É sempre bonito ver quando alguém consegue cantar um tema assim chamado folclórico incorporando-o ao seu repertório sem rupturas. É sinal de que seus pés estão bem fincados no chão, o que em música popular é fundamental. Mesmo a composição mais elaborada precisa manter este fio terra desimpedido, ou correrá o risco de se tornar mera teorização vazia, discussão intelectualizada – ou seja, vai deixando de ser arte, ou pelo menos arte popular.
Além disso, adoro comparar gravações. Gosto de ver como cada artista consegue trazer um tema escolhido para o seu universo musical, adaptando e adaptando-se, e muitas vezes revelando elementos fundamentais de seu trabalho que permanecem diluidos em outras músicas. Eventualmente, duas gravações da mesma música se distanciam enormemente, o que, sendo uma canção de domínio público, ao mesmo tempo é muito natural e pode ser espantoso.
Déa Trancoso é uma cantora mineira que mergulha fundo nas tradições populares. Gravou o seu primeiro CD, Tum Tum Tum em 2007 a partir do repertório musical do Vale do Jequitinhonha.
Wado é curitibano radicado em Alagoas, o que já dá uma boa medida de seu cosmopolitismo, e também de sua capacidade de misturar infuências. Gravou A Farsa do Samba Nublado, com a banda Realismo Fantástico, em 2004.
Mas há algo que considero talvez ainda mais interessante que isto: é quando o artista cria algo que tem ao mesmo tempo as características estéticas do seu trabalho, uma elaboração formal que dialogue com seus contemporâneos (ou com mestres), e uma identificação tal com a arte popular que pode mesmo vir a se confundir com o repertório folclórico. Volpi, nas artes plásticas, conseguiu isso, a meu ver. No campo da música brasileira, ninguém o fez melhor que Dorival.
Em tempo: Azymuth, trio de instrumentistas brasileiros radicados nos EUA, em atividade desde 1970 (!)
O cantor e compositor carioca Edu Krieger conta que um dia estava passando em frente a uma escola municipal, quando ouviu música no pátio, e se achegou ao portão para ouvir. Qual não foi sua surpresa ao reconhecer que uma ciranda sua estava sendo ensinada na aula de música. Ele ainda estava gravando seu primeiro álbum, mas a canção já fora gravada por mais de uma cantora, como Rita de Cássia e Maria Rita. Edu esperou a aula acabar, pediu licença para falar com a professora e perguntou de onde ela conhecia a música. A professora então “informou” a ele que a canção era folclórica! Neste momento, Edu decidiu incluir a música no seu primeiro disco, antes que ela deixasse de ser dele e virasse folclórica…
P.S. Deixo para o final o esclarecimento, bem no espírito deste texto: a canção Grande Poder não é de domínio público, tem autor. E este é Mestre Verdelinho, um dos maiores coqueiros e repentistas de Alagoas, perito no pandeiro e no ganzá. Mestre Verdelinho faleceu dia 18 de março de 2010. A ele, um dos muitos que realizaram a fusão perfeita da arte popular, dedico este post.
Nas aulas-show que já comentei e recomendei aqui intituladas O Fim da Canção, naRádio Batuta do Instituto Moreira Salles, José Miguel Wisnik e Arthur Nestrovski dissecam no capítulo Visões do Paraiso uma canção em particular:
Saudade de Itapuã (Coqueiro de Itapuã) – Dorival Caymmi
A análise de Wisnik e Nestrovski vai desde como Itapuã era um local afastado da cidade nos anos 40, assim como Salvador era uma cidade apartada culturalmente do Brasil, até detalhes da relação melodia/letra como a repetição de palavras estendida para o agudo usada como uma forma de evocação: o ouvinte é situado na praia de Itapuã enquanto escuta os primeiros versos, para só depois ser avisado de que se trata de uma lembrança: saudade de Itapuã, me deixa.
Mas o que mais me interessa, e que no fundo era o mote da análise, é esta construção do mito de um lugar, e a representação deste lugar, mesmo existente, como uma utopia de lugar, seja no passado ou no futuro, como um Brasil de alguma maneira possível, ainda que na lembrança de um paraíso perdido, mas que persiste na memória e nos guia ainda hoje.
Espera aí, será que não estou exagerando? Será que é possível extrair toda esta torrente de significações desta canção tão simples, como aliás todas do Dorival?
Itapuã – Caetano Veloso (ao vivo)
Wisnik cantou esta música, sem comentá-la, na sequência da enumeração de várias outras que exploram e desenvolvem a idealização de Itapuã como um lugar que, de real, torna-se lendário, e não somente de Itapuã. Maracangalha (a 57 km de Salvador), também de Dorival, assim como a Pasárgada (cidade da antiga Pérsia) do poema de Bandeira, existem ou existiram objetivamente, mas o que importa isso? Importa a simbolização do Paraíso Perdido.
Pois desde a carta de Caminha – que aportou na Bahia – que o Brasil é visto com uma espécie de paraíso reconquistado. Há suficiente literatura sobre isso, da citação famosa de Maiakovski: Dizem que em algum lugar, parece que no Brasil, existe um homem feliz, até a lenda irlandesa (!) da ilha encantada de Hi-Brasil, ou a também famosa frase de Stefan Zweig, na verdade o título de um de seus livros: Brasil, país do futuro.
Em Caymmi, Itapuã é presente, embora distante no espaço - ele pede ao vento que traga notícias de lá toda manhã. Já em Caetano, é recordação da infância, ou da inocência – distante no tempo. A canção é dividida em duas. A primeira parte, que retorna no fecho, em andamento mais lento, evoca recordações; a segunda e principal, mais movida, invoca a própria Itapuã e a faz presente:
Itapuã, Quando tu me faltas, tuas palmas altas mandam um vento a mim assim Caymmi
Ou seja, a canção pela qual Caetano faz a invocação de Itapuã é a própria canção de Caymmi, transfigurada. É Caymmi quem traz notícia de Itapuã para Caetano, toda vez que este precisa. Não à toa, é usado o mesmíssimo recurso de estender para o agudo a palavra do lugar recordado, logo no primeiro verso: Itapuã, logo depois, ainda mais agudo, Abaeté.
