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quinta-feira, 28 de março de 2013

La atracción como viene, se va

 

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Apenas lleva unos meses en tu vida y, sin embargo, es el centro de la misma. Ocupa gran parte de tus pensamientos, y anhelas su compañía casi todo el tiempo. Todo fluye, es esa etapa en la que todo parece simplemente perfecto. Y el sexo… el sexo es nuevo, pero a la vez conocido, es pasional, y sin embargo, increíblemente tierno. Pero en esta vida nada es eterno, la felicidad tampoco, y de pronto un día, el amor, la pasión y el deseo, tal como llegaron, se han ido.

Fragmentosdeundiariodiscontinuo"Me quiere, no me quiere", una imagen en la que verse reflejado del Blog Fragmento de un Diario Discontinuo.

Los sentimientos son casi siempre confusos y es muy difícil entender cómo funcionan. Si bien todos parecemos tener más o menos claro que el tiempo o la rutina pueden influir en nuestro deseo, ¿qué influye en qué de pronto alguien deje simplemente de atraernos?
 

Muchas veces ocurre que esa atracción física, en realidad tiene mucho que ver con el terreno emocional, y cuando dejas de tener idealizada a esa persona, para verla tal y como es, puede dejar de despertarte las mismas sensaciones. Puede ser eso, o que simplemente sin un motivo aparente, más allá que el del paso del tiempo y la pérdida de la emoción que sí tenían esos primeros encuentros, un día esos besos que antes te removían un gusanillo (si no en el estómago, sí en la entrepierna), ahora no nos sepan a absolutamente nada, y haya que darlos casi por obligación. Que llegue un momento en el que esas caricias que antes tanto te gustaban, ahora te parezcan torpes y nada motivadoras. Que finjas sin saber muy bien porqué sonrisas, abrazos, gemidos, orgasmos  …



Cuando la atracción entre dos personas desaparece, el problema radica en si bien es algo mútuo, o si por el contrario, sólo le sucede a uno de los dos. En el primer caso, tras un "tenemos que hablar", todo puede quedar arreglado más o menos cordialmente, pero en el segundo la cosa se complica sustancialmente. No es lo mismo dejar que ser dejado, eso está claro, pero en este caso, se esté en el lado en que se esté, siempre se acabará un poco perjudicado.
Decidir dejar a alguien no es un paso fácil, y es que es complicado tener claro si se va a estar mejor sin él o ella, o si en realidad es una cuestión de esfuerzo y de volver a ponerle ganas. Pero hay algo que muchas veces también ronda por nuestra mente, y que en pocas ocasiones decimos en alto. Antes de decidir dejar a alguien, al menos alguna vez hemos pensado, en lo poco que nos apetece volver a estar sin sexo, o al menos sin sexo habitual y asegurado (que nadie ha dicho que sea mejor que el sexo con uno mismo, o con un desconocido).
Pero desde luego, lo que tampoco es nada agradable es que sea el otro el que te deje, y precisamente quedándote con esa duda, "¿por qué ya no le gusto? ¿Qué ha cambiado?" Sobre todo cuando esa persona a ti aún te atrae, y mucho. Primero estará la fase de negación, después la melancolía y el anhelo, seguidos por el enfado, y dejando paso a un simple “volver a hacer cada uno su vida”, con esos ratitos de “te echo de menos”, sobre todo cuando la imaginación vuela, y a solas, tus manos recorren tu cuerpo, como si aún fueran las suyas.



Poco a poco la rutina de la soledad se instala en tu vida, pero el gusanillo vuelve, y además muy insistentemente a visitar tu entrepierna, y siempre sin haber sido invitado. Podemos evitar durante un tiempo el amor, pero no podemos evitar el sexo. Quizás casual, quizás con una amistad con la que también para esto se puede confiar, o quizás, en ese momento en el que estabas tan bien como estabas, aparezca de nuevo una persona especial, y ya se sabe, quien no arriesga, no gana.
Y llega el día, ese día en el que en el lugar y en el momento menos pensado os volvéis a cruzar. Es extraño que ese cuerpo que era tuyo, que tantas veces has poseído, y te ha poseído de todas las formas que hasta entonces creías posibles, que sabe de tus rincones más ocultos, de tus deseos más secretos, ahora es prácticamente un extraño, casi un desconocido. Porque el amor a veces llega de la forma más inesperada, y se rompe de la forma más simple, pero siempre vuelve.



http://blogs.elpais.com/eros/2013/01/la-atraccion-como-viene-se-va.html

Lua, lua, lua, lua - Caetano Veloso


Copo Vazio - Zizi Possi e Hélio Delmiro

 
 
Copo Vazio - Gilberto Gil


É sempre bom lembrar
Que um copo vazio
Está cheio de ar
É sempre bom lembrar
Que o ar sombrio de um rosto
Está cheio de um ar vazio
Vazio daquilo que no ar do copo
Ocupa um lugar
É sempre bom lembrar
Guardar de cor
Que o ar vazio de um rosto sombrio
Está cheio de dor
É sempre bom lembrar
Que um copo vazio
Está cheio de ar
Que o ar no copo ocupa o lugar do vinho
Que o vinho busca ocupar o lugar da dor
Que a dor ocupa a metade da verdade
A verdadeira natureza interior
Uma metade cheia, uma metade vazia
Uma metade tristeza, uma metade alegria
A magia da verdade inteira, todo poderoso amor
A magia da verdade inteira, todo poderoso amor
É sempre bom lembrar
Que um copo vazio
Está cheio de ar

você pensa na velhice?


20 março, 2013
meu pai pergunta:
mas meu filho, você não pensa na sua velhice?
e respondo:
pai, você não conhece ninguém que pensa mais na própria velhice mais do que eu. literalmente tudo o que eu faço ou deixo de fazer é porque eu tenho uma consciência urgente de que, em breve, estarei velho, doente, fraco, cansado, morto.
* * *
para o meu pai, “pensar na velhice” quer dizer:
abdicar da minha vida hoje; pegar um emprego chato mas que pague bem; passar o dia em um escritório realizando as metas e projetos de outros em troca de dinheiro; fazer um pé-de-meia para a velhice.
para mim, “pensar na velhice” quer dizer:
não desperdiçar minha vida realizando os projetos dos outros e nem correndo atrás de dinheiro, e sim tentar amar e escrever o máximo que posso enquanto ainda tenho saúde e energia, pois o fim é inevitável e está chegando.
* * *
tenho quase quarenta. eis meu projeto para o meu último ano na casa dos trinta:
- alugar meu apartamento para ganhar uns trocados;
- morar de favor com uma amiga, leitora, mecenas;
- não ter internet em casa;
- não correr mais atrás de grana, não pegar frilas nem trabalhos;
- escrever ficção como se fosse um bichinho sem alma que tem somente (na melhor das hipóteses) uns vinte bons anos de produtividade antes de desaparecer para sempre.
o plano entra em efeito no dia 1º de maio. seja o que machado quiser.


quarta-feira, 27 de março de 2013

a delicia do conforto



 
 
 
 
 

Quando a gente se sente perdida, basta lembrar que faz parte de uma massa que se movimenta nesse mundo... e acertar o passo.



segunda-feira, 25 de março de 2013

Moon River - Audrey Hepburn


Uma conversa franca

Playboy entrevista Maria Bethânia – Nov/1996


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Uma conversa franca com a voz mais impressionante da MPB sobre o vale-tudo no amor, a solidão da Xuxa, o chuveiro do Mastroianni e aquele cujo nome não pode ser dito.

