Pesquisar este blog

terça-feira, 30 de abril de 2013

Dos Suspiros ou Meus Sapatinhos Vermelhos


Um Salto Para o Abismo
Passei um tempo, muito tempo, sem pensar na clínica que deixei. E ponho-me a pensar se, afinal, isto não se deu porque, de alguma forma, algo ficou. Aqui, talvez. Interpretar, como escrever, é possibilitar sentidos antes insuspeitos. Manifestas na linguagem, interpretação e escrita caracterizam-se por não serem unívocas, ou seja, não dizem, nunca, exatamente tudo Porque há, sempre, o impossível de dizer (isso não é novo, of course, de Lacan e seus intérpretes à Clarice, um vasto mundo de melhores ditos sobre o tema se destacam em relação e este meu). Escrita e interpretação insistem, emergem nesse terreno: justamente o que não pode ser todo dito, não pode, de todo, deixar de ser dito. É no impasse que escrevo. A escrita tem vezes de tirana, impõe-se. É estéril perguntar para quem escreve? Porque escreve? Para que? Não há resposta para isto senão o ato mesmo de fazê-lo. Uma de minhas mais queridas escritoras, M. Duras, diz (diz? escreve!) que a escrita "permite ao escritor dizer para si mesmo que não é preciso se matar todos os dias, visto que é possível matar-se a qualquer dia" (quanto a isso tem sempre o delicioso texto de Verissimo: O Suicida e o Computador, eu, se fosse você, lia). Assim, vir aqui diariamente é escolher do que não quero morrer hoje. 

Ou, talvez, do que quero. Porque viver é justamente isso: um dia a menos. Eu lembro - ou gosto de pensar que sim - de quando aprendi a suspirar. Você lembra? Suspiros são pequenas morte, menores que os orgasmos, maiores do que nossa impávida e maquinal ação de inspirar/expirar. Suspirar é admitir. Admitir uma falta, uma ausência, um erro, um limite. Suspirar é indicar a medida do impossível. Há toda uma gama de ensaios de suspiros na minha infância, eu imagino: a primeira fome, o primeiro brinquedo guardado, a hora de dormir, o primeiro não. São ensaios, são ensaios. O primeiro suspiro que devo ter dado, eu lembro (lembro? claro que não, mas gosto de reinventar-me assim) foi para Bogart. Ou por ele, melhor dizendo. Em que filme? Em qualquer. O olhar cansado, a capa de chuva - sim, devia ser marlowe; o andar tão firme, as tristezas tão grandes. Meu primeiro suspiro deve ter sido por ele, quero que tenha sido. O Bogart  de uma mágoa que nos obseda, esse é o apelido do meu primeiro anseio. Mas ainda não é Bogart que vem ocupar este post. 

Meu suspiro mais profundo, o que não foi o primeiro mas é paradigma de todos que lhe sucederam e referência pra todos que o antecederam, este suspiro se fez ao ver Sapatinhos Vermelhos (The Red Shoes, 1948). Qual Cisne Negro, foi o que tive vontade de exclamar algumas vezes e o faço agora. Porque não há um olhar sobre o palco e a dança como este. Não há um horror infantil mais adulto que este. E não há cores, nem passos, nem impossibilidades e escolhas, ah, não há sapatilhas como estas. Pode haver tema mais atual do que a pergunta: ou isto ou aquilo? O amor ou o trabalho? Uma hora pergunta-se: "porque você quer dançar?" ao que se responde "Porque você quer viver?" [já havia, talvez, neste meu gosto, o motivo deste post: porque você quer escrever? porque você quer viver?].

Sapatinhos Vermelhos é um filme sobre a paixão. Sobre o que ela nos dá. Sobre o que nos cobra. É um filme sobre uma febre. Um filme de dolorosa beleza. O que são aquelas cores, senhor? O vívido vermelho, o denso preto, o azul profundo...cada cor tem algo a dizer. O Techinicolor enriquecido de sentido. Há tudo aqui: a busca da perfeição, o extremo esforço diário, o cansaço dos longos ensaios, a excitação ante o público, o arrebatamento que a arte propicia, o vazio que acompanha todos os "depois" conhecidos. Há momentos expressionistas nas cores, cenários, pequenos efeitos visuais. Um filme de direção forte e sensível, a cena do ballet é primorosa. Não há medo, nenhuma tentativa de agradar, nenhuma infantilização da linguagem. 

Foi aí que aprendi a suspirar. Que aprendi a reconhecer que algo falta, sempre. Que aprendi a viver morrendo e a fazer de cada automático respiro uma tentativa de beleza. Que aprendi que há um compromisso em calçar as vermelhas sapatilhas. Que é uma escolha. Que é uma escolha,  repito, todas as vezes que paro e escrevo. Cada letra, cada dito, uma opção. Um suspiro feito post, feito texto. Um reconhecimento, também, de que não é tudo. E de que se há de prosseguir tentando, mesmo já se sabendo do impossível desta empreitada. Que é o mesmo que viver. Minúscula piada que adotamos a ferro e fogo.

O vermelho voltou-me ainda aos sapatos e suspiros quando O Mágico de Oz aportou nos meus olhos, mas esta estrada de tijolos amarelos eu percorrerei outro dia.


Pela net, achei coisas. O trailler, delicioso. Trechos do filme, hipnóticos. Informações de uma cópia restaurada que preciso ter. E há, claro, a cena do ballet, que trago pra cá, pra habitar entre as Borboletas, hoje, todas elas vermelhas. Como meus sapatos:




http://borboletasnosolhos.blogspot.pt/2011/03/dos-suspiros-ou-meus-sapatinhos.html

all that JAZZ


INTERNATIONAL JAZZ DAY GLOBAL CONCERT WEBCAST

Live from Istanbul, Turkey at live.jazzday.com
9pm (Istanbul) / 7pm (London) / 2pm (New York) / 4am (Sydney - May 1st)






Distâncias



 Não tenho tempo, corre, corre, rápido, vai, ligeiro, não tenho tempo, não dá, não cabe. E, de repente. Todo esse nada diante de mim. Tudo errado, hora, lugar, jeito. Errada, torta, manca, esquerda, todos os planos feito papel am...assado no fundo da bolsa e o tempo, alto, largo e fundo, feito zombaria.

