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terça-feira, 29 de abril de 2014

Folclore. Folclore?



É sempre bonito ver quando alguém consegue cantar um tema assim chamado folclórico incorporando-o ao seu repertório sem rupturas. É sinal de que seus  pés estão bem fincados no chão, o que em música popular é fundamental. Mesmo a composição mais elaborada precisa manter este fio terra desimpedido, ou correrá o risco de se tornar mera teorização vazia, discussão intelectualizada – ou seja, vai deixando de ser arte, ou pelo menos arte popular.
Além disso, adoro comparar gravações. Gosto de ver como cada artista consegue trazer um tema escolhido para o seu universo musical, adaptando e adaptando-se, e muitas vezes revelando elementos fundamentais de seu trabalho que permanecem diluidos em outras músicas. Eventualmente, duas gravações da mesma música se distanciam enormemente, o que, sendo uma canção de domínio público, ao mesmo tempo é muito natural e pode ser espantoso.
Déa Trancoso é uma cantora mineira que mergulha fundo nas tradições populares. Gravou o seu primeiro CD, Tum Tum Tum em 2007 a partir do repertório musical do Vale do Jequitinhonha.
Wado é curitibano radicado em Alagoas, o que já dá uma boa medida de seu cosmopolitismo, e também de sua capacidade de misturar infuências. Gravou A Farsa do Samba Nublado, com a banda Realismo Fantástico, em 2004.
Mas há algo que considero talvez ainda mais interessante que isto: é quando o artista cria algo que tem ao mesmo tempo as características estéticas do seu trabalho, uma elaboração formal que dialogue com seus contemporâneos (ou com mestres), e uma identificação tal com a arte popular que pode mesmo vir a se confundir com o repertório folclórico. Volpi, nas artes plásticas, conseguiu isso, a meu ver. No campo da música brasileira, ninguém o fez melhor que Dorival.
Em tempo: Azymuth, trio de instrumentistas brasileiros radicados nos EUA, em atividade desde 1970 (!)
O cantor e compositor carioca Edu Krieger conta que um dia estava passando em frente a uma escola municipal, quando ouviu música no pátio, e se achegou ao portão para ouvir. Qual não foi sua surpresa ao reconhecer que uma ciranda sua estava sendo ensinada na aula de música. Ele ainda estava  gravando seu primeiro álbum, mas a canção já fora gravada por mais de uma cantora, como Rita de Cássia e Maria Rita. Edu esperou a aula acabar, pediu licença para falar com a professora e perguntou de onde ela conhecia a música. A professora então “informou” a ele que a canção era folclórica! Neste momento, Edu decidiu incluir a música no seu primeiro disco, antes que ela deixasse de ser dele e virasse folclórica…
P.S. Deixo para o final o esclarecimento, bem no espírito deste texto: a canção Grande Poder não é de domínio público, tem autor. E este é Mestre Verdelinho, um dos maiores coqueiros e repentistas de Alagoas, perito no pandeiro e no ganzá. Mestre Verdelinho faleceu dia 18 de março de 2010. A ele, um dos muitos que realizaram a fusão perfeita da arte popular, dedico este post.
http://tuliovillaca.wordpress.com/2010/06/08/folclore-folclore/

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