PLAYBOY: Qual o segredo do seu fascínio, tendo um tipo que foge dos padrões de beleza?
MB: E o que adianta ser a Xuxa se ela vive reclamando que não arruma namorado? [risos] Não penso nisso, mas gosto de ver o brasileiro apanhado por padrões que não foram impostos pelos europeus.
PLAYBOY: Que mulher é bonita para você?
MB: Billie Holliday. Uma delicadeza. Sempre com a alma à mostra, saindo pelo nariz, pelos lábios, pelo olho, tudo muito forte. É esse tipo de beleza que me convence. A sensualidade mora na alma da gente.
PLAYBOY: Alguns homens dizem que a sensualidade vem de quem menos se mostra.
MB: Veja o caso dessa louraça que está fazendo o maior sucesso no cinema…
PLAYBOY: A Sharon Stone?
MB: Pois é, outra que não consegue um namorado, nem convite para jantar ela recebe [risos]. Não é estranho? Isso é que é solidão! A Sharon Stone é a Xuxa americana.
PLAYBOY: Que há de errado com elas?
MB: Tem um segredo mal passado aí…Não é sensual. É uma coisa gelada, derrubada pela farsa. Passa pelo fingimento e pela mentira. Mas, como o público em geral não percebe, elas acabam virando mito.
PLAYBOY: Por que você nunca se casou?
MB: Quando eu era menina, achava lindo o casamento dos meus pais e queria ter filhos. Tinha muita vontade. Eu tinha 18 anos e conversava com Gal, que também tinha alucinação por filhos. “A gente tem que ter, mana”, ela dizia. Depois, entendi uma coisa na minha personalidade: eu sou solitária. Gosto de viver sozinha. E entendi Deus.
PLAYBOY: O que Deus tem a ver com isso?
MB: É quem determina tudo e foi muito claro comigo. Ele não me deu filhos. ele me deu a VOZ, que é femimina. Quando eu falo que lido com minha voz com uma atenção fora do normal, que não gasto minha voz à toa, nem com nomes, nem com pessoas ruins, é porque acho que ela é um dom sagrado que não me pertence. Nesse meu corpo mora isso que Deus plantou na terra.
PLAYBOY: E quanto ao casamento?
MB: O casamento estabelecido pela sociedade e religiões, um homem, uma mulher, tudo aquilo, não dá. Durante algumas horas acho bonito, depois fico aterrorizada com as dificuldades, o perigo, as dores. [pensando]. Você começou e entrevista dizendo que eu não tenho nada que é considerado padrão: beleza, nariz, voz. A cabeça, muito menos.
PLAYBOY: Não é chato ficar sozinha?
MB: Eu sou solitária, mas não sou sozinha. Não sei viver sem paixão. Preciso de estímulo para poder cantar, ou começo a ficar esvaziada, fria. Uma pessoa, duas, várias paixões, o que eu vejo com os meus olhos, o que sinto, é tudo alimento.
PLAYBOY: Você já reclamou de ter sido abandonada pelas pessoas que amava…
MB: O que na verdade foi um plágio da Fátima Guedes, que diz numa canção: [Desacostumei de Carinho, do disco Lápis de Cor]: “Eu nunca fui paixão de ninguém e sempre a tola apaixonada” Acho lindo uma mulher dizendo isso. É maravilhoso, não precisa ser a história dela nem a minha. Mas que é lindo uma mulher dizendo isso, é. Corajoso.
PLAYBOY: Quem abandonou você?
MB: Muita gente, Ave Maria! Me abandona, mas volta. De outro jeito, mas volta. Mas tenho fama de ter tido muitos casos de amor e abandonado tudo quando bem me dava na telha.
PLAYBOY: E de ser muito mandona, agressiva, tirana.
MB: Isso sou, posso ser, em algumas situações. Sempre sabendo o meu lugar e respeitando o do outro. Agora, invadiu, levou. O que não dá é ser covarde. A coragem é a maior qualidade de uma pessoa.
PLAYBOY: Cite uma mulher corajosa.
MB: Adriana Calcanhotto: essa é guerreira e tem posição de ataque mesmo quando fala nas derrotas amorosas. Fala com humor, dando a volta.
PLAYBOY: Você não gosta de quem sucumbe?
MB: Na divisão do mundo em dois, faço parte do grupo que batalha para vencer, se respeita e, em conseqüência, respeita os outros.
PLAYBOY: Na hora do abandono, você é igual a qualquer mulherzinha?
MB: Ahhhhhh….eu canto, fico quieta, trabalho, ouço música, escrevo. Gilete no pulso, não!
PLAYBOY: Quem são as pessoas que você amou?
MB: Não posso dizer nomes nem expor ninguém.
PLAYBOY: Mulher? Homem?
MB: Quando eu amo, pode ser mulher, homem, bicho, cachorro, pode ser tudo, o que for, eu deixo a fantasia passear bem.
PLAYBOY: Mas certa vez um admirador mandou um bilhete para o seu camarim, “Hoje eu quero a rosa mais linda que houver”, e você respondeu: “Acho que o cavalheiro errou de show!”
MB: [Gargalhada] Lembro não.
PLAYBOY: De que tipo de mulher ou homem você gosta?
MB: Um homem ou uma mulher educados. Tendo educação, já pode começar a conversar. Não é chegar assim e ir entrando.
PLAYBOY: O que atrai você?
MB: Inteligência, beleza.
PLAYBOY: E os fetiches?
MB: Mãos expressivas. E tenho obsessão por pés.
PLAYBOY: Os seus pés foram a obsessão do poeta Vinícius de Moraes, não é?
MB: Ele adorava! Quando fiz o show “Rosa do Ventos”, em 1971 e quebrei duas vezes o dedo do pé, levei uma bronca furiosa dele. E eu disse: Vinícius…não foi por querer…[risos]
PLAYBOY: O que as pessoas por quem você se apaixonou têm em comum?
MB: Inteligência, delicadeza…
PLAYBOY: Isso muita gente tem.
MB: …e a flecha do cupido. Acredito nisso. Flechou, acertou, matou. Tive paixões tão estranhas que duram até hoje e que não sei nem contar. Mas foi tão intenso…nem cheguei a viver com essas pessoas, mas guardo com paixão. Me aquecem.
PLAYBOY: Dizem que seus amores mais intensos foram Gal Costa, Leina Crespi, Renata Sorrah, Ângela Ro Ro.
MB: [sem se alterar] Dizem muita coisa, publicam muita coisa toda vez que eu faço sucesso. Mas não ligo, de algum modo, Deus me protege. Essa coisa se esvazia porque é tão acintosamente um recalque, um rancor, as pessoas ultrapassam, perdem a mão…
PLAYBOY: A fofoca é mais pesada quando é feita por homem ou mulher?
MB: Esse tipo de coisa já veio dos dois lados.
PLAYBOY: Você nunca cita nomes de pessoas que amou?
MB: Nunca. Acho isso uma indelicadeza, tenho de respeitar as pessoas com quem vivo, vivi, viverei, com quem não vivi, não viverei.
PLAYBOY: Disseram que você contou que a apresentadora de TV Márcia Mendes era tomada pela Pomba-Gira.
MB: Meu Deus…
PLAYBOY: E que Ro Ro disse: “Me apaixonei pela Bethânia quando a vi. No fundo ela é underground, subversiva, tresloucada, louca”.
MB: Não sinto nada disso, mas você perguntou, vou responder: Acho uma deselegância dizerem que eu disse isso dessa moça, Márcia Mendes, que já morreu. Fui muito próxima, muito amiga, tive uma relação afetiva muito intensa com ela. Era uma pessoa totalmente deslocada do mundo, teve uma morte horrível [de câncer generalizado], sofreu a vida inteira. Conheci Márcia casada com [o produtor fonográfico] André Midani, quando eu era contratada da Polygram. Era uma moça de beleza rara. Acho uma covardia falar dessa moça, que já morreu.
PLAYBOY: Mas a Ângela Ro Ro está viva.
MB: Está viva, pode falar o que quiser e eu posso me defender. Ângela é uma compositora por quem eu tenho um profundo respeito, cantei canções dela, cantarei sempre que fizer canções muito boas, e me oferecer. Agora, não quero ter contato pessoal nenhum com a Ângela, porque é uma pessoa que não me interessa. Não me interessa conversar, não me interessa o que ela pensa, o que ela faz, como ela age. A compositora que ela é me interessa, e muito. Agora, se para compor o que compõe ela tem que viver o que vive, problema dela, coitada dela, vire-se! Existem pessoas que têm necessidade de se desagregar, e, como não têm coragem para fazer isso sozinhas, precisam bater em alguém para ter uma resposta. E enfim serem ajudadas a se atirar no fundo do poço.
PLAYBOY: Esse é o comportamento do suicida.
MB: Ângela é suicida. A cada seis meses tenta um suicídio. Não que ela corte os pulsos, mas faz uma cena para se matar. Quer ser desrespeitada, detestada, abandonada, destratada. Isso pra mim é suicídio. Agora, é problema dela que seja assim. Não sou amiga de Ângela Ro Ro. Mas isso não me bota cega diante de sua música, que em muitos momentos é extraordinária.
PLAYBOY: Ro Ro disse que você tem medo da sua sexualidade, que ela é fêmea e que você também é, não precisa ter dúvidas sobre a sua sensualidade.
MB: Não sei onde ela se apóia pra dizer isso. Ela só pode fazer interpretações artísticas, que é onde ela me vê. Nunca foi à minha casa, nem eu à dela…
PLAYBOY: Além da sua sensualidade, como é que você consegue ficar há tanto tempo no coração do público?
MB: A explicação é uma: a verdade. É aí que está o segredo de tudo. E no palco você não pode mentir. Chico Buarque, Milton Nascimento, Elis Regina, Gilberto Gil, Caetano, Gal e Eu somos uma geração de muito poder. Os compositores foram os melhores, até hoje não conseguimos nada melhor que o Chico.
PLAYBOY: O Brasil parou em vocês?