Tempo material, pedra na vidraça, cotoco, careta. Tempo que sobra, que cutuca, que pergunta, que é, impávido, e eu aqui, sem saber, sem fazer, sem dizer. Querendo o “e se”. O mundo paralelo. Aquele dos finais felizes. Das coisas que encaixam. Do universo que conspira.

Passa tempo tic-tac, tic-tac passa a hora, podia aproveitar, útil ou gozo, tempo, tempo, tempo, vou te fazer um pedido, mas só quero o que queria, tento e agora nada me tenta. Vejo a noite se fazer lá fora, se fazer em mim, manta áspera, limite. Noite sem suspiro, sem anseio, sem vontade. Sem soluço, sem tristeza, sem agonia.

Penso nisso amanhã, penso nisso amanhã, scarlett tupiniquim. Mas o que faço com todos esses minutos que insistem em não sair do peito?

http://borboletasnosolhos.blogspot.pt/

domingo, 28 de abril de 2013

Ney Matogrosso fala

de perdas, medos e do desejo de ser lembrado pelas transgressões

  • Aos 71 anos, cantor que traz ao Rio a turnê ‘Atento aos sinais’ revela não ter iPod, Facebook, quase não ouve música e diz que não transa sem carinho



RIO - Não há o que Ney de Souza Pereira — o homem — não tenha dito sobre Ney Matogrosso — a obra. Nas duas milhões de páginas que citam o artista, na internet, habitam um sem-número de entrevistas em que ele relembra ter: namorado Cazuza (“Foram três meses de relacionamento com labaredas de dois metros de altura”); cheirado cocaína (“Odiava. Nunca entendi, achava aquilo uma mentira”); namorado mulheres (“É muito mais difícil as pessoas aceitarem que eu transo com mulheres do que com homens”); ido para a cama com 15 pessoas (“Ninguém trepa! Você deita em cima daquele topo, aí vai caindo lá pra baixo”); perdido amigos para a Aids (“Fiquei sem referência, parecia que tinham quebrado todos os espelhos à minha volta”); ter permanecido imune à doença (“Não me peça explicação porque eu não sei dar. Eu tenho certeza que tive contato com o vírus”).
Na música, Ney Matogrosso também teve carreira tão intensa quanto na vida. Nos anos 70, integrou o Secos & Molhados, grupo performático que, junto com os Mutantes, salpicou rock e transgressão na MPB. Em carreira solo, tocou ao lado do violonista Raphael Rabello, do clarinetista Paulo Moura, do pianista Arthur Moreira Lima. Gravou canções com Caetano Veloso, Chico Buarque e Pedro Luís. Com sua voz aguda e feminina de contratenor, cantou Cartola, Tom Jobim, Villa-Lobos. Aos 71 anos de idade, 40 de carreira, 38 discos gravados, prepara-se para mais uma etapa. “Atento aos sinais”, turnê iniciada em março, em São Paulo, desembarca no Rio a partir de sexta-feira, com três shows no Vivo Rio. Em cena, além de interpretar Itamar Assunção, Criolo e Vitor Ramil, o cantor usa mais de uma dezena de figurinos.
Ney Matogrosso já foi comparado a Josephine Baker pela imprensa francesa, descrito como uma mistura de Carmen Miranda, David Bowie e Jack Nicholson pela americana. Já subiu no palco usando penas de pavão, unhas de tigre, chifres de carneiro, cocares, paetês, pérolas e, claro, pele (a própria, praticamente nua). Rita Lee assim descreveu a primeira vez que o viu em ação, ainda na época do Secos & Molhados: “Um ET elegante vestindo um kabuki mucho louco com uma voz assexuada, cantando uma ciranda portuguesa.” Sobre um palco, como bem definiu o nome de sua turnê em 2008, sempre foi inclassificável.
Mas e fora dele? O que Ney Matogrosso — a obra — tem a dizer sobre Ney de Souza Pereira — o homem? Quanto do artista que atravessou o desregramento sexual da década de 70, a oferta infinita de drogas dos anos 80 e a perda dos amigos nos anos 90 sobrevive no senhor solteiro, sereno, que mora com dois gatos, numa cobertura de três andares no Leblon?
— Se não houvesse o Ney Matogrosso, talvez eu me ressentisse de não atuar artisticamente. Eu não estaria completo — responde ele, durante uma das três conversas com a Revista O GLOBO, na última semana. — No começo, eu era muito agressivo no palco. Se não fosse, seriam comigo. Hoje subo nele de uma maneira amorosa.
Nascido em Bela Vista, no Mato Grosso do Sul, Ney é o segundo de cinco filhos de uma família de classe média. Aos 6 anos, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde morou no bairro de Padre Miguel, até voltar ao seu estado natal — dessa vez morando em Campo Grande — cinco anos depois. Fã de Elvis Presley, chegou a ter topete igual ao do músico na adolescência. Mas seu pai, militar da Aeronáutica, impediu-o, desde cedo, de dar vazão ao lado artístico.
— Eu pintava, fazia retratos. Pedi um curso para o meu pai, que disse que não queria filho artista — lembra. — Fiz teatro escondido. Costumo dizer que eu dei sorte de ter nascido filho de militar, porque isso já me colocou como transgressor. Sempre contestei as decisões dele.
A juventude seguiu conturbada. Aos 17 anos, após a primeira e única troca de socos com o pai, resolveu sair de casa. Alistou-se na própria Aeronáutica (que aceitava recrutas com sua idade) e, uma vez aceito, pediu transferência de Campo Grande para a Base Aérea do Galeão, no Rio. Pelos dois anos seguintes, aprenderia a dar tiro (“Era Colt 45, mas nunca me interessou a arma”) e, sobretudo, a tomar as rédeas de si mesmo:
— Eu era muito duro. Na adolescência, tinha vergonha das minhas mãos. Vivia com elas no bolso. Eu também não tirava a camisa, por vergonha. Até que fui para o quartel, tendo que tomar banho com 20 camaradas ao mesmo tempo. Percebi que ninguém ali via o monstro que eu me achava.
Também no quartel, Ney presenciaria, pela primeira vez, uma troca de beijos entre dois homens. Estavam abraçados, sentados sobre uma mureta, durante uma madrugada quente.
