calcinhas, álbuns de figurinhas e embalagens de gomas de mascar. Lembro-me, como se fora hoje, de ter dito aos colegas de sala: “Amar é... transar com a professora Susi no banheiro do ginásio”. (Susi era nossa professora de Educação Física, linda, formosa, inalcançável e — melhor de tudo — tinha a língua levemente presa).
Não sei quem criou “Amar é...” (sei que não foi nem Deus, nem Moisés) e se o islougã continua vendendo hoje em dia. Com o tempo, perdi cabelos, o bom humor e um bocado de romantismo.
Então, esforçando-me para parecer inteligente (seguindo recomendações de um leitor militante do partido comunista, que postou mensagens no tuíter garantindo que eu era um escritor fraco e só escrevia besteiras), fiz uma analogia ao “Amar é...” (provavelmente, outra de minhas besteiras) para definir (presumir) o que fosse “fazer política no Brasil”.
“Fazer política é... teimar com a mãe e se candidatar a vereador”.
“Fazer política é... não apenas dormir com o inimigo, mas ser por ele sodomizado, e ainda por cima ter que dar tapinhas nas suas costas”.
“Fazer política é... um mal necessário”.
“Fazer política é... fazer o bem. Primeiro a sua família, é claro”.
“Fazer política é... exigir que, durante uma conversa reservada, seu interlocutor esvazie os bolsos e desligue o aparelho celular”.
“Fazer política é... colocar em dúvida a honra do seu adversário, por mais ilibado e probo que ele seja”.
“Fazer política é... conseguir tomar cafezinho com o sujeito que o difamou, ainda há pouco, no plenário da câmara”.
“Fazer política é... trair na hora certa”.
“Fazer política é... subtrair. Somar decepções”.
“Fazer política é... saber dar entrevistas à imprensa”.
“Fazer política é... exercitar o cinismo até convencer sua mãe que você presta”.
“Fazer política é... delatar um correligionário se ele esboçar sinal de fraqueza”.
“Fazer política é... convencer o policial federal que o uso de algemas é absolutamente desnecessário no seu caso”.
“Fazer política é... a arte de engolir sapos e evacuar porcos-espinhos. Há que se ter estômago de avestruz e ânus de elefante. Não tem jeito: precisa fazer parte da fauna”.
“Fazer política é... amar a Deus como se ama (e muito) a si mesmo”.
Para encerrar a minha crônica istendápi-cómedi (o meu surto rafinha-bastiano): eu, cidadão brasileiro, 98% honesto (presumivelmente), penso que fazer política no Brasil seja a arte de se relevar injúrias e difamações, ainda que elas sejam reais.
E antes que algum comunista mal humorado me coma como se eu fosse criancinha, declaro que, tal e qual a Dilma, eu também presumo seja o Ministro inocente. É. Eu também acredito no Landinho, camarada.

POR EM 21/10/2011

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