MB: Não foi isso que eu disse. O Brasil está andando, a música popular brasileira cintilando, e pela primeira vez em muito tempo veio uma onda de compositores com qualidade. Nesse meio tempo surgia um Djavan, ficava um pouco, virava um pouco americano, sumia, voltava. Vinha um Alceu Valença…mas acontecia esporadicamente. Agora, não. Sem fazer comparações, sem dizer se é melhor ou pior, integrei uma enxurrada muito elegante a este meu último disco, “Âmbar”. Chico César, Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown, Adriana Calcanhotto.
PLAYBOY: Antes só tinha Chico e Caetano…
MB: Eles abasteciam nossas carreiras. Só que, agora não dá. Eles têm que trabalhar muito para eles mesmos. Caetano não pára de fazer show. E quando o Chico, coitado, consegue fazer oito, dez, doze faixas inéditas, faz o disco dele. Como o Brasil sempre foi mais generoso em intérpretes do que em compositores, as vozes são muitas…
PLAYBOY: E raras como a sua…
MB: Voz de contralto.
PLAYBOY: Algum cuidado especial?
MB: Tem um segredo que uma professora de voz me deu no teatro Opinião, ela tinha 80 anos e eu, 18: não fazer nada! Disse apenas: “Menina, nunca deixe ninguém mexer na sua voz. Ela tem uma cor única”. Nunca estudei nem fiz curso de canto…
PLAYBOY: Mas exercícios você faz…
MB: Só para não ficar rouca. A cantora lírica Maria Lúcia Godoy também foi ao meu camarim há uns dez anos para me ensinar uns execícios de respiração na testa.
PLAYBOY: Como é isso?
MB: O som sai da testa, e não da garganta, a gente não sacrifica as cordas vocais. Mas a testa dói muito. Esse exercício abre o terceiro olho.
PLAYBOY: Então cantar, para você, é um ritual místico?
MB: O palco é minha casa, minha água, é onde eu existo. O sentido de estar viva na terra. Tudo o que sinto, percebo, pressinto, intuo e vivo é canalizado para o palco.
PLAYBOY: O resto da vida é acessório?
MB: Fico fazendo hora para o tempo passar, para poder subir no palco outra vez.
PLAYBOY: Você acha que passa isso para o público?
MB: Tem casos de pessoas que assistiram 36 vezes ao mesmo show. Uma vez, fui procurada por uma mulher com uma expressão desesperada, no final do show. Ela dizia: “E agora, o que é que eu faço com tudo isso? O que é que eu faço, pelo amor de Deus”…
PLAYBOY: O que você respondeu?
MB: Não tem resposta. São coisas que passam sem a gente perceber. Eu sei de gente que vai assistir ao show calibrado com um drinque antes e o motel reservado pra depois. Bebem a energia, ela não termina quando o show acaba.
PLAYBOY: E você, como sai?
MB: Exausta [risos]. Desabo na cama e durmo.
PLAYBOY: É como se tivessem tirado tudo de você?
MB: Não, EU é que dei tudo. Minha irmã Nicinha, que eu chamo de babá, já sabe. Quando chego depois do show, ela diz: “Bom, até já, que eu vou guardar a bolsa”, e não volta mais. Sabe que eu não volto muito normal. É isso há anos.
PLAYBOY: Redondos: 50 de vida, 35 de carreira, 35 discos.
MB: Já passei por todas as gravadoras do Brasil. Sou o contrário da Fafá de Belém, que, num programa de TV em que os quatro convidados dela eram presidentes de gravadora, dizia, muito orgulhosa, que nunca tinha brigado com eles. Eu brigo com todos e vou-me embora [risos]. Gravadora é para vender, e eu, para criar. Tem que haver desentendimento.
PLAYBOY: Você também não levaria ninguém à televisão, porque detesta, não é?
MB: Eu não rendo em TV. É fria e tem regras assumidas, quem entra num estúdio de televisão, tem de gritar. Ninguém diz: “Por favor, você poderia sentar ali?” Não, é assim [aos berros] “Maria Bethânia, senta ali” [risos]. Não é humano. Você está cantando, o câmera erra alguma coisa, o diretor grita, estremece o mundo e seguem-se muitos palavrões. Todo mundo é poderoso. O diretor fala: “corta”! e você some. Fico desse tamanhinho.
PLAYBOY: Por causa da sua aparição no programa da Hebe, há dois meses, você foi incluída entre os espantalhos da TV, junto com a primeira dama Ruth Cardoso e o cirurgião plástico Ivo Pitanguy.A audiência caiu dois pontos…
MB: A Hebe me convidou tanto que eu fui. Só que não agüentei, na hora de entrar pedi para ir embora. A Hebe implorava e eu chorava…É ruim porque TV é obsessão no Brasil e preciso divulgar meu disco.
PLAYBOY: Você vê televisão?
MB: Só esporte. Sou louca pelo Chicago Bulls, não perco um campeonato.
PLAYBOY: E novela, você acompanha?
MB: Quando o par romântico era Dina Sfat e Francisco Cuoco eu não perdia [risos]. A Dina chegava a me ligar no Canecão, em pleno show, para avisar: “Não perca a cena de amanhã, vai ter camisola preta” [risos]. Eu adorava as cenas em que ela punha camisola preta. De lá para cá…Santo Antônio!, piorou tudo nas novelas, até a luz. Claro, tem o Raul Cotez, o Lima Duarte, que é gente de teatro. Esses valem a pena.
PLAYBOY: Você se inspira em alguém? A musa não era a Janis Joplin?
MB: A gente se conheceu, ela gostava de mim, fez questão de vir á minha casa quando esteve no Brasil em 1970, mas já estava catatônica com a heroína. Mas o desconforto que ela e o guitarrista Jimmy Hendrix expressavam, tinha a ver com o tropicalismo. Era aquela alegria por trás, um querer bem ao Brasil e o lema “não parecemos com ninguém, mas temos estilo”. Sem a humilhação que o brasileiro normalmente ostenta, sem botar tapete vermelho pra estrangeiro.
PLAYBOY: Foi isso que você comentou sobre o terceiro disco da Marisa Monte, dizendo que era a primeira vez que ela parecia contente em ser brasileira?
MB: E sem mostrar que fala inglês! Ela se vendeu assim: sou bem-nascida, só me identifico com Nova York, a minha música, a minha maneira de vestir e de andar têm uma raiz nova-iorquina. Os discos nova-iorquinos dela são ótimos, só não me tocam o coração como esse que elogiei [Verde, Anil, Amarelo, Cor-de-Rosa e Carvão, de 1994]. Não se iluda, ela não deixou de ser nova-iorquina, não. Mas jogou com o charme do Paulinho da Viola e o violão do Gil.
PLAYBOY: Você não canta em outra língua?
MB: Não. Quando enfio umas canções espanholas no repértório é porque têm a cara da gente. Agora, não sei quando, vou fazer um disco – UM disco – com canções francesas, porque sou apaixonada.
PLAYBOY: Por Paris?
MB: Queria até fazer o clipe de Âmbar cantando “Chão de Estrelas” com cenas de Paris à noite. Você viu alguma coisa mais parecida com Paris do que “Tu pisavas nos astros distraída/Sem saber que a ventura dessa vida/É a cabrocha, o luar e o violão”…? Não dá uma força enorme numa canção carioca, que se refere ao morro do Salgueiro, com imagens de Paris? Mas a gravadora cancelou.
PLAYBOY: Paris é tão familiar assim para você?
MB: É igual a Santo Amaro da Purificação [risos]. Sempre tive fixação por Paris. Quando dizia que ia viver viajando para lá, meus amigos baianos diziam: “Oxente, essa menina é pequena, mas fita os Andes”. Chego lá e é como se estivesse em casa, ando sem parar, e tropeço nos astros distraída…no lobby do hotel.
PLAYBOY: Onde você costuma se hospedar em Paris?
MB: No L’Abbaye
PLAYBOY: Não é lá que ficava Jorge Amado?
MB: É, e meu companheiro de quarto, o Mastroianni! Quer dizer, ele se hospeda no mesmo quarto que uso quando vou a Paris, e fica tomando champagne na lareirinha lá de baixo, rodeado de um monte de atrizes francesas maravilhosas, todas ex-mulheres dele, Catherine Deneuve entre elas.
PLAYBOY: Você se senta lá também?
MB: Não, mas divido o chuveiro com ele. Só tem um quarto no L’Abbaye com chuveiro normal, os outros são aqueles europeus, estilo telefone de mão, que você tem que ficar segurando. Então, só me hospedo no quarto 3. Mas teve um reveillon em que eu estava no meu quarto e o Mastroianni chegou querendo ficar ficar ali. Falei com o porteiro e soube que aquele chuveiro em pé foi o Mastroianni quem mandou instalar. Achei que ele merecia que eu cedesse o quarto, eu ia passar a noite fora de qualquer jeito. ele me mandou um recado dizendo que voltava dia 2 para a Itália. E eu mandei um bilhetinho: “Mastroianni, pode ficar” [risos]. Não é pra me sentir em casa?
PLAYBOY: Vamos voltar pra cá. Ficou em todo mundo uma dúvida, desde 1965, quando você cantava Carcará…Era um ato político que tinha a ver com o marechal Castello Branco, na presidência depois do golpe militar de 1964? Afinal, Castello era fei e, como o carcará, nordestino.
MB: Carcará é um pássaro feio, forte, violento, que tem o poder de carregar até mesmo uma águia. E o autor da música, João do Vale, é um cara intuitivo, estávamos numa ditadura em 1965, ele sabia que a música ia ser usada no espetáculo do Opinião contra a maldade e o poder dos militares. Era também a força do nordestino, do homem brasileiro dizendo: sai de baixo que eu também sou carcará”
PLAYBOY: Você disse que não mistura arte com política…
MB: Mas, como todo artista, sou uma esponja, assimilo, chego no palco e boto pra fora. Foi isso que aconteceu no panorama musical daquele período. Depois, não melhoramos muito. Saímos desses anos negros para cair numa cilada perversa capaz de causar danos iguais ou piores. Como eleger aquela quadrilha que nos desducou, desnorteou e tirou tudo do lugar.