— O único exemplo de homossexual que eu tinha visto era o de um travesti em Campo Grande — diz. — Na Aeronáutica, vi que essas coisas rolavam, e que eu não tinha que me transformar. Gosto de ser homem.
Até então, Ney havia tido relações sexuais e namoros com mulheres (perdera a virgindade aos 13 anos, com uma prima distante, na fazenda de seu avô). Decidiu que tentaria com um homem, mas só quando surgisse uma ocasião especial.
— Eu queria que alguém me motivasse a ponto de realizar — explica.
A ocasião surgiu aos 21 anos, quando trabalhava no Hospital de Base de Brasília, fazendo lâminas de exames. Foi, ao mesmo tempo, um alívio e uma decepção:
— Pensei: “É isso? Esse tempo todo sofrendo, penando num vale de lágrimas, para isso?” Não ficou escrito na minha testa, marcado a ferro. Perdi tanto tempo me debatendo por uma coisa que era simples, normal.
A decepção veio logo depois:
— Fui da libertação ao inferno. Eu achava que relação entre homens era de igual para igual. Aprendi que não faz diferença: é o velho ciúme. Depois, por muito tempo, não quis namorar ninguém.
Aos 25 anos, decidido a ser ator, voltou para o Rio. Trabalhou com artesanato, tomou daime, viveu uma vida religiosamente desregrada. Quatro anos depois, por intermédio de sua amiga Luhli (da dupla Luhli e Luciana), professora de canto e compositora, foi apresentado ao jornalista João Ricardo, que buscava um homem de voz aguda para capitanear sua banda, Secos & Molhados. Até então, Ney havia cantado apenas num coral de 60 pessoas em Brasília (onde o maestro elogiara-lhe a voz) ou em boates, de forma amadora. Ele não sabe ler música.
O encontro ocorreu em 1971, em São Paulo. João Ricardo gostou do que viu (um rapaz de 53 quilos que se movimentava no palco como se fosse um animal indomado) e do que ouviu (uma voz de contratenor sem igual em qualquer outra banda brasileira). Dali a dois anos seria lançado o primeiro disco. O Secos & Molhados se tornaria um sucesso instantâneo, vendendo 700 mil cópias. Para preservar o anonimato — um dos únicos bens conquistados nos 31 anos de vida — Ney de Souza Pereira decidiu subir ao palco com a cara escondida atrás de uma forte maquiagem.
— Ouvia falar que artista não tinha vida privada, não andava na rua. Eu tinha 31 anos, não queria perder minha liberdade. Minha inspiração foi a maquiagem usada pelos atores do teatro kabuki — ressalta.
Havia, ainda, uma segunda razão:
— Percebi que, escondendo o rosto, eu sentia uma coragem e uma liberdade física que jamais supus ter. Quando subia ao palco, pensava em personagens. Eu queria ser um inseto. Eu botava uma peruca de crina de cavalo e e me sentia um ser dos Andes. Depois do gostinho, não voltei atrás.
Nascia, ali, o artista Ney Matogrosso.
Aquela formação do Secos & Molhados teve vida curta. Em 1974, Ney desentendeu-se com João Ricardo, que decidira rever os critérios de divisão do dinheiro. Após gravar o segundo disco, abandonou a banda.
— Ele tem essa coragem de ser ele mesmo, de não se submeter. Teve que pagar uma multa colossal — lembra Luhli.
Lançou-se, então, em carreira solo. Do Secos & Molhados, manteve a postura libidinosa e o figurino onírico — que se tornariam, junto com a voz aguda, sua marca registrada.
— Na época da ditadura, os militares tinham metralhadoras, e eu tinha minha libido como arma. É um prazer enorme poder brincar com a libido, poder trocar de roupa no palco, na frente das pessoas. Mas sempre tive a preocupação de não ser vulgar. Isso foi o limitador — diz.
Manteve a estética extravagante até lançar “Pescador de pérolas”, em 1987. O disco, intimista, foi um divisor de águas em sua carreira. Ney se fez acompanhar dos músicos Raphael Rabello, Paulo Moura e Arthur Moreira Lima, respectivamente os grandes nomes do violão, da clarineta e do piano de então:
— Até esse disco, eu só sabia fazer as coisas escandalosamente. Fui me testar, ver se eu era um cantor de verdade ou apenas o que falavam de mim.
A partir dali, voou em céu de brigadeiro. Como músico, ganhou três discos de ouro e outros três de plantina. Como iluminador, dirigiu a luz de shows de Chico Buarque, Nana Caymmi e Nelson Gonçalves. Como ator, estrelou o curta-metragem “Depois de tudo”, de Rafael Saar, e o longa “Luz nas trevas”, de Helena Ignez e Ícaro Martins. Foi retratado no documentário “Olho nu”, de Joel Pizzini, exibido este ano no Festival de Brasília.
Em paralelo, Ney entrou de cabeça numa campanha em prol dos portadores de hanseníase. O convite surgiu ao acaso, quando recebeu uma ligação por engano, endereçada ao ator Ney Latorraca.
— Volta e meia sou chamado de Latorraca na rua. Aceno de volta — diz, resignado.
Dias antes, Latorraca (o original) havia declarado, numa entrevista, que, quando morresse, deixaria a herança para os portadores de hanseníase. Ao ouvir a história pelo telefone, Latorraca (o Matogrosso) se surpreendeu:
— Perguntei: “Mas ainda existe isso no Brasil?” Comecei a dar trela para o assunto.
Esteve com José Serra, ministro da Saúde do governo Fernando Henrique (“Ele foi indiferente. Fiquei chocado. São mais de 40 mil pessoas infectadas por ano”), e com Lula, que instituiu uma pensão indenizatória para os pacientes que foram internados à força em asilos.
— Essa doença tem que ser banalizada, vulgarizada, para que acabe o preconceito, que é gigantesco — afirma. — Abraço e beijo todos. Para pegar a doença, tem que ter um contato regular.
Idealizador de duas caixas de CDs com a obra de Ney Matogrosso, o produtor Rodrigo Faour diz que, além da qualidade musical, Ney tem uma segunda característica menos lembrada: a integridade.
— Nunca conheci uma pessoa do tamanho dele que atenda ao telefone, que não coloque problema onde não tem. Ele me ensinou que você pode curtir, mas não pode acreditar no sucesso.
