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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Pimenta Nos Olhos Dos Outros...

 

E se o corpo fosse percurso e tu andarilho?
E se houvesse fontes pra saciar a sede
e sombras onde recostar a cabeça?
Se ofegasses nas curvas,
tateasses as veredas e descobrisses os atalhos?
Se a partida fosse chegada,
alegria de esquecer o que já visitaste?


Pimenta
Eu me perco. Não publiquei nenhum livro. Não tenho namorado. Nunca aprendi a assoviar, piscar, nem levantar as sobrancelhas. Eu não sei responder minhas perguntas. Detesto lavar roupa. Não falo italiano. Não faço bolo. Não aprendi a nadar estilo borboleta. Às vezes confundo direita e esquerda. Empilho livros ao pé da cama. Nunca terminei de ler Ulysses. Invento rejeições. Tenho péssima memória.


Refresco
Sou carinhosa. Conjugo os verbos direitinho. Não tenho namorado. Sei fazer panqueca. Rio fácil. Não tenho frescura. Sento no chão, coloco salto. Aprendi a dizer adeus. Invento origens pra palavra patagônia. Divirto-me na cozinha. Sei fazer perguntas. Gosto de aprender. Durmo nua. Tenho paciência. Bebo cerveja, bebo vinho e, em noites de lua, bebo sonhos. Eu sei simplesmente segurar a mão. Nunca me falta assunto. Jogo buraco. Mudo de opinião.

Nos Olhos dos Outros
Esfrego os olhos, borrando o agora e brinco de confundir sonhos e realidade. Faço caretas pro espelho que não me sorri. A imagem no espelho é sempre de uma aterradora atualidade, não há antecedentes. Nenhuma história. O espelho ignora futuros. Despreza intenções. A imagem é o que é o que é o que é. Abandona a interrogação. Ela simplesmente está. A imagem no espelho não sabe sobrenomes e desconhece o passado. Como saber o viver se nenhuma memória é possível? O espelho decifra e devora. Não tem a ternura atroz das fotografias. Gentileza de nos apresentar o tempo e nos acenar com a morte. Nas fotografias, a trajetória. Cada sorriso congelado são todos os sorrisos que foram e todas as promessas de alegrias futuras. Uma fotografia nos comove porque nela converge o que há de mais familiar e estranho. Somos nós que inquirimos a foto e, ao nos decifrar, devoramos o tempo que nos assedia. Uma foto não tem agora, é na mirada que ela nos devolve que se coloca o vir a ser. Uma fotografia é terrível: carrega toda a vida.
 
 
 
 

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