PLAYBOY: Você está falando…
MB: …daquele presidente que a gente botou pra fora.
PLAYBOY: Fernando Collor.
MB: [Bate na madeira 3 vezes e sopra]. Não digo o nome dessa miséria.
PLAYBOY: Você fez campanha por Tancredo Neves, não foi?
MB: Achava o Tancredo um velhinho maravilhoso e torci por uma idéia, “Diretas Já”. Campanha mesmo foi só para Fernando Henrique em 1994. Nunca mais faço outra…
PLAYBOY: Por Quê? Você se decepcionou?
MB: Está sobrando miséria, violência, desemprego e as pessoas fingem que não estão vendo. Lembro-me do julgamento dos “anões do orçamento”, no qual aquele deputado descarado, Genebaldo Correia, aquele moleque lá da minha terra, olhava para um cheque dele mesmo e respondia: “Não lembro, não” [risos]. Ele “esqueceu” de ter comprado uma fazendinha de 1 milhão de hectares. Pois o poder brasileiro hoje é genebaldo.
PLAYBOY: E quanto ao senador Antônio Carlos Magalhães, que apóia o governo?
MB: O Tonico? Ele é como saraptel: ou se ama ou se odeia. Adoro ele, é supermaravilhoso, a gente se envia telegramas nos aniversários. Antônio Carlos é um homem poderoso, que mexe com emoçõs exageradas, sentimentos extremados. Todos os estados têm seus caciques, ele é louco pela Bahia, faz uma campanhas no jornal e na rádio, com: “orgulho de ser baiano”! E é machão, desacata todo mundo e divide os baianos. Em todos os espetáculos que fiz, desde a estréia no Rio, dentro ou fora do Brasil, ele estava na platéia.
PLAYBOY: Você vota nele?
MB: Nós somos uma família de esquerda, não temos formação para apoiar o pensamento do senador, que é de extrema direita. Além do quê, voto aqui no Rio. Mas esse homem trata o artista com respeito e distinção. E sempre reverencia minha mãe, Canô, da maneira mais nobre e clássica. Esse gesto de delicadeza tem de ser agradecido, porque é educação que está faltando no Brasil. E olha, quando a igreja da minha cidade, que tem 400 anos, caiu, não houve político de esquerda que desse jeito. Telefonei para o Tonico e foi na hora! E eu não posso pensar em viver sem a Igreja da Nossa Senhora da Purificação de pé.
PLAYBOY: O presidente também é um homem distinto?
MB: Fernando Henrique, que conheci há muitos anos em Paris, na casa da minha amiga Violeta Arraes, é inteligentíssimo, bem-humoradíssimo, honestíssimo e tem uma conversa bacaníssima. Agora, como é que ele permite que no governo dele as escolas exijam avalista para matricular uma criança?
PLAYBOY: O Lula seria um presidente melhor?
MB: Votei nele, em 1989. Chorei na hora do voto, fui criada ouvindo meu pai, funcionário dos Correios, carteiro e porta, dizer que queria um trabalhador na Presidência do Brasil.
PLAYBOY: E o que acha do envolvimento de artistas em outro tipo de campanha, como a que Daniela Mercury fez para a Antarctica?
MB: A conta da antarctica é do publicitário Nizan Guanaes, que é baiano. Ele patrocina e usa a Daniela. Agora a Daniela está com uma música na novela [À Primeira Vista, de Chico César, na trilha de 'O Rei do Gado'], até que está tocando bem. Mas soube que o segundo disco foi um equívoco. Eu não suporto a axé music, acho um cão. Mas a Daniela tem talento.
PLAYBOY: E a Adriana Calcanhotto?
MB: Não coloque Adriana no nível de Daniela, que não tem nada a ver. A Calcanhotto é uma compositora muuuuuuito booooooa, uma menina que tem um trabalho diferenciado, especial, nobre e com muito humor, sem perder o pé no popular. Faz as performances mais loucas, as poesias mais absurdas, os discos mais complicados. As gravadoras devem se arrepiar todas quando Adriana entra no estúdio. Ela declarou que não gosta de música com princípio, meio e fim, o que é, no mínimo, louco e maravilhoso.
PLAYBOY: E Daniela?
MB: É uma moça bonitinha, gostosinha, bem-feitinha, faz essa linha pernoca-de-fora, tem talento, sabe dançar, sabe fazer tudo. Mas canta uma musiquinha que não é nada.
PLAYBOY: Quem toca o seu coração?
MB: Nora Ney é chiquérrima. Dalva de Oliveira é campeã. Hoje a voz que me comove no Brasil é a de Nana Caymmi.
PLAYBOY: A onda Mamonas Assassinas não pegou você?
MB: Tive pena da morte dos meninos, mas tinha uma grossura braba ali.
PLAYBOY: E o Tiririca?
MB: É a prova de que o brasileiro se identifica com suas misérias: o palhaço sem dente, falando palavrão. Música sertaneja, baião, festa junina, forró, repente, xaxado…tudo descambou para essa coisa porca.
Parece aquele filme horrível com aquela atriz estranhíssima que ataca o Michael Douglas…
PLAYBOY: Assédio Sexual, com Demi Moore?
MB: …a grande vedetinha, o maior salário de Hollywood, essa mulherzinha que deu para fazer strip-tease e casar com aquele machão [o ator Bruce Willis]. Pior mesmo, só 9 e 1/2 Semanas de Amor, nojento, medonho, saí do cinema no meio do filme. Eu adorava o Waldick Soriano cantando “Eu Não Sou Cachorro Não”, mas não acho a menor graça no fulano que canta hoje “Eu Não Sou Corno Não”.
PLAYBOY: Como você escapa dessa poluição radiofônica?
MB: Não ligando o rádio. E lendo Mônica, Cebolinha, Pato Donald, Tarzan, Fantasma, Drummond, Pessoa, Verlaine, Baudelaire e Proust.
PLAYBOY: Nessa ordem?
MB: [risos] Na ordem inversa. Em quadrinhos eu me viciei depois de grande. Agora, Proust eu lia com 14 anos porque um grande amigo meu, Alvinho, me aconselhava: “Bethânia, você tem de ler Proust muito cedo, para já arrancar na vida sabendo das coisas”.
PLAYBOY: Você entendia o que lia?
MB: [rindo] Dançava. Quando desembarquei no Rio, três anos depois, minha amiga Teresa Aragão voltou a me aconselhar: “Esquece o que você leu, leia tudo outra vez; você não tinha juízo para ler Proust”. Na época, obedeci porque Alvinho era diretor de teatro. E tudo o que eu queria na vida, era fazer teatro.
PLAYBOY: Você nunca fez?
MB: O que eu gosto no teatro são os extremos. De um lado, circo, picadeiro, trapézio. Do outro, personagens como Electra ou a Adela de “A Casa de Bernarda Alba”, de García Lorca.
Descobri que me realizo mesmo é misturando teatro a circo no espetáculo….e cantando.
PLAYBOY: Você nunca teve medo do palco?
MB: Nenhum. Hoje tenho medo de tudo, até de avião. Passei a ter medo das coisas de que mais gostava. Trovoada, por exemplo.
PLAYBOY: Seu orixá não é Iansã?
MB: Precisamente, a senhora dos raios, dona das trovoadas e da tempestade. Tenho medo, horror, pavor também de…aquele inseto nojento…que é igual àquela pessoa cujo nome eu não falo…
PLAYBOY: Barata?
MB: [Bate na madeira três vezes e sopra. Risos.] Tenho horror de rato, também. O que eu era corajosa antes…acabou. Andava de moto a 150 km por hora. Enfrentei o Teatro Opinião sem sentir nada. O medo veio agora, retroativo.
PLAYBOY: Quando foi chamada pelo Opinião, aos 18 anos, você viajou sozinha?
MB: Caetano teve de me acompanhar, ou meus pais proibiam…eu era virgem! Caetano e eu sempre fomos muito unidos, parecidos.
PLAYBOY: O escritor argentino Julio Cortázar, quando viu um espetáculo de vocês dois, em 1975, no Rio, definiu: “Ele e a irmã são a mesma pessoa”.
MB: Isso porque ele não viu o resto da família. Somos oito irmãos, dois adotados, alguns muito parecidos…Mas Caetano e eu somos grudados. Quando nasci, ele tinha 4 anos e me deu o nome.
PLAYBOY: Tirou de onde?
MB: De uma valsa linda do Capiba, compositor pernambucano, gravada por Nelson Gonçalves. Meu irmão Rodrigo queria Mary Gislene, nome de uma rumbeira do circo por quem estava apaixonado. Entre a valsa e a rumbeira, meu pai agarrou um boné e fez um sorteio, cada um pôs um nome. Saiu Mary Gislene [risos]. Mas Caetano fez birra.
PLAYBOY: Caetano disse que você se atirava no chão, que era exótica, rebelde…
MB: [rindo] Me atirar, sempre me atirei. Enchia o tanque de água e pulava, achando que era o mar. Dava saltos de trampolim da cabeceira da cama, sonhava que estava dando um mergulho e ficava estática no ar. Como tinha umas unhas gigantescas e pintava cada uma de uma cor, me achavam muito exótica lá em casa. Me enchia de pancake na cara, tipo máscara de índio americano, me enrolava numas roupas de cânhamo misturadas com fios de couro e cobre que eu mesma fazia. E essas loucuras todas eu tripliquei, de rejeição e raiva, quando meus pais me mandaram estudar em Salvador. Pasei a me vestir de Fedra, copiando o filme da Melina Mercouri.
PLAYBOY: Você sempre foi assim?
MB: Engraçada, saudável e feliz. O ventre da minha mãe é muito limpo. Todos os filhos têm muito humor, o que é fundamental.
PLAYBOY: Um humor um tanto alterado, segundo dizem…
MB: Oscila, sim. Tenho um rubi no coração com 29 pontas, vai para todos os lados, dá para muitas pessoas e emoções. Por outro lado, sou quieta, interiorana…
PLAYBOY: …e, por outro, arrumou alguns desafetos. Todo mundo soube daquela corrida que você deu no Guilherme Araújo, seu ex-empresário, na sua própria casa, saindo do banheiro, nua. É verdade que você caiu de pancada em cima dele?