Quanto à música, teoriza:
— Ele não gosta de cantar o que já deu certo. Um show dele é como se fosse um espetáculo de teatro, um texto que ele prepara para o público. E o ator não quer fazer sempre o mesmo texto.
Insônia, personal trainer e astrologia
Ney tem, desde sempre, dificuldade para dormir. Quando está em turnê, leva fita crepe na mala, que usa para tapar eventuais entradas de luz nas janelas dos hotéis. Já tomou hipnóticos, que descartou, por demasiado fortes. Hoje faz uso de uma pílula de Frontal antes de se deitar.
— Na semana passada fiz um exame do sono em São Paulo. Passei a noite com eletrodos no peito e na cabeça. Fico achando que é vício, da época do Hospital de Base de Brasília.
No Rio, acorda por volta de nove da manhã. Recebe um personal trainerde segunda a sexta-feira, que o ajuda a treinar num sótão adaptado com aparelhos de ginástica. Almoça e janta em casa, pouco sai à rua. Diz ler muito (seu último livro de cabeceira é “Havia gigantes na Terra — Deuses, semideuses e antepassados humanos: a evidência do DNA alienígena”, de Zecharia Sitchin).
— É a teoria de um camarada da Nasa de que os seres da mitologia existiram — explica. — Leio sobre geologia, biologia, astrologia, astronomia. Não gosto de romance.
A decoração de seu apartamento segue uma lógica mais afetiva que estética. Uma poltrona está arranhada pelas unhas dos gatos Nego e Zula. Outra, coberta por uma bandeira de Pernambuco. Na sala, há uma estante com taças. No escritório, alguns livros velhos de botânica e arte. Três toalhas coloridas, com motivos de flores, repousam sobre uma cadeira perto da piscina; há cristais e pedras por toda parte. A maioria dos quadros nas paredes chegou ali presenteada pelos próprios pintores. Assim foi com três obras de Gilvan Nunes; assim foi com um retrato pintado em 1978 pelo goiano Siron Franco.
Televisão, assiste pouco. Música, só quando liga o rádio do carro. Sua festa de 70 anos, em 2012, foi sem som.
— Ele diz que música é trabalho. Queria que as pessoas conversassem — conta o amigo e diretor Joel Pizzini.
Quando vai para o sítio que tem em Saquarema, gosta de escutar o barulho da noite:
— Acendo uma vela e fico ouvindo a noite se instalar. Vai virando uma sinfonia. Já passei quatro horas com o gravador ligado, na mão, só ouvindo, com a sensação de estar dentro de uma coisa viva.
Não tem iPod. Seu aparelho de rádio é antigo e pequeno, com uma única entrada para CD. Vez por outra revisita seus discos.
— Dia desses, parei para ouvir de novo um que gravei com músicas do Cartola. Gostei. Achei os arranjos chiques — avalia.
Não atrela o que canta ao seu estado de espírito:
— Posso fazer um trabalho sobre o amor sem estar apaixonado. E um trabalho alegríssimo, estando triste.
Nunca entrou no Facebook. Soube que existe um perfil falso seu no Twitter, com quatro mil seguidores.
— Fica esse camarada lá falando o que bem entende — reclama.
Ney teve um relacionamento estável de 1980 a 1993, ano da morte de seu parceiro. Chegaram a morar juntos por sete anos. Desde então, teve alguns namoros, que não revela. Mas não se diz solitário:
— Não gosto de tumulto. Recebo e vou à casa de amigos. Mas gosto de ficar sozinho. Sempre estou fazendo alguma coisa, regando as plantas, costurando.
Seu pai morreu quando já tinham feito as pazes.
— Ele foi a figura mais importante da minha vida. Graças a ele sou a pessoa que sou — costuma dizer. — Depois das brigas tivemos conversas. Ele disse como se arrependia da forma que tinha criado os filhos homens. Fui o único filho que beijou ele a vida inteira. Se existe essa questão de carma, nós queimamos o nosso. O amor que passou a existir nos libertou.
Perdeu também sua gata Rita, dois anos atrás, de um problema súbito no pâncreas:
— A Rita dormia comigo, andava atrás de mim pela casa, que nem cachorro. Era o meu amor. Como eu havia perdido muitos amigos, pensei que fosse uma pessoa preparada para a morte — lembra. — Não era. Fiquei apático, não saía para a rua.
Ney se diz um ser noturno, um “vampiro”. Ao cair da tarde, deixa a casa na penumbra e observa o acender de luzes nos apartamentos do Leblon (seu prédio, de 14 andares, é mais alto que os demais do entorno). Diz que a cidade, nesse momento, lembra um presépio.
Continua magro, com 61 quilos. Aparenta menos que os 72 anos que completará em agosto. No seu último check-up, o médico diagnosticou que seu organismo é como o de uma pessoa de 50 anos.
— Não sei que idade eu tenho. Não me sinto um velho na cabeça e na vida — garante.
Usa roupas básicas: uma camiseta, um jeans, uma bota de couro. Chegou a passar produto contra queda capilar — que logo abandonou, por preguiça. Nunca tomou Viagra.
— Tenho medo de tomar. Você tem que conviver com essa coisa de broxar, faz parte da vida. Antigamente eu era entregue ao sexo, se não trepava, não dormia. Nunca me arrependi disso — lembra. — Hoje não diria que estou apaziguado, mas não tenho mais a ansiedade. Não sinto tesão se não tem carinho.
A primeira entrevista de Ney Matogrosso aconteceu 40 anos atrás, quando do estouro repentino do Secos & Molhados. Ficou aflito, até ouvir a pergunta inicial:
— Entrei em pânico. Mas uma coisa dentro de mim disse: “Fala a verdade.” Acredito que tenho o direito de ser a pessoa que eu sou.
É o que tem feito desde então. Numa cena do filme “Olho nu”, ele declara: “Não busco Deus fora. Busco dentro de mim.”
— Gostaria de ser lembrado como uma pessoa que defendeu a liberdade de expressão, de ser, de existir — complementa. — Como alguém que ousou lutar contra a hipocrisia das coisas.


