No público empolgadíssimo, um cara bonito e de cabelos verdes sobe no palco pra cantar Maracatu Atômico.
A galera lá embaixo (embaixo era da altura do palco) não parecia entender direito e nem gostar tanto daquele cara que vinha de fora cantar a música de Chico Science.
Em terra alheia todo mundo é alheio...
Pois é. Maracatu Atômico passou a ser de Chico Science, o que é um equívoco maravilhoso!
A música é de Nelson Jacobina e Jorge Mautner, mas Chico cantou de tal jeito e fez, junto com a Nação Zumbi, um arranjo tão incrível que a música passou a ser um pouco deles também. E cá estou eu perdendo o fio da meada.
Mas vou terminar o raciocínio pra voltar ao centro do assunto.
O cara de cabelo verde, Celso Sim, que estava ali com o Teatro Oficina (era o Festival de Teatro do Recife e eles foram, depois da peça, assistir o show) foi o cara que gravou Maracatu Atômico em 1992, num disco do próprio Jorge Mautner.
1992 foi mais ou menos quando começaram a acontecer coisas de revolução na música e na cidade do Recife.
A versão de Chico Science e Nação Zumbi está no Afrociberdelia, de 1996, 20 anos depois de Jorge Mautner ter feito a música com Jacobina.
São os caminhos maravilhosamente fazendo curvas e provocando encontros, assim, do nada, no meio de todas as loucuras diárias.
Assim começou minha história com o Teatro Oficina. Quando acabou o show, Zé convidou pra fazer Bacantes, que seria encenada na virada pro ano 2000, dizendo que nós, as Comadre Fulozinhas, éramos Bacantes. Só fui ter coragem de aceitar o convite em 2001, dessa vez pra temporada e gravação do DVD da peça. E chegando lá entendi tudo!
Ou melhor desentendi tudo pra depois começar, devagarzinho a entender.
Em 1999 estava eu em São Paulo no meio de uma turnê com a banda Eddie.
Eis que resolvo ir no Teatro Oficina assistir a peça Cacilda.
Eis que vou, mais uma vez, no Oficina assistir Cacilda.
Eis que vou, de novo, no Oficina assistir Cacilda.
Eis que volto mais uma vez ao Oficina pra assistir Cacilda.
A peça tinha 5 horas de duração divididas em dois atos.
Muita informação sobre a atriz que eu não conhecia. De Cacilda Becker só conhecia o nome incrível e sabia que era atriz.
Foi na peça de Zé Celso, no meio de toda aquela imensidão de beleza e de informações e de horas a correr, que passei a conhecer um pouco sobre essa mulher.
E a toda vez que assistia, cada vez de um lugar diferente da platéia, via uma nova peça.
Percebia a beleza de uma cena que ainda não tinha reparado tanto, descobria alguma coisa sobre Cacilda, ou simplesmente viajava sem entender bulhufas, em alguma cena absurda de linda.
Foi ali que descobri que Walmor era o Chagas e que Tônia era a Carrero e o quanto impressionantes e importantes pra tanta coisa na minha vida e na nossa eles eram.
E, vejam só, Tônia Carrero pra mim até então era a eternamente bela das novelas.
Walmor era o belo e grande ator...das novelas.
De todo modo agradeço aqui as novelas da Globo. Não fossem elas, muita gente que mora fora do eixo Rio/ São Paulo deixaria de conhecer esses e outros diamantes.
Se não fosse a Globo também não teria @naterciapontes fazendo a cobertura VAV (Viver a Visa) e nossa vida seria menos divertida.
Raul Cortez é outro nome que me vem agora. Guarnieri é outro. Enfim...descobri, dentro de uma peça genial, um bom pedaço do que é e do que foi o teatro brasileiro.
Não sou nenhuma expert no assunto, diga-se de passagem. Apenas apaixonada e semi ignorante.
Cacilda foi escrita por Zé Celso Martinez Correia, o Zé. Dirigida também por ele e com uma equipe translumbrante trabalhando junto.
Marcelo Drummond, Camila Mota, Sylvia Prado, Renée Gumiel, Bete Coelho, Leona Cavalli, Ligia Cortez, Iara Jamra, Cibele Forjaz, Elisete Jeremias, Vadim Nikitin...
Eis que, em 2001, como veio a acontecer tantas outras vezes, fui do aeroporto direto pro ensaio no Teatro Oficina e entrei, de mala, cuia e de cabeça na cena.
Era a cena do nascimento das Bacantes!
Peréio era Zeus, Denise Assumpção (!!!) era Agave, Vera Barreto Leite Hera, Pascoal da Conceição Kadmos, Zé Celso era Tirésias, Marcelo Drummond Dionysios, Renée Gumiel era Nanã Buruku...
e Renée ensinava sempre com seus “rrrrespira!” e seus “tá tudo errrrrrado!”.
Vou ter que frear totalmente as lembranças todas que me vêm agora na cabeça. Ou melhor, frear a descrição delas e a escrevência aqui.
Senão, danou-se tudo, ninguém consegue ler mais nada. É muita coisa prum texto de blog.
Pros que acaso não conhecerem os nomes que citei aqui, sugiro googles intensos e desejo boa viagem.
Denise Assumpção pode ser um bom começo. É uma deusa que atua e que canta e que deixa um buraco na vida da gente quando sai de cena.
Me proponho, nesse momento, a organizar as idéias e escrever mais sobre isso uma outra hora, de uma outra forma.
Aqui não vai caber, nem pra mim, nem pra você.
Pulando então de 2001 pra 2010...aconteceu, dia 7 de abril de 2010, uma coisa importantíssima lá na Jaceguai, 520, Bixiga, São Paulo.
Nesse dia, lá no Teatro Oficina, teve uma cerimônia oficial de encerramento do processo de anistia de Zé Celso.
Compareceram representantes da lei, público, moradores do Bixiga e de todos os lugares, apaixonados por Zé o diretor, o brasileiro e por esse e por outros teatros.
Eu faltei.
Estava eu no ofício e não pude aparecer com meu corpo, mas meu pensamento e minha vontade estavam lá.
Na minha intenção de terminar de escrever esse texto, pra que ele se torne possível nesse formato vai aqui um link de Zé falando sobre o tal 7 de abril.
http://www.youtube.com/watch#!v=9p_cgUWLnpM
Entre tantas coisas que foram importantes nesse processo de anistia, teve a indenização em dinheiro, acompanhando o pedido de desculpas do Estado.
Zé recebeu "por unanimidade do conselho da Comissão de Anistia Política do Ministério da Justiça indenização de R$ 596.083,33 retroativa a 5 de julho de 2001, além de pensão vitalícia de R$ 5.000, como reparação por males feitos ao artista e à sua companhia pelo Estado".
Buhr
karinabuhr.com.br
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