MB: [Séria]. Hoje ele é meu grande amigo. Tivemos uma discusão muito violenta, mas foi ótima.
PLAYBOY: Problema de dinheiro?
MB: Não. Aquela discussão maravilhosa, de trabalho, foi porque eu sou muito ciumenta. Ele queria trabalhar com a Gal e o Caetano…Queria que eu fizesse mais show do que eu podia…Foi construtivo.
PLAYBOY: Pode ter sido construtivo, mas houve tapas.
MB: Não, já passou, somos amigos. Guilherme acabou foi inimigo da Gal, com quem não fala até hoje. Pelo Caetano, tem respeito. As pessoas têm é que entender o Guilherme, tudo nele é muito passional. A vida dele não tem a distância do empresário, é relação de casamento. Mas ele gosta de mim. Nos meus 50 anos, pegou uma foto minha aos 25, mandou fazer um cartão lindo e deu para todos os meus amigos.
PLAYBOY: Mas você rasgou o contrato que tinha com ele…
MB: Realmente, fui ao escritório dele e falei: “A partir de hoje estamos rompendo nosso contrato. Nós não temos contrato de nada, nem de trabalho, nem de amizade, nem de amor, nem de nada. A-ca-bou. A-deus.” Ele chorou, disse que eu estava errada. Mas fui embora. Eu sou assim.
PLAYBOY: Com Ronaldo Bôscoli também teve briga?
MB: Briga, propriamente, não. O Ronaldo, que Deus o tenha, foi um jornalista que me perseguiu aaaaaaaaaaaaaanos, na coluna dele. De repente, começou a dizer que eu era deusa. Nunca me aproximei dele.
PLAYBOY: Não foi com ele que você e Caetano se desentenderam já no primeiro Festival Internacional da Canção, em 1966, no Maracanãzinho, no Rio? Era uma canção Do Caetano e do Gil, “Beira Mar”?
MB: O Ronaldo Bôscoli, carioca, estava no júri e falava pros jornais: “Ué, o que esses baianos estão pensando? Eles não conhecem Cabo Frio, Saquarema, Araruama, Angra dos Reis? Estão falando que o mar da Bahia é o mais azul do mundo?” E Caetano, que já era metido a galo de briga, se enfezou. A música foi desclassificada, né?
PLAYBOY: Você não brigou também com a Nana Caymmi?
MB: Nana? Não vive sem brigar com alguém [risos]. Morro de medo dela, tremo…e morro de rir
PLAYBOY: Você teve outro desafeto: Glauber Rocha.
MB: Briga não houve não. Mas quando Glauber fez o “Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro”, eu cantei uma música no filme e ele cortou. Era um verso, “Será que o sol quebra a vidraça/ Será que o sol vai quebrar?”, só isso. Gravei durante dois dias, só porque amava o Glauber e minha melhor amiga era a irmã dele, a Anecy Rocha. Glauber era um deus. Ficava trabalhando nu em casa, criava um clima. A Anecy falava: “Bethânia, não vai lá porque o Glauber está trabalhando”, e eu ja sabia que significava: Glauber está nu. Eles morriam de rir, mas eu ficava muito tensa, aí a Anecy tentava relaxar: “Vamos quebrar uma loucinha por aí” [risos] , o que, na época, significava “vamos dar uns amassos”.
PLAYBOY: Por que o Glauber cortou a cena da música?
MB: Não sei. A Anecy explicou que ele precisou tirar toda a seqüência. Claro que eu nunca cobrei nada, imagina. O Glauber me convidar? Um luxo! Só que um dia estava no bar Zepellin quando a Odete Lara, que era atriz no filme, chegou à mesa e fez uns comentários muito ruins, botando tudo pra baixo. E eu, claro, reagi, fiquei com raiva.
PLAYBOY: Você continuou amiga do Glauber até a morte dele?
MB: A gente se via muito em Paris, ele e a mulher dele, Juliet Berto. Era uma francesa linda que eu amava, com quem ele teve a última casa na França, e que durante um show que fiz no Olympia, me deu todas as relíquias do Glauber. Fotos, cartas, cartazes de filmes, recortes. ela confiou isso amim e levei direto à mãe dele.
PLAYBOY: Você falou do seu humor alternado, revendo seus desafetos, seus períodos negros. É verdade que, nos anos 60, você tentou suicídio tomando Varsol e barbitúricos?
MB: Não importa se tomei Varsol, se não tomei, se foram cinco ou dez comprimidos. Acho que quem tomou Varsol foi uma amiga minha, eu fui só nos barbitúricos. De qualquer forma, estava num processo depressivo, por nada, ia tudo bem, carreira, dinheiro….Eu morava numa cobertura na Rua Nascimento Silva, em Ipanema, brincava muito nas areias das “Dunas da Gal”, andava de boate em boate. De repente, foi tudo ficando triste e banal. Comecei pedindo remédio pra dormir, fui tomando, paguei e não acordava mais. O que importa é que não morri.
PLAYBOY: O que tirou você desse buraco? Psicanálise?
MB: Foi. Passei por três psicanalistas. Fez brotar uma coisa em mim, me despertar, jogar essa angústia fora, agüentar a dor. Depois tive perdas muito fortes, meu pai morreu e o máximo que me aconteceu foi ficar mancando.
PLAYBOY: Você tem medo de ficar velha?
MB: Nenhum. Meu cabelo demorou a ficar branco e eu peço aos fotógrafos que não disfarcem, nem na capa do meu disco. Também não vou fazer plástica nenhuma. Foram 50 anos para chegar até aqui, pretendo me divertir muito e não jogar nada fora. Até minha voz melhorou.
PLAYBOY: Qual é a parte do seu corpo que você acha mais bonita?
MB: Gosto do meu corpo, minha cara, meus pés, minhas mãos quando estou cantando. Fora do palco, eu me esqueço.
PLAYBOY: Você nunca quis ser rechochuda?
MB: Nunca quis ser diferente do que eu sou. Convivo muito bem comigo, não me atrapalho em nada.
PLAYBOY: Você gosta de ser sexy?
MB: Não me acho sexy.
PLAYBOY: Mas gosta de sexo. Sexo é fundamental?
MB: Importantíssimo.
PLAYBOY: Só de olhar alguém você saberia dizer se se trata de uma pessoa realizada no sexo?
MB: Ah, não sou assim craque, não, menina [gargalhada]. Como dizia uma amiga: às vezes é rebate falso! [gargalhando]
PLAYBOY: Mas você diria que sexo muda as pessoas a ponto de outros notarem?
MB: Não acho que seja tão evidente assim. Depende. Conheço pessoas de uma beleza, de uma profundidade, de uma expressão…que jamais tiveram qualquer relação sexual na vida.
Pessoas de chorar de tanta beleza. E conheço outras que transam, fazem muito amor, são muito dirigidas para o sexo. Tem períodos mais animados para o sexo, mas, mesmo não praticando, existe o sexo na cabeça.
PLAYBOY: O sexo ficou banal?
MB: Ficou. Para mim, não tem graça nenhuma. É fácil e rápido? Não quero, obrigada. Eu gosto da coisa com tempo, é uma perna que passa, é um olhar demorado, isso é que eu acho sensual e bonito.
PLAYBOY: Você acha, como tanta gente, que sexo é pra se fazer todo dia?
MB: Tô fora. Parece que é escovar os dentes, o Fantástico anunciando, “escovar os dentes todo dia, fazer sexo todo dia, comer tomate, senão morre”. Menina, o povo vive doido!
PLAYBOY: Então a liberação fez mais mal do que bem?
MB: Tem muita gente nova fazendo sexo assim, porque não tem o que fazer. Isso é loucura. O namoro ainda é o grande momento.
PLAYBOY: E os complementos?
MB: Lençol de cetim claro. Adoro. Mas na verdade prefiro linho. Sou apaixonada, não esquenta, e no lençol fica bom.
PLAYBOY: E roupa?
MB: Acho mais bonito uma mulher sob uma cachoeira vestida do que nua, acho mais bonito tirar a roupa de uma pessoa do que já encontrá-la sem. Tudo pra mim tem que ter teatro.
Você vai se sentar para almoçar, não tem teatro nisso? Senta, desdobra o guardanapo, pega o copo…é teatro. A mesma coisa numa relação de amor ou de amizade.
PLAYBOY: A vida é um cenário…
MB: E tem que ser bem feito, com boa luz. Um bom espetáculo!
PLAYBOY: Você é ciumenta?
MB: Sou. Demais. De tudo.
PLAYBOY: Seus amores acabam por isso?
MB: No amor é onde sou menos ciumenta. Sou muito mais com os amigos, família, trabalho. Para trabalhar comigo tem de ser 24 horas para mim. Mas sou ciumenta também nas paixões…
PLAYBOY: Você namora duas pessoas ao mesmo tempo?
MB: Já fiz.
PLAYBOY: Quando era jovem?
MB: [Rindo] Nem tão jovem…
PLAYBOY: Ontem mesmo?
MB: Não. A gente tem na cabeça a idéia de que pode trair porque tem juízo e o outro não pode porque não tem. Já caí nessa, não caio mais. Não tenho mais vontade de anarquia.
Já brinquei demais…[pausa] E continuo brincando [gargalhada].
PLAYBOY: Mas não tem essa de viver um amor de cada vez?
MB: Sempre que se ama, se vive um grande amor de cada vez…
PLAYBOY: É um pouco coisa de mulher só fazer amor com quem ama?
MB: Concordo ple-na-men-te.
PLAYBOY: Se você tivesse que dar um conselho às mulheres, o que diria?
MB: Procurar ter prazer em tudo. quem está sendo traído, que parta pra outra, esqueça…tem tanta mulher, tanto homem no mundo…
PLAYBOY: É fácil assim?
MB: Nada é fácil nesta vida. Mais difícil é ser humilhada, traída, amargurada, se achando gorda, feia, velha, desprezível…Não!! Segura a onda! Parte pra outra. Ou então agüenta essa numa boa. Se gosta tanto que não pode viver sem, aproveita o tempo que tiver, todo mundo vai ficar mais feliz.
PLAYBOY: Quem a AIDS penalizou mais: o homem ou a mulher?
MB: Pior é a situação da mulher, a grande sofredora dessa história. Porque homem não tem vergonha na cara, mesmo. Parece que achou na lata de lixo, vai com homem, mulher, periquito, papagaio, de tarde, no ônibus, no elevador, debaixo da mesa…e a mulher em casa, séria, ajuizada…contaminada. E olhe lá se não vai ter júri por aí para dizer que foi a mulher que contaminou, que é a vadia.