http://oglobo.globo.com/cultura/ney-matogrosso




 

Maria Bethania dá o recado...


A difícil conquista de Dorival Caymmi

Photo: A DIFÍCIL CONQUISTA DE DORIVAL CAYMMI
Inveja, ciúmes, indiferença... Livro conta como foi a chegada do baiano ao Rio
► http://migre.me/ej3CM


Inveja, ciúmes, indiferença... Livro conta como foi a chegada do baiano ao Rio


27 de abril de 2013 | 10h 47

Julio Maria - O Estado de S.Paulo

Dorival Caymmi deitava na rede com a cabeça quente. Ao contrário da ideia de que tudo lhe chegava pelas mãos do vento, de que sua vida foi uma eterna tarde à sombra de um coqueiro em Itapuã, Caymmi sofreu calado. Sua chegada ao estrelato na voz de Carmen Miranda cantando O Que É Que a Baiana Tem?, em 1938, lançada no filme Banana da Terra, o fez vítima duas vezes: Carmen - não havia como ser o contrário - ofuscou a relevância de Caymmi. Diante do carisma avassalador da ‘pequena notável’, pouca gente queria saber que cabeça estava por trás daquelas canções. E O Que É Que a Baiana Tem? foi só o começo. Menos de um ano depois, em 1939, Carmen embarcou para os Estados Unidos levando mais três composições na bagagem: A Preta do Acarajé, Roda Pião e O Dengo (lançado em 1941). Nos anos em que autor de música mal recebia direito autoral, Caymmi sentia o peso da indiferença ao seu nome no mundo novo que Carmen conquistava.

O cantor e compositor baiano Dorival Caymmi em 1997 - Tasso Marcelo/AE
Tasso Marcelo/AE
O cantor e compositor baiano Dorival Caymmi em 1997
 
A classe dos compositores do Rio de Janeiro também não recebeu o baiano com um festival de acarajés. Afinal, como é que um sujeito de fala mansa saía das terras lá de cima cheio de risinhos para ganhar Carmen logo na chegada? Notas em jornais o desqualificavam de tal forma que o periódico O Imparcial, da Bahia, assumiu sua defesa, questionando "de onde poderia sair tamanha resistência?". Caymmi incomodava o mundo sem mover um fio do seu bigode.
O Que É Que a Baiana Tem? pisou também no pé de Ary Barroso. A música para o filme Banana da Terra seria A Baixa do Sapateiro, de Ary, se ele não tivesse pedido um aumento em seu cachê por saber que os direitos da canção passariam a ser do produtor Wallace Downey assim que o filme fosse lançado no exterior. Ary saiu da jogada e Caymmi entrou. Ganhou a gravação de Carmen e a ira de Ary. O jornalista e compositor Antonio Maria quis saber de Ary o que ele achava do baiano. "Ele veio ruim da Bahia, só melhorou no meio do caminho...", disse. E o acusou ainda de ter praticado plágio. Jogou tão baixo que teve de reconhecer depois que foi longe demais. Já nos fins dos anos 90, quando a neta Stella Caymmi o entrevistou para lançar a biografia Dorival Caymmi, O Mar e o Tempo, o compositor disse que se ressentia sobretudo de episódios do início de carreira. "Ele sentia não ter tido sua importância reconhecida."
Stella volta agora às memórias do avô com O Que É Que a Baiana Tem - Dorival Caymmi na Era do Rádio, uma detalhada pesquisa que traça um momento histórico de vitórias e percalços de um dos maiores compositores brasileiros. Caymmi foi atormentado, sofreu pressões de diferentes grupos da sociedade dos anos 40 e 50 e foi atingido por ciúme, inveja e indiferença mesmo depois de cair nas graças de Carmen Miranda.
Seu primeiro contrato com uma gravadora veio logo depois do estouro da Baiana, uma experiência que o deixou traumatizado. A Odeon estipulava simplesmente seis sucessos obrigatórios por ano. Que Caymmi se virasse para fazer outras baianas virarem fenômeno de vendas. O compositor olhou aquilo desconfiado: "Isso não vai dar certo e você vai me mandar embora", disse aos diretores da companhia. A profecia se cumpriu em 1941. Uma história conta que a Odeon o demitiu por sua demora em criar novas músicas. O fato é que, no olho da rua, Dorival Caymmi voltou aos diretores da Odeon apenas para lembrar: "Eu disse que isso não iria dar certo".
Stella tem suas desconfianças sobre as razões que teriam motivado Villa-Lobos a desencorajar Caymmi dos estudos de música. O interessante do trabalho do baiano era seu primitivismo, defendia Villa. Logo, interferências a ele com conceitos acadêmicos poderiam colocar em risco sua autenticidade. Mais tarde, Caymmi contou à neta que seu sonho era estudar música. "E desde quando estudo atrapalha?", questiona Stella.
Em 2014 serão celebrados os 100 anos de nascimento de Dorival, morto em 2008. Dentre os lançamentos, um disco em família (gravado por Nana, mãe de Stella, Danilo e Dori), que também será lançado em DVD, trará uma canção inédita. Cantiga de Cego foi feita em parceria com o poeta Jorge Amado para ser trilha da adaptação teatral de seu livro Terras do Sem Fim. Mais do que suscitar revisionismos, 2014 pode ser a chance para se colocar o pingo certo no único i de Caymmi.

http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,a-dificil-conquista-de-dorival-caymmi,1026176,0.htm


sábado, 27 de abril de 2013

Eu Sei


Eu sei
Marisa Monte

Um dia eu vou estar à toa
E você vai estar na mira
Eu sei que você sabe
Que eu sei que você sabe
Que é difícil de dizer
O meu coração
É um músculo involuntário
E ele pulsa por você
Um dia eu vou estar contigo
E você vai estar na minha

Enquanto eu vou andando o mundo gira
E nos espera numa boa
Eu sei, eu sei,
Eu sei

LIXO EXTRAORDINÁRIO


ANIMUS MOVENDI

relativizando o movimento e o referencial

LIXO EXTRAORDINÁRIO

em fotografia por  em 09 de jun de 2012 
Extraordinário – aquele fato imprevisível capaz de produzir uma sensação marcante, fora da ordem... um impactante suspiro de admiração.

