Paulo Moreira Leite
Em sua coluna publicada hoje, no New York Times, o Premio Nobel Paul Krugman mostra que a crise econômica já ameaça as instituições democráticas do Velho Mundo. Leia:
“A crise do euro está matando o sonho europeu. Em vez de unificar o continente, amoeda única criou uma atmosfera amarga de desentendimento.”
Krugmann afirma que as sucessivas demonstrações de força da Alemanha sobre
os demais parceiros do continente tem levado a um ambiente político muito ruim:
“O descrédito de governos e instituições é crescente. E os valores democráticos
estão sob ataque.”
No raciocínio do Premio Nobel, seria ingenuidade considerar que a situação é
pouco preocupante porque não atingiu (pelo menos até agora, digo eu) os 40% da
Alemanha em 1932, ou porque “não há um Hitler” (pelo menos até agora) em cena.
Ele recorda o crescimento de partidos de ultra-direita na Finlandia e na Austria.
Lembra da Hungria, que está fora da zona do euro, mas paga a conta pesada pela
crise. Ali, um governo conservador ensaia medidas de cunho autoritário aque
preocupam a própria Casa Branca.
O título do artigo é didático: “Depressão e democracia.”
O Premio Nobel lembra que o alimento para o nazismo europeu foi produzido pela
crise de 1929, quando os principais governos do Velho Continente não
conseguiram responder a altura.
A esse respeito, é bom fazer um esclarecimento. Antes, como agora, eles erraram
de diagnóstico. Cometeram o mesmo erro, aliás. Seu maior receio era impedir a volta da inflação. Por isso, estavam preocupados
em preservar suas moedas. Mas o drama real era outro: falta de crescimento.
Ao contrário do que muitas pessoas imaginam, influenciadas até pelo belo filme O
Ovo da Serpente, de Ingmar Bergmann, que é uma grande aula de cinema mas
uma péssima lição de economia, a ascenção de Adolf Hitler ao poder não ocorreu
num período de inflação alta. A hiperinflação alemã é um fenômeno dos anos 20 e foi debelada graças a
imensos investimentos de empresas americanas, que até ajudaram na
recuperação da economia. Durante boa parte da década, a Alemanha não só
prosperou mas tinha excedente para pagar suas dívidas com os EUA. Hitler é um produto direto da depressão econômica produzida pela crise de 1929.
Em 1927, seu partido tinha menos de 2,5% dos votos e era motivo de anedota
junto a maioria dos analistas políticos. A mudança ocorreu depois de 1929, quando
a crise mundial jogou o país num desemprego que, em apenas três anos, envolveu
6 milhões de pessoas e bateu em 40%, uma taxa muito pior que a atingida nos
Estados Unidos.
Foi nessas condições que, em 1932, os nazistas se tornaram a principal força do
parlamento alemão.
Um ano depois da posse de Hitler, Victor Schiff, líder do partido social-democrata
alemão, fez uma autocrítica de valor histórico. Ele descreve um ambiente onde o
consumo está no chão, os preços caem, ninguém consegue trabalho. Mas a
inflação não é o problema. Afinal, com a população sem dinheiro, os comércio
encolhe e os preços caem.
Vale a pena ler:
– Se existe um ponto sobre o qual não existem divergências de opinião entre nós,
e não poderá existir, então é certamente que Hitler deve sua ascensão e
finalmente sua vitória essencialmente à crise econômica mundial: ao desespero
dos proletários desempregados, da juventude universitária sem futuro, dos comerciantes e artesões de classe média indo à falência e dos agricultores
seriamente ameaçados pela queda dos preços. Voltando a Krugman.
Ele encerra o artigo com uma advertência: se a Europa não modificar sua política
econômica, o risco de um retrocesso democrático é real “e neste caso o colapso
do euro será a menor das preocupações de seus governantes.”
Pegue o link: http://www.nytimes.com/2011/12/12/opinion/krugman-depression-and-
democracy.html?nl=todaysheadlines&emc=tha212
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