E na repetição de um verso inicial encerando a canção, fica claro que o que inicialmente soava como uma história de amor entre homem e mulher, na verdade tinha outro objeto:Ela foi a minha guia quando eu era alegre e jovem. Ela é Itapuã, que, mesmo distante, faz-se presente: Nada estanca Itapuã, ainda sou feliz. A utopia de lugar serve de guia para a vida, para a busca desta utopia talvez.
E uma última pista parece reconfirmar esta leitura: na primeira gravação desta canção, no álbum Circuladô, Caetano chamou o filho Moreno para dividir os vocais, cantando inclusive os dois primeiros versos/chave. Caetano passa o bastão do país do futuro, levando seu filho não até Itapuã, mas até Caymmi, reconhecendo que Caymmi, cantando Itapuã, cantou a ilha, ou melhor, a praia encantada de Hi-Brasil, onde parece que há um homem feliz.
Durante alguns meses, fui amigo de João Gilberto no Facebook. Durante este período, a revista Veja publicou uma falsa entrevista dele, em que teria dito, entre outras coisas, que iria fugir para a Argentina. Segundo a própria revista, tratava-se de uma compilação de declarações (algumas particulares e vazadas) arrancadas de João ao longo de um período. Se apenas a transformação de frases esparsas – e provavelmente algumas inventadas como esta declaração absurda acima – em entrevista já é uma prática antiética bem de acordo com o que a revista se tornou, nem falo do anúncio da revista, replicado por alguns jornais, de que o perfil no Facebook era falso. Não era. Este artigo de Luiz Nassif não trata de música, que é o mote deste blog, e sim da pessoa João Gilberto. Mas em se tratando de uma pessoa que se tornou sinônimo e encarnação de música, sua leitura é fundamental.
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João Gilberto provavelmente não mais voltará. Escondeu-se em alguma dobra do tempo, em algum mundo auto-referenciado, de onde aguarda o momento da partida definitiva.
Nos últimos anos eram nítidos os sinais dessa ida sem volta. A síndrome do pânico, ou o nome clínico que se dê às suas vulnerabilidades, o impediram de concretizar a última turnê, a despedida triunfal. Foram dois canos nas duas últimas excursões planejadas. Espocaram críticas, dos que viam nas suas estranhezas apenas um caráter excêntrico.
Era muito mais que isso: uma questão médica para a qual não havia diagnósticos na época.
Aqui no carnaval, caminho pelos jardins ouvindo Marilu interpretar “Porque é”, de Roberto Martins e Mário Rossi. É de 1942, quando a música carioca descobria a riqueza interminável do sincopado. Marilu escande cada sílaba em cada nota, usando o contratempo inserido na composição – os mesmos recursos dos conjuntos vocais, dos extraordinários Anjos do Inferno, da dupla Joel e Gaúcho.
Foi ali que os músicos mais sofisticados foram buscar a base, o molho e, depois, fizeram a síntese. Primeiro Garoto desenvolvendo a batida inicial da bossa nova. Depois, João Gilberto, assimilando a batida de Garoto e incluindo nela o Brasil.
Nem vou discorrer sobre a sua importância.
O que me importa é o homem João Gilberto.
Tempos atrás, surgiu o boato de que João Gilberto tinha um perfil no Facebook. Em pouco tempo o perfil lotou e os seguidores ganharam durante meses preciosidades da música brasileira e internacional em vídeos do Youtube.
O perfil ganhou visibilidade em dois momentos. Primeiro, no episódio em que a Vejinha do Rio publicou uma suposta entrevista com ele. Segundo, no caso da dona do apartamento de João Gilberto pretendendo despejá-lo.
Defendi-o dos ataques que sofreu, quando negou que tivesse concedido a entrevista à Veja. Surpreendi-me quando recebi uma mensagem reservada do tal perfil, agradecendo minha defesa e insistindo que jamais havia recebido o repórter ou qualquer jornalista da revista.
Depois, no episódio do despejo, escrevi uma crônica sugerindo o “tombamento” de João Gilberto.
Ele passou a se comunicar permanentemente comigo, da maneira mais discreta possível: clicando no CURTIR quando colocava algum vídeo que o interessava. Ou pedindo socorro.
Até então, meu único contato indireto com ele foi uma crônica que escrevi na Folha, quando completou 70 anos. Seu produtor me ligou pedindo para usar a crônica na divulgação de seus shows. Provavelmente, ele nem soube dessas tratativas. No episódio Veja, vários jornais sugeriram que o perfil do FB era fake.
Fiquei com um pé atrás, para não ser pego num trote. Conversamos muitas vezes, até que apliquei o teste definitivo. No período anterior ao do lançamento do Chega de Saudade, em 1957, foi feito um conjunto de gravações caseiras de João Gilberto,. Saraus entremeados de conversas, dicas musicais, avaliações de músicos. Consegui baixar da Internet durante o meio dia que ficou disponível, colocada pelo dono da casa depois que João Gilberto decidiu não autorizar seu lançamento em CD.
Em uma das conversas, o anfitrião pergunta a João Gilberto quem seria o maior violinista brasileiro. O próprio anfitrião se incumbe de desqualificar nada menos do que Baden Powell, em início de carreira. Baden tinha cometido a audácia de acompanhar a grande Ângela Maria, pecado indesculpável para a juventude esnobe e internacionalista da zona sul do Rio.
João Gilberto não entra na discussão sobre Baden, mas indica o melhor: Jacob, violonista que conheceu em São Paulo. O anfitrião pede para que ele toque algo de Jacob e João Gilberto diz que não consegue. A harmonia era muito sofisticada para seu nível de conhecimento do instrumento.
Só havia essa menção. Joguei a informação aqui no Blog, pretendendo identificar o tal do Jacob. Um mineiro de Diamantina garantiu tratar-se de um boêmio local, que morou em São Paulo, onde conheceu Garoto, e de quem João Gilberto teria se aproximado no período em que morou com a irmã – e que, segundo o livro do Rui Castro, teria descoberto a batida. Era um “causo” mineiro apenas.
Matei a charada em um sarau na casa de Walter Appel, em São Paulo, com o pessoal da bossa nova paulista, os antigos instrumentistas dos barzinhos de jazz dos anos 60 e 70. Foi o Luiz Roberto ou o Theo de Barros que me disse que o Jacob era o Edgard Gianullo, amigo dos tempos do Bar do Alemão, músico excepcional.