Vicente José de Oliveira Muniz é o inconfundível Vik Muniz. Nascido em São Paulo em 1961, estabeleceu sua vida e domicílio na cidade de Nova York, desde 1983. Fotógrafo, desenhista, pintor e escultor - um artista múltiplo.

Seu processo criativo passa pela composição das imagens, utilizando materiais instáveis e perecíveis; a reutilização de conceitos e enfoques; a disposição em uma superfície ou plano para fotografá-las. As séries são apresentadas como edições limitadas e especiais, onde a fotografia assume o papel de produto final do trabalho – a célebre ilustradora do seu cartão de visitas.
Em 1988, produziu uma série de desenhos “The Best of Life”, na qual reproduziu a sua memória, de algumas das famosas fotografias veiculadas pela revista americana Life. O artista fotografou seus desenhos e deu a eles um tratamento de impressão, simulando a realidade. A partir de uma abordagem muito sensível e plástica, provocou o debate sobre questões relacionadas à circulação e contextualização de imagens. “Nesses trabalhos eu tentei encontrar como a fotografia se parece em nossa cabeça quando não estamos olhando para ela. Elas trazem as estruturas das famosas fotos, mas, na verdade, são muito diferentes”, na explicação do artista.
Nas séries seguintes: Imagens de Arame, Imagens de Terra, Imagens de Chocolate, Crianças de Açúcar (que receberam o nome do material utilizado), recriou imagens referentes ao universo da história da arte e do cotidiano.
Suas obras podem ser encontradas em importantes acervos, como da Tate Modern e do Victoria & Albert Museum, ambos em Londres. Muniz foi curador da mostra “Artist’s Choice”, a convite do Museum of Modern Art (MoMA New York).
A série “Pictures of Garbage” inspirou e originou o documentário brasileiro indicado ao Oscar , intitulado Lixo Extraordinário, feito com ajuda do seu próprio tema: catadores de lixo do aterro de Gramacho (RJ), que, após serem fotografados, trabalharam ao lado do artista no processo de montagem das obras, selecionando as imagens. A filmagem recebeu um prêmio no festival de Berlim na categoria Anistia Internacional e no Festival de Sundance.
lixo_.jpg
vik_muniz_passione.jpg
vik_muniz-sarah_bernhardt.jpg
processo de criação2.jpg
lixo.jpg
processo de criação.jpg
lixo_extraordinario_alta.jpg
lixo_extraordinario.jpg
Para saber mais sobre o artista brasileiro - Vik Muniz

Blanco - Marisa Monte






  1. Blanco (poema do mexicano Octavio Paz, traduzido por Haroldo de Campos e musicado por Marisa).

    Me vejo no que vejo
    Como entrar por meus olhos
    Em um olho mais límpido
    Me olha o que eu olho
    É minha criação
    Isto que vejo
    Perceber é conceber
    Águas de pensamentos
    Sou a criatura do que vejo.


Pelo Tempo que Durar (Marisa Monte)


Marisa Monte: “Nuestra forma de mirar habla de nosotros”


