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sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Os dez mandamentos do bacalhau

Dez passos importantes, do mercado à mesa, para preparar um bacalhau impecável. E mais: dez receitas diferentes e bem portuguesas


Kike Martins da Costa, especial para o iG São Paulo | 08/12/2011




 
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Na dúvida, sirva o bacalhau com batatas cozidas. Elas acompanham bem qualquer receita
Não passarás a noite de Natal sem comer um bom prato de bacalhau; não comprarás bacalhau estragado; não farás a mesma receita de bacalhau do ano passado; e não cobiçarás o bacalhau do próximo porque desta vez o seu estará muito mais gostoso. Essas são resoluções importantes a se tomar neste fim de ano. Para ajudar você nesta tarefa, o iG Comida consultou um dos maiores especialistas na iguaria para elaborar a lista dos “dez mandamentos do bacalhau": o português Vitor Sobral, dos restaurantes Tasca da Esquina, em Lisboa e São Paulo (Al. Itu, 225, Jardins, tel. 11 3262-0033).


Seguindo religiosamente as dicas do chef, você aprenderá a escolher uma boa posta, a dessalgar e reidratar o peixe curado, e outros macetes para deixar seu bacalhau muito mais macio e saboroso.
De brinde, selecionamos algumas receitas que fogem do óbvio e outras clássicas, que agradam sempre. A seguir, os dez preceitos básicos estabelecidos pelo chef, verdadeiro Moisés do rio Tejo.

1. Não comprarás bacalhau gordoO bom bacalhau é aquele que foi pecado na época mais fria do ano, com um corpo robusto, mas sem muita gordura. Além de ele estar com sua carne mais própria para o preparo e o consumo, certamente terá sido bem conservado antes de chegar em terra para ser curado. Isso acontece porque no frio as redes dos pecadores costumam chegar carregadas não só de peixes, mas também de pedras de gelo. Como não dá para identificar a data da pesca, o importante é escolher peças magras, que, provalmente, foram coletadas no inverno.

Bacalhau com gema de ovo e creme de cebola
Bacalhau alla Vicentina

2. Não escolherás o bacalhau erradoNa hora de comprar o bacalhau, procure uma posta que esteja bem seca e tenha um tom quase branco ou amarelo desmaiado, bem clarinho. Se houver sinais de umidade ou manchas de bolor (que podem ser avermelhadas, marrons, amarelo forte ou cinza plúmbeo), é sinal de que a cura não foi feita propriamente e que, depois de salgado, o peixe foi mal conservado. Uma camada de sal fina e como que vitrificada deve recobrir a carne, sempre.
Existem vários tipos de bacalhau. O mais nobre é o Gadus morhua, que tem carne clara, macia e suculenta, ideal para receitas que exijem uma peça inteiriça, como um lombo de bacalhau à lagareiro. De qualidade um pouco inferior é o Ling (Molva molva), com postas altas e bonitas e carne muito branca -- este se separa em lascas macias e úmidas, e é ideal para receitas de forno, panela ou frigideira. O Saithe (Gadus virens ou Pollachius virens), o Zarbo e o Gadus macrocephalus têm carne mais escura e amarelada e se desfazem bem em lascas. Assim, são mais indicados para refogados e preparações rápidas, que pedem o ingrediente em pedaços ou desfiado, como recheios, saladas e bolinhos. Desnecessário dizer que o Gadus morhua é o mais caro e os três últimos (Saithe, Zarbo e Gadus macrocephalus), os mais baratos.

3. Não tratarás todas as partes da mesma formaNa hipótese remota de você comprar um peixe inteiro, corte-o em pedaços separando os “filés” em que a carne tem mais ou menos a mesma espessura. Repare que, próximo à espinha dorsal, os lombos são mais altos, e à medida que vai chegando à barriga, eles vão ficando mais finos. Cada um desses pedaços receberão um tratamento diferente, por isso devem ser separados.