PLAYBOY: De qualquer forma, é cruel…
MB: O choque da AIDS veio como um castigo à leviandade. Estava demais. Precisava de um freio, era um não-tinha-mais-onde-parar. O castigo veio cruel e já perdi muitos amigos, fico apavorada, tenho sobrinhos, sobrinhas, filhos de amigos jovens, e o Brasil não tem sequer uma campanha digna, convincente, é uma misériao que vem sendo feito. Convivo com pessoas instruídas e pergunto: Transou com camisinha? Não? Então tem que se internar, porque é loucura. Isso porque a campanha no Brasil é assim: “Se possível, use camisinha”.
PLAYBOY: Não é coisa de país macho? A camisinha faz muita gente desanimar…
MB: Mas é um tipo de relação sexual que não é carregada por nenhum sentimento ou atração mais forte, é a mecância do sexo. É a famosa excitação artificial, para ter a relação naquele momento. Igual a parar no posto de gasolina e trocar o óleo de um carro. Já ouvi de muitas amigas: “Até pensar na camisinha, eu mesma já perdi a vontade”. Meu queixo cai.
PLAYBOY: Você acha que a Bahia tem a ver com sua sensualidade?
MB: A Bahia é muito sensual e não estou falando só de mim, não. O povo baiano tem languidez…um jeito ali…uma gingada aqui…
PLAYBOY: Dizem que é porque baiano come muito marisco.
MB: Tem um específico: Mapé. Uma delícia. Muita vitamina E. Dizem que é afrodisíaco. sobre o mapé brinca-se muito, porque os pescadores da região vêm com umas histórias. Teve um que teve filho aos 100 anos, e a base da comida deles é o mapé. Que é pequeno, mas saborosíssimo. Quem for à Bahia, não pode deixar de comer moqueca de mapé.
PLAYBOY: Que mais a Bahia tem de tão especial?
MB: Acho que é tudo. Até o mar da Bahia é morno como a barriga da mãe da gente. Nunca vou perder essa vontade de estar cercada das águas baianas, mar, cachoeiras e rios, nunca vou perder essa saudade.
PLAYBOY: Como você cura essa saudade?
MB: A casa onde moro no Rio, há 21 anos, em São Conrado, eu construí no estilo de uma antiga fazenda baiana misturada com o Japão [risos]. Fica no pé da pedra da gávea, que era uma ilha onde os fenícios deixaram marcas, ou talvez fossem hieróglifos do Egito antigo gravados no granito, porque ali era uma ilha. Quer dizer, morando na Estradas das Canoas, estou no fundo do mar.
PLAYBOY: Tem cachoeira em casa?
MB: E controle remoto pra regular o jato! Não posso viver sem isso, sou louca por água, é Iansã e Iemanjá em mim.
PLAYBOY: Quantos santos você tem?
MB: Muitos. Como fui criada na religião católica, na minha casa tem Santo Antônio, Senhor do Bonfim, Santa Bárbara, Nossa Senhora da Purificação, a Sagrada Família, Deus Menino, tenho de tudo que é para minha adoração. E uma casa de santos para o candomblé, que não comporta imagens.
PLAYBOY: São as suas relíquias?
MB: Entre outras. Tenho, no altar dos meus troféus, um par de sandálias douradas, de plataforma altíssima, que pertenceu a Carmen Miranda, um vestido de Dalva de Oliveira e as pulseiras de Eliseth Cardoso.Tudo é relíquia. Mas não se pode misturar candomblé com o resto.
PLAYBOY: Você tem medo de despacho de macumba?
MB: Naquela época do suicídio disseram que tinha muito despacho em cima de mim, mas eu nem conhecia candomblé. Sabe como eu conheci Mãe Menininha? Por meio de Vinícius de Moraes.Foi ele que me apresentou a ela, uma das maiores alegrias da minha vida. Paixão, paixão, paixão!! Eu, baiana, não sabia de nada, tanto que encerrava o “Rosa do Ventos” vestida de preto da cabeça aos pés. Foi a primeira coisa que o candomblé me proibiu. O preto não combina com meus orixás.
PLAYBOY: Você curte igreja?
MB: Nunca deixei de celebrar meus aniversários com missa, sempre na igrejinha de São Conrado, com o padre Djalma, um dos raros que eu respeito e adoro, um padre de muito juízo, amor e vocação. Mas este ano a capelinha estava em reforma e eu fazia 50 anos. Então, minha mãe fez a festa na Bahia e encomendou a missa na igreja de Santo Amaro. Missa em latim! Olha, foi de uma elegância, de um chique…com três padres, muita pompa, tudo a que eu tinha direito.
PLAYBOY: Você fala muito em Deus.
MB: Quando eu era pequena e acreditava piamente em Deus, Caetano chegou pra mim e disse que Deus não existia. “Acredita não, Deus sou eu, mana, eu é que sou Deus” [risos]. Apesar disso, continuei acreditando em Deus. O que não tenho é muita intimidade com ele. Me dá um pouco de medo…Como fui criada em colégio de freiras, fui ameaçada com a imagem daquele Ser que vê tudo, um perseguidor, um milico tirano me vigiando para me botar em cana a qualquer momento. Intimidade, mesmo, eu tenho com Nossa Senhora, com ela, tudo bem.
PLAYBOY: Quem trabalhou com você jura que não pode ter ruga na roupa, o palco é purificado com sal grosso e você chega para um show com menos de 3 horas de antecedência.
MB: Olha, tem muita fantasia e acaba ficando tudo meio banal. Ruga na roupa não pode mesmo! E nunca chego com menos de 3 horas de antecedência nos meus shows. Mas as coisas que são feitas dentro da religião devem ser preservadas e respeitadas. Numa casa de candomblé se trabalha muito, trabalho braçal, trabalho de concentração, monitoração. Não é nada dessas pequenas bobagens. Mas estou convencida que devo estimular esse tipo de história.
PLAYBOY: Por quê?
MB: Porque sou muito calada, na minha…O que eu NÃO faço é que incomoda as pessoas. Não freqüento boate, não janto em rstaurante, não vou aonde tem foco para ser fotografada. Sou uma pessoa de dentro de casa e saio quando dá vontade e para o que interessa.
PLAYBOY: Você vai à festa de Iemanjá?
MB: Acho imperdível. Quem perder a do Rio pode recuperar os fluidos na festa da Iemanjá baiana, que é no dia 2 de fevereiro, com saída de barquinhos cheios de presentes para a rainha do mar. É a feta mais bonita do Brasil. mas também acho que ninguém deve perder o Boi-Bumbá em São Luis do Maranhão, o Reisado, as nossas tradições para as quias, infelizmente, não temos um ministério da cultura preparado.
PLAYBOY: É uma crítica ao ministro Francisco Weffort?
MB: Eu nem sabia que ele existia. Mas vi o ministro sendo entrevistado num programa de TV, o Roda Viva, e pensei: “Será que estou ficando pirada? Esse ministro é da cultura ou da economia?” Durante 50 minutos ele só falou em verbas, dinheiro e outros palavrões. Depois vi que ele foi homenageado pelas tietas do Brasil, Betty Faria e Sônia Braga. Agora, de tradição ele não entende nada!
PLAYBOY: Isso é um recado?
MB: Estou dizendo que a coisa mais bonita que o Brasil tem é a cultura popular. Sabe quem está preservando estacultura? Famílias simples, como a minha, meu pai, que trabalhava nos correios e ensinou música aos oito filhos. E gente como o Naná Vasconcellos. Ele junta 500 crianças de rua no Recife, ensina todo mundo a tocar com caixa de fósforo, lata de cerveja, tampa de panela.Ensina ritmos, percussão. Passado um tempo, ele elege 100 crianças e faz um disco. Isso é um ministério da cultura! E sabe com quanto dinheiro trabalha? Nenhum! É maravilhoso, mas é dever do estado: preservar, não ter vergonha. para assimilar o que vem de fora a gente não tem de acabar com o que é nosso. Eu faço o que posso.
PLAYBOY: Como?
MB: Por exemplo, fiz questão de colocar a Virgínia, a voz afro-lírica-baiana mais bonita do momento, no meu novo disco. Também mando reza missa todo dia de Reis, 6 de Janeiro.
Minha mãefoi porta-estandarte desta festa durante muitos anos em Santo Amaro e outro dia passou o estandarte para mim.Dancei um pouco na rua, morta de vergonha, mas cumpri a tradição.
PLAYBOY: E no Rio?
MB: Também tiro Reis para os amigos. É uma festa-surpresa. A gente arruma os três reis magos, s pastorinhas, as ciganinhas, os convidados, a orquestra, porta-estandarte, combino com as pessoas e levamos tudo, comida, presentes, bebida. Aí, a gente bate á porta de alguém, canta-se, canta-se, canta-se, até a pessoa abrir a casa e é festa até de manhã. O amigo não gasta nada e se diverte.
PLAYBOY: Para quem você já fez?
MB: A última foi para o Caetano, no apartamento dele no Leblon. A Gal anda enfurnada nessa casa que comprou em Trancoso, está mais preguiçosa de sair da beira do mar. Meus amigos passaram a morar todos em apartamento, andam meio desanimados, precisam levantar com essas coisas.
PLAYBOY: O que você deu?
MB: Camisetas. Mandei imprimir várias. Numa, o título do primeiro romance que li, O Coração É um Caçador Solitário. Noutra, o final de “Chão de Estrelas”, que me arrebata, ao fundo! Para o esenho da terceira, escolhi uma menina africa da tribo gigante KAO com as mãos nas cadeiras, e por cima estampei a frase de um cubano, que era tudo que queria dizer nos meus 50 anos: “APRENDI A NÃO ME ENTRISTECER COM POUCA COISA.”


