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segunda-feira, 11 de junho de 2012

Os bem-amados

 

postado por Nadja Vladi

10 de junho de 2012
 
Ronaldo Jacobina

Aos olhos de muita gente, datas comemorativas, como o 12 de junho – Dia dos Namorados –, nada mais são do que estratégias de marketing para alavancar as vendas. Que seja. Ainda que o homem (não estou falando do gênero, mas do indivíduo) venha se tornando cada vez menos romântico, raros são os apaixonados que não se rendem às verdadeiras histórias de amor. Especialmente se estas são daquelas parecidas com as que a literatura e o cinema consagraram. Pensando nisso, Muito elegeu quatro delas que bem dariam um romance ou um filme. São histórias como a dos escritores Jorge Amado e Zélia Gattai, que durou até a morte dos dois. Do artista plástico Calasans Neto e da professora Auta Rosa, que durou exatos 40 anos, dois meses, 26 dias e 12 horas e meia, nas contas dela. Ou os casos de amor dos empresários e colunáveis Regina e Buba Werckle e do casal Gilberto e Flora Gil. Que me perdoe a pieguice, mas o amor é lindo.
Foram longos 56 anos de vida em comum. Jorge Amado (10.8.1912 – 6.8.2001) e Zélia Gattai (2.7.1916 – 17.5.2008) se conheceram durante um congresso de literatura em São Paulo. A imigrante estava separada do primeiro marido e se encantou com o deputado comunista que, mais tarde, viraria escritor. A paixão foi instantânea, conforme revelou Zélia em muitas ocasiões. Inseparáveis, os dois tiveram dois filhos (Paloma e João Jorge) e viajaram o mundo juntos. “Eles formavam um casal normal. Brigavam, como todo mundo, divergiam, mas tinham um respeito muito grande entre eles. Mamãe era muito ciumenta. E papai tinha aquele jeito sedutor, então já viu, né?”, conta Paloma. Mas e o escritor? Paloma garante que ele também era ciumento, embora mais contido. “Mamãe era uma mulher linda, e ele percebia que ela chamava a atenção”. Segundo a filha, as divergências eram resolvidas rapidamente. “As brigas eram engraçadas porque sempre giravam em torno do ciúme de mamãe. E ele dava motivos, porque era muito assediado”. Paloma lembra, certa feita, estavam os dois no Pelourinho quando uma fã veio pedir para tirar uma foto com o escritor. “Como ele conhecia mamãe, tratou de chamá-la para posar junto, mas a moça queria fazer a foto sozinha com ele. O autor não se fez de rogado e deixou a mão “cair”, sobre a bunda da moça. Quando mamãe viu, tascou um beliscão na bunda dele”. Paloma lembra que, quando Jorge ficou doente, sem falar, sempre que Zélia passava, ele buscava sua mão e a beijava.

Que outra mulher teve o privilégio de ganhar, não uma, mas duas letras de pura poesia do cantor Gilberto Gil? Só mesmo a mãe de Bem (27), Isabela (24) e José (21), a empresária Flora Gil. Casada com o artista baiano desde 1980, Flora abraçou não apenas o casamento como a carreira do cantor, de que cuida com o mesmo carinho com que declara seu amor por ele. “É muito bom ser casada com Gil. Ele é um homem maravilhoso, inteligente, destacado no que faz, além de ser um poeta brilhante, um escritor talentoso e um marido especial”, devolve a apaixonada Flora para o compositor, que criou para ela, e somente para ela, a canção Flora (Imagino-te já idosa, frondosa toda a folhagem, multiplicada a ramagem, de agora…). Ainda não convencido de que apenas esse poema ilustraria sua paixão pela mulher, o compositor aproveitou uma noite insone, num quarto de hotel no exterior e, enquanto a amada dormia sob os lençóis, ele compôs para ela A linha e o linho (É a sua vida que eu quero bordar na minha/ Como se eu fosse o pano e você fosse a linha/ E a agulha do real nas mãos da fantasia/ Fosse bordando ponto a ponto nosso dia a dia/ E fosse aparecendo aos poucos nosso amor…). Passados 32 anos de convivência, Flora garante que o respeito que têm um pelo outro ajuda a manter vivo o amor. “Eu e Gil viemos de famílias estruturadas. Tivemos pais que se respeitaram muito, e é isso que faz a diferença no nosso casamento, respeitamos um ao outro, temos muito carinho e amizade, além de confiança e compreensão”, conta a musa do artista. Segundo ela, os dois formam um casal como outro qualquer, com ciúmes e muita intimidade. Ciúme? “Pouco. Todo casamento tem seus códigos”, diz sem revelar os do seu.

No próximo dia 2 de julho, os empresários Regina, 66, e Buba Werckle, 72, completam 50 anos de namoro. Quem está acostumado a ver os dois nas colunas sociais deve estar pensando que eles se conheceram numa festa do grand monde. Errou. Embora de famílias tradicionais – ela é descendente de sírios; ele, de alemães –, haviam ido assistir ao desfile do Dois de Julho no Campo Grande. Mas os dois, que já se conheciam do Rio Vermelho, onde suas famílias moravam, demoraram para se acertar de vez. “Eu tinha só 16 anos, era inexperiente, e ele, muito ciumento”, conta Regina. Após quatro anos de vaivém, acertaram-se. De lá para cá, são 46 anos de uma história de amor quase pública, já que, como ambos sempre estampam páginas de jornais e revistas, os baianos passaram a conhecê-los. Mas engana-se quem pensa que o casal é parceiro apenas na badalação. No dia a dia, estão sempre juntos. Ora cuidando cada um do próprio negócio (ela, na área de moda; ele, na de ótica), ora curtindo-se. “Todo final de tarde, nos encontramos aqui na loja e ficamos juntos até a hora de irmos para casa”, conta Regina. Mais tímido, Buba ressalta as qualidades da amada e diz que, se tivesse que escolher de novo uma companheira, esta seria Regina. “A vida a dois, a gente faz todos os dias”, ensina.

Os 42 anos, dois meses, 26 dias e 12 horas e meia que Auta Rosa, 79, conta como o tempo que durou a sua história de amor com o artista plástico Calasans Neto, o mestre Calá, não marcam o último dia de vida do amado. “A felicidade traz em si o estigma da eternidade. Fechei essa conta no dia em que percebi que a nossa festa havia acabado, que não poderíamos mais viver como vivíamos em função da gravidade da sua doença. Ali, tivemos a certeza de que o fim estava chegando”. Quem pensa que o depoimento da professora aposentada vem carregado de tristeza é porque não a conhece. “Enfrentamos nossa família para viver essa história de amor. A dele foi ruim conosco, mas a minha foi muito pior. Hoje, tenho a sensação de que vivemos intensamente o que tínhamos para viver. Sempre respeitando o jeito de ser um do outro. Calá foi a pessoa mais feliz que conheci. Se tivesse que voltar no tempo, casaria com ele de novo”. Vivendo na mesma casa onde morou com o artista, Auta Rosa nem de longe demonstra nostalgia ou solidão. “Eu achei ótimo ele ter vivido 73 anos fazendo tudo o que queria. Triste eu teria ficado se ele estivesse vivo, impossibilitado de viver como gostava: feliz”. O segredo do casamento feliz, segundo Auta Rosa, foi o companheirismo. “Nós conversávamos muito. Não conto as vezes que passamos a noite inteira de papo e, quando nos dávamos conta, o dia tinha amanhecido. O melhor presente que a vida me deu foi ter vivido com ele”.


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