Foto: Divulgação Ampliar
Bacalhau à Braz: receita clássica, feita com lascas, que agrada sempre
4. Não dessalgarás as lascas
A carne das extremidades (os pedaços mais próximos da barriga e mais distantes da espinha dorsal) não é própria para ser consumida em postas. Depois de separada em lascas, não se preocupe em dessalgá-la. Basta lavá-la em água farta três ou quatro vezes antes de começar a cozinhar, seja lá qual for a receita. É ideal para o preparo de bolinhos, recheios e saladas.
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5. Não dessalgarás fora da geladeiraPara dessalgar e reidratar os pedaços de lombo de bacalhau, coloque-os em uma bacia relativamente funda e cubra-os com água a uma temperatura de mais ou menos 5ºC (fria). O ideal é tentar manter a temperatura constante durante todo o processo, para não interromper a dissolução do sal. Em Portugal, que é um país mais frio, as pessoas podem fazer isso em temperatura ambiente, mas aqui no Brasil o mais correto é utilizar a geladeira.
Cubra o bacalhau inteiramente, isso vai evitar a ação de bactérias e o aparecimento de odores desagradáveis. Troque a água uma vez a cada 6 ou 8 horas, por outra com a mesma temperatura. As postas mais altas (de 3 a 4 dedos) devem ficar de molho por três dias, três e meio; as mais finas (de 1 a 2 dedos), por apenas dois. Não é errado dessalgar o bacalhau no leite, mas o melhor é usar água mesmo. Se não for devidamente hidratado, sua carne pode ter a textura prejudicada, ficando dura e borrachuda. E nesse quesito a água pura é melhor do que o leite. Para saber se a carne já está suficientemente dessalgada, o mais indicado é arrancar uma lasquinha e provar. Se achar esquisito morder o peixe “cru”, dê uma rápida ferventada nesse pedaço antes de testar o seu sabor.

Bacalhau gratinado com migas
Bacalhau gratinado com broa portuguesa



Foto: Divulgação Ampliar
Bacalahu espiritual: difícil é sobrar para o enterro de ossos do dia seguinte
6. Não prepararás pratos sem sabor

Na hora de cozinhar (ou assar ou grelhar...), as espinhas e pele do peixe devem ser mantidas. Quando retiramos as espinhas, boa parte da gelatina do peixe, fundamental no sabor, vai embora. Já a pele funciona como uma proteção ao calor excessivo. Durante o cozimento, para que o ingrediente não resseque, é importante a presença de algum tipo de gordura. Ela atua como condutor de calor e catalisador de sabores. É por isso que tantas receitas cobrem o peixe de azeite de oliva. Outra dica é enrolar o pedaço de lombo de bacalhau em uma tira de bacon ou toucinho de porco -- a gordura suína derrete e penetra no peixe, deixando-o mais macio e saboroso.

Se ficar com preguiça de cozinhar:
encomende sua ceia ou comemore no restaurante
7. Não farás mais de uma cocçãoO bacalhau pode parecer um bicho durão, mas é sensível, delicado. E não resiste a mais de uma cocção. Assim, se for servido grelhado, deve ser apenas grelhado; se frito, que seja frito e pronto. Se ele for cozido e depois frito, por exemplo, ficará borrachudo; se cozido e depois levado ao forno, uma palha. E não exagere nas temperaturas: nunca deixe ferver a água de cozimento e, no forno, o calor não pode ultrapassar os 150ºC.
Crocantes de bacalhau
Bacalhau a Bráz

8. Não servirás bacalhau sem salSe, ao final do preparo, você perceber que a carne do bacalhau foi exageradamente dessalgada, salpique floquinhos de flor de sal sobre a posta. Esta é a melhor maneira de corrigir a mancada. Não prepare molhos fortes, isso só vai encobrir e esconder ainda mais o enfraquecido sabor do peixe.

Escolha um presente comestível: a noite vai ficar ainda mais gostosa
9. Não servirás pratos sem molho com arrozEvite servir bacalhau grelhado ou sem muito molho com arroz soltinho. As postas de bacalhau, na maioria das receitas, são um tanto secas, portanto devem ser guarnecidas por batatas cozidas (que têm umidade) ou legumes no vapor. Grãos e farofas só com pratos mais caldosos ou ensopados.

Pataniscas de bacalhau
Bacalhau Espiritual

10. Não tomarás vinhos encorpadosPara acompanhar um prato de bacalhau, a melhor pedida é um bom vinho verde, de preferência aveludado, untuoso e aromático, para se equiparar à potência do peixe. Se você preferir harmonizar com um branco comum, escolha uma variedade que não tenha envelhecido em barricas de madeira, pois seus sabores e aromas, em geral, brigam com o bacalhau. Prefira tipos jovens e de boa acidez. Se você não abre mão dos tintos, evite os muito encorpados e tente escolher uma bebida frutada, com taninos redondos e equilibrados. Por fim, os espumantes também são uma excelente opção de harmonização, principalmente os secos e com notas de amêndoas torradas.



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