Amanheci com uma ressaca meio existencialista... Pensando muito nas questões levantadas ontem na mesa do bar, mas principalmente nas pessoas ali, e no modo próprio e, certamente construído à duras penas, como cada uma gerencia sua própria vida, seus dramas pessoais, os momentos de crise e os de calmaria... A mesa misturava gente que amo e conheço de tempos, pessoas que entraram agora na minha vida e gente que conheci ali, na hora. Daí talvez, a diversidade e riqueza dos temas em pauta. Pra melhorar, falávamos várias línguas já que havia um espanhol e um português à mesa, o que deu um tempero especial a tudo.
E o bar, ainda trouxe aparições especialíssimas e que também rechearam a experiência. Primeiro um ex namorado, com quem falei pela primeira vez após nosso término nada agradável. Ocasião sempre reveladora e libertadora porque permite o novo! (Se não ficarmos bem agarrados ao que já passou, claro.) A página virou assim como a desavença. Puta presente sentir que o desapego aos pequenos conflitos desnecessários é possível. E segundo, um contemporâneo do Instituto de Artes na UnB, artista plástico de primeira, mas que vive um terrível momento de auto-destruição. Difícil julgar e também imaginar os percalços pelos quais ele passou pra ter chegado até o ponto de perder completamente o domínio sobre a própria vida. Domínio? Temos mesmo algum? E mesmo se tivermos, sabemos, existe algo que nos foge ao controle, muitas vezes (sempre?). O que é Isso? É algo inesperado que chega mudando rumos e muitas vezes, nos tirando o remo das mãos. E o barquinho corre por si e nosso livre arbítrio vai pras cucuias... De onde vem esse inesperado? Quem nos manda Isso? Deus cê tá aí? Natureza, foi você? Inconsciente, sempre tu?
Penso na política e no quanto desacredito em tudo o que vejo acontecendo. Mais do que nunca só a micropolítica faz sentido, o indivíduo esforçando-se pra ser feliz, em primeiro lugar e mais do que tudo. Focado no que lhe deixa feliz, no que vale a pena... Imagine um mundo cheio de gente feliz? Essa é a grande revolução! Mas pra isso a educação tem que ser outra, priorizar o amor, a diversidade, o respeito, a escuta... A escuta... Que coisa difícil, ouvir verdadeiramente o outro, perceber suas demandas, considerá-las... Como nos livrar dos ruídos pra escutar a canção da vida? A canção do amor que toca sempre que cruzamos com outro ser humano?
Mas micropolítica não tem nada a ver com egocentrismo e alienação, pelo contrário, acho que pressupõe um estar em si conectado com o outro, com o mundo. O egocêntrico só vê a si mesmo, só escuta a si mesmo, é quase doença... Acho que todos nós temos certo nível de egocentrismo, que vamos trabalhando ao longo da vida, ou não. Penso no discurso praguejado contra os homens, que aponta suas falhas e dificuldades, culpabilizando-os pelo fracasso das relações e do mundo... E outros tantos discursos generalizadores e impeditivos que funcionam como sentença de morte pra qualquer mudança real. Mas nosso eggs (que de tão metido acha que vale por dois e tem que ser escrito em inglês que é mais chique!), esse bichinho carente que nos move, precisa dos discursos alheios pra se dar valor. O pobrezinho não sabe que o verdadeiro discurso é individual e ditado pela voz da alma, que já dizia Nilton Bonder, é imoral!
Me vejo repetindo discursos, crenças, pensamentos e de repente, percebo que nenhum deles me representa. O discurso individual é dinâmico, maleável, em constante mudança, discurso vivo! Aquela mesa de bar – também divã, templo, ritual, festa, encontro, regozijo - me fez atualizar-me de mim mesma, refletir sobre meu discurso ... Ali me vi diferente, outra, embora a mesma. Senti na nuca o bafo quente da minha amplidão interior, da liberdade possível, e que me habita lá nos confins...
Penso no Tempo, no amadurecer e também no envelhecer... Difícil envelhecer e não devia ser. Faz parte da vida, sempre soubemos que acontece, sempre aconteceu, e ainda assim dói ver o corpo perdendo o viço... Não devíamos ser tão sensíveis a isso, nos tira muita energia. Questão de educação também? Penso em gente que morre, assim, de repente, na flor da idade... O que traz imediatamente a pergunta: O que é realmente essencial? O que é supérfluo? Só a presença da morte traz essa percepção tão aguda... E que logo passa com a primeira ilusão que nos cruza o caminho. E de novo, esquecemos, e de novo, perdemos tempo com coisas inúteis, jogando vida fora... A presença da morte nos é vital, talvez seja nossa maior professora... Tudo morre: as relações, o corpo, os pensamentos, a infância, ontem, agora... Tudo morre, mas se transforma em outras coisas... Ali naquela mesa de bar...
Meu imenso agradecimento ao Luís, Sal, Jok, Ana, Noêmia e Ribamar, presentes na mesa e cúmplices de um regozijo ímpar!
Namastê
Anasha
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