(Entrevista feita por Norma Curi)
Fonte: Blog Encontro com a cultura brasileira
http://galsantiago.wordpress.com/

 

domingo, 24 de março de 2013

Primeval Atom

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The origin of the universe is often portrayed in popular science as a vast sea of darkness.  Centered in this darkness is a bright point of light, which suddenly expands, filling your view with light, fading into a dance of galaxies.  Of course this raises all sorts of questions:  What did the universe expand into? What triggered the initial explosion?  Where did all that matter and energy come from? The problem is, this isn't how cosmologists see the big bang at all.

Popular science loves to portray cosmology starting with the big bang and ending with our modern universe, but in astrophysics we work the other way around.  We start with what we observe in the universe today, and work back as far as we can to the early moments of the universe.  This is an important distinction, because it means we don't have to know every detail of the origin of the universe to know quite a bit about its history and early period.  In the same way, biologists don't have to know exactly how early life appeared on Earth (abiogenesis) to know that the variety of life we see today evolved through natural selection from that early common ancestor.  Understanding that earliest moment is our destination, not our starting hypothesis.

So let's walk through the process of how what we observe today leads us to conclude that the universe started with a big bang 13.8 billion years ago.  It's a rather detailed process, but I've written about many of the underlying topics before.  Instead of restating all of them here, I've just summarized them and added links to earlier posts).  How far you want to delve into the details is up to you, but I think it's useful to explain just how well we understand the origin and history of the universe.  

The first clue was found by observing the relation between a galaxy's distance and speed. There are various ways we can determine the distance of a particular galaxy (http://goo.gl/uuYUt, http://goo.gl/lGCkQ).  For example, there are certain variable stars known as Cepheid variables that brighten and darken at a rate correlating to their overall brightness (http://goo.gl/QdQSI).  There is a type of supernova called type Ia that has a pretty standard brightness (http://goo.gl/S9mu9).  By observing the apparent brightness of these things in a particular galaxy we can get an accurate measurement of just how far away they actually are.

We can measure the speed of a galaxy by observing the Doppler shift of light coming from the galaxy.  Atoms and molecules emit and absorb light at specific wavelengths (http://goo.gl/58tZq).  By observing this spectral pattern we can determine what type of atoms and molecules exist in a particular galaxy.  But if a galaxy is moving away from us, that pattern is shifted a bit toward the red end of the spectrum (http://goo.gl/Gbn6t).  The light waves emitted from the galaxy are stretched a bit due to the galaxy's motion away from us.  Similarly, if a galaxy is moving toward us, the pattern is shifted a bit toward the blue end of the spectrum, as the light waves bunch up a bit.  You've probably experienced this effect with sound, where the sound of a passing car or train sounds higher as it approaches you and lower as it passes you by.

When we observe different galaxies, we find that the light of most galaxies are red shifted.  Not only that, the more distant a galaxy is, the more its light tends to be redshifted.  This was first observed in detail by Edwin Hubble in 1927 (http://goo.gl/timkP).  Hubble demonstrated that there was a linear relationship between a galaxies distance and its redshift.  When this was first observed, it was generally thought that the universe was pretty static. If that were the case, then one would expect galactic speeds to be random, with some moving toward us, and some moving away from us.  Since galaxies appear to be receding from us at a rate proportional to their distance, a better model is that of an expanding universe.  Not just fixed region of space where galaxies are flying away from us, because that wouldn't account for more distant galaxies having greater speeds.  Instead it must be that the universe itself must be expanding, kind of like bread dough rising (http://goo.gl/WC1xE, http://goo.gl/7Y2sf).

That seems like a rather radical idea (which it was), but it is the model that best fits the data.  It also agrees with Einstein's theory of relativity (http://goo.gl/3RSj2), which has been verified extensively (http://goo.gl/b0Rhz,  http://goo.gl/Po9hehttp://goo.gl/9KkYp).  Einstein had actually had a chance to predict the expansion of the universe, since it's a consequence of the theory of relativity.  But Einstein assumed the universe must be static, so he introduced a cosmological constant to allow for stationary universe.  More modern observations show that not only is the universe expanding, it is expanding at an ever increasing rate (http://goo.gl/ZOYNx), and one way to account for this is through a cosmological constant.

So if the universe is currently expanding, then in the past the universe must have been smaller.  Extrapolating really, really far back, the universe must have been really, really small.  So it must have had a beginning as a small initial "seed".  This idea was first proposed by Georges Lemaître, who referred to that initial seed as the primordial atom.  From Hubble's original data you could get an age for this primordial atom of 10 - 20 billion years, which would be the age of the universe.

Now this is a huge leap.  After all, no one looks at a loaf of rising bread and presumes a week ago it must have begun as ultra dense "primordial dough".  Many astronomers thought extrapolating cosmic expansion back to a primordial atom was pseudoscientific nonsense.  Among them was astronomer Fred Hoyle, who actually coined the term "big bang".  (It's rumored that Hoyle meant the term to mock the idea, but Hoyle denied it.)  Hoyle proposed an alternative interpretation, known as the steady-state model.  In Hoyle's model, the universe has a process of slow continuous creation of matter, which creates the positive pressure necessary to cause cosmic expansion.  Thus the universe is ever expanding, but is ageless.

Of course both of these models have very clear predictions.  In particular, the big bang model predicts a very specific signature.  If the universe began as a dense primordial fireball, then a remnant of that intensely hot period must still exist.  As the universe expanded its temperature would cool, but it wouldn't be zero.  So either there is a background temperature to the universe, or the big bang model is wrong.  Given Hubble's observations of cosmic expansion, that temperature should be a few Kelvin today.  In 1965 just such a background temperature was observed (http://goo.gl/b5ycs) by Penzias and Wilson.  This cosmic microwave background as it now known matched the temperature of a thermal blackbody exactly, with a temperature of 2.7 K.

The cosmic microwave background (CMB) and the evidence of cosmic expansion demonstrated pretty clearly that billions of years ago the universe was a primordial fireball.  But we have to be a bit careful here.  The simple existence of the CMB does not tell us the universe began as a primordial atom.  The CMB is not light from the big bang itself, but light from when the universe had a temperature of about 4000 K.  At higher temperatures hydrogen ionizes into a plasma of electrons and protons.  Light is heavily scattered in a plasma, so it isn't possible for us to see anything further back than then.

