Maria Stella de Azevedo Santos
“Não queria ser o mar, me bastava a fonte; muito menos ser a rosa; simplesmente o espinho; não queria ser caminho, porém o atalho; muito menos ser a chuva, apenas o orvalho. Não queria ser o dia, só a alvorada; muito menos ser o campo, me bastava o grão; não queria ser a vida, porém o momento; muito menos ser concerto, apenas a canção. O ouro afunda no mar, madeira fica por cima, ostra nasce do lodo, gerando pérolas finas”.
Ederaldo Gentil não morreu, ele apenas desistiu de viver em uma sociedade onde a grande luta é pelo poder e pela fama; onde as pessoas correm e pisam umas nas outras visando alcançar o primeiro lugar, e quando lá conseguem chegar continuam pisando; onde as pessoas se esqueceram da sabedoria do segundo lugar, posicionamento que nos mantém olhando sempre para o alto, lembrando-nos que o primeiro lugar é um horizonte perdido como Shangri-la, uma espécie de paraíso que creio precisa ser encontrado, primeiro, dentro de si mesmo.
A humildade do segundo lugar guiou a caminhada de Ederaldo Gentil, que mais uma vez a enalteceu quando cantou: “Sou o menor dos pequeninos, o mais pobre dos plebeus, o alheio inquilino, o mais baixo pigmeu, o comum do singular, o último dos derradeiros, viandante e peregrino, o mais manso dos cordeiros. Eu sou maior em lampejos de brandura, de angélica candura dos mistérios do amor. Sou bem maior que os pinheirais da humildade, pelos campos da bondade, eu sou a felicidade”.
Ederaldo Gentil guardava em seus olhos a tristeza dos que estão vendo o que quase ninguém consegue ver e por isto são tomados por uma síndrome que acomete os grandes poetas. Confundida muitas vezes com depressão, a síndrome dos poetas revela um estado quase que permanente de melancolia, que nosso Ederaldo Gentil soube demonstrar através de uma composição onde a dor da constante dor ganha uma leveza que só os poetas conseguem transmitir. Ele canta:
“Depois que Maria da Graça foi embora, não tenho graça na vida. A vida pra mim é sem graça, toda hora escuto um cadê a Graça que eu tinha na vida, a graça que eu tinha em meu ser. Como posso eu viver sem Graça, se já não tenho graça em meu viver? Um dia aparece Aparecida, no outro Maria José, Maria das Dores da vida, Maria dos Prazeres de Nazaré. Assim eu vou vivendo nessa vida uma farsa, pois minha vida sem Graça não tem graça”.
Seria até lógico dizer que Ederaldo Gentil foi acometido pela depressão em virtude de seus poemas melodiosos não mais encontrarem espaço na mídia e por isto não atingirem o sucesso almejado por todos. Seria lógico, mas não provável. Quem teve o prazer de conhecê-lo ou de ver uma imagem sua da época em que explodia nos meios de comunicação, pode observar a tristeza já presente em seus olhos, os quais já espelhavam seus profundos sentimentos. Porém, são imortais todos que fazem de sua vida uma grande obra. Como Jorge Amado, Cidália de Iroko, Chico Anysio, Millôr Fernandes, Ederaldo Gentil não morreu. Parafraseando Gustavo Corção, digo: “Os seus acordes finais não são um fim. O silêncio que os segue não é um vazio. Os acordes finais anunciam que a beleza se consumou. E o silêncio que se segue é para que o encantamento não seja quebrado”.
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