Conheci Edgard levado pelo Nelsinho Risada, caixa e cavaquinho do bar, que havia participado com ele de um conjunto vocal dos anos 50.
Depois, o Serginho Leite me contou que, em Nova York, quando foi visitar a loja da Tender (o grande fabricante de violão), na parede havia quadros com os melhores guitarristas que passaram por lá. E Edgard estava lá com seu sorriso escancarado, que ilustrou vários comerciais dos anos 80.
O único ponto em comum com a hipótese Diamantina era o fato de Edgard ter convivido com Garoto e bebido na sua influência. Aliás, outro dia o Paulo Vanzolini me contou que Garoto chegou a montar um bar na Major Sertório, frequentado pela boemia musical da cidade.
Uma noite, perguntei de chofre a João Gilberto quem era o Jacob, ao qual ele se referiu na gravação. A resposta foi imediata: era um rapaz de São Paulo, por volta de 18 anos. Justamente a idade de Edgard na época.
(aqui a confirmação da identidade de Edgard/Jacó, inclusive por Edgard Poças, testemunha da época, nos comentários)
Tempos depois, Danilo Caymmi também confirmou que era João no perfil.
Durante meses desenvolvemos uma conversa de poucas palavras. João escrevia colocando um ponto entre cada palavra. Assim: q.u.e.r.i.a..f.a.l.a.r..c.o.m..v.o.c.e. Ou clicava no CURTIR, quando eu fazia algum comentário em seus posts.
O que se revelou, naquela conversas reservadas, é o que qualquer pessoa de bom senso intuiria sobre suas extravagancias: uma pessoa extremamente vulnerável, sem nenhum sentido prático, indefesa ante um mundo em que havia pessoas, objetos, rotinas, contratos. Era incapaz de resolver os problemas mais comezinhos. Como trocar as cordas do violão, como me disse uma vez Raphael Rabello.
No episódio do despejo, escrevi uma coluna sugerindo o “tombamento” de João Gilberto. De noite, mandou mensagem agradecendo, indignado com a petulância da dona do apartamento, de pretender…. vistoriar seu próprio apartamento. Perguntou o que eu poderia fazer por ele. Respondi que apenas o que sabia fazer: podíamos marcar uma entrevista no Rio, filmada ou não, onde se mostraria seu lado humano e, com toda sutileza, as razões que o faziam ter tal comportamento, longe do estrelismo, perto dos problemas emocionais graves.
Topou, de início. Depois, recuou. Foi se aconselhar com Roberto Carvalho, ex-Rita Lee, que se tornara seu conselheiro mais próximo. E Roberto desaconselhou qualquer contato com a imprensa. Então, tá!
Duas vezes foi alvo de ataques virulentos de trolls. Cada ataque o deixava prostrado. No primeiro, desapareceu por vários dias. No segundo, veio pedir minha ajuda. Confessou estar apavorado e perguntou que providências poderia tomar.
Informei-me com uma procuradora conhecida, que me passou o telefone e e-mail de um local que poderia acolher a denúncia. Dias depois, pediu para esquecer. Descobriu que o ataque viera do filho de um amigo, solidário com Bebel em uma das brigas entre pai e filha.
Depois, espalhou-se que o autor do perfil, na verdade, seria seu filho Marcelo Gilberto. Não era, de fato. Se foi, pode ter sido por um período. Não naquele em que o perfil sabia o detalhe correto de uma conversa ocorrido em 1957.
Tempos depois, tentou-se a derradeira excursão. Mais uma vez João Gilberto falhou, como havia falhado algum tempo antes com duas empresarias cariocas – que depois o processariam.
Foi o último vestígio de sua presença vaga entre nós.
Para mim, ficou a lembrança de um dos últimos vídeos que postou no Facebook, a declaração apaixonada a seus dois grandes e únicos amores: a música e o Brasil. O “Canta Brasil” é uma declaração definitiva de amor.
As pesquisas eleitorais recentes mostram Dilma Rousseff em queda. Quando se está caindo, a gente normalmente diz opa!. Não creio, porém, que Dilma vá dizer opa! e recuperar o equilíbrio. Além dos problemas de seu governo, ela é mal aconselhada por Lula nos dois temas que polarizam a cena política: Petrobrás e Copa do Mundo.
São cada vez mais claras as evidências de que se perdeu muito dinheiro em Pasadena. Lula, no entanto, não acredita nas evidências, mas nas versões. Se o seu conselho é partir para a ofensiva quando se perdem quase US$ 2 bilhões, a agressividade será redobrada quando a perda for de US$ 4 bilhões e, se for de US$ 6 bilhões, o mais sábio será chegar caindo de porrada nos adversários antes que comecem a reclamar.
Partir para a ofensiva na Copa do Mundo? Não é melhor deixar isso para os atacantes Neymar e Fred? Desde o ano passado ficou claro que muitas pessoas não compartilham o otimismo do governo nem consideram acertada a decisão de hospedar a Copa.
O governo acha que sufoca as evidências. O próximo passo desse voluntarismo é controlar as evidências. O papel do IBGE e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), por exemplo, começa a ser deformado pelo aparelhamento político. Pesquisas que contrariam os números de desemprego são suspensas. E o Ipea foi trabalhar estatísticas para Nicolás Maduro, que acredita ver Hugo Chávez transmutado em passarinho e, com essa tendência ao realismo mágico, deve detestar os números.
Controlar as evidências, determinar as sentenças pela escolha de ministros simpáticos à causa, tudo isso é a expressão de uma vontade autoritária que vê a oposição como vê os números desfavoráveis: algo que deva ser banido do mundo real. A visão de que o País seria melhor sem uma oposição, formada por inimigos da Petrobrás e por gente que torce contra a Copa, empobrece e envenena o debate político.
Desde o mensalão até agora o PT decidiu brigar com os fatos, e isso pode ter tido influência na queda de Dilma nas pesquisas. O partido foi incapaz, embora figuras como Olívio Dutra o tenham feito, de reconhecer seus erros. Está sendo incapaz de admitir os prejuízos que sua política de alianças impôs à Petrobrás ou mesmo que a Copa do Mundo foi pensada num contexto de crescimento e destinava-se a mostrar nossa exuberância econômica e capacidade de organização a todo o planeta. Gilberto Carvalho revelou sua perplexidade: achava que a conquista da Copa seria saudada por todos, mas as pessoas atacaram o governo por causa dela.
