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quinta-feira, 10 de novembro de 2011

O urso de mel

Publicado no guida Divirta-se em O Estado de S. Paulo, em junho de 2011
Ah, mas faça-se o favor. Você perdendo tempo com André Laurentino. Só não é perda total pela sugestão que urge e encontra você agora: corra, um Sabiá está esperando. Ou uma orquídea (Physosiphon Bragae Ruschi). Ou um urso. Ou um homem que queria ser urubu. Chama-se Rubem Braga, e agora vive solto no mais recente dos Cadernos de Literatura Brasileira, do Instituto Moreira Salles.

Vou resistir à tentação de iluminar esta crônica com brilhos tirados do Braga, exemplos de seu gênio. As aspas usadas dariam asinhas muito finas para suportar o peso do desnível. Que o leitor imagine nesta pena de pardal a maravilha do pavão.

Rubem Braga foi um homem generoso, e não se pode abusar do generoso. Seria feio, duplamente feio. Nas suas crônicas, as frases e o modo de dizer mais simples — ou melhor, o modo de perceber o que é mais simples — vinham entregues ao leitor sem cerimônia. No museu de Rubem Braga, ele estaria observando o guarda dormir enquanto os mais tolos perderiam tempo com o que fica além das cordas, das faixas vermelhas e dentro de cúpulas. Ao sinal de “Proibido Fotografar” Rubem daria de ombros, e empunharia lápis e papel para desenhar. O mundo visto por ele era mais rico e delicado, e mais mordaz.

Escreveu algumas das melhores crônicas da língua, e ao mesmo tempo piorou quase todas as outras. Perto dele, somos quando muito passarinhos pedestres. Não precisava de assunto. Até uma aula de inglês, com suas perguntas idiotas (is this an elephant?), era suficiente para fazer rir ou voar.

Rubem riu do próprio câncer, amou as mulheres e viveu solteiro a maior parte do tempo. Saiu da cobertura em Ipanema para as antologias, depois para prateleiras esquecidas e para os maus vendedores que precisam buscar seu nome em computadores de livraria — a vida fora do jornal diário.

Agora, volta na pele lustrosa do couchê desses Cadernos. Talvez não gostasse do brilho. Ou do barulho exagerado que os dedos fazem ao apurar suas páginas. Mas merece as fotos de Eduardo Simões, os depoimentos, e uma certa solenidade que nunca deixou de afugentar. Corra. Vá ver Rubem Braga. Chega de passe-partout.

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