Light travels at a finite speed (about 300,000 km/s), and that means the more distant an object is the longer it takes for the light to reach us.  That means when we view distant objects such as galaxies, we are seeing them as they were in the past.  It also means when we observe something that happened in the past, we observe how it happened light years away from us.  Our best measurement of the age of the CMB is 13.798 billion years ago.  That means the CMB we observe is from a region of space that was 13.798 billion light years from our current position at that time.  Due to the expansion of the universe, that region of space is about 47 billion light years from us today.  In other words, by the time the universe had cooled enough to condense into neutral gas (the time of the CMB), that gas covered a region at least  28 billion light years across, because that was the size of the observable universe at the time.

So now that we know that 13.8 billion years ago the observable universe was a primordial fireball 28 billion light years wide, what's to say we can extrapolate further back than that?  What if the universe simply began as a fiery expanse of gas?  To go beyond the time of the CMB we need high energy physics.

We know high energy physics pretty well.  We've been doing high-energy experiments since the mid 20th century, so we have a good understanding of how matter behaves at high energies.  If we use this knowledge to extrapolate before the CMB, we reach a point where the temperature would be about a billion Kelvin, too hot for atomic nuclei to form.  If the universe began at least that hot, then as it cooled the protons would collide with such energy that a fourth of them would fuse into helium nuclei, a process known as nucleosynthesis.  That means the matter of the post CMB universe would have to consist of about 75% hydrogen and 25% helium by mass (with small traces of elements such as lithium).  This ratio agrees perfectly with the distribution of elements we see today.  We have recently observed the spectra of distant quasars and observed early gas clouds that contain no higher elements (carbon, nitrogen, etc), exactly as we would expect from nucleosynthesis.

Once we've reached back to nucleosynthesis, we've covered the history of the universe back 13.8 billion years to the time where the initial elements of the universe formed.  At this point the universe is at most about 10 seconds old.  We can extrapolate further back using particle physics, to a time when quarks and gluons form into protons and neutrons, or earlier, where the weak nuclear force and electromagnetism unite into the electroweak force. At this point the universe is no more than a trillionth of a second old, and the observable universe is about the size of a grapefruit.

This is what particle physics, astronomy and astrophysics tells us.  This is what we can demonstrate scientifically.  The early observable universe was once small enough to fit in the palm of your hand.

Of course this is only the observable universe.  Remember that our view is limited by the finite age of the universe.  If that early universe were truly only the size of a grapefruit, then its mass and energy would have curved space over time, and we would see the effects of that curvature on the expansion of the universe.  But to the limits of our measurements the universe has no overall curvature.  That means the universe must be much larger than the region we can observe.  As best we can tell, the universe is infinite in size. So our best understanding of the universe is that it's infinite in space, finite in time, made of matter, dark matter and dark energy.

And we are a part of it all.

Brian Koberlein

Antes que o diabo saiba que você está morto

 




Philip Seymour Hoffman e Albert Finney
Sidney Lumet nunca foi um autor na expressão da palavra, mas um artesão admirável que faz filmes melhores do que muitos considerados autorais. É, na verdade, um grande cineasta, um homem de cinema com todas as letras, dotado de um pulso surpreendente na direção de suas obras. Antes que o diabo saiba que você está morto surpreende pela força dramática, pelo manejo exemplar dos elementos da linguagem cinematográfica, e sempre a se afastar de maneirismos inúteis, de virtuoses para se mostrar (a exemplo de Feliz Natal, de Selton Mello, que poderia ser um bom filme não fossem os maneirismos virtuosísticos que tentam, claramente, mostrar que o autor sabe fazer cinema).
Lumet entende de economia dramática, possui um sentido de espetáculo acima da média, sabe cortar no momento certo, é excepcional na condução dos atores em cena, há, nele, uma concepção rígida do conceito de duração da tomada, uma intuição precisa de quando a câmara deve se movimentar em função exclusivamente dramática e da necessidade do fomento da fabulação. Um filme de Lumet, além do mais, oferece o prazer do cinema, coisa rara na crise balística da cinematografia atual.
O que faz um artista (sim, Lumet é um artista) de idade provecta estar mais antenado do que os seus contemporâneos? Em Antes que o diabo saiba que você está morto, Lumet, sobre realizar um filme que, como sempre, é uma análise da sociedade americana, do american way of life, de acentos trágicos impressionantes, oferece uma lição exemplar de como o tempo cinematográfico pode estar à disposição do enriquecimento dramático, a lembrar O grande golpe/The killing, de Stanley Kubrick, mas com logística própria e maturidade suficiente para que não se possa pensar em plágio.
O tempo em Antes que o diabo saiba que você está morto é pulverizado e desconstruído em função de dar ao filme força de expressão e fazê-lo, com isso, produzir mais sentido.
Lumet, pioneiro das filmagens in loco em Hollywood, tem, como de hábito, a ação de seu filme em Nova York. Philip Seymour Hoffman (o grande ator oscarizado por Capote, um dos grandes do cinema atual) vê sua carreira de executivo de uma empresa imobiliária a desmoronar, principalmente quando vem a saber da visita de auditores cuja vistoria pode comprometê-lo, e, além do mais, está viciadíssimo em drogas pesadas.
Decide, então, convencer o irmão (Ethan Hawke no melhor desempenho de sua carreira), que também tem graves problemas financeiros e vive num completodolce far niente (divorciado, sua filha está sob a guarda da ex-mulher e tem dívida atrasada da pensão alimentícia), a assaltar a joalheira de seus pais.
A princípio, um assalto fácil, pois eles conhecem bem todo o funcionamento do lugar. Mas na hora da ação, quando esperavam encontrar uma idosa funcionária, esta, por impedimento, é substituída pela mãe deles, que acaba morrendo pelas mãos de um terceiro cúmplice, que entra na loja enquanto Hawke espera no carro. O pai, Albert Finney, desesperado com a morte da esposa, tenta se vingar, sem saber que se encontra à caça dos próprios filhos.
Os acidentes de percurso são vários e conduzem a trama a um clima de tragédia, que Lumet constrói com a sua habitual competência narrativa. Há momentos dramáticos dilacerantes, a exemplo do diálogo entre pai e filho, Finney e Hoffman, e o clímax final regido com um crescendo trágico que coloca o filme bem acima da média do gênero.
Aliás, a julgar Lumet (e o livro que escreveu sobre o fazer cinema é obrigatório:Fazendo Filmes/Making Movies), vem a constatação de que a indústria pode muito bem produzir filmes de envergadura sem que venham obrigatoriamente de autores. Muitos artesãos, por competentes, dinâmicos, verdadeiros, estão acima de muitos autores de ocasião e, por que não dizer, cultores da aporrinhação.
É o tempo cinematográfico que rege a construção dramática de Before the devil knows you're dead. Uma mesma situação é vista sob os diversos pontos de vistas dos personagens, como no referido O grande golpe, de Kubrick, permitindo a Lumet, com isso, uma maior riqueza na observação dos momentos dramáticos e dando a perceber certas nuanças comportamentais dos personagens, principalmente o de Philip Seymour Hoffman.
À guisa de exemplo, há um plano no qual Marisa Tomei, no dia do enterro da mãe assassinada, vai à janela observar Hoffman e Finney a conversar no jardim. Em outro plano, já sob outro ponto de vista, ela é vista de fora, a contemplar, de dentro, a conversação.
Sidney Lumet (1924) vem da geração da televisão dos anos 50, que muito contribuiu para o revigoramento da linguagem cinematográfica do cinema americano. Depois de realizar vários seriados e adaptações teatrais para o veículo televisivo, estreou, e em grande estilo, no cinema, com 12 homens e uma sentença (12 angry men, 1957), com Henry Fonda e grande elenco, um filme de tribunal que se passa rigorosamente, por quase duas horas, dentro de uma sala do júri.
A crítica, porém, ainda que se lhe reconheça os méritos, diz que Sidney Lumet tem uma filmografia com altos e baixos, irregular. Sim, mas apenas por ter proporcionado aos cinéfilos de todo o mundo obras do quilate deste Antes que o diabo saiba que você está mortoO veredito (The verdict, 1982), com grande interpretação de Paul Newman e James Mason, A colina dos homens perdidos(The Hill, 1966), talvez o melhor desempenho de Sean Connery neste filme árido, difícil e de denúncia, Chamada para um morto (The Deadly Affair, 1966), thriller absorvente com James Mason, Simone Signoret, Harriet Anderson (sim, a bergmaniana Harriet de Mônica e o desejo), Maximilian Schell, Serpico (1973), com Al Pacino, e, ainda com este, Um dia de cão (Dog day afternoon, 1975), A manhã seguinte (The morning after, 1986), com Jeff Bridges e Jane Fonda, sobre o sofrimento dos alcoólatras, Um estranho entre nós (A stranger among us, 1992), com Melanie Griffith, Limite de segurança (Fail-safe, 1964, com Henry Fonda, alerta impressionante sobre a ameaça nuclear, um Dr. Fantástico levado a sério), entre tantos outros, a sua irregularidade é muito bem vinda.
Que todos os cineastas fossem assim tão irregulares como este fantástico Sidney Lumet!