Bom dia, Cinderela. O mundo mudou. Dilma e o PT não perceberam, no seu sono, que as condições são outras. Brigar com os fatos num contexto de crescimento econômico deu a Lula a sensação de onipotência, uma crença do tipo "deixa conosco que a gente resolve na conversa". Hoje, em vez de contestar fatos, o PT estigmatiza a oposição como força do atraso. Ele se comporta como se a exclusão dos adversários da cena política e cultural fosse uma bênção para o Brasil. A concepção de aniquilar o outro não é vivida com culpa por certa esquerda, porque ela se move num script histórico que prevê o aniquilamento de uma classe pela outra. O que acabará com os adversários é a inexorável lei da história, eles apenas dão um empurrão.
Sabemos que a verdade é mais nuançada. O governo mantém excelentes relações com o empresariado que financia por meio do BNDES e com os fornecedores de estatais como a Petrobrás. Não se trata de luta de classes, mas de quem está se dando bem com a situação contra quem está ou protestando ou pedindo investigações rigorosas contra a roubalheira, na Petrobrás ou na Copa.
A aliança do governo é aberta a todos os que possam ser controlados, pois o controle é um objetivo permanente. Tudo o que escapa, evidências, vozes dissonantes, estatísticas indesejáveis, tudo é condenado à lata de lixo da História. Felizmente, a História não se faz com líderes que preferem partir para cima a dialogar diante de evidências negativas, tanto na Petrobrás como na Copa ou no mensalão. Nem com partidos incapazes de rever sua tática diante de situações econômicas modificadas.
Dilma, com a queda continuada nas pesquisas, sai da área de conforto e cai no mundo em que os candidatos dependem muito de si próprios e não contam com vitória antecipada pelo peso da máquina. Será a hora de pôr de novo em xeque a onipotente tática de eleger um poste. Nem o poste nem seu inventor hoje conseguem iluminar sequer um pedaço de rua. Estão mergulhados no escuro e comandarão um exército de blogueiros amestrados para nublar as redes sociais. Com a máquina do Estado, o prestígio de Lula, muita grana em propaganda e na própria campanha eleitoral, o governo tem um poderoso aparato para enfrentar a realidade. Mas essa abundância de recursos não basta. Num momento como este no País, será preciso horizonte, olhar um pouco adiante das eleições e estabelecer um debate baseado no respeito às evidências.
Esse é um dos caminhos possíveis para recuperar o interesse pela política. No momento, a resposta ao cinismo é a indiferença com forte tendência ao voto em branco ou nulo. Embora a oposição também seja parte do jogo, a multidão que dá as costas para a escolha de um presidente é uma obra do PT que subiu ao poder, em 2002, prometendo ampliar o interesse nacional pela política, mas conseguiu, na verdade, reduzi-lo dramaticamente. Para quem se importa só com a vitória eleitoral, essa questão da legitimidade não conta. Mas é o tipo de cegueira que nos mantém no atraso político e na ilusão de que adversários são inimigos. O PT comanda um estranho caso de governo cujo discurso nega o próprio slogan: Brasil, um país de todos. De todos os que concordam com a sua política.
Até nas relações exteriores o viés partidário sufocou o nacional, atrelando o País aos vizinhos, alguns com sonhos bolivarianos, e afastando-o dos grandes centros tecnológicos. Contestar esse caminho quase exclusivo é defender interesses americanos; denunciar corrupção na empresa é ser contra a Petrobrás; assim como questionar a Copa é torcer contra o Brasil.
Bom dia, Cinderela, acorde. Em 2014 você pode se afogar nos próprios mitos.
'Foram dois namorados felizes entre a multidão, e até chegaram a suspeitar que o amor podia ser um sentimento mais repousado e profundo que a felicidade arrebatada, mas momentânea, das suas noites secretas.'
La cantautora colombiana Shakira se despidió de su amigo y compatriota el escritor Gabriel García Márquez, fallecido hoy a los 87 años en Ciudad de México, y elogió su vida como "un regalo único e irrepetible, y como el más original de los relatos".
La artista lamentó la muerte del Nobel de Literatura de 1982 en su página de internet, en Twitter y en Instagram, donde además colgó una foto en la que aparece abrazada muy sonriente al genio de las letras.
"Querido Gabo, alguna vez dijiste que la vida no es la que uno vivió sino la que uno recuerda y cómo la recuerda para contarla", parafraseó la cantante barranquillera.
Y prosiguió: "Tu vida querido Gabo la recordaremos como un regalo único e irrepetible, y como el más original de los relatos. ¡Es difícil despedirse de ti, puesto que nos has dado tanto! Te quedarás para siempre conmigo y con todos los que te quisimos y admiramos".
Shakira, quien interpretó la canción "Hay amores" en la banda sonora de la película basada en la novela "El amor en los tiempos del cólera", mantuvo una cercana relación con el escritor, con el que además compartía procedencia en la región Caribe colombiana.
The one man I wish I could have interviewed died yesterday. But his wisdom, collected here, will live on.
By Cal Fussman on April 18, 2014
People often ask me: Who have you never been able to interview for the What I’ve Learned column that you’d most like to spend time with?
That man died yesterday. Gabriel Garcia Marquez.
Well, he didn’t really die. Nobody who writes great literature ever dies.
I wish I could re-create the sensation that surged through me when I first opened One Hundred Years of Solitude at the age of 22. It was like looking at stars for the first time from an untouched spot in the middle of The Amazon or The Sahara. You realize in moments like those that the world offers a much deeper and more vivid experience than you could’ve possibly imagined. You’re in God’s mind.
I will never be able to know the combustion of that book and the age of 22 again. That pulsing of cosmic electricity and excitement only visits once. But I did figure out a way to do that What I’ve Learned. I journeyed through sites on the Internet to compile some wisdom originating in Gabo’s books and interviews.
It turned a day that would have been tinged with sadness into hours of soft smiles as each nugget was uncovered. And as the maestro himself advised: “Never stop smiling not even when you're sad, someone might fall in love with your smile.”
So here it is. An interview that couldn’t be more truthful even though it never happened. What I’ve Learned, from Gabriel Garcia Marquez:
No matter what, nobody can take away the dances you’ve already had.
Just as real events are forgotten, some that never were can be in our memories as if they happened.
Sex is the consolation you have when you can't have love.
