Sobrevivente de face serena e coração quente, a fotógrafa paulistana traz profundas cicatrizes, como a perda do pai ainda menina; o tempo em que foi presa e torturada durante a ditadura; uma insuficiência renal que a levou ao transplante um ano e meio atrás. Nem por isso Nair é uma mulher amarga. Lida de peito aberto com os percalços da vida e continua usando suas lentes para chamar a atenção para questões sociais que considera relevantes.
Seu trabalho, reconhecido internacionalmente e ganhador de vários prêmios (como o 11º Prêmio Abril de Jornalismo, por foto publicada na Veja, e o prêmio Embratur, por retrato na revista Ícaro), explora o que ela acredita ser “o potencial transformador da fotografia”, provocando reações na sociedade ao expor suas cicatrizes. Sob a mira de suas lentes estão as minorias esquecidas. São índios e populações ribeirinhas, homossexuais, travestis, operários, assalariados, menores viciados, mulheres e homens oprimidos pelo interior do Brasil. Porém, as fotografias de Nair são um bálsamo ao olhar, tamanha delicadeza com que aborda as cruezas da vida. Integram os acervos do MoMA de Nova York, da Coleção Masp-Pirelli, do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, entre outros.
O olhar de viés sensível, sempre enxergando poesia na dramaticidade, acompanha Nair desde o início da carreira, quando ela estudava comunicação na USP e na Faap e produzia vídeos sobre temas como a violência doméstica contra a mulher e a liberdade sexual. No entanto, no início dos anos 70, trabalhar com produção autoral era bastante arriscado e foi nessa época que ela e o então marido, o francês Jacques Breyton, foram presos: “Fui presa política entre o fim de 1969 e meados de 70. Além disso, o trabalho na TV era censurado pelo regime [militar]. Então, a fotografia surgiu como alternativa de trabalhar a imagem de uma forma independente”, lembra.
À flor da pele
A primeira exposição, um ensaio sobre o popular Forró do Mario Zan (famoso forró paulista da década de 70), interessou um estrangeiro, que comprou meia dúzia de fotografias, mostrou para as pessoas certas e dali então foi só sucesso. A célebre foto desse ensaio – um casal se agarrando no meio da pista – é tão sensual quanto a da Trip Girl mais badalada. Só que ela está bem acima dos padrões de magreza, a camiseta colada deixando à mostra a barriga saliente. Ele, malvestido e despudorado, completa a dupla de glamour nulo e sensualidade à flor da pele, que a fotógrafa soube tão bem captar.
Seu trabalho, reconhecido internacionalmente e ganhador de vários prêmios (como o 11º Prêmio Abril de Jornalismo, por foto publicada na Veja, e o prêmio Embratur, por retrato na revista Ícaro), explora o que ela acredita ser “o potencial transformador da fotografia”, provocando reações na sociedade ao expor suas cicatrizes. Sob a mira de suas lentes estão as minorias esquecidas. São índios e populações ribeirinhas, homossexuais, travestis, operários, assalariados, menores viciados, mulheres e homens oprimidos pelo interior do Brasil. Porém, as fotografias de Nair são um bálsamo ao olhar, tamanha delicadeza com que aborda as cruezas da vida. Integram os acervos do MoMA de Nova York, da Coleção Masp-Pirelli, do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, entre outros.
O olhar de viés sensível, sempre enxergando poesia na dramaticidade, acompanha Nair desde o início da carreira, quando ela estudava comunicação na USP e na Faap e produzia vídeos sobre temas como a violência doméstica contra a mulher e a liberdade sexual. No entanto, no início dos anos 70, trabalhar com produção autoral era bastante arriscado e foi nessa época que ela e o então marido, o francês Jacques Breyton, foram presos: “Fui presa política entre o fim de 1969 e meados de 70. Além disso, o trabalho na TV era censurado pelo regime [militar]. Então, a fotografia surgiu como alternativa de trabalhar a imagem de uma forma independente”, lembra.
À flor da pele
A primeira exposição, um ensaio sobre o popular Forró do Mario Zan (famoso forró paulista da década de 70), interessou um estrangeiro, que comprou meia dúzia de fotografias, mostrou para as pessoas certas e dali então foi só sucesso. A célebre foto desse ensaio – um casal se agarrando no meio da pista – é tão sensual quanto a da Trip Girl mais badalada. Só que ela está bem acima dos padrões de magreza, a camiseta colada deixando à mostra a barriga saliente. Ele, malvestido e despudorado, completa a dupla de glamour nulo e sensualidade à flor da pele, que a fotógrafa soube tão bem captar.
Claus Lehmann
A foto, de 1977, Tesão no Forró do Mario Zan, em São Paulo
“O trabalho na TV era censurado, então a fotografia surgiu como alternativa de trabalhar a imagem de uma forma independente”
Foi nesse jeito delicado e feminino, porém persistente, que Nair se apoiou para suportar o sofrimento dos nove meses em que ela e Breyton foram mantidos presos e torturados a mando de Sérgio Paranhos Fleury, o delegado do Dops (Departamento de Ordem Política e Social), órgão criado durante o Estado Novo para reprimir movimentos contrários ao regime no poder, durante os interrogatórios da ditadura militar que assolou o Brasil de meados dos anos 60 ao início dos 80.
Claus Lehmann
Retrato de Nair em ação
Com três filhos pequenos – Ariane, Danielle e Frederic –, o casal apoiava a luta armada da esquerda. Herói da resistência francesa, Breyton combateu a invasão nazista em seu país na Segunda Guerra e foi torturado pela Gestapo antes de ser libertado pelas tropas americanas e vir morar no Brasil. Aqui, além de se tornar um industrial bem-sucedido, colaborou para a criação do PT (Partido dos Trabalhadores). “Não posso dizer que todo mundo deveria passar por isso, mas cresci muito naquela época”, reflete Nair sobre o tempo de repressão, antes de completar: “A prisão é como a morte, quando você fica só consigo mesmo”.
Com a cabeça envolta nas lembranças do passado e os olhos fixos no futuro, Nair raramente tira os óculos escuros que os protegem. Depois do transplante de rim, em 2008, os remédios deixaram seus olhos mais suscetíveis aos danos dos raios solares. Ela não se deixa abalar. Prefere citar o mestre francês Henri Cartier-Bresson: “Apesar de o mundo em que vivemos estar despencando sob o peso da rentabilidade, invadido pelas sirenes enraivecidas da tecnociência e pela voracidade do poder pela mundialização – essa nova forma de escravidão –, a amizade e o amor continuam existindo”. É nisso que ela continua acreditando e, sem dúvida, fotografando.
Com a cabeça envolta nas lembranças do passado e os olhos fixos no futuro, Nair raramente tira os óculos escuros que os protegem. Depois do transplante de rim, em 2008, os remédios deixaram seus olhos mais suscetíveis aos danos dos raios solares. Ela não se deixa abalar. Prefere citar o mestre francês Henri Cartier-Bresson: “Apesar de o mundo em que vivemos estar despencando sob o peso da rentabilidade, invadido pelas sirenes enraivecidas da tecnociência e pela voracidade do poder pela mundialização – essa nova forma de escravidão –, a amizade e o amor continuam existindo”. É nisso que ela continua acreditando e, sem dúvida, fotografando.
Claus Lehmann
Travestis no Rio de Janeiro, de 1984
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