Gostaria de poder dizer que Tabu é o mais belo filme do cinema português. Gostaria, se não fosse eu um quase desconhecedor do cinema português. Mas, ainda assim, arrisco: Tabu é o mais belo filme do cinema português. Se é ou não o mais perfeito, o mais bem construído, o mais equilibrado, o mais irrepreensível tecnicamente, o mais português, não sei. Mas é o mais belo, no sentido mais bonito que a expressão belo pode ter. Tudo por causa de um detalhe, ou não fossem sempre os detalhes a fazer a diferença, tanto na vida como na ficção. E qual é o detalhe que faz toda a diferença em Tabu? Por incrível que pareça, é uma voz off, uma longuíssima voz off, talvez a mais longa voz off do cinema desde que há cinema. E digo incrível porque não escondo a minha embirração com vozes off, porque as acho, quase sempre, um recurso fácil e pobre daqueles que não sabem encontrar outro recurso num filme para contar uma história. Mas, aqui, a voz off de Gian Luca Ventura (a personagem que nos narra a trágica história de amor do filme em flash-back) tem tudo menos de fácil e pobre recurso. É uma voz off, sim, mas uma voz off que faz de intertítulo – e que dramatismo trazem à história esses intertítulos falados — de filme mudo. Filme mudo? Sim, filme mudo, porque é na ausência de som dos protagonistas da história africana, e do enquadramento em que se insere essa ausência, que reside toda a beleza do filme.
Já disse, e volto a dizer, que Tabu é o mais belo filme do cinema português. Mas gostava que ficasse para a História, ainda, como o mais belo filme mudo de sempre a par do Aurora (Sunrise) de Murnau (a quem o monte que dá título ao filme presta homenagem aliás). Se me acusarem de tomar a parte pelo todo, o corpo estranho da segunda parte (e, já agora, do seu ainda mais insólito prelúdio) pelo filme todo, pouco me importa. Sem esse corpo estranho, que é o mudo, que habita a segunda parte do filme (e o tal prelúdio), Tabu não existiria. Sem esse detalhe, Tabu nunca passaria de mais um filme, igual a muitos outros.
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