Fiction was invented the day Jonah arrived home and told his wife that he was three days late because he had been swallowed by a whale.
Then the writing became so fluid that I sometimes felt as if I were writing for the sheer pleasure of telling a story, which may be the human condition that most resembles levitation.
Wisdom comes to us when it can no longer do any good.
The problem in public life is learning to overcome terror; the problem in married life is learning to overcome boredom.
No medicine cures what happiness cannot.
The day shit is worth money, poor people will be born without an asshole.
A person does not belong to a place until there is someone dead under the ground.
The only thing worse than bad health is a bad name.
I don't believe in God, but I'm afraid of Him.
It is not true that people stop pursuing dreams because they grow old, they grow old because they stop pursuing dreams.
Age isn't how old you are but how old you feel.
Inspiration gives no warnings.
Always remember that the most important thing in a good marriage is not happiness, but stability.
The heart's memory eliminates the bad and magnifies the good.
It is like a firstborn son: you spend your life working for him, sacrificing everything for him, and at the moment of truth he does just as he pleases.
Justice limps along, but gets there all the same.
A lie is more comfortable than doubt, more useful than love, more lasting than truth.
Crazy people are not crazy if one accepts their reasoning.
One does not love one’s children just because they are one’s children but because of the friendship formed while raising them.
Shame has a poor memory.
The world must be all fucked up when men travel first class and literature goes as freight.
He who awaits much can expect little.
A falcon who chases a warlike crane can only hope for a life of pain.
One minute of reconciliation is worth more than a whole life of friendship.
Nobody deserves your tears, but whoever deserves them will not make you cry.
I don’t think you can write a book that’s worth anything without extraordinary discipline.
A true friend is the one who holds your hand and touches your heart.
All human beings have three lives: public, private, and secret.
If men gave birth, they'd be less inconsiderate.
How strange women are.
Don't let yourself die without knowing the wonder of fucking with love.
Jealousy knows more than truth does.
I have learned that a man has the right and obligation to look down at another man, only when that man needs help to get up from the ground.
In the end, it is impossible not to become what others believe you are.
Ceasing to believe caused a permanent scar in the place where one's faith had been, making it impossible to forget.
One ages more and with more intensity in pictures than in reality.
With The Thousand and One Nights, I learned and never forgot that we should read only those books that force us to reread them.
I can't think of any film that improved on a good novel, but I can think of many good films that came from very bad novels.
Literature was the best plaything that had ever been invented to make fun of people.
An early-rising man is a good spouse but a bad husband.
Everything that goes into my mouth seems to make me fat, everything that comes out of my mouth embarrasses me.
Fame is very agreeable, but the bad thing is that it goes on 24 hours a day.
Fiction has helped my journalism because it has given it literary value. Journalism has helped my fiction because it has kept me in a close relationship with reality.
To all, I would say how mistaken they are when they think that they stop falling in love when they grow old, without knowing that they grow old when they stop falling in love...
There is always something left to love.
Courage did not come from the need to survive, or from a brute indifference inherited from someone else, but from a driving need for love which no obstacle in this world or the next world will break.
The secret of a good old age is simply an honorable pact with solitude.
Nobody teaches life anything.
The only regret I will have in dying is if it is not for love.
The Nobel Prize winner was possessed of a vivid imagination
The vivid prose of Gabriel Garcia Marquez described a world as exotic as a Latin American carnival.
His backdrop was the poverty-stricken, and often violent world of his Colombian home where democracy never really found roots.
His stories wove imaginary magical elements into real life and were often set in a fictional village called Macondo.
A left-winger by conviction he was not slow to criticise the Colombian government and spent a great part of his life in exile.
There is not a single line in all my work that does not have a basis in reality”Gabriel Garcia Marquez
Garcia Marquez was born in the town of Aracataca, Colombia on 6 March 1927.
Shortly after he was born, his father became a pharmacist and his parents moved away. The young Marquez was left in the care of his maternal grandparents.Critical acclaim
His grandfather, a veteran of Colombia's Thousand Days' War and a liberal activist, gave him an awareness of politics. At the Nobel Prize-giving ceremony in 1982
From his grandmother, Garcia Marquez learned of superstitions and folk tales. She spoke to him of dead ancestors, ghosts and spirits dancing round the house, all in a deadpan style that he would later adopt for his greatest novel.
Garcia Marquez went to a Jesuit college and began to study law, but soon broke off his studies to work as a journalist.
In 1954, he was sent to Rome on a newspaper assignment, and since that time, lived mostly abroad, in Paris, Venezuela, and finally Mexico City.
He always continued his work as a journalist, even when his fiction increased in popularity.
From the moment I wrote Leaf Storm I realised I wanted to be a writer and that nobody could stop me”Gabriel Garcia MarquezFacilitator
Heavily influenced by the work of William Faulkner, Garcia Marquez wrote his first novel at the age of 23 although it took seven years to find a publisher.
Published in 1955, Leaf Storm and his three subsequent novels received critical acclaim from the literary establishment but did not reach the wide audience he would win with his later books.
In 1965, the idea for the first chapter of One Hundred Years of Solitude came to him while he was driving to Acapulco.
He turned the car, drove home and locked himself into his room with six packets of cigarettes a day for company. He enjoyed the friendship of Fidel Castro
He emerged 18 months later to find his family $12,000 in debt. Fortunately, he had thirteen hundred pages of phenomenal best-selling text in his hands.
The novel's first printing in Spanish sold out within a week, and during the next thirty years One Hundred Years of Solitude sold more than twenty million copies and was translated into more than thirty languages.
The New York Times called it the first piece of literature since the Book of Genesis that should be required reading for the entire human race.
A novelist can do anything he wants so long as he makes people believe in it”Gabriel Garcia MarquezReality
Following its publication, Garcia Marquez was asked to act as a facilitator in negotiations between the Colombian government and a number of guerrilla organisations including Farc and ELN.
He also became friends with the Cuban leader Fidel Castro, a relationship that Garcia Marquez insisted was based on books.
"Fidel is a very cultured man," he said in an interview. "When we're together we talk about literature." Garcia Marquez married Mercedes in 1958
In 1982 Garcia Marquez received the Nobel Prize for Literature. He received praise for the vibrancy of his prose and the rich language he used to convey his overflowing imagination.