Marisa Monte. / Tom Munro

Carlos Galilea
 
Entró en el Estadio Olímpico de Londres, al final de la clausura de los Juegos, tras la exhibición de poderío musical en que los británicos convirtieron la ceremonia. Marisa Monte encarnó a Iemanjá, diosa de las aguas del mar en el sincretismo religioso brasileño, cantando el aria de la Bachiana nº5 de Villa-Lobos. “Fue muy emocionante porque nunca había participado en algo tan global. El espectáculo se desarrolla en el estadio, y tiene cierto impacto allí, pero dónde tiene que ser todo perfecto es en televisión. La producción fue primorosa. La parte brasileña, en los últimos ocho minutos, aunque subordinada a la estructura de los ingleses, se hizo con cierta independencia”, cuenta la cantante desde su casa en el barrio de Gávea, en Río de Janeiro. Todavía no está claro si participará en los fastos de 2016 en su ciudad. Deja la puerta abierta tanto a las Olimpiadas como al Mundial de Fútbol de 2014 o a la Copa Confederaciones que se va a celebrar en junio en Brasil.
Marisa Monte es una de las cuatro brasileñas elegidas para el calendario Pirelli 2013: junto a las modelos de rigor, fotografiadas en escenarios de Río por Steve McCurry, el estadounidense cuyo retrato de una niña afgana dio la vuelta al mundo a mediados de los ochenta. “El calendario se centra tradicionalmente en la belleza física de la mujer, pero este año cambiaron el concepto incluyendo mujeres que tienen relevancia por su trabajo o su activismo en causas humanitarias. Me invitaron en parte por mi contribución al proyecto Red Hot [organización que lucha contra el sida para la que ha grabado Aguas de março con David Byrne y, con Devendra Banhart y Rodrigo Amarante, una antigua canción de Caetano Veloso]. La intención era encontrar otra mirada sobre la belleza femenina, sobre la sensibilidad de la mujer”.
Alguien puede pensar que Marisa Monte es maravillosa y otro que es horrorosa. Tiene más que ver con las propias personas que conmigo”
Tenía 19 años –ahora 45- cuando su nombre apareció por primera vez en periódicos y revistas. Se presentaba únicamente en clubes y pequeños teatros. Pocos la habían oído cantar, pero todo el mundo hablaba de aquella muchacha alta, delgada y pálida. Un antiguo directivo de su discográfica suele contar lo que toda la profesión sabe en Brasil: que Marisa Monte logró desde el primer día un control sobre su obra como probablemente ningún músico contratado por una multinacional. Desde la portada del disco hasta que una canción suya pueda figurar en un recopilatorio o ser utilizada para un anuncio. Nada puede hacerse sin su autorización.
La relación con los medios ha cambiado radicalmente en estos 25 años de oficio. La promoción del último disco se hizo sobre todo a través de su página web. “Acorta el camino, elimina muchos intermediarios, y eso es un sueño, una utopía maravillosa para el artista y también para el fan, que tiene una fuente directa, oficial, de informaciones. Por otro lado, las formas de consumir música se han diversificado mucho. Ahora existen millones de maneras diferentes de oir música. No es sólo a través de los conciertos, el disco y la radio. Se descarga, se escucha en servicios de streaming, en los portátiles personales... Como consumidora me parece fantástico poder escuchar en mi teléfono móvil, en plena madrugada, a cualquier artista de cualquier lugar del mundo y de cualquier época”.
“Sin embargo, personalmente, no tengo Facebook, no utilizo Twitter ni Instagram. Como artista todos esos servicios los lleva para mi una empresa. Permiten una comunicación ágil con el público que se interesa por mi trabajo. Yo lo superviso todo, sé lo que se está colgando y, de vez en cuando, yo misma cuento algo allí. Pero con mis amigos me comunico por teléfono o por correo electrónico. No tengo ganas de publicar mensajes colectivos sobre mi vida privada. No me seduce e incluso me parece innecesario”.
Aún hay nostálgicos que se preguntan si los exitosos Tribalistas volverán algún día. “Los Tribalistas nunca se fueron”, exclama, “continuamos escribiendo canciones juntos. El proyecto fortaleció nuestra relación de amistad y no sufrimos desgaste tal vez porque no hicimos una gira. Sobrevivimos a aquello y desde entonces ya compusimos y grabamos suficiente material en mis discos, los de Arnaldo [Antunes] y los de [Carlinhos] Brown como para, aunque de forma más atomizada, tres discos más de Tribalistas que todo el mundo ha escuchado ya. Me parece interesante la no percepción de ese hecho. Nunca fuimos un grupo y nunca dejamos de existir como núcleo de creación. Somos tres artistas con trabajos individuales que hicimos un trabajo colectivo que ya era consecuencia en aquel momento de diez años de colaboraciones entre los tres. Y hoy, diez años después, seguimos componiendo mucho juntos”.
En su último disco, O que você quer saber de verdade, octavo que lleva su firma, junto a los temas escritos con Arnaldo Antunes y Carlinhos Brown, Marisa Monte exploró una vez más el cancionero de las últimas décadas. Al publicarse en Brasil, se la acusó en una revista cultural de haber grabado 14 canciones demasiado comerciales. “Yo no pienso en esos términos cuando compongo. Esas definiciones son completamente externas a mi raciocinio, a mis sentimientos. Creo que lo que hago está muy ligado a mis vivencias, a mis encuentros, a las conversaciones con mis colaboradores, a la música con la que crecí. Un reflejo mucho más amplio de mi experiencia existencial, que quizá coincide en muchos puntos con la de muchas otras personas”, explica. “Siempre he sido muy popular, ya desde mi primer disco, y, al mismo tiempo, con el aura de algo sofisticado. Y me parecía que las dos cosas podían convivir perfectamente. En mi opinión las etiquetas no sirven de una forma muy objetiva ni concluyente para casi nada”, dice riendo.
Como consumidora me parece fantástico poder escuchar en mi teléfono móvil, en plena madrugada, a cualquier artista de cualquier lugar del mundo y de cualquier época”
Si el disco generó críticas dispares, en cambio los conciertos de presentación han sido recibidos con elogios unánimes. Seis pantallas, en torno a nueve músicos y la cantante, muestran sin cesar vídeos, fotografías y palabras. Imágenes extraídas de obras de 15 artistas plásticos brasileños contemporáneos como Tunga, José Damasceno, Luiz Zerbini... y animadas y programadas por Emotique, un colectivo de Barcelona que desarrolló un software especial para la gira y que ya ha instalado sistemas similares en el Sónar y la Fundación Miró.
“Abro las actuaciones con una canción que escribí hace años sobre un poema de Octavio Paz en versión de Haroldo de Campos. Y precisamente el primer verso dice “me vejo no que vejo” (me veo en lo que veo). Nuestra forma de mirar el mundo habla de nosotros mismos. Alguien puede pensar que Marisa Monte es maravillosa y otro que es horrorosa. Tiene más que ver con las propias personas que conmigo. Creo que comienzo así la actuación para decirles que cuando me ven en realidad se ven a sí mismas. ‘Prestad atención porque hoy os vais a ver”.
Interpreta Sono come tu mi vuoi, que Mina llevó al éxito hace más de cuarenta años. Hace dos, la mítica cantante italiana incluyó en su disco Piccolino una composición de Marisa Monte y Arnaldo Antunes: Ainda bem. “La invité para que la cantara conmigo en mi disco, pero se demoró intentando escribir una letra en italiano y se pasó el plazo de la grabación. Me dijo que la quería grabar en el suyo y al final prefirió cantarla en portugués. Me sentí muy honrada porque soy muy fan. Tengo muchos discos y DVDs suyos”. Recuerda que siendo muy joven estudió para cantante lírica en Roma. Unos meses. Y sabe “el frisson que Mina causa en Italia”.
Podría parecer que siempre tuvo el viento a favor, que todo le ha resultado fácil. “Esa afirmación le quita un poco de mérito al trabajo”, dice riendo. “Soy muy trabajadora y digamos que supe honrar a la suerte y el talento. Y tengo vocación por lo que hago. No me extravié por el camino, no desperdicié la energía, no perdí la alegría y el placer. Empecé a ser famosa con 20 años, pero trabajaba desde los 14. No sólo con música también en otras áreas. No me asusta el trabajo ¿sabe? Me encanta. Es un gran valor en mi vida y quizá haya guiado todos estos 25 años.”
Marisa Monte no está dispuesta a pasar demasiado tiempo lejos de casa. “Consigo organizarme porque tengo dos hijos pequeños. Mi vida no es sólo trabajo. No quiero perderme ninguna de las dos cosas y ése también es un desafío de la mujer de hoy”. Asegura que le gustan las rutinas de la vida cotidiana y tiene clarísimo que una gira puede ser algo muy poco saludable. “Yo podría ser una atleta, creo que tengo personalidad de atleta”, dice. “No salgo mucho, leo bastante, intento hacer un poco de ejercicio todos los días y descanso lo suficiente. Para dar lo mejor de mí. No como nada pesado, no salgo a almorzar fuera, no bebo. Me cuido como si estuviera concentrada en la víspera de un partido de fútbol. Y eso se refleja en una estabilidad, una solidez, que me permiten sentirme bien en el escenario. Es horrible estar en un escenario y no sentirse bien”.

