O Eurodeputado do Bloco de Esquerda morreu esta terça-feira, em Antuérpia. Fazia 54 anos no próximo dia 1 de maio. Recorde-o numa entrevista "Na primeira pessoa", publicada na VISÃO em 2008
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Entrevista
Miguel Portas na primeira pessoa
Numa entrevista publicada na VISÃO, em Julho de 2008, Miguel Portas falava de política. Mas também se expunha, falando de si e do que lhe ia na alma.
O comunismo é uma grande religião"
"Gente que não soube fazer outra coisa se não da política uma carreira, é gente que jamais perceberá porque é que a política é necessária a outros e não apenas a eles próprios". Foram palavras de Miguel Portas, numa entrevista, marcada para uma tarde de sexta de maio de 2008 e que terminou já com a sala, virada a sul, a receber os últimos raios de sol do dia. Portas comemorara, dias antes, o seu 50.º aniversário, celebrado no primeiro dia daquele mês. Uma data que, aliás, lhe assentou como uma luva.O jornalista emprestado à política para uma comissão de serviço falou de política, oposição renhida que, em Bruxelas, fazia a uma Europa fortaleza que transformou o Mediterrâneo, o seu Mediterrâneo num muro intransponível e num imenso cemitério. Contou a história da boleia que apanhou para França e refletiu sobre religião, sobre o marxismo e sobre a vida em geral. Eis o registo de uma conversa que deixou saudades.
A "Directiva do Retorno", relativa a imigrantes ilegais, é uma vergonha para a Europa do século XXI, como diz Gaspar Llamazares, da Esquerda Unida espanhola?
Sem dúvida. Que outra classificação é possível, quando ela permite a detenção de pessoas, maiores ou menores de idade, até 18 meses, sem que tenham cometido qualquer crime, que não o de lutarem pela vida?
Vem aí a Europa-fortaleza?
Ela tem sido isso. Essa uma das razões porque há tantos indocumentados. O mediterrâneo foi transformado num imenso muro e num cemitério. Esta directiva prevê o reforço dos 197 centros de detenção que já existem. Classificam-nos de "especializados". Conheço alguns e posso afirmar que são melhores as prisões. Na ilha de Lampedusa, nem água potável tem. Não é século XXI, é século XIX...
Prometer fronteiras abertas a toda a gente, como acusa o líder do CDS-PP, seria uma alternativa de esquerda?
Antes de agitar fantasmas, a direita deveria saber que o direito à mobilidade está na Declaração Universal dos Direitos do Homem, subscrita por todos os Estados. Também não lhe ficaria mal reconhecer que esta é a posição das igrejas cristãs. Porque há de ser livre a circulação de capital e mercadorias e não a das pessoas? De qualquer modo, a acusação não tem sentido. A Europa precisa de muitos mais imigrantes e sabe-o. O que faz é seleção. És árabe, preto e de África, não queremos. És alto, louro e licenciado, vem daí. O movimento de entradas e saídas pode e deve ser regulado, mas na base do reconhecimento do direito à mobilidade. Se, em vez de uma política de seleção e expulsão, tivéssemos uma que gerisse fluxos nas duas direções, assente em fortes políticas de cooperação e desenvolvimento, estaríamos bem melhor. E os imigrantes, também. Muitos poderiam, até, ficar nas suas terras, que ninguém parte se não precisa.
O Bloco está preparado para governar?
O Bloco está preparado para se afirmar como alternativa de governo aos governos que temos tido e em particular a este último. Parafraseando Honório Novo, como as coisas estão, temos mesmo que nos preparar para um dia governarmos. As pessoas já conhecem os resultados daqueles que pensam estarem "preparados para governar". Venham, portanto, os que não estão, que nada se perde e algo se ganha...
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