Some saw his work as deliberate exaggeration, a supernatural, mythical approach he effected to escape the unrest of his country.
He said himself that "surrealism came from the reality of Latin America," and such works as The General in his Labyrinth and The Autumn of the Patriarch illustrate his growing political opposition to the increasing violence in Colombia.
Garcia Marquez's place in the ranks of literary masters was further assured by the publication of another best-selling work, Love in the Time of Cholera in 1986.
In the story of two couples, the younger based on the love affair between his own parents.
The Mexican novelist, Carlos Macias described Garcia Marquez as perhaps the best writer in Spanish since Cervantes.
"He is one of those rare artists who succeed in chronicling, not only a nation's life, culture and history, but also those of an entire continent."
El poeta, narrador y ensayista José Luis Díaz Granados (1946) afirma que García Márquez nunca ha buscado otra cosa en su obra que evocar los espíritus esquivos de la poesía pues su prosa está impregnada de lírica. El siguiente texto desenpolva los inicios de Gabo como poeta lírico. Un texto imperdible.
LA POESÍA DE GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ
Entre nostalgias de la casa grande de Aracataca, alegrías y timideces multicolores, vividas o soñadas en las nacientes aventuras preadolescentes en Barranquilla y las conventuales y monótonas vigilias en Zipaquirá y Bogotá, nacen y crecen los primeros poemas de amor, reflexión y soledad, salidos de la pluma febril de Gabriel García Márquez.
Recordemos que Leopoldo Mozart, el padre de Amadeus, era un músico que estaba muy lejos de poseer la gracia de los dioses y que don José Ruiz Blasco, el progenitor de Picasso, era un profesor de dibujo que en su vejez, escaso de la vista, encargaba a su precoz hijo que terminara de perfeccionar los ojos de las palomas y otros pequeños detalles de sus pinturas. No cabe duda, sin embargo, que de estos oscuros artistas sin ambiciones brotaron las maravillosas vocaciones de sus geniales hijos.
Por eso cuando nos enteramos que don Gabriel Eligio García, además de ser telegrafista en Aracataca, partero, dentista y farmacéutico en Sucre y violinista inspirado en sentidas y románticas serenatas en Santa Marta y Riohacha, era un poeta de entusiasmos dominicales —que pergueñaba en forma especial las décimas, los romances y los sonetos endecasílabos en celebraciones familiares y aniversarios cívicos—, corroboramos la anterior convicción.
De manera que esta circunstancia, sumada a un especial temperamento de niño observador e imaginativo y a la influyente personalidad de su abuelo el coronel Nicolás Ricardo Márquez y a la prodigiosa agudeza mental, supersticiosa y mística, de Tranquilina Iguarán Cotes, su abuela, determinaron sin lugar a dudas la adhesión espiritual y vitalicia hacia lo que Gabriel García Márquez denominaría más adelante como “los espíritus esquivos de la poesía”.
* * *
En 1940, cuando el futuro autor de Cien años de soledad acababa de cumplir sus 13 años y cursaba el primer año de secundaria en el Colegio San José de Barranquilla, regentado por los padres jesuitas, dio a conocer unas tímidas muestras de su enorme capacidad para versificar, cuando le improvisaba a cada uno de sus condiscípulos lo mismo que a sus profesores, cuartetas festivas y versos satíricos, sin que hubiera en alguno de ellos ningún asomo de gracia lírica.
“El padre Luis Posada —recuerda Gabo en sus memorias—, capturó uno, lo leyó con ceño adusto y me soltó la reprimenda de rigor, pero se lo guardó en el bolsillo. El padre Arturo Mejía me citó entonces en su oficina para proponerme que las sátiras decomisadas se publicaran en la revista Juventud, órgano oficial de los alumnos del colegio. Mi reacción inmediata fue un retortijón de sorpresa, vergüenza y felicidad, que resolví con un rechazo nada convincente: —Son bobadas mías. El padre Mejía tomó nota de la respuesta y publicó los versos con ese título —“Bobadas mías”— y con la firma de Gabito, en el número siguiente de la revista y con la autorización de las víctimas”…
Por ese tiempo, Gabo tenía el vicio de leer todo lo que cayera en sus manos y se aprendió de memoria decenas de romances del repertorio popular y los más hermosos poemas del Siglo de Oro español. También, el súbito aliento embrujador de los Veinte poemas de amor de Pablo Neruda sedujo al joven Gabo hasta el punto de aprenderse de memoria y recitar no pocas veces al día el famoso “Poema veinte”, lo cual ocasionaba la cólera de algún jesuita.
En los años iniciales de la década conoció en Barranquilla a un muchacho algo mayor que él llamado Cesar Augusto del Valle, alto, bohemio y melenudo, quien comandaba un grupo denominado Arena y cielo, en homenaje e imitación al de Piedra y cielo que desde Bogotá integraban Eduardo Carranza, Jorge Rojas, Arturo Camacho Ramírez, Gerardo Valencia, Tomás Vargas Osorio, Darío Samper y Carlos Martín, quienes a su vez estaban asimilando las influencias de César Vallejo, Pablo Neruda y de los poetas españoles contemporáneos. Fueron los años, como lo dice el mismo Gabo, que le dieron la base retórica para soltar sus duendes, ciclo que culminó meses después con la muerte prematura del joven César Augusto.
Una breve muestra de lo que escribía Gabito en esa época es el poema titulado “La muerte de la rosa”:
Murió de mal de aroma
Rosa idéntica, exacta.
Subsistió a su belleza,
Sucumbió a su fragancia.
No tuvo nombre: acaso
La llamarían Rosaura,
O Rosa-fina, o Rosa
Del amor o Rosalía,
O simplemente: Rosa,
Como la nombra el agua.
Más le hubiera valido
Ser siempreviva, Dalia,
Pensamiento con luna
Como un ramo de acacia.
Pero ella será eterna:
Fue rosa y eso basta.
Dios le guarde en su reino
A la diestra del alba.