Marisa Monte actuará el día 30 en Barcelona (Gran Teatre del Liceu) y el 2 de mayo en Madrid (Palacio Municipal de Congresos).
O que você quer saber de verdade está editado por EMI. www.marisamonte.com.br
 
 
*Um passarinho pousou na minha janela e me disse pra ler o http://cultura.elpais.com/cultura/2013/04/25/actualidad/1366889270_350122.html
 
 
 

sexta-feira, 26 de abril de 2013

NADA ALÉM - LUIZ MELODIA -



Nada além
Nada além de uma ilusão
Chega bem 
Que é demais para o meu coração
Acreditando 
Em tudo que o amor mentindo sempre diz
Eu vou vivendo assim feliz
Na ilusão de ser feliz
Se o amor só nos causa sofrimento e dor
E melhor bem melhor a ilusão do amor
Eu não quero e não peço 
Para o meu coração
Nada além de uma linda ilusão

Se o amor
Só nos causa sofrimento e dor
E melhor, bem melhor
A ilusão do amor
Eu não quero e não peço 
Para o meu coração
Nada além de uma linda ilusã

‘La noche de la iguana’




Los cuatro revólveres de ‘La noche de la iguana’

Huston consiguió un reparto tan estelar como repleto de egos: Richard Burton, Ava Gardner, Deborah Kerr y Sue Lyon

 

Alcohol, frustraciones, sexualidad reprimida, miserias... En La noche de la iguana, el dramaturgo Tennessee Williams volvió a combinar el abanico de ingredientes emocionales con los que había estado experimentando a lo largo de toda su carrera. El director John Huston los envolvió en una atmósfera sofocante de aislamiento, calor y humedad, y, entre los dos, cocinaron una obra maestra a fuego intenso.
El guion estaba basado en la obra del mismo título que había triunfado en Broadway con Bette Davis como protagonista. John Huston consiguió un reparto estelar: Richard Burton, Ava Gardner, Deborah Kerr y Sue Lyon, que después de haberse dado a conocer en Lolita se había convertido en el icono de la precocidad sexual. Todos estaban en lo más alto de su popularidad. Consciente del impacto que podría tener la presencia de todas aquellas estrellas en el lugar de rodaje y de la revolución mediática que podrían ocasionar, Huston se decantó por una localización aislada. La película se rodó en la localidad mexicana de Puerto Vallarta que, por entonces, no pasaba de ser una remota aldea de pescadores. El elenco de estrellas se instaló allí durante semanas, en una convivencia que puede que sirviera para que los actores se acercaran al estado emocional de sus personajes, pero que a priori era temible. Una reunión de egos en la que todo hacía presagiar que saltarían chispas, más aún teniendo en cuenta que –todo el mundo lo sabía– no era difícil trazar en aquel grupo conexiones de tipo sentimental. Sin ir más lejos, Peter Viertel, marido de Deborah Kerr, había tenido un lío previo con Ava Gardner. Curándose en salud, antes de viajar a Puerto Vallarta, Huston reunió a sus actores y regaló a cada uno de ellos un revólver Derringer. "Dentro hay unas balas doradas en las que están escritos los nombres de los demás", les dijo. "Si las necesitáis durante el rodaje, utilizadlas, y así me evitáis a mí problemas".
Contra todo pronóstico, nadie echó mano de su arma. Y eso a pesar de que, al parecer, el alcohol fluía a oleadas, con un Richard Burton que desayunaba cerveza y una Ava Gardner que trataba de ahogar la inseguridad que le provocaban algunas escenas. A Puerto Vallarta también se trasladó Tennessee Williams, que ayudaba a Huston cuando este se estancaba con algún diálogo; el novio de Sue Lyon, a quien el director prohibió acercarse al plató porque no dejaba de darse arrumacos con la actriz, y también Liz Taylor, que se instaló allí para acompañar a Richard Burton y que trabó una relación tan estrecha con el sobrino de un vecino que, meses después, volvería para asistir a su primera comunión. En sus memorias Ava Gardner sólo tuvo halagos para la Taylor y, ante tanta armonía inesperada en un rodaje que se preveía tumultuoso, la prensa desplazada hasta la zona no tuvo más remedio que entretenerse escribiendo acerca del lugar. La noche de la iguana supuso un antes y un después para Puerto Vallarta que, a partir de entonces, empezó a transformarse en un centro turístico. "Fue una bendición a medias", diría John Huston años después. “Las playas se llenaron de hoteles y grandes y edificios de apartamentos. Los habitantes se convirtieron en camareros, doncellas y policías. La mayoría de las tiendas están orientadas al turismo, pero el agua es potable, la fiebre tifoidea y el tifus casi han desaparecido. Los niños tienen tantas posibilidades de nacer vivos como en cualquier lugar de Estados Unidos y ahora hay escuelas”.
La noche de la iguana ganó en 1965 los Oscar a mejor fotografía, dirección artística y mejor actriz de reparto, para Dorothy Jeakins. Ava Gardner, sin embargo, ni siquiera consiguió una candidatura. Ganó, eso sí, el premio a mejor intérprete femenina en el Festival de San Sebastián, y hoy todo el mundo coincide en que La noche de la iguana es una de sus mejores interpretaciones. Un gran texto de Tennessee Williams. Una de las grandes películas de John Huston.