1.) TETRO (Tetro), de Francis Ford Coppola. Expiação de seus tormentos familiares, de suas relações pretéritas com a sua família, obra de soberba autoral com resultado mais que perfeito. Rapaz ingênuo, ainda adolescente, chega a Buenos Aires para encontrar o irmão mais velho, que abandonou os familiares e vive com outro nome. Coppola, realizador notável, amplia, aqui, a sua dimensão como artista em filme de reflexão. O melhor do ano, de longe e, nem de perto, pode-se compará-lo aos outros.
2.) CÓPIA FIEL (Copie conforme), de Abbas Kiarostami. Este realizador iraniano, desta vez em produção fora de seu país, filmada na belíssima Toscana, através do relacionamento de um casal (Juliette Binoche e o cantor lírico inglês William Shimelli) provoca um jogo de ambiguidades, de verdades e mentiras, um discurso amoroso sobre a autenticidade e a mentira com uma pessoal maneira de filmar os seres e as coisas. E, com isso, confirma que é um realizador acima da média e o filme um dos mais curiosos do ano.
3.) HOMENS E DEUSES (Des hommes et des dieux). Detentor do prêmio especial do júri no Festival de Cannes deste ano, Des hommes et des dieux, de Xavier Beauvois, é inspirado em fatos ocorridos na Argélia em 1996, quando monges católicos são sitiados em seu mosteiro por fundamentalistas islâmicos. Beauvois traça com rigor o perfil de cada monge e sustenta, com vigor, a tensão da crônica de uma morte anunciada. Momento sublime: quando os monges ouvem o Lago dos cisnes de Tchaikovsky.
4.) O MÁGICO (L'illusionniste), de Sylvain Chomet. Delicadeza e sensibilidade na abordagem da decadência de um ilusionista cujo desenvolvimento narrativo, em sua maior parte, é feita pela visualidade em detrimento dos diálogos. Baseado num roteiro inacabado de Jacques Tati, a diretora Chomet, premiada em As biciletas de Belleville, confirma, aqui, o seu talento e a sua predisposição poética de ver e olhar o mundo. E bate na tecla de uma constante temática de Tati: o embate entre a tradição e a modernidade (vista com tanta arte e inventiva em Meu tio/Mon oncle, 1958.
5.) ALÉM DA VIDA (Hereafter), de Clint Eastwood. Este conceituado diretor, que dá continuidade à tradição do grande cinema americano, não realizou em Hereafter, como muitos pensaram, um filme espírita, mas se valeu de uma abordagem sobrenatural como um recurso de sua fabulação para falar de sentimentos, culpa, e a capacidade de superação dos traumas. O filme acompanha três personagens: Matt Damon, que tenta deixar para trás uma promissora carreira de médium; em Londres, um menino sofre com a trágica morte do irmão gêmeo; e, em Paris, a jornalista Cécile De France vê sua vida mudar radicalmente após sobreviver ao tsunami de 2004. Os três personagens acabam por se encontrar e estabelecem ligações. Obra bela e envolvente.
6.) AS PRAIAS DE AGNÈS (Les plages d'Agnès).Documentário memorialístico, Les plages d'Agnès utiliza, na sua estrutura narrativa, materiais de origens diversas: fotografias, fragmentos de filmes, entrevistas, pequenas encenações. Por meio desse sensível documentário, Agnès Varda realiza uma espécie de autobiografia, recorda momentos, instantes de felicidade: sua meninice, seus passeios pela Bélgica, nos tempos de criança e, quando chega adulta a Paris, a descoberta e o assombro pela possibilidade criadora através das imagens em movimento. Apesar de realizado em 2009, somente no ano em curso foi lançado em Salvador.
7.) MEIA-NOITE EM PARIS (Midnight in Paris), de Woody Allen. Consagrado autor do cinema contemporâneo dotado de estilo próprio e constantes temáticas, Allen entra no túnel do tempo para refletir sobre as ilusões que temos sobre a existência. Paris sempre fascinou cineastas, escritores, e artistas em geral.Midnight in Paris, sobre ser um canto à sua beleza, é um filme que nos permite pensar acerca do tempo como fator existencial e que determina as circunstâncias do aqui e do agora. Um momento, entre outros, antológico: quando o personagem fala a Buñuel sobre O anjo exterminador e o aragonês acha o argumento confuso.
8.) MELANCOLIA (Melancholia), de Lars Von Triers. A melancolia deste rebelde cineasta dinamarquês da terra de Carl Theodor Dreyer é uma melancolia que reflete sobre o mal estar da civilização. O cinema de Von Tries é um cinema agressivo e de imagens fortes, mas sempre com o condão de nos levar à reflexão. Nele, não há piedade na exposição das fraturas expostas da civilização. Enquanto um planeta chamado Melancolia está prestes a colidir com a Terra, uma mulher se prepara para a sua festa suntuosa de casamento. Interpretações notáveis de Kirsten Dunst e Charlotte Gainsbourg.
9.) O DISCURSO DO REI (The king's speech), de Tom Hopper. Com a abdicação de seu irmão, George assume o poder real na Inglaterra como George VII.O filme é um duelo interpretativo entre Colin Firth e seu instrutor Geoffrey Rush para que este consiga curar a gagueira crônica do aspirante ao trono. Criticado por uma estrutura narrativa convencional, The king's speech justamente por isso consegue um equilíbrio perfeito entre os seus diversos elementos de composição: a excelência interpretativa, a cenografia apurada, um ritmo envolvente e um espetáculo grandioso.
10.) A PELE QUE HABITO (La piel que habito), de Pedro Almodóvar. A ação se passa no ano de 2012, e assinala a volta de Antonio Banderas aos filmes do cineasta, como o bem-sucedido cirurgião plástico Richard Legrand que, após a trágica morte de sua esposa (que tem seu corpo completamente incinerado em um acidente), parte em busca de uma "pele perfeita", que poderia tê-la salvado. Sem limites em sua insaciável busca, Richard é capaz de tudo para tentar reescrever a história e evitar o inevitável. O cinema de Almodóvar é uma mescla de gêneros e aqui, assumindo o thriller, faz um trabalho primoroso como cinema e a obsessão pelo cinema. Influência notória de Os olhos sem rosto (Les yeux sans visage, 1960), de Georges Franju.
Publicado originariamente na revista eletrônica Terra Magazine.
Nenhum comentário:
Postar um comentário