* * *
Durante su adolescencia, Gabriel García Márquez no mostró interés literario distinto de la poesía. Recitaba de memoria en veladas familiares, sesiones solemnes y eventos escolares el poema “El circo” del maestro Guillermo Valencia, poemas de la barranquillera Meira Delmar —de quien sería después cercano amigo— y el famoso disparate lírico de don José Manuel Marroquín, el cual comenzaba:
Ahora que los ladros perran, ahora que los cantos gallan,
Ahora que albando la toca las altas suenas campanan;
Y que los rebuznos burran y que los gorjeos pájaran
Y que los silbos serenan y que los gruños marranan
Y que aurorada rosa los extensos doran campan,
Perlando líquidas viertas cual yo lágrimo derramas
Y friando de tirito si bien el abraza almada,
Vengo a suspirar mis lanzos ventano de tus debajas.
Un buen día, don Gabriel Eligio decidió que su primogénito se fuera a estudiar al interior del país. Luego de un viaje de 8 días por el Río Magdalena hasta Puerto Salgar y luego en tren hasta la remota y glacial Bogotá, el joven Gabo se enteró que la beca diligenciada por su padre lo conducía hasta un municipio situado a pocas horas de la capital dela República, donde la única catedral de sal del mundo es su símbolo perpetuo. Allí, en el Liceo Nacional de Zipaquirá, padeció largas horas, días y semanas de silencio, frío y llovizna, lo más opuesto a la camaradería, el bullicio y la parranda musical de su tierra costeña.
“Mal educado en los espacios sin ley del Caribe —escribe Gabo sesenta años después— me asaltó el terror de vivir los 4 años decisivos de mi adolescencia en aquel tiempo varado”. Sin embargo, en la natural adaptación al nuevo ambiente, se familiarizó pronto con el ropaje moderno y progresista de la mayoría de sus profesores, casi todos formados en la Escuela Normal Superior, bajo la dirección del psiquiatra y cuentista vallenato José Francisco Socarrás. Y así, entre lecciones nada disimuladas de marxismo, lecturas de Vargas Vila y de José Eustasio Rivera y poemas de Residencia en la Tierra de Neruda, Gabito comenzó a escribir poesía de manera voraz, influido también por los textos de los Piedracielistas que aparecieran en las Lecturas dominicales de El Tiempo que dirigía Eduardo Carranza.
En septiembre de 1943 le llegaron a Zipaquirá los ecos de la controversial visita a Colombia de Pablo Neruda y de la violenta polémica que lo enfrentó el líder conservador Laureano Gómez. Tres décadas más tarde el poeta chileno declararía que la novela estelar de García Márquez era el Quijote de América y pediría para él el Premio Nobel de Literatura. Cuando este deseo se hizo realidad Gabo en su discurso de recepción le rendiría homenaje, llamándolo “Pablo Neruda el grande, el más grande, en cuyos versos destilan su tristeza milenaria, nuestros mejores sueños sin salida”.
De pronto y a manera de recompensa precoz al solitario poeta, fue nombrado rector del Liceo el más joven de los integrantes de Piedra y Cielo, Carlos Martín, quien desde el primer momento descubrió los destellos poéticos del alumno de Aracataca y le tomó una gran simpatía, al punto que un día le prestó La experiencia literaria de Alfonso Reyes, libro que lo deslumbró de principio a fin y le reveló sorpresivas afinidades del corazón, como fueron las letras de los boleros de Agustín Lara.
Ya por entonces Gabito imitaba a Eduardo Carranza en las prosas líricas que, a la manera de Juan Ramón Jiménez en Platero y yo, publicaba Carranza en la revista Sábado. Animado por Martín en la lectura de los famosos cuadernillos dirigidos por Jorge Rojas, Gabo ensayó escribir un texto en cuartetos eneasílabos, titulado “Poema desde un caracol”:
Yo he visto el mar. Pero no era
El mar retórico con mástiles
Y marineros amarrados
A una leyenda de cantares.
Ni el verde mar cosmopolita
—mar de Babel— de las ciudades,
que nunca tuvo unas ventanas
para el lucero de la tarde.
Ni el mar de Ulises que tenía
Siete sirenas musicales
Cual siete islas rodeadas
De música por todas partes.
Ni el mar inútil que regresa
Con una carga de paisajes
Para que siempre sea octubre
En el sueño de los alcatraces.
Ni el mar bohemio con un puerto
Y un marinero delirante
Que perdiera su corazón
En una partida de naipes.
Ni el mar que rompe contra el muelle
Una canción irremediable
Que llega al pecho de los días
Sin emoción, como un tatuaje.
Ni el mar puntual que siempre tiene
Un puerto para cada viaje
Donde el amor se vuelve vida
Como en el vientre de una madre.
Que era mi mar el mar eterno,
Mar de la infancia, inolvidable,
Suspendido de nuestro sueño
Como una paloma en el aire.
Era el mar de la geografía
De los pequeños estudiantes,
Que aprendimos a navegar
En los mapas elementales.
Era el mar de los caracoles,
Mar prisionero, mar distante,
Que llevábamos en el bolsillo
Como un juguete a todas partes.
El mar azul que nos miraba,
Cuando era nuestra edad tan frágil
Que se doblaba bajo el peso
De los castillos en el aire.
Y era el mar del primer amor
En unos ojos otoñales.
Un día quise ver el mar
—mar de la infancia— y ya era tarde.
Gabo no cabía de la dicha a sus 17 años pensando en que sería un poeta y nada más que un poeta. Luego de graduarse de bachiller con honores, pues además de haber sido quien pronunció el discurso de rigor en la sesión solemne, fue uno de los escogidos por Carlos Martín para asistir a la audiencia concedida por el presidente de la república, un escritor de 38 años, Alberto Lleras Camargo, de quien más tarde sería uno de sus más cercanos amigos, para discutir sobre diferentes temas relacionados con la educación nacional.
Al ingresar a la Universidad Nacional meses más tarde, conoció a Pedro Gómez Valderrama, entonces un joven de 23 años, cuyos libros de poemas Norma para lo efímero y Biografía de la campana, habían despertado la admiración del poeta de Aracataca. “Mi sorpresa más grata —recuerda Gabo en Vivir para contarla—, fue encontrar como secretario general de la Facultad de Derecho al escritor Pedro Gómez Valderrama, del cual tenía noticia por sus colaboraciones tempranas en las páginas literarias, y que fue uno de mis amigos grandes hasta su muerte prematura”. No olvidemos que muchos años después, García Márquez sería uno de los más entusiastas lectores y admiradores de La otra raya del tigre, la magistral novela de Gómez Valderrama.
