Humberto Braga
A igualdade social é um horizonte, portanto inatingível. Toda sociedade de estrutura complexa é organizada hierarquicamente. Não se trata de diferenças individuais e sim de inevitável estratificação social em dirigentes e dirigidos. O poder é sempre apanágio de uma minoria, isto é, de uma elite.
A História, como disse Pareto, é um cemitério de elites: o patriciado romano, o baronato feudal, a nobreza nas antigas monarquias etc. É certo que na história ocidental a desigualdade social se reduziu. Ela era maior entre senhores e escravos, na Antiguidade, do que entre barões e servos, na Idade Média, e, esta, maior do que a existente entre capitalistas e proletários, nos tempos modernos.
Nas sociedades de estrutura complexa, quando emergem os antagonismos de interesses entre os diversos segmentos que as compõem, existem, necessariamente, a direita e a esquerda. Escrevi, no passado, que a esquerda é um movimento e a direita é uma situação. Mas só é esquerdista o movimento que se propuser a combater desigualdades sociais.
O nazi-fascismo foi um grande movimento de direita, já que repudiava o próprio ideal de igualdade social. Tradicionalmente, a direita, elitista, é conservadora (manutenção do status quo) ou reacionária (retorno ao passado próximo). A esquerda pode ser revolucionária ou reformista.
Comunismo e nazi-fascismo foram modalidades extremadas de esquerda e direita. Mas, estas são legítimas e inevitáveis. Sempre existiram nas sociedades complexas. Essa oposição, pacífica ou violenta, foi um fator crucial na História.
Em Roma, Cesar estava à esquerda de Catão e de Cícero, preclaros defensores dos privilégios do patriciado. Todavia, pugnar pela redução ou abolição de uma determinada desigualdade social não implica pretender a implantação da igualdade. Cesar nunca propôs suprimir a escravidão, que era o meio de produção na sua época.
O programa econômico não é um dado seguro para distinguir essas orientações políticas. Na Revolução Social, os monarquistas (direita da época) sustentavam o controle da economia pelo Estado, enquanto os revolucionários (esquerda da época) pregavam a liberdade econômica.
Hoje a situação se modificou: é a direita que condena a intervenção do Estado na economia, ao passo que a esquerda reclama. Nem sempre há uma relação direta entre interesse econômico e posição política. O apoio decisivo aos nazistas não foi dado pelos grandes proprietários e sim pelas classes médias. Não me parece correto dizer que alguém é da direita ou da esquerda. Mais apropriado seria afirmar: A está à direita ou à esquerda de B. Assim, o critério é o de relação.
Realmente a oposição política é uma questão de configuração histórica. Conforme a conjuntura, as posições podem inverter-se: o esquerdista de ontem se transformar no direitista de hoje e vice-versa. Daí, alguns cépticos concluírem que a esquerda, no poder, tende a “endireitar-se”.
Mas, também, alguns governantes de ostensiva mentalidade direitista (apreço às elites, desprezo pelas massas, ordem muito acima da justiça) promoveram, objetivamente, mudanças esquerdistas. Exemplos: Napoleão, ao romper as relações feudais na Europa sob seu domínio, ou Bismarck, ao instituir a primeira legislação social do Ocidente.
No largo espectro da esquerda, o marxismo foi a mais elaborada e prestigiosa corrente ideologia. Surgiu no mundo industrial do século XIX como crítica do sistema capitalista. Na interpretação da História, o marxismo se baseia no materialismo filosófico: primado dos fatores objetivos (sociais e econômicos). Já a direita, de um modo geral, se inspira na filosofia idealista: predominância dos fatores subjetivos (ideais, crenças, ação dos grandes indivíduos, etc).
Marx previu uma sociedade sem classes e, portanto, sem conflitos sociais. Mas, a História não confirmou sua profecia. Toda sociedade complexa é inevitavelmente conflituosa. A democracia busca a resolução pacífica dos conflitos e nela a maioria ora pende para a direita, ora para a esquerda. A ditadura pretende abafar os antagonismos sociais pela força.
sexta-feira, 02 de março de 2012 | 14:09
A igualdade social é um horizonte, portanto inatingível. Toda sociedade de estrutura complexa é organizada hierarquicamente. Não se trata de diferenças individuais e sim de inevitável estratificação social em dirigentes e dirigidos. O poder é sempre apanágio de uma minoria, isto é, de uma elite.
