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terça-feira, 4 de junho de 2013

Mãe não é tudo igual

Os filhos que o digam...

ISABEL CLEMENTE


Isabel Clemente é editora de ÉPOCA na sucursal do Rio. Há 19 anos tem escrito sobre temas econômicos e sociais que compõem os desafios da história recente do país. Aos domingos, escreverá sobre família e a divertida e desafiante missão de ser mãe (Foto: Rodrigo Schmidt/ÉPOCA)

Você acredita que mãe só muda o endereço? Eu não. Ser mãe é uma missão de muitas nuances. Por mais que a gente se prepare, leia, troque ideias e estude ao longo da vida para exercê-la da melhor maneira possível, ainda cabe muito improviso. A pessoa no exercício dessa função encontrará pela frente situações, personalidades e desafios tão variados que, arrisco dizer, não consegue ser igual nem com um filho depois do outro. Que dirá em endereços diferentes. Me dou por exemplo.
A primeira filha encontrou a Dona Antiséptica louca por manuais sobre bebês. Chorou quando a enfermeira furou a orelha da neném. Chorou nas vacinas também. Por acreditar-se despreparada, essa mulher tratou de arrumar uma enfermeira e usou seus superserviços por 40 dias. Quando a moça foi embora, o mundo era mais ou menos como uma escura floresta sem placas sinalizadoras e a filha, um filhote indefeso largado aos cuidados dos pais, esses incompetentes. Essa mulher fervia mamadeiras, chupetas e mordedores, fazia questão de papinhas feitas no mesmo dia com legumes frescos e tinha horror a essa mania que todo mundo tem de pegar seu bebê no colo sem tomar banho de álcool gel antes. Ela mantinha os álbuns de fotografia atualizados e todas as gracinhas escritas. Essa mãe ligou para o pediatra preocupada quando a filha comeu lenço umedecido e achava que a filha precisava de atenção 24 horas por dia, sob pena de parar de respirar se alguém não estivesse olhando. Comprou CDs tranquilos para a filha ouvir, Baby Einstein, Baby Mozart e Baby Beatles, e considerava a televisão um dos venenos a ser banido do campo de visão do seu bebê. Dormia quando a filha tirava soneca. Voltou a fazer pilates um mês depois do parto. Tinha disposição e paciência. Aplicou o nana-nenê e outras estratégias da moda para sua filha dormir a noite toda. E a filha dormiu a noite toda aos 3 anos e meio. Ela seria incapaz de discordar do marido, mesmo na frente de um bebê de seis meses. Ela sabia que coerência é um importante pilar na vida do casal. Essa mulher voltou aos prantos da licença maternidade sentindo-se a pior das criaturas por abandonar uma criança em formação.
A segunda filha encontrou Mamãe Cansada de não dormir. No dia em que voltaram da maternidade, a babá resolveu ir a uma festa e Mamãe Cansada mas segura logo viu que não precisaria dela nem naquela noite, nem dia nenhum depois disso, aliás. Só voltou a ter babá (outra) pouco antes de retornar ao trabalho porque acredita que ninguém cuida melhor dos fihos do que os pais. Essa mãe não quis assistir ao ritual de furar a orelha, mas não chorou. Nem nas vacinas. Ela continua fazendo as crianças gargalharem, mas dá bronca na filha desde que a filha aprendeu a sentar. Além de não comer legumes e verduras e fazer mais besteiras do que a primogênita fazia sozinha, a segunda filha conta com cumplicidade da irmã para duplicar as bobagens que pensa e faz. E as duas levam broncas. Essa mãe parou de ferver chupetas no décimo dia de vida da filha (ou terá sido no quinto?) e desistiu dos mordedores. A filha mordia qualquer coisa que tivesse à mão mesmo. Ela sabe que Fisher Price é legal, mas caixas vazias também, além de custar mais barato. Perdeu o controle sobre a revelação de fotos e, não sabe por quê, sobre o tom da própria voz. Ela chegou à conclusão que a filha podia brincar sozinha sem o risco de parar de respirar ou ficar traumatizada. Mamãe Cansada heroicamente voltou a fazer pilates quando a segunda filha tinha dois meses e faltou bastante às aulas depois. Quando o professor mandava ela acionar a força abdominal, ela achava que acionar a força de vontade bastava. Essa mãe também resolveu que, entre um CD infantil e outro, a filha podia ouvir Lulu Santos, Alceu Valença, Chico Buarque e Legião Urbana porque os pais merecem mudar o fundo musical da casa de vez em quando. Ah, e podia ver TV também, que mal há nisso...No batizado, a neném já sem vestido rodou por todos os colos cheios de perdigotos enquanto mamãe distraída sorria feliz esquecendo-se do álcool gel. Essa mãe brincava com a filha mais velha quando a caçula dormia e, por isso, continuou cansada. Ela voltou a trabalhar depois da licença maternidade tranquila (e cansada) porque sabia que uma menina tinha a companhia da outra. Ela não usou o nana-nenê nem outra estratégia da moda para sua filha dormir a noite toda. E a filha dormiu a noite toda aos 3 anos e meio. Essa mulher desistiu dos manuais, conformou-se com o fato de suas filhas não dormirem cedo como manda o figurino e passou a observar mais a dinâmica da própria família, tentando deixar o pai fazer as coisas da maneira dele, mesmo que elas cheguem na escola cheirosas e despenteadas.
A vida dessa mulher ficou tão corrida que, às vezes, ela se esquece que, para discordar do marido sobre algum quesito da educação das meninas, ela precisa sair do campo de visão e audição das crianças. Para ela, o bom humor é o verdadeiro pilar na vida do casal com dois filhos. Ela se leva menos a sério.
Mas essas duas mulheres têm vários pontos em comum. Destaco a vontade de acertar e o hábito de continuar registrando por escrito o quanto ela tem se divertido, aprendido e sofrido com o crescimento de suas meninas. Tira muitas fotos também. Só falta reveler.

(Este é o texto de estreia da coluna semanal de Isabel Clemente em epoca.com.br. Ela escreverá aos domingos.)

http://revistaepoca.globo.com//Sociedade/Isabel-Clemente/noticia/2013/06/mae-nao-e-tudo-igual.html

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