En la Nacional, Gabo continuó escribiendo secreta y públicamente poesía. Dos condiscípulos suyos, egresados del Liceo de Cervantes, Luis Villar-Borda y Camilo Torres Restrepo, eran los redactores en aquel entonces del suplemento literario del diario La Razón, fundado y dirigido por el poeta —cuyos sonetos admiraba y decía Gabo de memoria—, Juan Lozano y Lozano. Con ellos, al igual que con Plinio Apuleyo Mendoza, Gonzalo Mallarino, Álvaro Mutis y Álvaro Castaño Castillo, el joven escritor costeño se reunía en el Café Asturias, —lo mismo que con De Greiff, Jorge y Eduardo Zalamea en los cafés Windsor y El Molino—, y no tardó en colaborarles poéticamente en La Razón y posteriormente enSábado, revista que dirigía el padre de Plinio, un legendario y aguerrido periodista y político liberal.
En La Razón, en una columna bautizada “Poetas Universitarios” apareció firmado por Gabriel García Márquez un poema titulado “Geografía celeste” con el antetítulo de “Elegía a la Marisela”, que dice así:
No ha muerto. Ha iniciado
Un viaje atardecido.
De azul en azul claro
—de cielo en cielo— ha ido
por la senda del sueño
con su arcángel de lino.
A las tres de la tarde
Hallará a San Isidro
Con sus dos bueyes mansos
Arando en cielo límpido
Para sembrar luceros
Y estrellas en racimos.
—Señor, ¿cuál es la senda
para ir al Paraíso?
—Sube por la Vía Láctea,
ruta de leche y lirio,
la menor de las Osas
te enseñará el camino.
Cuando sean las cuatro
La Virgen con el Niño
Saldrán a ver los astros
Que en su infancia de siglos
Juegan la Rueda-Rueda
En un bosque de trinos.
Y a las seis de la tarde
El ángel de servicio
Saldrá a colgar la luna
De un clavo vespertino.
Será tarde. Si acaso
No te han guardado sitio
Dile a Gabriel Arcángel
Que te preste su nido
Que está en el más frondoso
Árbol del Paraíso.
Murió la Marisela.
Pero aún queda un lirio
Era evidente que además de la influencia pegajosa de la poesía de los Piedracielistas, Gabo parecía querer contarnos un cuento en cada poema o versificación. Reiteraba, sin saberlo, que cada buen poema no era otra cosa que el teatro de una acción. Y así, hasta que por propia confesión, se sintió cegado por el rayo de sol de La metamorfosis de Kafka, en un insólito camino hacia el Damasco narrativo, Gabo se convenció a sí mismo que la avenida ancha de su destino literario no estaba en la poesía propiamente dicha como género a cultivar sino en la novela y el cuento (el cuento, por lo pronto), en tanto que aquella era tan sólo un preludio prodigioso y fosforescente, un ejercicio de disciplina impostergable, un riguroso sistema de elaboración de estructuras literarias para obras superiores aún no soñadas.
Sin embargo, con esa sorda y peligrosa terquedad de quien no es nadie pero quiere serlo todo, Gabo continuó escribiendo poemas y sonetos de medidas perfectas y publicándolos en las páginas de sus buenos amigos, unas veces con el seudónimo de “Javier Garcés” y otras con su nombre verdadero.
A medidados de 1945 publicó con seudónimo el soneto “Tercera ausencia del amor”:
Este amor que ha venido de repente
Y sabe la razón de la hermosura.
Este amor, amorosa vestidura
Ceñida al corazón exactamente.
Este amor que es harina en la ternura,
Que es infancia de sueños en la frente,
Que es líquido de música en la fuente
Y es lucero nostálgico en la altura.
Este amor que es el verso y es la rosa,
Y es saber que la vida en cada cosa
Se nos repite cada vez más fuerte.
Tan eterno, este amor tan resistible,
Que comparado al tiempo es imposible
Saber dónde limita con la muerte.
“Es difícil imaginar, escribe Gabo en sus memorias, hasta qué punto se vivía entonces a la sombra de la poesía. Era una pasión frenética, otro modo de ser, una bola de candela que andaba de su cuenta por todas partes. Abríamos el periódico, aún en la sección económica o en la página judicial, o leíamos el asiento del café en el fondo de la taza, y allí estaba esperándonos la poesía para hacerse cargo de nuestros sueños”.
Y como Bogotá no era solamente la capital dela Repúblicay la sede del gobierno, sino sobre todo la ciudad donde vivían los poetas, no sólo creía Gabo en la poesía y se moría por ella, sino que sabía con certeza que, como lo escribió Luis Cardoza y Aragón, “era la única prueba concreta de la existencia del hombre”.
Un soneto bautizado “Sin título” —junto con el “Soneto matinal a una colegiala ingrávida”—, son los últimos poemas que Gabriel García Márquez publicó en los diarios capitalinos y en cualquier otro periódico de la Tierra, antes de que apareciera “La tercera resignación”, su primer texto narrativo, hace exactamente 60 años en el suplemento Fin de semana de El Espectador.
“Sin título” dice así:
Si alguien llama a tu puerta, amiga mía,
Y algo en tu sangre late y no reposa
Y en su tallo de agua temblorosa
El surtidor florece su alegría.
Si alguien llama a tu puerta y todavía
Te queda tiempo para ser hermosa,
Si aún existe la arteria de la rosa
Para tomarle el pulso a la poesía.
Si alguien llama a tu puerta una mañana,
Sonora de palomas y campanas
Y aún crees en el dolor de la alegría;
Si aún la vida es verdad y el beso existe,
Si alguien llama a tu puerta y estás triste
Abre que es el amor, amiga mía.
Hoy, cuando el orbe entero está celebrando los 80 años del nacimiento del genial fabulista de Macondo, el único inmortal vivo de nuestro tiempo, queremos reconocer en su narrativa magistral, el duende inequívoco de la lírica, las deslumbrantes y arrobadoras gotas de luz con que suele constelar su prosa prodigiosa, y corroborar así que la presencia de la poesía en la novela, el cuento y el periodismo de Gabriel García Márquez no es solamente la prueba concreta de la magnificencia de su parábola vital, sino que es la única artífice de una obra que desde siempre nos ha pertenecido a todos y que se cristaliza en la memoria de los tiempos “más allá del aire donde se terminan las cuatro de la tarde hasta donde no pueden alcanzarla ni los más altos pájaros de la memoria”.