A História, como disse Pareto, é um cemitério de elites: o patriciado romano, o baronato feudal, a nobreza nas antigas monarquias etc. É certo que na história ocidental a desigualdade social se reduziu. Ela era maior entre senhores e escravos, na Antiguidade, do que entre barões e servos, na Idade Média, e, esta, maior do que a existente entre capitalistas e proletários, nos tempos modernos.
Nas sociedades de estrutura complexa, quando emergem os antagonismos de interesses entre os diversos segmentos que as compõem, existem, necessariamente, a direita e a esquerda. Escrevi, no passado, que a esquerda é um movimento e a direita é uma situação. Mas só é esquerdista o movimento que se propuser a combater desigualdades sociais.
O nazi-fascismo foi um grande movimento de direita, já que repudiava o próprio ideal de igualdade social. Tradicionalmente, a direita, elitista, é conservadora (manutenção do status quo) ou reacionária (retorno ao passado próximo). A esquerda pode ser revolucionária ou reformista.
Comunismo e nazi-fascismo foram modalidades extremadas de esquerda e direita. Mas, estas são legítimas e inevitáveis. Sempre existiram nas sociedades complexas. Essa oposição, pacífica ou violenta, foi um fator crucial na História.
Em Roma, Cesar estava à esquerda de Catão e de Cícero, preclaros defensores dos privilégios do patriciado. Todavia, pugnar pela redução ou abolição de uma determinada desigualdade social não implica pretender a implantação da igualdade. Cesar nunca propôs suprimir a escravidão, que era o meio de produção na sua época.
O programa econômico não é um dado seguro para distinguir essas orientações políticas. Na Revolução Social, os monarquistas (direita da época) sustentavam o controle da economia pelo Estado, enquanto os revolucionários (esquerda da época) pregavam a liberdade econômica.
Hoje a situação se modificou: é a direita que condena a intervenção do Estado na economia, ao passo que a esquerda reclama. Nem sempre há uma relação direta entre interesse econômico e posição política. O apoio decisivo aos nazistas não foi dado pelos grandes proprietários e sim pelas classes médias. Não me parece correto dizer que alguém é da direita ou da esquerda. Mais apropriado seria afirmar: A está à direita ou à esquerda de B. Assim, o critério é o de relação.
Realmente a oposição política é uma questão de configuração histórica. Conforme a conjuntura, as posições podem inverter-se: o esquerdista de ontem se transformar no direitista de hoje e vice-versa. Daí, alguns cépticos concluírem que a esquerda, no poder, tende a “endireitar-se”.
Mas, também, alguns governantes de ostensiva mentalidade direitista (apreço às elites, desprezo pelas massas, ordem muito acima da justiça) promoveram, objetivamente, mudanças esquerdistas. Exemplos: Napoleão, ao romper as relações feudais na Europa sob seu domínio, ou Bismarck, ao instituir a primeira legislação social do Ocidente.
No largo espectro da esquerda, o marxismo foi a mais elaborada e prestigiosa corrente ideologia. Surgiu no mundo industrial do século XIX como crítica do sistema capitalista. Na interpretação da História, o marxismo se baseia no materialismo filosófico: primado dos fatores objetivos (sociais e econômicos). Já a direita, de um modo geral, se inspira na filosofia idealista: predominância dos fatores subjetivos (ideais, crenças, ação dos grandes indivíduos, etc).
Marx previu uma sociedade sem classes e, portanto, sem conflitos sociais. Mas, a História não confirmou sua profecia. Toda sociedade complexa é inevitavelmente conflituosa. A democracia busca a resolução pacífica dos conflitos e nela a maioria ora pende para a direita, ora para a esquerda. A ditadura pretende abafar os antagonismos sociais pela força.
Humberto Braga é conselheiro aposentado do TCE-RJ.
Bastante didático.
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